1. Em mensagem de José Manuel Matos Dinis* (ex-Fur Mil da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71), com data de 17 de Maio de 2010 recebemos mais este pedaço da História da sua Companhia:
HISTÓRIA DA CCAÇ 2679 (36)
O jogo do gato e do rato
Com um pedaço de pão limpei o óleo, quase côr de sangue, que cobria o fundo da lata de chouriço. O petisco salgado soubera-me muito bem, e esta gordura prolongava o prazer do paladar. O local era fresco, se assim se pode dizer de uma temperatura ambiente idêntica às dos meses de Verão em Portugal, mas a sombra proporcionada pelas muitas árvores, conferia uma frescura que nós valorizávamos.
Um ou outro chamamento das aves que esvoaçavam entre as copas, contribuía para o ambiente bucólico da savana algo densa nesta região fronteiriça com o Senegal.
Apeteceu-me saborear o sol. Assim, a modos que um qualquer turista em região de excursões, deixei escorregar o corpo num local onde incidiam os raios do astro, apoiei a cabeça sobre as cartucheiras, abri a camisa e senti o efeito da luz rarefeita pela folhagem, mas que me aquecia o peito como se estivesse em estância balnear.
Em redor, o pessoal também adoptava atitudes pachorrentas.
Era muito improvável que, àquela hora e naquele lugar (fora de trilhos e linhas de passagem na fronteira), tivéssemos um inesperado encontro com o IN, por isso dava oportunidade à descontração.
Passaram-se alguns momentos naquele estado de ausência, em que a mente voava para outras paragens familiares e saudosas.
Até que do ar, lá longe, da direcção de Pirada, chegou o ruído grave e mecânico de um helicóptero. Abri os olhos, apurei os sentidos, e parecia que o aparelho pairava suspenso no ar, como quem me procurava. Mau, pensei para comigo. De facto, o Foxtrot estava muito longe do percurso desenhado para uma daquelas patrulhas de combate, pomposa designação que nos dá a ideia de termos saído à caça do IN, como os caçadores saem de casa, caçadeira ao ombro, e embrenham-se no campo, de onde regressam com meia-dúzia de rolas, enquanto os canitos alegres fazem correrias espevitados por cheiros de animais que passaram pelos caminhos. Pois era destas sugestões que viviam os nossos gestores de Operações, que faziam traços coloridos sobre as cartas, para a tropa devassar numa lógica de que se ali passassemos, a guerra estava controlada.
Entretanto, aquelas ondas sonoras provenientes do movimento das pás e dos motores, pareciam garantir-me que, lá do alto, alguém queria observar os nossos movimentos em terra. Talvez por isso, ou porque eu sabia perfeitamente que me estava a baldar para o percurso, que devia estender-se precisamente naquela direcção, dei um salto e dirigi-me para o Transmissões:
- Nuno, dá cá a pilha do rádio!
O Nuno quase não reagiu, com um olhar surpreso, calado, sem esboçar qualquer movimento, como se lhe tirassem a vida, tirando-lhe a pilha do rádio.
- Dá cá a pilha, não ouves? insisti.
Ouviu, e incrédulo retirou a pilha do rádio para ma entregar. Guardei-a, e perante os olhares atónitos justifiquei-me:
- Malta, nós devíamos estar naquela área que o héli sobrevoa, mas decidi ficarmos por aqui a descansar. Esta minha decisão pode custar uma porrada para mim, por isso não quero qualquer comunicação. Se vocês se dispuserem a fazer uma corrida de quatro ou cinco quilómetros, pode ser que a coisa passe, sobretudo se o héli voltar àquele lugar.
O Pelotão, estimulado por dois ou três, decidiu imediatamente, que sim, que num instante nos poríamos lá.
Começámos a correria, toc-toc, com as mochilas a bater nas nádegas e nos cantis, tropeçando em raízes e lianas, em gincana por entre os obstáculos da vegetação.
Até que chegámos ao rio Mael Jaubé.
O rio apresentava-se quase seco, limitado a três ou quatro drenos onde a água, praticamente estagnada, esperava os efeitos da vaporização até à seca derradeira. Não era um obstáculo, mas as botas submergiram à sua passagem, encharcando os pés e dificultando a marcha. Não desistimos, que o Foxtrot era um grupo determinado e teimoso. Prolongámos a corrida por mais um pouco. Do héli já não havia sinal, ainda progredimos um bocado, até que a pedido de alguns fizémos uma paragem. Houve quem tirasse as botas e meias húmidas. Deixámo-nos estar ao sol, como bacalhaus a secar.
