Guiné > Zona leste > Seto L1 (Bambadinca) > BARt 2917 (1970/72) > Tabancas fulas em autodefesa do Regulado de Badora: crianças... e cães.
Fotos: © Arlindo T. Roda (2010). Todos os direitos reservados
1. Enquanto não aparece o poste relativo ao mês de novembro de 1970. quando a CCAÇ 12 perfazia 18 meses de Guiné (, mês que me traz amargas memórias) (*), vou iniciar um séria paralela, para lá pôr uns textos anexos... O primeiro tem a ver com a temporada (duas semanas e meio) que passei em Sansacuta, no sul do regulado de Badora, do lado esquerdo da estrada Bambadinca-Mansambo, comandando uma secção do 4º Gr Comb da CCAÇ 12, entre 24 de fevereiro e 12 de março de 1970.
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por Luís Graça
1. Como esses bandos sinistros de jagudis (abutres) que pousam sobre a morança dos que estão a morrer, também o espectro negro da fome paira sobre as tabancas da Guiné. Porque a desnutrição, essa, é já endémica: facilmente se constata, sobretudo nas crianças, toda uma série de sintomas patológicos provocados pelas carências proteicas e vitamínicas de uma alimentação quase só à base de cereais (arroz, milho, fundo) e túbérculos (mandioca, inhame), acompanhos de molhos de origem vegetal (óleo de palma).
A alimentação é, pois, deficiente, sobretudo em qualidade. O peixe (sobretudo seco) e a carne são raros. Além disso, os fulas, que são islamizados, não comem carne de porco. Em contrapartida, não têm os problemas de alcoolismo dos povos ribeirinhos, animistas (como os balantas de Nhabijões).
E, no entanto, trata-se dum território aparentemente fértil, mas com umas das mais elevadas densidades demográficas do continente africano, concentrando-se as populações em especial nas bacias hidrográficas, junto às bolanhas e lalas (regiões alagadiças ricas em húmus) onde cultivam o arroz.
Mas a guerra e a sua escalada vêm modificar profundamente a geografia humana e económica da Guiné: por um lado, provocam o êxodo maciço de populações inteira (balantas, beafadas, mandingas, manjacos, etc.) para as zonas controladas pelos guerrilheiros e para os países límitrofes (Senegal e Guiné-Conacri). E por outro, assiste-se ao fenómeno da militarização dos fulas (uma tribo islamizada cujos régulos detêm ainda algum do seu antigo poder feudal), através não só do reagrupamento e organização em autodefesa das suas aldeias como também da formação de milícias.
2. Eis a razão por que, a partir de 1963, se tem vindo a acentuar o decréscimo da produção agrícola (que aliás é cada vez para autoconsumo). Mas vejamos as duas culturas ainda comercialmente importantes: o amendoim e o arroz.
O amendoim (ou mancarra) só por si deve representar hoje cerca de metade do valor total das exportações (da Guiné para a Metrópole).
Muito antes ainda de passar à clandestinidade, o engenheiro agrónomo Amílcar Cabral (que terá dirigido uma brigada técnica dos Serviços Agrícolas Coloniais, não em Fá, aqui perto de Bambadinca, mas em Pessubé, tendo feito estudos sobre a produtividade de diversos tipos de amendoim), já tinha denunciado o perigo que representava a monocultura desta oleaginosa para o desenvolvimento económico e social da Guiné, e criticando implicitamente a sua importância estratégica como matéria-prima para os monopólios metropolitanos (a CUF, aqui representada pela Casa Gouveia).
Tendo sido imposta ao indígena pela administração colonial, a cultura da mancarra está hoje em declínio irreversível: os fulas ainda são os únicos que lavram mancarra (cultivam amendoim) na periferia das suas tristes tabancas, cercadas de arame farpado e de minas. É com o produto da sua venda que o camponês fula paga, no posto administrativo, a sua taxa domiciliária (imposto de palhota), colectada na base do número de mulheres (e moranças) que possui!
