segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

Guiné 63/74 - P14120: Manuscrito(s) (Luís Graça) (43): Notas à margem do documentário de Silas Tiny, "Bafatá Filme Clube", com direção de fotografia da Marta Pessoa (Portugal e Guiné-Bissau, 2012, 78')


Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 15 de dezembro de 2009 > 18h02 > O Joaão Graça faz um selfie (quando o selfie ainda não era uma moda viral),  tendo o velho cinema local (, edifício do início dos anos 70) por detrás de si. Comopranado o edifício em 2009 e com as imagens do filme (estreado em 2012), concluo que estará hoje mais bem conservado.



Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 15 de dezembro de 2009 > 15h22 > O edifício da antiga Casa Gouveia, hoje Tribunal Regional de Bafatá; o centro do parque onde estava a estátua do antigo governador Oliveira Muzanty, 1º ten da marinha (1906-1909) está agora o busto de Amílcar Cabral; à dierita da foto, fica o mercado e a piscina (agora em ruínas).


Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 15 de dezembro de 2009 > 16h16 > Bomba de combustíveis (já desativada) junto ao tribunal regional de Bafatá


Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 15 de dezembro de 2009 > 16h19 > O João Graça fotografado junto a uma velha bomba de combustível desventrada...



Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 15 de dezembro de 2009 > 15h22 > O edifício da Repartição de Finanças da Região de Bafatá (Direção  Geral das Contribuições e Impostos, Ministério das Finanças).


Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 15 de dezembro de 2009 > 18h02 > 16h27 > A rua principal de Bafatá; do lado direito, o edifício do antigo restaurante A Transmontana onde muitos de nós íamos nos anos 69/71,  matar a malvada... O supremo luxo para um tuga que vinha do mato, para "respirar aqui os ares da civilização", era um bife com ovo a cavalo e batatas fritas, regada com uma "basuca", tudo por 25 pesos...



Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 15 de dezembro de 2009 > 18h02 > 16h26 > O antigo edifício do Restaurante A Transmontana... Será que estas casas "ainda têm dono" ?



Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 15 de dezembro de 2009 > 15h25 > A Dona Vitória no seu estabelecimento. É irmã do falecido Faraha  Heneni, um dos importantes comerciantes libaneses (ou de origem  sírio-libanesa) de Bafatá... Como diz o Toninho, filho da Dona Vitória,  "a gente giosta de Bafatá, apesar de ser um cidade-fantasma. Temos cá as nossas raízes, nascemos cá, os nossos avós estão cá enterrados, bem como os avós dos nossos avós"...


Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 15 de dezembro de 2009 > 15h26 > A imponente Dona Vitória, viúva e mãe do Toninho, o filho mais novo. Não sei com quem a senhoar era casada... Será que era casada como filho do comerciante português António Marques da Silva ?


Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 15 de dezembro de 2009 > 15h13 > O João, fotogarado com a Célia Dinis e o filho, Bruno, no seu estabelecimento (Restaurante Ponto de Encontro). Diz-me agora o Patrício Ribeiro,  em comentário a este poste, que o filho do casal morreu há dois anos: "O filho do Diniz e da Célia, o Bruno, infelizmente faleceu há  aproximadamente 2 anos, por acidente de moto,  o que deixou os pais muito abalados. Continuam a morar em Bafatá, depois de alguns meses passados em Portugal."


Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 15 de dezembro de 2009 > 18h11> O João Graça a telefonar ao pai... A eletricidade e o telefone terão sido levadas para a cidade pelo administrador colonial Guerra Ribeiro, em 1968... Há postos de iluminação pública na cidade mas á noite é a escuridão total... Ou era, na altura em que "Bafatá Filme Clube" foi rodado...



Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 15 de dezembro de 2009 > 17h34 > Fim de tarde, rua de Bafatá, com o rio ao fundo (1): há muito que o alcatrão desapareceu...



Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 15 de dezembro de 2009 > 17h33 >  Fim de tarde, rua de Bafatá, com o rio ao fundo (2): quem vive em cima ("Barro do Rocha") não vai à baixa ("Bairro da Praça") só para ver a água do Rio Gebam, diz o João Diniz no filme...


Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 15 de dezembro de 2009 > 18h24> Pôr do sol sobre o rio Geba e a antiga piscina em ruínas.


Fotos: © João Graça (2009) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: L.G]



1. Notas à margem de um comentário do Valdemar Queiroz (*):

Valdemar, gravei o documentário "Bafatá Filme Clube" que passou na RTP2 no primeiro dia do ano...

Estive a vê-lo hoje, com alguma emoção. Devo acrescentar, às tuas  notas, que se trata de uma co-produção lusoguineense, da Real Ficção e da Telecine Bisssau...

Ver o filme (que é uma longa metragem, de cerca de 80 minutos) é rever Bafatá, embora se correndo o risco de se cair  na tentação de comparar a cidade de hoje  com aquela conhecemos, bonitinha, se não mesmo esplendorosa, entre meados de 1969 e o primeiro trimestre de 1971.  Chamava-se então a "princesa do Geba"...