Quando decidi regressar ao aquartelamento, havia pessoal que não conseguia calçar as botas por terem os pés inchados. Surpresa ingrata aquela, que não permitia o regresso normal da patrulha. No entanto, aqueles poucos reagiram que andariam descalços, não haveria problema.
Do héli não tivemos mais notícias, nem sei se alguém tentou contactar-nos durante o percurso. A chegada verificou-se com os pés descalços fazendo chalaças sobre a situação.
__________
Notas de CV:
(*) Vd. poste de 4 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6309: Controvérsias (72): Uma Página Negra (José Manuel Matos Dinis)
Vd. último poste da série24 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6236: História da CCAÇ 2679 (35): De estórias se faz a história de uma Companhia (José Manuel M. Dinis)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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13 comentários:
Caro Zé Manel
Um relato bem feito.
Por um lado ressalta bem a unidade conseguida no grupo. Por outro, surpreende-me por te encontrar em situação de, digamos assim, 'não obediência' à orientação recebida.
É que me estou a lembrar de outros artigos teus em que aplicavas os teus métodos 'directos' para disciplinar o pessoal...
Abraço
Hélder S.
Linda história.
Parabéns
Filomena
Helder,
Sempre ouvi que um fraco chefe faz fraca a forte gente. Por isso não ganhàmos a guerra.
Desculpa lá qualquer coisinha.
JD
Ao contrário da Filomena, considero ser uma "triste história".
E depois queixam-se que o AB diga o que disse.
Abraços
António Martins de Matos
Meu Caro António Martins de Matos,
Sobre o comentário anterior, eu pergunto, o que disse o AB?
Que o pessoal se acoitava no arame.
Pois esta narrativa incide sobre uma acção fora do arame. Com possibilidades mínimas de contactar o IN, como em tantas vezes sempre aconteceu.
De facto, da única vez em que isso se me afigurou viável (contactar o IN), com a possibilidade de o emboscar, até de o apanhar à mão, comunicado o aquartelamento, foi transmitida a ordem, por parte do cmdt do CAOP ocasionalmente em Canquelifá, para retirar para um ponto elevado, que não havia, mas retirámos, para de lá bombardear em seguida.
Que resultados foram conseguidos?
Que moral para a tropa?
Por outro lado, sabendo que um pelotão era constituído por 30 elementos, o Foxtrot chegou a sair com apenas nove. Digamos que a média foi abaixo de 20. Quem se preocupou com essa situação? Qual a solidariedade manifestada por quem alinhava no mato?
Pois a este pelotão em formato reduzido, conforme narrarei mais tarde, foi incumbida a missão de fazer uma coluna a Copá, mesmo dispondo da informação da PIDE de que o Nino estaria emboscado no percurso.
O capitão cmdt de companhia teve comigo uma troca de impressões exemplar, digna do discurso dos cobardes.
Não sei se o Nino lá estava quando passei, mas fomos, e o pessoal sabia, porque os avisei, e pela disposição adoptada, do perigo que corríamos.
Nem o capitão, nem o cmdt do COT, nem o AB, nem qualquer representante do E.P. teve algum sentido de responsabilidade antes, nem manifestou apreço depois.
Meu Caro A.M.M., não me lembro do motivo porque não cumpria a rota traçada, mas fi-lo mais alguma vez, quando o pessoal manifestava cansaço e decidia dar descanso. Digamos que fiz uma gestão por conta própria, já que a incapacidade de quem teria essa responsabilidade, manifestou-se sempre em sentido contrário.
Aliás, ao longo da História da C.Caç. já dei notícia de alguns episódios ilustrativos da incompetência.
Calcorreei bastante daquele território, nunca me queixei, e andei só com o pelotão durante a maior parte do tempo. Não vejo em que é que o AB terá contribuído mais do que eu para atingirmos a vitória que, afinal, os altos comandos não conseguiram. Se calhar por incompetência.
Um abraço
JD
António Martins,
Podia simplesmente comentar o texto sem referir a Filomena.
Quero apenas que fique bem claro para todos, aliás não é a primeira vez que o afirmo:
Sou uma leitora assidua do Blogue, mas nada entendo da Guerra Colonial. Os meus comentários podem, ou devem ser avaliados apenas como uma leitora que leu uma história e gostou do que leu, seja qual for o escritor, e a verdade é que gostei do texto que li.