Curiosa é a origem da mancarra, a semente do diabo, segundo a lenda fula, que aqui ouvi em Sansacuta (em 8 de março de 1970):
Na mitologia fula a mancarra (amendoím) está associada ao Diabo em pessoa (Iblissa). O cherno Umaru que dirige uma pequena escola islâmica nesta tabanca e que se prepara , como bom muçulmano devoto (tijanianké), para fazer no próximo ano a sua peregrinação a Meca (Iado Hadjo, em fula) e assim juntar ao seu nome o título venerando de al-hadj,contou-me a seguinte história, traduzida pelo Suleimane, o José Carlos Suleimane Baldé (o meu braço direito, guarda-costa, intérprete, cozinheiro, secretário):
- Um dia Iblissa (o Diabo) quis desafiar a autoridade divina de Mohamadu (o Profeta Maomé). Tinha chovido muito e o Profeta dissera que então nasceriam todas as sementes que fossem lançadas à terra. O Diabo, em vez de uma semente de milho ou de arroz, deitou leite numa cova que ele próprio tinha feito no chão. Mohamadu, intrigado e inquieto com a provocação de Iblissa, foi falar com Alá, que lhe mandou guardar uma semente. E ao fim desse tempo, não é que do leite nasceu mesmo a mancarra ? (**)
O segundo produto é o arroz (***). Antes da guerra, dois terços eram exclusivamente produzidos pelos balantas, a maior etnia do território (que são 150 mil, segundo o censo de 1962). Inclusive o arroz chegou a ser exportado. Hoje mal chega para o autoconsumo, tornando-se dramática a sua carência nos anos de menor pluviosidade.
Guiné > Zona leste > Setor L1 (Bambadinca) > Subsetor de Bambadinca > Detalhe > Tabancas fulas em autodefesa, Samba Juli, Sinchã Mamadjai e Sansacuta, situadas entre os rio Querol e Timinco, a leste da estrada Bambadinca-Mansambo > Carta do Xime (1955) (Escala 1/50 mil)... Lugares que continuam no nosso imaginário...
Entretanto, no circuito da economia monetorizada, devido à inflação provocada pela guerra, a população que está sob o nosso controlo vê-se muitas vezes na contingência de vender, ao pequeno comerciante português ou libanês, o arroz que produz para comer (preço por quilo: 3 pesos!) para comprar umas chinelas de plástico:
- O senhor administrador dá porrada se pessoal africano anda descalço em Bambadinca!-, diz um dos meus soldados fulas.
Noutras ocasiões, trata-se de fazer dinheiro para pagar a taxa domiciliária I"o famigerado "imposto de palhota"), imposta ao guinéu e devida pelos escassos metros quadrados de superfície que ocupa a sua morança. Entretanto, quando as reservas se acabam no tempo seco, o guinéu volta a adquirir o mesmo arroz pelo dobro do preço (6 pesos).
O drama destes pobres camponeses que foram obrigados a abandonar as suas áreas de cultura, arrancadas à floresta tropical ou à savana arbustiva, de geração em geração, pude senti-lo aqui em Sansancuta onde estive em autodefesa. (****).
3. Sansancuta faz parte dum eixo de aldeias estratégicas, como se diz no Vietname, no limite sul do regulado de Badora, no Sector L1, e que funciona como uma espécie de pequena muralha da China, cortando as linhas de infiltração das forças da guerrilha que eventualmente se dirijam para o interior daquele regulado a partir do Rio Corubal.
Estão aqui reagrupados os habitantes de três tabancas, uma das quais Sare Ade cuja população, sobretudo os mais jovens, não se conformou com a ordem de deportação dada pelo comando militar de Bambadinca, tendo fugido para o nordeste (Gabu) e inclusivamente para o Senegal, que também é chão fula.
Hoje, de resto, só há duas alternativas para um homem fula: (i) oferece-se como voluntário para o exército colonial, passando primeiro pela milícia; ou (ii) emigra todo os anos, na época das chuvas, para o chão de francês (Senegal ou Guiné-Conacri) a fim de trabalhar nos campos de mancarra.