Devo dizer que não me deixei ir na onda do saudosismo nem do miserabilismo, muito menos do derrotismo… Os países e as cidades são muito o que são a sua economia… E têm,  graças aos seus povos, uma grande capacidade de resiliência e de regeneração...

Claro que Bafatá (, o centro histórico,) é hoje uma cidadezinha "decadente", do interior da Guiné-Bissau, e aonde já não se vai, onde ninguém vai...  Como muitas partes do mundo, a começar pelo interior de Portugal onde há vilas e aldeias históricas completamente despovoadas...

No interior da Guiné, no antigo "chão fula",  Bafatá terá sido destronada por Gabu, mais próxima da fronteira leste e dos mercados dos países francófonos (Senegal e Guiné-Conacri),  Nem o rio Geba Estreito é mais navegável, como no nosso tempo. As principais casas comerciais (Gouveia, Ultramarina, Barbosa, Esteves, Marques Silva, Faraha Heneni, Marques da XSilva,  …) estavam ligadas à economia colonial, e já estavam em decadência com a guerra, tanto quanto me apercebi na altura…

A Bafatá que eu conheci, que tu conheceste, que muitos de nós conhecemos, vivia do “patacão da guerra”… Não escamoteemos esse facto...  Por outro lado, muitos jovens partiram, depois da independência, uns por razões políticas (temendo represálias dos novos senhores no poder, como foi o caso de muitos dos nossos antigos camaradas guineenses) outros procurando oportunidades de trabalho no estrangeiro (Senegal, Guiné-Conacri, Cabo Verde"...) ou na capital, Bissau.

2. O meu filho tinha estado em Bafatá em 15 de dezembro de 2009, como as fotos acima publicadas documentam (e outras já publicadas anteriormente)... Ficou lá uma noite,  e outra noite em Tabató, não sei se conheceu o Canjajá,  conheceu, a Dona Vitória, a família Dinis, os novos e os velhos habitantes da cidade baixa, os poucos que lá viviam e por lá deambuklavam... Percorreu as ruas e tirou fotos nalguns sítios emblemáticos, a pensar no pai: o cinema, a antiga Transmontana, a piscina, o cais, o rio, o mercado... E as fotos, mais as notas que escreveu no seu caderno, deram-me uma ideia precisa da extrema decadência que atingira a cidade, em particular a parte baixa (e histórica) de Bafatá, decadência essa que se acelerou com o fim da guerra e com a  independência…

Notas do caderno de viagem do João Graça, médico e músico à Guiné-Bissau em dezembro de 2009:

15/12/2009, 3ª feira, 11º dia, Bafatá, Tabatô 

(...) Partida [, de Bissau, ] às 10h00 com Antero (motorista) e Ali (funcionário da AD).  Ida ao quartel de Bambadinca, mas os militares recusaram [a entrada] , pela 2ª vez. Campos (bolanhas) de arroz. Ali disse: “África é um cego em cima de um diamante”. Paragem em Bafatá. Encontro com Demba, músico dos Super-Camarimba [, grupo de música tradicional afro-mandinga, com origem em Tabatô, tabanca a 12km de Bafatá; vd. também a sua página na Net]. 

Almoço no restaurante da Célia, portuguesa radicada em Bafatá desde os anos 70. Marido – não me recordo o nome [. Dinis] – esteve na guerra, nos anos 68/70 […]. Agora tem uma escola de condução.  Decadência de Bafatá velha. Sem pessoas, prédios degradados. Telefono ao meu pai: Libanesas (Vitória), piscina, cinema, [Restaurante] Transmontana. 

Passeio de piroga com pescador no Rio Geba.  Encontro com surdo-mudo que nos levou à sua tabanca (são familiares de Tabatô). Moram numa colina do Geba à entrada de Bafatá. Ofereceram-me uma cadeira e em 20 segundos juntaram-se 20 pessoas à volta da morança.  Ida para Tabatô (aguardada), passando antes pela casa do Victor [, cooperante espanhol, que conheci na viagem para Bubaque]. (...) 

Acho que o filme do jovem realizador, sãotomense,  Silas Tiny (que conversou comigo e com o Fernando Gouveia, entre outras pessoas que conheceram a Bafatá colonial, na fase de conceção do filme) não mostra só o lado decadente de Bafatá (e, por extensão, da Guiné). Descortino no filme sinais de esperança, porque acredito que a Guiné-Bissau tem futuro... (E a talhe foice, acrescente-se, como nota positiva, que a Guiné-Bissau fez uma doação, de 75 mil dólares, para as vítimas do vulcão da Ilha do Fogo e, pela primeira vez, Bissau teve fogo de artifício na passagem de ano, em vez de tiros de Kalasnikov para o ar!)...