Um abraço
Filomena
E inegável que o JMD é dotado de inúmeras qualidades imaginativas. No entanto convém relembrar que algumas das suas "histórias" não merecem credibilidade.
Quem assim procede não merece crédito nem respeito.
Cumprimentos,
constantino costa
Constantino,
És um provocador, e acho-te graça. Então o que é que não é verdade para não merecer credibilidade?
Não basta uma afirmação, é preciso fundamentar. Sem esse fundamento, a tua afirmação vale zero, que é o valor que se estampa na tua imagem até um cabal esclarecimento do que afirmas.
Cumprimentos
JD
Caro JMD;
Com a mesma frontalidade, mantenho as observações que fiz.
Por favor, não queiras confundir os ex-militares da CCaç. 2679.
Algumas das tuas histórias roçam o desvario e denotam falta de respei-to para com os outros.
Esta é a história certa que eu pró-prio teria escrito se tivesse a ar-te de bem escrever.
Lê e tira as ilações que bem enten-deres, eu tirei as minhas.... Garanto-te!!!
O urso Gingão, gostava de dar nas vistas. Mas, por
mais que se esforçasse não conse- guia chamar a atênção dos outros. O que é que adiantava nos afazeres de cada qual um urso, com um enorme laçarote á volta do pescoço?
Nem lhe ligavam.
E o urso Gingão lá ia tirar o laça-
rote. No dia seguinte, aparecia a fazer o pino e atravessava a flo-
ta, de cabeça para baixo, ouvido atento a qualquer comentário. Nenhum?
Os bichos tinham mais que fazer. Então o urso Gingão pegava num vio-lino e ia tocar para uma clareira. Tocava, tocava(pouco bem, aliás), mas espectadores nem um.
De aí a dias,montado numa bicicleta
pedalava com ganas de corredor:
-Cá vou eu! Cá vou eu!
Fugiam os lagartos, com medo de fi-
carem sem rabo.
Fugiam as doninhas, os coelhos, os
texugos, as lebres, as perdizes....
Fugiam todos.
E ele que gostava tanto de dar nas vistas!
Desanimado, foi procurar outras paragens. Por atalhos e desvios, chegou diante de um palácio.
Porque não tentar ali mesmo a sua sorte? Sem cerimónia, como se estivesse na floresta, entrou no palacete iluminado. Era um baile de máscaras. O urso fez sensação. Tocava violino. Muitas palmas. Deu cambalhotas e perdeu o tino. Mais e mais palmas. No mais animado da festa, a dona da casa anunciou:
-Meus queridos convidados, chegou o momento de tirarem as máscaras. Quero ver os vossos rostos, amigos.
Os piratas desfizeram-se das palas, as bruxas dos narizes, os sultões dos bigodes. Só o urso fi-
cou, no meio da sala, um pouco comprometido.
-Quer que eu puxe o fecho de correr? - perguntou uma senhora, muito amável. Muitas outras mãos ocorreram, e procuravam, fazendo cócegas, os botões, o fecho, os colchetes....
-Mas é um urso de verdade!- excla- mava, aterrorizado, um senhor ves- tido de general!
As luzes quase desfaleceram de susto. Tudo fugiu, numa grande gritaria.
Só ficou na sala o urso. Afinal, tinham-no tomado por aquilo que não era.
Cabisbaixo, voltou á floresta, saboreando pensamentos novos.
Parece que o urso Gingão ainda toca violino, mas porque gosta.
Já não quer dar nas vistas. Perdeu a presunção num baile de máscaras.
Permite-me ainda o avisado conselho para que, te auto -corrijas, pois não faltarão as vo-
zes(recordas-te) que se apressarão a acusar-te de falta de rigor nas
tuas(algumas) miranbolantes narra- tivas.
Cumprimentos,
Constantino.
Caro JMD;
Pela minha parte relevo a ofensa, na medida em que imagina as inculcadas e naturais limitações decorrentes de uma continua e estanque deformação socio-profissional,moral e cultural.
Felimente que "vozes de burro não chegam ao céu".
Com a mesma frontalidade, mantenho as afirmações que fiz.
Não queiras confundir os ex-militares da CCaç. 2679.
As tuas mirabolantes narrativas, correspondem a uma falta, grave, de respeito pelos ex-camaradas.
As tuas pretênsas ofensas dedico o meu mais profundo desprezo.
Algumas das tuas histórias roçam o desvario e denotam grave falta de respeito para com outros.
Esta é a história que eu proprio gostaria de ter escrito se tivesse a arte de bem escrever.