É a única maneira de fugir ao universo concentracionário da sua tabanca, e sobretudo à fome. Essa fome visceral que leva as crianças a aproveitar tudo aquilo que nós, tugas, nos damos ao luxo de deitar fora (vi-as aqui a assaram na brasa as vísceras de um frango que o bom do José Carlos Suleimane Baldé me arranjou e reparti-las equitativamente entre si).
Tínhamos uma secção destacada em Sinchã Mamadjai [ou Mamajã] que foi transferida em 24 de Fevereiro de 1970 para Sansacuta, com o objetivo de controlar os trabalhos de autodefesa [, e que haveria de regressar definitivamente a Bambadinca a 12 de Março de 1970].
Fome, subnutrição, carências de toda a ordem (roupas, medicamentos...), doenças como paludismo, mortalidade infantil, etc., contrastam, de modo chocante, com a relativa opulência com que um tuga , como eu, aqui vive: ainda ontem me vieram trazer o reabastecimento semanal e, entre outros produtos enlatados, deixaram-me cinco quilos (!) de fiambre dinamarquês, para dois mecos, para mim e para o operador de transmissões, os dois únicos brancos, já que as praças são desarranchadas.
Tivemos de comero fiambre em menos de vinte e quatro horas, sob pena de se estragar com o calor (, frigorífico a petróleo ka tem!), e, uma vez aberta a lata, repartir o resto do fiambre pelos putos da aldeia e soldados africanos da secção. É claro que lhe chamaram um figo, não tendo desconfiado sequer que tal iguaria pudesse ser feita de carne.. de porco!
Deportado e reagrupado em aldeias estratégicas (ou tabancas em a/d, chamem-lhe o que quiserem), o camponês da Guiné que ama os grandes espaços livres (a floresta onde vai caçar a gazela, a bolanha onde cultiva o arroz, o rio onde vai buscar o mafé) vê-se confinado a uma área de reserva onde pratica uma miserável agricultura de subsistência.
Ironicamemnte as fiadas de arame farpado que cercam as palhotas cónicas,as trincheiras e os abrigos de combate, os espaldões para as armas pesadas, as valas de comunicação e os abrigos passivos das tabancas em a/d, ficarão proventura como os únicos vestígios arqueológicos da presença duma civilização tecnologicamente superior nesta parte ocidental de África...
Luís Graça
Guiné > Zona Leste > Croquis do Sector L1 (Bambadinca) > 1969/71 (vd. Sinais e legendas). Dentro retângulo a vermelho, ficavam localizadas as duas tabancas aqui referidas neste poste, Sansacuta e Sinchã Mamadjai, no limite sul do regulado de Badora, entre Bambadinca e Mansambo. A sudeste ficavam três importantes (e das últimas) tabancas fulas do regulado do Corubal, Afiá, Candamã e Camará, eestas já pertencentes ao subsetor de Mansambo.
Infografias: © Luís Graça (2005). Todos os direitos reservados
______________
Excertos de: História da CCAÇ 12: Guiné 69/71. Bambadinca: Companhia de Caçadores nº 12. 1969/71.
Cap. II.26: A secção destacada em Sinchã Mamadjai foi transferida em 24 de Fevereiro de 1970 para Sansancuta a fim de controlar os trabalhos de autodefesa da tabanca, regressando definitivamente a Bambadinca a 12 do mês seguinte [Março de 1970].~
Notas do editor:
(*) vd. último poste da série > 30 de julho de 2012 > Guiné 62/74 - P10209: A minha CCAÇ 12 (26): Outubro de 1970: o jogo do rato e do gato... (Luís Graça)
(**) Números sobre a mancarra: Principal produto de exportação da Guiné nos anos 60: 76% do total (em 1964), percentagem que decresce para 61% em 1965, em consequência do agravamento da guerra. A área cultivada atingia os 100 mil hectares (um 1/4 do total da área cultivada da província). A produção rondava as 65 mil toneladas. A produtividade era baixa: 600 kg / ha (2 mil kg /ha em casos excecionais).
A cultura era feita em regime de rotação, sem seleção de sementes, sem recurso a adubos ou estrume, proporcionando fracos rendimentos e exigindo grande esforço nas várias fases do ciclo de produção (sementeira, monda, colheita, protecção contra os babuínos...). Principais regiões de produção: o leste da Guiné, Farim, Bafatá, Gabu, onde os solos são mais leves e a precipitação menor.