3. Algumas notas sobre as pessoas que são entrevistadas no filme, e que retirei do seu visionamento (**):

(i) Canjajá [ou Canjanjá, como vem, parece que erradamente,  no genérico do filme ?] Mané, o antigo projecionista do cinema local (, pertença do Sporting Clube de Bafatá) e atual guardião das instalações, é o protagonista do filme… Há cinquenta anos que este homem guarda religiosamente o cinema de Bafatá (, um edifício ainda relatuivamente conservado, construído no início dos anos 70).… Terá hoje 75 anos. Nasceu em Mansoa, por volta de 1940, onde era pescador de “rede grande”… Em 1960, veio para Bafatá e começou a trabalhar no Sporting Clube de Bafatá, primeiro como contínuo e depois como projecionista, até chegar a fazer parte dos corpos gerentes, depois da indpendência… Ainda hoje é recordado pelos espetadores mais novos… Costumava adormecer durante as sessões, sendo preciso acordá-lo, ruidosamente, quando a fita se partia… Mandavam-lhe sacos de água e ovos, recorda o filho da Dona Vitória, o Toninho.

(ii) Muçulmano, praticante, Canjajá é homem de poucas falas. A primeira máquina de projetar era a “carvão” (?)… Depois veio uma “BU4 Bauer”, alemã, elétrica, acrescenta o presidente do Clube, que começou por ter uma pequena sala de cinema… Também havia cinema ao ar livre, antes da construção do cinema novo. A nova sede nasce do aumento da população de Bafatá e da sua nova prosperidade, com a forte presença dos militares durante a guerra colonial… Nessa altura, o Clube chegou a ter 500/600 sócios… Além das sessões de cinema, faziam-se festas e a vida era bela nesse tempo, dizem as senhoras, entrevistadas…

(iii) A talhe de foice, também há uma referência à passagem, por Bafatá, do Manuel Joaquim dos Prazeres, o conhecido empresário de cinema ambulante, pai da nossa leitora e escritora Lucinda Aranha. Chegou a fazer sessões de cinema na casa do comerciantes António Marques da Silva-

(iv) Canjajá também foi, já depois da independência, o encarregado da piscina de Bafatá: recorde-se que tinha o nome do administrador Guerra Ribeiro, e foi inaugurada em 1962. Depois da independência, ter-se-á chamado “Corca Só” (antigo futebolista do Clube Futebol Os Balantas de Mansoa, e comandante do PAIGC) e não “Orca do Sol” (como aparece, por crasso erro, nas legendas, por falta de memórias da guerra colonial da jovem que faz a tradução do crioulo para português (Joacine Katar Moreira)..

(v ) Outro dos entrevistados é o atual presidente do Sporting Clube de Bafatá, já acima referido, que fala, com ternura e candura, das glórias e misérias da vida da associação, incluindo a conquista do campeonato de futebol da Guiné-Bissau, em 1984 . Era então treinador o falecido Demba... E a histórica partida de futebol, disputada em Bissau, teve na assistência o general 'Nino' Vieira... 

(vi) É também entrevistado, em francês (!), o atual treinador do clube (, provavelmente oriundo do Senegal ou da Guiné-Conacri), que ainda sonha com o renascimento da equipa de futebol… Haja parceiros, de preferência vindos de Portugal, subentende-se... De qualquer modo, parece haver uma forte ligação da cidade ao Sporting Clube de Bafatá… Aquando da conquista do campeonato, em 1984, os futebolistas foram recebidos em apoteose…Mas em geral, o clube da terra fica nos primeiros lugares do campeonato...

(vii) As irmãs Danif, libanesas, que vieram de Sonaco, quando pequenas... Um delas para casar. Penso que são as filhas da Dona Rosa… Um dos irmãos foi paraquedista do BCP 12, hoje ten cor ref e amigo de alguns camaradas nossos, como o Humberto Reis. Um destas manas Danif tem filhas em Portugal, que casaram com ex-militares portugueses… (Eran meninas casadoiras no nosso tempo; e casaram no clube, diz a mãe!)... Os pais das irmãs Danif, Said Danif, estiveram esatabelecidos em Sonaco, Bambadinca, Geba...

(viii) Não sei qual é a relação das  manas Danif com a Dona Vitória, também libanesa, que tinha uma filha que morreu, já depois da independência, e depois de regressar de Portugal onde foi em tratamento. Havia, pelo menos, dois comerciantes libaneses, ligados ao Sporting Clube de Bafatá. Um eles era o irmão da Dona Vitória, Faraha Heneni, citado no filme por ela e pelo seu filho Toninho. Outro libanês era o Arif Elawar, que fazia parte da direcção do Sporting Clube de Bafatá (criado em 1937), quando o presidente era então o  administrador Carlos Caetano Costa (que anteceu o Guerra Ribeiro).

