1. Mensagem do nosso camarigo Joaquim Mexia Alves*, ex-Alf Mil Op Esp/Ranger da CART 3492, (Xitole/Ponte dos Fulas); Pel Caç Nat 52, (Ponte Rio Udunduma, Mato Cão) e CCAÇ 15 (Mansoa), 1971/73, com data de 22 de Dezembro de 2010:
Meus camarigos
Queria ter tempo para escrever alguma coisa que nos levasse ao encontro uns dos outros.
Este tempo de Natal é um tempo muito ocupado para mim e traz-me recordações imensas dos meus pais e da sua/minha enorme família à volta da mesa, (9 irmãos, trinta e tal netos e já alguns bisnetos, quando ainda o meu pai era vivo), e o extraordinário que era, apesar da mesma educação base dada a todos, as diferenças que entre nós havia.
Por vezes estalavam discussões, (o que numa família de homens grandes e voz grossa), ultrapassavam os limites do razoável, e então lá vinha o meu pai dizer-nos que não havia divergências que não fossem ultrapassáveis e sobretudo que éramos uma família, e que uma família se mantêm unida apesar das diferenças.
A nossa “família” foi enraizada na Guiné e deu muitos filhos, tantos como aqueles que lá serviram, desde o mais guerreiro combatente, ao mais cozinheiro que não deixou de ser combatente, porque também esteve em guerra.
Família desunida, separa-se, não se entre ajuda, não se constrói, não tem dimensão, não tem voz, e aqueles que por qualquer razão não gostam dessa família alegram-se com a sua desunião, porque no fundo torna fraca essa família.
Há convicções arreigadas, tudo bem. Há palavras mais duras e menos compreensíveis, tudo bem. Há pensamentos diferentes e diferentes maneiras de interpretar, tudo bem. Há até vontade de dar dois murros na mesa e partir a loiça, tudo bem.
Mas família que se preza ultrapassa tudo isso, e, não abandonando cada um as suas convicções e pensamentos, fazem-se mais forte do que elas e do que eles, e cada um estende a sua mão, oferece o seu ombro, e abre os braços para o abraço.
Que raio de coisa é esta que por umas quaisquer designações políticas se desagrega uma camarigagem feita na dor, na tristeza, mas também na luta, e na entrega?
Por mim, deixo agora as minhas convicções de lado, para num abraço apertado próprio da quadra natalícia, (que é sempre que um homem quiser), vos abraçar a todos, meus camarigos, e pedir-vos insistentemente que cada um o faça também, para não só a união da família continuar forte e coesa, mas também para aqueles que nos querem derrotar, não só nos nossos direitos, mas sobretudo na nossa dignidade, se sintam mais uma vez vencidos pela força da família da Guiné.
E aí sim, seremos todos homens com H grande, porque fomos capazes de nos ultrapassarmos, para nos encontrarmos.
Será utópico?
Não, se nós não quisermos que seja!
E se em alguma coisa contribuí para esta situação, esqueçam o que escrevi, e apenas leiam o que agora escrevo.
Um Feliz Natal para todos.
Um forte, enorme, imenso abraço camarigo para todos do
Joaquim
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2. Mensagem do nosso camarada Hélder Sousa (ex-Fur Mil de TRMS TSF, Piche e Bissau, 1970/72), com data de 27 de Dezembro de 2010:
BOAS FESTAS...
Agora que o Natal já passou, espero que tenha abrandado o frenesim dos votos de ‘boas festas’, do ‘Bom Natal’, das prendas, de toda a carga mais ou menos sentimentalista desenvolvida a partir do acontecimento comemorado.
Não pensem que sou insensível à época, não senhor! Também costumo munir-me dos meus melhores sentimentos e procuro ‘espalhar’ o amor, a compreensão, a fraternidade, a solidariedade. Para aqueles que foram meus companheiros na ‘aventura africana’ digo-lhes que também tive dois Natais na Guiné, o primeiro em 1970, no interior, em Piche, e o outro, em 1971, já em Bissau. Foram dois momentos distintos na forma e no conteúdo, com posturas diferentes, com reacções diferentes, mas para relatar noutra ocasião e em local próprio.
Sei que o Natal é a época em que o ‘povo cristão’ comemora o nascimento de Deus, feito Homem. É o momento que ‘marca’ o cumprimento das promessas de Deus enviando o seu Filho para nos salvar, para redimir o Homem dos seus pecados, para nos transmitir a esperança de que depois do período de trevas em que a humanidade viveu ia abrir-se uma época de luz permitindo a salvação.
E é isto que é renovado todos os anos. A esperança dum tempo melhor, a partir duma redenção, originada pelo nascimento do ‘Menino Jesus’. E é isto que todos os anos é largamente esquecido em detrimento do consumismo e das palavras de circunstância. Ou seja, numa larga maioria de situações, o ‘motivo’ da Festa não é convidado para a mesma e isso desagrada-me.