No entanto, esta cultura era já considerada na época como muito lesiva do ambiente, pelo uso intensivo dos solos, a redução do pousio, as queimadas... Tradicionalmente os camponeses da região praticavam um sistema de rotação mancarra - cereal - pousio, considerado pouco eficaz. Acrescente ainda o sistema de comercialização, penalizando fortemente os produtores. (Fonte: adapt. de Dragomir Knapic - Geografia económica de Portugal: Guiné. Lisboa: Instituto Comercial de Lisboa, 1996, 44 pp., policopiado).
(***) Arroz: a área de cultivo devia representar 150 mil hectares no início da década de 60, antes da guerra, o que equivalente a 38% do total, concentrando-se em especial nas regiõe do Cacheu, Bissorã e Mansoa, a norte do Rio Geba, e Fulacunda e Catió, a sul. Havia dois tipos de cultura de arroz: o alagado, ou de bolanha (nas regiões mais ribeirinhas, no litoral); e o arroz de sequeiro, no interior, praticado sobretudo pelos manjacos e fulas.
A produtividade é também baixa, oscilando entre os 30 kg e os 2 mil kg por hectare, com um a média de 800 kg/ha. A produtividade é sempre maior no arroz alagado. A Guiné passou a ser autossuficiente em matéria de arroz, sobretudo a partir dos anos 30 até ao início da guerra colonial. Exportava arroz para a metrópole, para a África francesa (Senegal e Guiné-Conacri) e para Cabo Verde. Com a guerra, a situação inverteu-se: passou a importar. (Fonte: Dragomir Knapic, 1966, op. cit.).
(****) A terceira cultura de maior peso na Guiné era a do milho (cavalo, preto e basil), mas que tinha um baixíssimo valor alimentar. A área ocupada era sensivelmente a mesma do arroz, mas a produção era 3 vezes inferior: apenas cerca de 50 mil toneladas. Era também uma cultura devastadora para o ambiente, sendo precedida de derrube da floresta e de queimadas...
Outras culturas, mas de menor impacto na economia e na dieta do guineense do nosso tempo: fundo (30 mil hectares / 10 mil toneladas / 300 quilos por hectare), o feijão, a mandioca, a batata doce, o inhame... Dos frutos mais comuns, e com relevância para a alimentação, destaque-se a manga, a papaia, a banana, a laranja, a tangerina, o limão, a cola, o cajú, o coco... A cana de acúcar também era cultivada, no litoral, destinando-se praticamente apenas para a produção de aguardente de cana.
Outras culturas, com valor económico e alimentar: o óleo de palma (extraído da palmeira de dendê, "Elaeis guineensis"), o coconote, gergelim...
Quanto á riqueza pecuária era estimada, em 1961, em mais de 230 mil cabeças de gado bovino. Havia umas escassas dezenas de cavalos e mais de 3800 burros. Outros animais domésticos: cabras (c. 144 mil), porcos (c. 98 mil) e ovelhas (c. 54 mil). (Fonte: Dragomir Knapic, 1966, op. cit.).
14 comentários:
Tenho pena de nunca mais ter encontrado o meu camarada Jaime, o vaguemestre da CCAÇ 12... Disseram-me que se tinha formado em economia, depois da tropa, e trabalhava (ou trabalhou) na TAP...
A verdade é que naquela semana ele não terá feito bem as contas: 5 km de fiambre (e do bom, da pernil!) a dividir por duas bocas cristãs, dava 2,5 kg "per capita"... Se cada um (eu e o transmissões) comesse 100 gramas ao pequeno almoço (!), a coisa dava para 25 dias, se calhar até ao próximo reabastecimento... Só que a nossa missão não foi tão longa e, pormenor não menos importante, em Sansacuta não havia eletricidade nem sequer frigorífico a petróleo...
Em todo o caso, nunca lhe agradeci, pessoalmente, o privilégio que foi ter recebido um produto "gourmet" como aquele numa tabanca perdida no mato, lá na Guiné profunda...