(ix) O João Dinis… Um camarada do nosso tempo que ficou em Bafatá, veio casar a Portugal e levou a esposa, Célia, para a Guiné em 1972… É um homem, desencantado, precomente envelhecido, mas ainda a reconhecer que ama África e a terra que escolheu para viver e trabalhar. Quando jovem, vivia melhor em Bafatá do que em Portugal, costumava dizer ele para os seus antigos camaradas de armas... Mas hoje confessa que ainda sonha em acabar os seus dias na sua terra, Portugal… 

O casal, João e Célia Dinis, abriram um negócio na área da restauração e hotelaria, mas hoje a baixa de Bafatá não tem gente, está às moscas…“O movimnento é que faz falta", diz ele... Havia barcos, havia camiões, sempre a carregar e a descarregar, havia correpios de gente na baixa... Agora é o vazio, diz o Toninho, que deve ser homen dos seus cinquentas e tais anos (, era criança  quando das primeiras flagelações do PAIGC a Bafatá, em 1973, de se lembra bem; o pai mandava o Canjajá desligar as luzes do cinema e levar  o Toninho e os primos para casa...).

(x) No filme, o João Dinis fala para a câmara, num verdadeiro monólogo, tentando explicar  as razões por que se foi deixando ficar até hoje...O realizador e o diretor de fotografia não fazem perguntas nem fornecem informação de contextualização: Bafatá é atravessada por uma "câmara muda"; há momentos de antologia como a sequência da partida de futebol, disputada ao longe (no estádio da Rocha) sob um uma nuvem de pó que se poderia confundir com o cacimbo...); ou a cena em que Canjajá, vestido de preto e com ar de asceta, faz as suas orações virado para Meca, enquanto um grupo de mulheres, a um canto da casa, tagarelam e dão continuidade à vida; ou ainda a cena, bem conseguida,  em que um voluntarioso entrevistado se transforma em proativo entrevistador, inquirindo em crioulo, de microfone em punho, a  opinião dos seus conterrâneos sobre o futuro de Batafá... E tem um comentário final otimista: "Bafatá há-de mudar para melhor, se Deus quiser"

(xi) Outro dos entrevistados é o empregado da atual escola de condução, cujo nome não consegui fixar … Era filho de um comerciante (, português ?), foi para a escola de condução por volta de 1995... Deve ser a escola de condução mais "surrealista" do mundo, a avaliar pelo número de carros que circulam por aquelas bandas... A escola pertence também ao portuguiês João Dinis...

(xii) O filme podia ter mostrado a casa onde nasceu Amílcar Cabral (e os filhos da Dona Vitória!), mas não o fez… Vê-se o seu busto, em bronze,  e um cartaz onde se lê “Cabral Ka Muri”… São as únicas referências ao “pai da Pátria”…

(xiii) Bafatá está hoje dividida em duas partes: a parte de cima (“Bairro do Rocha"), populosa, e a parte de baixo, vazia, o "bairro da Praça". onde alguns dos antigos edifícios coloniais que ainda se mantêm de pé foram ocupados pelo tribunal, as finanças, a conservatória, e uma delegação (?) do ministério do comércio… A baixa está vazia, o mercado está vazio, as lojas estão vazias, há muito que deixou de haver cinema, e os entrevistados vivem pateticamente das suas memórias do passado… À Dona Vitória vale-lhe a televisão que  a liga ao mundo... Não há electricidade, algumas casas têm gerador...A população de  cima só vem à baixa para tratar de algum assunto nas finanças ou no tribunal.. Até a paragem dos transportes públicos mudou-se, democraticamente,  para a parte de cima, no "Bairro do Rocha" [ou "da" Rocha, pergunto eu ao Fernando Gouveia, que é o nosso especialista em Bafatá...].

(xiv) Referência ainda para o ourives de Bafatá, o Tcham [ouTchame], filho do célebre ourives de Bafatá do nosso tempo que fez a famosa espada para o gen Spínola, guarnecida a ouro e prata… Em paga ganhou uma viagem a Portugal, para ele e a esposa... 

Tcham[e], o filho, faz referências (elogiosas) aos administradores Costa [Carlos Caetano Costa ] e Guerra Ribeiro (,sendo este o que trouxe a eletricidade e o telefone para a vila e depois cidade, em 1970)… E, claro, aos militares portugueses que eram clientes da oficina do seu pai, onde vinham encomendar joias para levar para as suas amadas na metrópole...




Guiné > Bafatá >  1959 > Foto nº 4: > "A fonte pública de Bafatá, 1948" [ Esta belíssima fonte, na "Mãe de Água", na zona conhecida como "Nova Sintra" de Bafatá, também aparece no filme, mas já muto degradada, bem, como o seu meio envolvente... O nosso especialista, o arquiteto Fernando Gouveia, que esteve em Bafatá como alferes miliciano nos anos de 1968/7o0, descreve esta zona nestes termos, num dos seus postes do roteiro de Bafatá: "A Mãe d'Água ou a 'Sintra de Bafatá', local aprazível e romântico onde se realizavam almoços dançantes para os quais se convidavam os senhores alferes, alguns furriéis e as moças casadoiras".]


