1. Uma peça (de antologia, de finíssimo humor...) que eu acabo de receber do ilustre jurista João Seabra, ex-Alf Mil da CCAV 8350, Piratas de Guileje (Guileje, 1972/74), e querido (como todos os demais) membro da nossa Tabanca Grande:
Caro Luís,
Recebi, há dias, um mail teu em que vinha anexo o actual RDM (*).
Andando para trás no blogue, encontrei uma sugestão tua para que eu e o Jorge Cabral, entre outros, nos pronunciássemos sobre as hipotéticas consequências criminais do constante numa narrativa do Amílcar Ventura (**).
Antes de mais, deixa-me dizer-te que tenho o Amílcar na conta de boa pessoa. Aliás, já foi muito simpático comigo, a propósito de uma correspondência tumultuária que manteve, há tempos, com um terceiro e que desencadeou, por iniciativa deste último, numa grande agitação em cavalariças e canis.
Todavia, aqui para nós, parece-me (podendo estar enganado) que a história dele é uma fantasia que terá descambado em convicção. Aliás não é a primeira, nem será a última, que aparece no blogue.
O menos que se poderá dizer é que o frete foi muito pouco produtivo. Porque não levou ele mais dois ou três bidons de gasóleo? Era para uma emergência?
De qualquer modo, o RDM dispõe sobre ilícitos disciplinares, e a matéria de que se trata é de natureza criminal e está contemplada no Código de Justiça Militar (CJM). Que eu saiba, ao CJM em vigor em 73-74 seguiu-se outro de 77, outro de 2003, e ainda outro mais recente.
Acontece que as minhas áreas de actuação profissional são as do direito fiscal e do direito das sociedades. Neste momento, por exemplo, estou muito atrapalhado porque tenho de opinar urgentemente sobre a vexatória questão da hipotética neutralidade fiscal da fusão inversa. Se calhar vou-lhe chamar reverse merger porque, como diria o Serafim Saudade, “o verdadeiro artista é o que fala estrangeiro”.
Do CJM ocorre-me – “entre as brumas da memória” – a curiosa figura do “presumido delinquente”, e pouco mais. E mesmo assim, porque – por vezes e com grande gáudio – ouço colegas espanhóis aludirem aos “presuntos implicados”.
Para tratar adequadamente a vertiginosa questão da sucessão de leis penais, e da qualificação da hipótese em causa, a pessoa indicada é, realmente, o Jorge Cabral. Mas seria um desperdício, porque o iria distrair das valiosas opiniões periciais que nos vai dando sobre matérias menos áridas.
No fundo seria preferível encerrar o assunto, como o fez, há muitos anos, um magistrado do Ministério Público, quando soube que tinha sido bem sucedido num concurso para a carreira diplomática.
Os impulsos processuais do Ministério Público, designam-se, no nosso jargão, por “promoções”.
Vai daí o nosso futuro diplomata, no primeiro processo que lhe chegou às mãos, exarou o seguinte:
Tendo decorrido o prazo,
e operado a prescrição
vão os autos para arquivo
- eis a minha promoção.
Aplicando o que antecede a mim próprio, diria que muito me preocupa a eventualidade de, involuntariamente, concorrer para envenenar o ambiente de um blogue fundado por um grupo de amigos e que vive, sobretudo, da inexcedível dedicação dos seus editores.
Assim sendo, vou fazer o possível para, de futuro, escrever apenas para arquivo ou para “presuntos interessados”. Se e quando tiver tempo, já se vê.
Abraço amigo do
João Seabra
P.S.: Uma observação (ou “nota”, como se diz agora) final. Fiz serviço militar na Guiné na condição de “compelido”. Mas, uma vez lá, a situação, para mim, era muito simples: de um lado estavam as nossas forças (às quais eu pertencia) e do outro o inimigo. Tudo o mais são subtilezas que estão fora do meu alcance.
[ Revisão / fixação de texto / bold, a cor: L.G.]
___________
Notas de L.G.:
(*) Dirigido ao Jorge Cabral e com conhecimento a outros juristas da nossa Tabanca Grande:
"Jorge: Aqui tens o novo RDM... Não sei se tens tempo e pachorra para o analisar, do ponto de vista daquilo que pode interessar ao nosso blogue e à nossa Tabanca Grande".
(**) Vd. poste de 24 de Setembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5002: O segredo de... (7): Amílcar Ventura: Ajudei o PAIGC por razões políticas e humanitárias
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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1 comentário:
Caro João Seabra e, por extenção, aos nossos devotados editores e feis blogistas e leitores
Tomando as palavras do douto Sr Juiz e
TENDO DECORRIDO O PRAZO
e ao tempo passado desde o facto relatado
E OPERADO A PRESCRIÇÃO
e após fazermos uma boa reflecção
VÃO OS AUTOS PARA ARQUIVO
e propor que, de futuro se evite tratar de casos fracturante com levesa
- EIS A MINHA [NOSSA] PROMOÇÃO.
Criar, de novo, uma saudavel troca de experiencias e comentários
José Martins
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