Lê e tira as ilações que muito bem entenderes, eu tirei as minhas....
Garanto-te!!!!
O urso Gingão, gostava de dar nas vistas. Mas, por mais que se esforçasse não conseguia chamar a atênção dos outros. O que é que adiantava nos afazeres de cada qual um urso com um enorme laçarote à volta do pescoço?
Nem lhe ligavam.
E o urso Gingão lá ia tirar o laçarote. No dia seguinte, aparecia a fazer o pino e atravessava a floresta, de cabeça baixa, ouvido atento a qualquer comentário. Nenhum?
Os bichos tinham mais que fazer. Então o urso Gingão pegava num violino e ia tocar para uma clareira. Tocava, tocava, (pouco bem, aliás), mas espectadores nem um.
De aí a dias, montado numa bicicleta pedalava com ganas de corredor:
-Cá vou eu! Cá vou eu!
Fugiam os lagartos, com medo de ficarem sem rabo.
Fugiam as doninhas, os coelhos, os texugos, as lebres, as perdizes.... Fugiam todos.
E ele que gostava tanto de dar nas vistas!
Desanimado, foi procurar outras paragens. Por atalhos e desvios, chegou diante de um palácio. Porque não tentar ali mesmo a sua sorte? Sem cerimónia como se estivesse na floresta, entrou no palacete iluminado.
Era um baile de máscaras. O urso fez sensação. Tocava violino. Muitas palmas. No mais animado da festa, a dona da casa anunciou:
-Meus queridos convidados chegou o momento de tirarem as máscaras. Quero ver os vossos rostos amigos.
Os piratas desfizeram-se das palas, as bruxas dos narizes, os sultões dos bigodes. Só o urso ficou no meio da sala, um pouco comprometido.
-Quer que eu puxe o fecho de correr?-Pergunta um senhor, muito amável. Muitas outras mãos ocorreram e procuravam, fazendo cócegas, os botões, o fecho, os colchetes....
-Mas é um urso de verdade!-exclamava, aterrorizado, um senhor vestido de general!
As luzes quase desfaleceram de susto. Tudo fugiu, numa grande gritaria. Só ficou na sala o urso. Afinal, tinham-no tomado por aquilo que não era.
Cabisbaixo, voltou à floresta, saboreando pensamentos novos. Parece que o urso Gingão ainda toca violino, mas porque gosta.
Já não quer dar nas vistas.
Perdeu a presunção num baile de máscaras.
Permite-me ainda o avisado conselho para que, te auto corrijas, pois não faltarão as vozes (mais uma vez) que se apressarão a acusar-te de falta de rigor.
Constantino,
Escreves muito bem, de maneira rebuscada e quase doutoral, dizes umas patacoadas que nem sei, se me fazem rir, se me fazem chorar, carregadas de uma insondável raiva, talvez associada à correspondência que me enviaste sobre a tua "guerra" de Guilege, e por ter-te respondido que, do que falavas (uma emboscada), não percebias nada.
Assim, gastavas a prosa inutilmente, talvez, até, desbaratando alguma razão que tivesses.
Agora, de maneira boçal, encadeando contradições como "inculcadas e naturais limitações decorrentes de uma contínua e estanque deformação sócio-profissional, moral e cultural", pretendes descarregar a superior parvoeira que te enche a cabeça, com frases dignas do urso da tua estória.
Pois é! Mas eu não tenho vocação para aturar malucos e, a partir de agora, escrevas o que escreveres, não lerei uma linha tua, porque claramente desvalorizo a presunção.
JD
Constantino,
Escreves muito bem, de maneira rebuscada e quase doutoral, dizes umas patacoadas que nem sei, se me fazem rir, se me fazem chorar, carregadas de uma insondável raiva, talvez associada à correspondência que me enviaste sobre a tua "guerra" de Guilege, e por ter-te respondido que, do que falavas (uma emboscada), não percebias nada.
Assim, gastavas a prosa inutilmente, talvez, até, desbaratando alguma razão que tivesses.
Agora, de maneira boçal, encadeando contradições como "inculcadas e naturais limitações decorrentes de uma contínua e estanque deformação sócio-profissional, moral e cultural", pretendes descarregar a superior parvoeira que te enche a cabeça, com frases dignas do urso da tua estória.
Pois é! Mas eu não tenho vocação para aturar malucos e, a partir de agora, escrevas o que escreveres, não lerei uma linha tua, porque claramente desvalorizo a presunção.
JD
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