Guiné > Bafatá >  1979 > Foto nº 7:> "A família Marques da Silva em Bafatá, em 1979. O rapaz ao centro da foto era o Xico, filho de uma Balanta e do Marques da Silva, ambos já faleceram. Talvez alguns dos nossos camaradas desse tempo ainda se recordem deles."



Guiné > Bafatá >  1958/59  > Foto nº 242: > "Equipa de futebol do Sporting Clube de Bafatá"


Fotos enviadas pelo nosso camarada Leopoldo Correia (ex-fur mil da CART 564, Nhacra, Quinhamel, Binar, Teixeira Pinto, Encheia e Mansoa, 1963/65). Já tinham sido publicadas anteriormente (***). São agora reeditadas.

[Observação do LC:"Fotos de Bafatá, de 1959, tiradas por um familiar ligado ao comércio local (Casa Marques Silva), casado com uma senhora libanesa,  filha do senhor Faraha Heneni",


4. Dito isto, acho que que vale a pena comprar o DVD (7 €):  título "Bafatá Filme Clube"; realizador Silas Tiny; fotografia: Marta Pessoa; produção: Real Ficção (e Telecine Bissau); ano: 2012; duração: 78'.

Não sei se Canjajá e o seu cinema são uma "metáfora de Bafatá" e da própria Guiné.-Bissau (****).... Talvez sim, da Guiné-Bissau e da própria África pós-colonial... É seguramente uma  metáfora das nossas ruínas, materiais e imateriais, as que ficaram do nosso império (*****)...

Mas o mérito do realizador e da equipa é terem ido para Bafatá, despidos de preconceitos etnocêntricos... E trata-se de cinema lusófono!... Por outro lado, o filme faz-me lembrar o "Nuovo Cinema Paradiso", do italiano Giuseppe Tornatore (1988)...  Mas isso daria aso a outras reflexões sobre o cinema enquanto objeto de cinema que não cabem aqui neste blogue e nestes "manuscritos"... (LG)

______________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 4 de janeiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14115: Memória dos lugares (279): Bafatá, princesa do Geba, parada no tempo: o cinema local e o seu mítico guardião, Canjajá Mané, o casal João e Célia Dinis, Dona Vitória, as irmãs Danif (libanesas), o glorioso Sporting Clube de Bafatá (fundado em 1937 pelos prósperos comerciantes locais, e que chegou a ter 600 sócios), o ourives, o rio, os pescadores, e os demais fantasmas do passado que hoje povoam a terra de Amílcar Cabral... A propósito de "Bafatá Filme Clube" (2012) que acabou de passar na RTP2, no passado dia 1 (Valdemar Queiroz)

(**) Último poste da série > 1 de janeiro de 2015 Guiné 63/74 - P14105: Manuscrito(s) (Luís Graça) (42): Requiem para um paisano... (à memória do meu infortunado camarada Luciano Severo de Almeida)

(***) Vd. poste de 16 de abril de 2013 > Guiné 63/74 - P11402: Memória dos lugares (229): Bafatá dos anos cinquenta (Leopoldo Correia)

(****)  Vd. crítica de António Rodrigues > "O movimento é que faz falta" > Rede Angola > 12/12/2014

(...) Mas Canjanjá é apenas a metáfora de Bafatá, segunda cidade da Guiné-Bissau, berço de Amílcar Cabral, entreposto adormecido no centro do país, onde só o tempo e natureza se dão ao luxo de ter futuro. O demais – casas, gentes, ideias – entrega-se resignado à decadência urbana ou à evocação do outrora, quando o cinema era cinema, o Sporting de Bafatá luzia viçoso, o comércio tinha com quem comerciar, os pescadores pescavam e os barcos faziam fila para descarregar no porto fluvial.

Se o projeccionista se limita todos os dias a abrir as portas, vassourar o chão, alimentar fingido o projector, também quase todos os outros personagens fingem gestos habituados a outras décadas, quando havia gente na baixa da cidade que ao perder o mercado, perdeu quase todo o movimento que tinha e o desfiar das casas de comércio – herança do passado colonial – não é roteiro mas rememorar.

Nem sequer é nostalgia, somente o evocar do movimento. “O movimento é que faz falta”, diz a certa altura João Dinis, dono do restaurante e hotel onde nunca se vê ninguém mais do que os seus proprietários. “Se eu chegasse aqui e visse isto, não ficava nem uma hora”, garante, para explicar a razão por que todos partem. Antes já afirmara porque vão ficando aqueles que ficam: “Fomos nos habituando à decadência.” (...)