Senti-me, num primeiro momento, uma pessoa deveras importante, para logo de seguida soltar meia dúzia de impropérios que nunca devem ter chegado a Bambadinca:
- Jaime, meu querido vaguemestre, diz-me lá como é que eu vou gerir a minha despensa no mato!...
O resultado foi termos de abrir a lata, comer duas grossas fatias de fiambre e o resto... distribuir por aquelas bocas esfomeadas, as crianças, os cães e alguns adultos que, apesar dos avisos do bom do Suleimane, chamaram um petisco à perna do porco dinamarquês...
Olá Luis.
Aprendi um pouco da história da então província da Guiné, já tomei a liberdade de copiar o texto e coloquei no meu arquivo da Guiné, assim como as fotos típicas, onde estão as "bajudas", que chegavam aos treze ou catorze anos de idade e tinham que parir, porque de contrário algo estava mal nelas!. As moranças com a roupa, que mais eram farrapos, pendurada a secar, e por fim os cães vadios cheios de moscas, que estavam em todo o lado!.
Era esta a nossa então província da Guiné!.
Um abraço, e espero a continuação.
O amigo Tony Borie.
Luís como é que vais gerir a tua despensa no mato?
O mato tinha muitas coisas hilariantes, por exemplo após meses de atraso no pré receber um cheque!
Onde o ia rebater, só se fosse na palmeira mais próxima.
Um alfa bravo.
Colaço.
Olá Luís; Como sabes passamos muito tempo nas tabancas, mais na zona do Regulado do Corubal - Antº Bonco Baldé - e a base eram as tabancas de Candamã e Áfia. Aquela era uma zona que se foi despovoando e Camará já não existia no nosso tempo, Musa Iéro foi destruida pelo IN (fomos lá) e a população foi, não recordo quando, para Dulo Gengelê e, os doentes com lepra de uma tabanca mais a sul creio terem sido levados para Bafatá. Era zona de actuação de Galomaro.
Mais tarde,Jun/Jul69 o I)N -Mamadu Indjai e seu muchachos assentaram arraiais - zona mesmo no canto inferior da Carta Duas Fontes (isto para um ex de Cartografia é lastimável - preguiça). Essa história sabes tu. Eles atacaram demais e tiveram que ser "mandados embora". Nós estávamos em Galomaro a trabalhar p/a 2405 no COP7 e viemos cheirar onde o In se acoitava. Os Páraquedistas, creio que fizeste parte da operação que os Páras destruiram o acampamento In, creio mesmo que, um oficial deles escreve (comenta) aqui no Blogue, esteve lá também. Devo-o ter encontrado,Galomaro, mas tentavamos passar entre os pingos da chuva, tanto assim que nunca nos vimos, mas sabia bem da CCaç12. Isto dava um escrito se fosse bem contado. Já se escreveu aqui muito sobre a vida nas tabancas, essa operação que falei etc.A comida era assim...e haver...enfim está descrito algures. Bom Domingo Ab T
....mas tentavamos passar entre os pingos da chuva, tanto assim que nunca nos vimos, mas sabia bem da CCaç12...
Vim ver, antes de almoçar, se o comentário tinha saído.
Sair saiu mas é uma salganhada. Isto ainda não está bom.
Aqui, #nunca nos vimos# ou conhecemos, refere-se a nós os dois. O meu trabalho era outro e o"modus vivendi" estaria de acordo com isso.
Dois pontos:
- nós,Companhia,dávamos o apoio ás tabancas em auto defesa;
- em Galomaro estávamos em reforço á 2405, integrados no COP 7.Era, como dizes por vezes,"o pião das nicas"e mais não digo. Já o disse aqui noutros escritos. Galomaro e os Camaradas de lá eram óptimos.Gostei.
Saimos de lá, a contragosto, para ir á procura do acampamento do Indjai. Já aqui também descrito. Pena o GC (Marques dos Santos) não ter liquidado o fulano...ferido gravemente ainda o levou (???)a ter estado?? por detrás da morte de A. Cabral.Mas a minha Companhia era boa e bem comandada.
Podia escrever a vida nas tabancas, já o fiz longamente...gente do mato.