Sei também que antes do cristianismo, os povos, principalmente aqueles com rituais ligados aos fenómenos da Natureza, aos movimentos solares, também comemoravam uma situação semelhante no sentido da ‘vitória da luz sobre as trevas’, consubstanciada naquele fenómeno que conhecemos por ‘solstício’. Neste caso, o solstício de Inverno, ocorrido sensivelmente na época do Natal cristão, também ilustra o momento em que as trevas atingem o seu máximo sendo que depois haverá todo um crescimento da luz, do calor, da Vida. Comemoravam o momento em que a esperança renascia com a certeza que iriam caminhar para tempos melhores.
Sei, por isso, que o cristianismo triunfante fez muito bem em ‘enquadrar’ essas práticas ancestrais dando a lição (raramente aproveitada por outros em situações em que o deveriam ter feito) de como se deve aproveitar aquilo que é a tradição, aquilo que está arreigado no sentir do povo, para lhe dar um novo enquadramento, uma nova visão, ou justificação, para uma mesma ‘razão de ser’.
Depois disto espero que os meus queridos amigos, os meus ‘irmãos’, os meus camaradas e até também ‘os outros’, compreendam porque não fui pródigo em mensagens e outras manifestações do género, correntes nesta época. E espero que dessa compreensão resulte a concordância.
Dentro da mesma linha, perfila-se agora o “Bom Ano Novo”. Só podem estar a brincar….
O que é preciso, mais do que votos de ‘Feliz Ano Novo’, ‘tudo de bom’, ‘todos os sonhos realizados’, ‘muita Paz, Saúde e Prosperidade’, etc., é coragem para persistir na vontade de contribuir para mudar o que se acha que está mal.
Não basta ‘vociferar’, chamar nomes feios aos que nos desgovernam. Há que não desistir de lutar. Volta a fazer sentido “ousar lutar para ousar vencer” mas é necessário muito cuidado para não se cair nas teias daqueles que espreitam e manipulam para aproveitar certos ‘voluntarismos’.
Não tenho ‘receitas’ para vencer a descrença e voltar a ‘levantar a cabeça’. Mas digo-vos que às vezes encontro alento na leitura dum poema de Brecht que diz “…ouvimos dizer que estás cansado…”, ou ouvindo com o som bem alto, pelo menos na parte final, uma canção chamada “The Boxer” de Simon & Garefunkel, ou o “Hey Jude”, dos Beatles, “Cry Baby” da Janis Joplin, também ajuda Mozart, a ‘Abertura’ da 1812 de Tchaikovsky, Elgar, etc. Que cada qual encontre o seu ‘motor de arranque’. Que temos a perder? Acham que ‘os mercados’ vão reagir negativamente ao nosso empenho para resistir a estes ‘tempos de perdição’?
Para terminar com uma nota positiva, queria deixar aqui uma espécie de prece aos meus Irmãos, aos meus Amigos e aos meus Camaradas, quer se encontrem em terra, no mar ou no ar, em que lhes desejo um pronto restabelecimento dos seus males e um rápido regresso a casa, se for esse o seu desejo.
“Feliz Ano Novo”!.
Hélder Sousa
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3. Mensagem da nossa tertuliana Maria Teresa Almeida (Liga dos Combatentes), com data de 27 de Dezembro de 2010:
Boa tarde meu estimado Combatente do Ultramar - Sr. Carlos Vinhal - GUINÉ
Leio várias vezes ao dia o blogue do Luís Graça e Camaradas da Guiné, de bastante interesse, para quem tem de lidar com a guerra, para assim, não a fazer esquecer, pois marcou tantos jovens. Onde consta o seu nome.
Aqui na Liga dos Combatentes, é o meu dia a dia eu e os Combatentes. É gratificante, custa muito ouvir o que sofreram, por isso NÃO PODEMOS NEM DEVEMOS ESQUECER OS COMBATENTES DO ULTRAMAR. APENAS ENALTECE-LOS, HONRÁ-LOS, DANDO-LHES A NOSSA GRATIDÃO, O NOSSO APREÇO E O GRANDE VALOR, é o que diariamente faço.
Pedia o favor de mencionar no blogue do Luís Graça os meus votos de BOAS FESTAS E FELIZ 2011, PARA TODOS OS COMBATENTES DO ULTRAMAR, de Norte a Sul de Portugal
Para o meu Estimado Combatente, e Família, envio votos de BOAS FESTAS E BOM ANO NOVO 2011
Um abraço de GRATIDÃO
Liga dos Combatentes
Teresa Almeida
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Nota do Editor
Vd. último poste da série de 27 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7508: O Mural do Pai Natal da Nossa Tabanca Grande (20): Jorge Picado, o nosso querido capitão ilhavense
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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1 comentário:
Gostei muito das palavras do Joaquim: Oportunas e apropriadas face à tempestade que passou pela nossa tabanca.Palavras pensadas e pesadas são precisas quando os corações fervem.
Um abraço grande para todos.
Carvalho de Mampatá
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