(...) Silas Tiny, com ajuda da excelentíssima fotografia de Marta Pessoa, filma como se a câmara fosse apenas uma janela para esse mundo que se acaba. Não é o retrato do fim do mundo, só de um mundo, onde o tempo vai fluindo de mansinho, de sol a sol, medido pelas portas e janelas que se abrem e fecham, sem desígnio mais que o acto em si. (...)


(*****) Vd, também poste  de 17 de janeiro de 2014 > Guiné 63/74 - P12595: Roteiro de Bafatá, a doce, tranquila e bela princesa do Geba (Fernando Gouveia) (15): O cinema local e a figura lendária do seu guardião, o Canjajá Mané... E, a propósito, relembre-se o documentário, já em DVD, "Bafatá Filme Clube", do realizador Silas Tiny, com fotografia de Marta Pessoa (Lisboa, Real Ficção, 2012, 78')

15 comentários:

António J. P. Costa disse...

Olá Camaradas

Não vi o filme. Se calhar, se o tivesse visto, a minha atitude seria(?) outra.
Mas, depois de ter visto as fotos e ter lido o post só posso dizer:
- Foi por isto e para isto que tanta gente morreu e se estropiou?

Um Abraço e Bom Ano para todos
António J. P. Costa

Luís Graça disse...

Excerto do sítio UCCLA- União das Cidades Capitais de Língua Portuguesa. com a devida vénia:


http://www.uccla.pt/membro/bafata

Bafatá

ÁREA
5 981 km² (região)

POPULAÇÃO
143 377 habitantes (região)
~
CLIMA
Tropical, geralmente quente e húmido. Chuvoso de junho a outubro, seco de novembro a maio

RECURSOS ECONÓMICOS
Pesca, agricultura, pecuária e comércio

ELEMENTOS INSTITUCIONAIS

ADESÃO À UCCLA
9 de março de 2008

GOVERNADOR
Adriano Gomes Ferreira

MORADA
Caixa Postal n.º 1
Bafatá, Guiné-Bissau

TELEFONE
(00245) 661 00 07 / 341 11 02
FAX
(00245) 3201269

BREVE HISTÓRIA

Bafatá é uma região no centro-norte da Guiné-Bissau, sua capital é a cidade de Bafatá, com uma população de 22.501 (2008 est). Situada no interior, 150 kms a leste de Bissau, é a segunda maior cidade da Guiné-Bissau.

Bafatá, conhecida como o berço de Amílcar Cabral, é uma cidade tranquila, caracterizada por uma predominância de edifícios e casas coloniais, infelizmente num estado acentuado de degradação.

O herói nacional, Amílcar Cabral nasceu em Bafatá e esse facto está assinalado num pequeno monumento com o seu busto e na casa onde nasceu, perto do Mercado Central.

A cidade fica numa colina sobre o Rio Geba e 12 kms a oeste ficam as ruínas de Geba, um antigo entreposto português. Cidade conhecida pela sua fauna, incluindo macacos. As principais indústrias de Bafatá fazem tijolos.

Luís Graça disse...

A avaliar pela imagem de satélite do Google Earth, a Bafatá de hoje já não tem nada a ver com a de ontem...

Estimava-se que a cidade tivesse 22500 habitantes em 2008, mas deve ter mais... A expansão da cidade fez-se no sentido nordeste ao longo da estrada que vai para o Gabu...

A baixa, ribeirinha, está hoje isolada e cada vez mais degradada. O rio é hoje inútil em termos de transporte fluvial...

Segundo percebi no filme, há uma barragem (?) a montante ou a jusante (?), que inclusive terá afetado a atividade piscatória...

Luís Graça disse...

Notíca da RTC - Radiotelevisão caboverdiana, de 8/12/2014:

Erupção Vulcão do Fogo: Guiné-Bissau oferece Governo de Cabo Verde 75 mil dólares para apoiar os desalojados de Chã das Caldeiras

http://rtc.cv/index.php?paginas=13&id_cod=37122

Luís Graça disse...

Com a devida vénia, do Jornal Digital:

http://www.jornaldigital.com/noticias.php?noticia=44288

Guiné-Bissau: Governo proíbe uso de armas de fogo para assinalar passagem do ano
2014-12-31 15:50:44

Bissau - Pela primeira o Governo da Guiné-Bissau anunciou o uso do fogo-de-artifício para assinalar este ano passagem do ano 2014 – 2015 e proibiu a clássica utilização de armas de fogo durante os mesmos festejos.

O Ministério da Administração Interna através do Comissariado Nacional da Polícia da Ordem Pública informou em conferência de imprensa a proibição do uso de qualquer tipo de armas de fogo pelas forças armadas ou pessoas singulares, para assinalarem a passagem do ano.

De acordo com Armando Nhaga, Comissário Nacional da Polícia da Ordem Pública, será lançado fogo-de-artifício na Praça dos Heróis Nacionais e no Estádio Lino Correia. “Temos o hábito de usar armas de fogo, mas, mesmo as Forças Armadas não vão usar armas, porque o Governo tomou iniciativa do uso de fogo-de-artifício como acontece em todos em partes do mundo”, disse Nhaga.