Um abraço, camarada e toma atenção á saúde e aos abusos.
Ab T.
1. Pois é, meu velho, só dois tontos como nós é que nos preocuparíamos em evocar e preservar a memória de velhas aldeias fulas, perdidas no tempo e no espaço... Sei que falaste delas e desses tempos de brasa (1968/69)... Candamã tem diversas referências no nosso blogue, a maior parte da tua autoria... Também passei por lá, em Candemá e Afiá, e vi a "assinatura" do famigerado Mamadu Indjai que vocês deixaram escapar por um triz e que depois irá fazer parte do complô que estava na origem do assassínio de Amílcar Cabral... Já não está cá para defender a sua eventual honra e inocência...
http://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/search/label/Candam%C3%A3
2. O oficial pára a que te referes é o Salvador Nogueira... Fizemos juntos (tu, eu e ele, sem nunca nos conhecermos...) a Op Nada Consta, onde foi capturado o Malan Mané...
http://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/search/label/Op%20Nada%20Consta
1-....quem safou o Indjai foi o transporte rápido para a Guiné Conakry, ouvíamos o rádio deles em "aberto" a pedir ajuda e a dizer a gravidade do ferido, e os médicos cubanos e algum transfuga português...fdep.
No Fiofioli haviam médicos e enfermeiros cubanos... custa-me tanto escrever sobre aquela "Lança..." volto e escrevo, volto e rasgo ou vai para o arquivo...logo acabo, mas fica escrito o que recordo ter visto e posteriormente analisado? Creio que não.
2 - Só me lembro de ter falado com um Major Páraquedista depois de ter sido atacado em Cansamba (Galomaro). Falei com outros certamente mas não sei. Vivia no aquartelamento em construção, estava a pista ali ao lado e eles saiam de lá para as operações. Recordo irem para uma operação e meia hora? depois já traziam sacos de fardamento? do IN e uma gazela meio esfolada. A nossa missão era "proteger" a zona...preferia participar no assalto indo de héli...
Lá estou a escrever. Abri para ver o mail e lá o teu escrito.
Vou já fechar e por hoje talvez pare ou volto a abrir ás 23/24 H.
Abraço Luís Graça. Tenho saudades mas, as maiores, são da minha juventude...perdida (?talvez não aquilo até era, por vezes, giro...falo da porrada)
Ab. T.
As tuas memórias escritas da Op Lança Afiada... eu não tas perdoo!... Sei que foi doloroso, mas tu és dos poucos grã-tabanqueiros que a fez, e que portanto pode "falar de cátedra"... O Paulo Raposo já aqui (na outra série) escreveu qualquer coisa, sumária, sobre a Op Lança Afiada... Eu também já publiquei 4 postes com o relatório do BCAÇ 2852 (cujo comandante estava à frente de um dos dois agrupamentos)... Força!
http://blogueforanada.blogspot.pt/search?q=%22Lan%C3%A7a+Afiada%22
Sobre a "pobreza" e a "miséria" com que fomos confrontados na Guiné... Naturalmente que eu vinha de "olhos tapados", sabia pouco da real situação económica, social, demográfica e sanitária da Guiné... Mas tinha "sensibilidade" para os problemas sociais...
O primeiro impacto foi, para mim, doloroso... Bissau, as crianças na rua, os pés descalços, a venda ambulante de mancarra, o Pilão, a prostituição... Depois as tabancas do interior: a região de Contuboel até me encantou, não havia guerra, as tabancas eram limpas e prósperas...
O primeiro choque, no mato, foi Sare Ganá, uma tabanca perdida, do regulado de Joladu... Depois, veio o tempo de Bambadinca... Apesar do esforço de assistência militar (1 médico + 2 furrieis enfermeiros + alguns auxiliares da CCS que não iam para o mato, em operações ...), a situação sanitária de velhos, mulheres e crianças chocava-me... As bichas para o posto sanitário eram, diariamente, intermináveis...