Em termo de segurança, o responsável da força da ordem disse que os mais de 4 mil homens serão disponibilizados para esta operação e foram dotados pelo Governo de novas viaturas para Polícia da Ordem Pública e Guarda Nacional.

A operação também conta com a participação da força da ECOMIB e Polícia Militar.

(c) PNN Portuguese News Network

Luís Graça disse...

Do Jornal Digutal, com a devida v
vénia...

http://www.jornaldigital.com/noticias.php?noticia=44279


Guiné-Bissau: PR encoraja guineenses a acreditarem em dias melhores
2014-12-30 08:44:01

Bissau – O Presidente da República [, José Mário Vaz.} encorajou os guineenses a acreditarem em dias melhores para a Guiné-Bissau, e com trabalho, coragem e inteligência conseguirá transformar as dificuldades em oportunidades.

Na mensagem do fim do ano, que a PNN teve acesso, José Mário Vaz voltou a insistir na necessidade do aumento da produtividade nacional a fim que o país possa atingir um nível de auto-suficiência alimentar e criar as riquezas.

“Temos de combater o desemprego e promover o emprego jovem, porque temos um país essencialmente jovem. Não podemos dar ao luxo de desperdiçar toda a energia da juventude afastando-a das tarefas de criação de riqueza e do impulso para o desenvolvimento”, disse o chefe de estado guineense.

Sobre a exploração dos recursos naturais da Guiné-Bissau, Mário Vaz lembrou que na abertura do ano legislativo, quando manifestara a sua reserva sobre a matéria, frisou que continua convicto de que a agricultura e as pescas devem merecer atenção como base para o desenvolvimento da economia da Guiné-Bissau. “Quanto a outros recursos penso que devemos preparar melhor para a sua exploração, sobretudo investindo na formação de quadros guineenses nos seus respectivos sectores, fortalecendo assim o quadro institucional e da governação”, observou.

Mário Vaz sublinhou, mais uma vez, que várias indústrias extractivas são exploradas apenas beneficiam a minoria e não chegam à população mais necessitada.

No que concerne as suas promessas eleitorais, e particularmente sobre respeito da Constituição da República, defesa da integridade territorial, não permissão do uso do território nacional para a destabilização dos países vizinhos e a produção do arroz, o presidente disse estar firmemente empenhado em cumprir essas promessas e as pôr em prática durante o seu mandato.

Apesar de reconhecer que o ano que termina não ter sido um ano de resultados concretos, Mário Vaz disse que o mesmo não poderá acontecer em 2015, contudo reconhece que com base no Orçamento Geral do Estado o próximo ano poderá ser um ano muito difícil e de grandes exigências sobretudo para o Governo.

O Chefe de Estado elogiou também as mulheres guineenses assim como a Força da Alerta da Comunidade de Estados da África Ocidental na Guiné-Bissau (ECOMIB), e destacou o processo eleitoral que ocorreu no país entre os meses de Abril e Maio assim como os órgãos de soberania dele resultante.

O chefe de estado guineense parte esta segunda-feira para a capital brasileira, Brasília, onde assistirá na cerimónia de investidura da Presidente Dilma Rousseff.

(c) PNN Portuguese News Network

Hélder Valério disse...

Caros camaradas

Em comentário anterior já comentei a propósito do documentário em apreço.

E, na verdade, considero que seja natural que as povoações tenham períodos de desenvolvimento e de decadência, alguns dos quais irreversíveis.

Neste conjunto de fotos, em que se vê a chamada cidade antiga ou colonial, no fundo a que conhecemos melhor, quase cidade-fantasma, sem praticamente movimento, com um porco a passear calmamente junto à Transmontana, reconhece-se contudo que este último edifício aparenta alguma manutenção já que parece pintado (ou caiado) e com as caixilharias das janelas em bom estado.

Como disse, há que saber ser paciente e aguardar que medidas possam ser tomadas para (caso queiram) reverter a situação.

Hélder S.

Valdemar Silva disse...

Viva, caro Luís Graça.
Concordo, plenamente, com o teu ponto de vista.
Realmente, por razões de vária ordem, as localidades nascem, crescem e vão ficando, outras nascem, crescem e vão desaparecendo. É o caso de Bafatá e foi o caso muitas mais, muitas mais ao longo dos tempos.
O que diriam os antigos habitantes dessas localidades se as vissem agora? Se calhar o mesmo que nós, agora.
No entanto, julgo que Bafatá só foi como a conhecemos por haver lá muita tropa, mas sem tropa, agora, continua a ser a bonita Bafatá.
Um abraço
Valdemar Queiroz

Cherno Baldé disse...