Confesso, no entanto, que a "miséria" maior que vi foi no lado da população controlada pelo PAIGC: velhos, mulheres e crianças, imundos, esfarrapados, escanzelados, famélicos, aterrorizados... Eram os prisioneiros que trazíamos... Também não gostei de estar em Nhabijões, mesmo "reordenada"...
Caro Luís Graça
Não me vou 'meter' por essa famigerada "Lança afiada".
Tenho a noção que é terreno doloroso e não me sinto à vontade para falar ou comentar sobre ela.
Mas, já quanto ao cerne deste post, os 5 kg de fiambre dinamarquês (dizem que é o melhor do mundo), deixa-me que te diga que o assunto é típico do "tuga".... os se reclama porque os 'géneros' não chegam ou se reclama porque, se chegam, não são apropriados...
Então o 'fiambrinho' não servia? Queriam continuar com a 'bianda'?
Preso por ter cão, preso por o não ter...
Ingratos!
Abraço
Hélder S.
Caro amigo Luis,
O reagrupamento estratégico era prejudicial e muito dificil de suportar para a generalidade das populações e no caso concreto dos fulas-forros, com os seus animais, (gado vacum) era simplesmente impossivel, isto porque agricultores e criadores de animais, pela natureza das suas ocupaçoes principais, registam interesses economicos complementares mas com procedimentos de produção que são divergentes,daí nascem os conflitos. É isto que explica a grande dispersão e a multiplicação de pequenas tabancas (Sintchãs) no chão fula.
Sobre a pobreza e as misérias da nossa população não quero repetir o comentário feito no Poste do excerto sobre o Diario do AGA que, no fundo, é um conceito relativo e que varia em função da vivencia humana. Também achei portugal muito pequeno e bastante pobre em infraestruturas quando lá estive, pela primeira vez em 1989, depois de passear quatro anos entre Kiev, Moscovo e Berlim, onde as pessoas são geralmente mais altas, com as suas largas avenidas e prédios imponentes.
Em contrapartida, gostei de reencontrar entre as tuas notas de referencia o nome do professor Dragomir Knapic, cujos compêndios de geografia foram o nosso pão de cada dia, durante a fase terminal do liceu em Bissau, no principio dos anos 80. Tempos de sonhos em que a juventude guineense ainda tinha fome do "saber". Ainda me lembro do terror que o capitulo da cosmografia causava nos alunos do Liceu Kuame N´krumah (antigo H. Barreto).
Um abraço amigo,
Cherno Baldé
PS: O livro do Idálio Reis já chegou e com gestos e a linguagem mais áspera já ouvi de um ex-soldado já estamos em Gandembel.
Retive algumas palavras que me acompanham junto aos ouvidos: "De todo o modo.....malfadada sorte....vileza e ignomínia". O livro promete.
Olá Cherno:
Só para citar o teu coment. acima e, nele, a tua referência ao autor dos "compêndios de Geografia (que) foram o nosso pão de cada dia". A este propósito quero dizer que Dragomir Knapic foi meu professor de Geografia Social e Económica no Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Lisboa. Um grande e inesquecível professor que tive a sorte de encontrar. Dele guardo uma enternecida e estimulante memória.
Um grande abraço do
Manuel Joaquim
Camaradas da Ccac 12 se algum dia alguém decidir escrever sobre a Ccac 12 de 1973 até à queda do império, os últimos meses em Bambadinca, depois no Xime para onde marchou por decisão e com a presença do Comandante Chefe. Tenho uma foto do primeiro cabo africano, homem de peso, do meu pelotão, mas que não recordo o mome. Tenho outra onde estão 4 furrieis da 12 dessa época, um deles Grã-Tanbaqueiro, António Duarte. Recordo que o cabo foi promovido a furriel e colocado na Ccac 21 que estava em formação, prosseguindo a politica do Spinola de africanização da guerra. É um pequeno contributo.
joao silva ex-furriel at. inf. Ccac 12
O nosso blogue é uma fonte constante de pesquisa, seja pelos editores, seja pelos leitores.
Andava por aqui à procura da localidade de Sansacuta e acabo por descobrir que o editor Luís Graça devia querer dizer Sansancuta (ver carta do Xime).
Fica aqui a correcção.
Carlos Vinhal
Coeditor
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