CAROS AMIGOS,

Provavelmente o factor Guerra e a presenca de 3 ou mais batalhoes da tropa metropolitana e local na zona leste tera impulsionado a actividade commercial, mas na verdade, Bafata ja era uma cidade com forte dinamica de crescimento antes desta.

Como disse o Luis Graca, a economia acaba por ser o factor determinante do movimento e/ou assentamento humano. Acho que no caso de Bafata a industria do amendoim (mancarra)- producao, descasque e transporte via fluvial constituiam a forca motriz da sua expansao. Nao eh por acaso que ainda existe a marca de oleo "fula".

Nao tenho estatisticas em mao, mas acho que a contribuicao monetaria da tropa seria menos importante do que se pode pensar, se atendermos que a maior parte do dinheiro recebido pela tropa era enviado de volta para casa.

Um abraco amigo,

Cherno Balde

António J. P. Costa disse...

Tava com ganas de fazer um comentário, mas não vale a pena.
Em face das considerações ético-socio-humano-ecoonómicas produzidas, que se lixe Bafatá e Viva o Glorioso.
Longa Bida a Jorge Jâsus!
Um Ab.
António José Pereira da Costa

Torcato Mendonca disse...

1
##BAFATÁ; Amor e ódio

Era uma vez um homem jovem, tão jovem que, quando lhe perguntavam a profissão dizia: estudante.

Calmo, sorridente, bon vivant, o homem jovem percorria a vida de bem com ele e com os outros.

Um dia os velhos, gentes que não gostavam de jovens, disseram-lhe: - precisamos de ti. A partir de agora vamos tomar conta de ti e serás um tu, um ser com um número. Juntamos-te a outros seres a outros tu’s.

Fizeram-no. A princípio estranhou, protestou em surdina cada vez mais fraca, mais fraca e, de repente ou lentamente, começou a ser o tu, o número metamorfoseado e já diferente. Corria, saltava, fazia correr e saltar, brincava ás guerras com armas verdadeiras, dizia disparates como sendo verdades mais fortes do que leis, vestia como os outros, igual aos outros, vestuário esverdeado. Bonito o tom. Esverdeado.
(cont)

Torcato Mendonca disse...

2

Um dia pagaram-lhe uma viagem, só de ida e lá foi mar fora. Seguia o rumo outrora traçado pelas caravelas do seu País.

Parou e desembarcou numa terra diferente, terra quente, húmida, avermelhada, com densas matas e rios que eram tejos.

O tempo passou lentamente.

Ah esqueci-me. Era militar. Todos os que o acompanhavam o eram. Eram muitos mais de cento e cinquenta. O grupo dele tinha cerca de trinta, por vezes mais e outras menos.

E que faziam?

Defendiam a pátria. Defendiam um país do Minho a Timor. Só que eles ficaram logo na Guiné. Poupança no cruzeiro. Os velhos, mais um que os outros, eram poupadinhos.

Habituaram-se àquela vida. Eram unidos e defendiam-se em bloco como se fossem um. Porquê? Porque só assim podiam sobreviver.

Viviam, preferencialmente, nas matas em tabancas aqui e acolá. Tinham um aquartelamento meio enterrado, meio tudo e quase nada. O inimigo visitava-os a tiro de armas ligeiras e pesadas. Eles iam á procura deles e zás, catrapás, partiam-lhes as casotas de mato.

De quando em vez iam á cidade.

Primeiro passavam por uma aldeola onde estava o Batalhão. Assim habituavam-se ás casas e aos objectos que outrora usavam.

Quais? Tantos. Dos mais simples até aos mais complicados. Até ás portas. Sim na sede do Batalhão haviam portas. Quando, ao serem fechadas, batiam mais forte, pareciam saídas de armas pesadas… e lá vem ataque… salta macaquinho. Os residentes riam-se e diziam: é a porta… a partir de um mês de Maio começaram a saltar ou a estremecer… é a porta!

Nesse dia ou no outro, já mais adaptados iam até á cidade. A cidade era Bafatá. Tinha luz dia e noite, casas, ruas e gentes ou vestidas como eles ou com melhor roupagem sempre esverdeada. Outros vestiam roupagens garridas e bonitas de vida civil. Mas todos, toda essa gente, ria. Tinham piscina, sim piscina, casa bonitas, restaurantes, lojas de libaneses onde de tudo se vendia, cinema. Sim sala de cinema. Encostada á cidade haviam casas de putas, esculturas de ébano á disposição. Havia tanto.

Eles queriam num dia e numa noite viver tudo, ter tudo. Bebiam, comiam, iam ás putas (gente boa), á piscina para terror de quem lá estava, ao mercado e ás lojas, ao cinema. Tudo num dia e numa noite.

Olhavam os outros iguais a eles, vestidos como eles ou á civil e gostavam de os ver rir. É bom rir. Tentavam rir mas ficavam com a cara dorida.

Tinham pena dos bafatenses se um dia fossem para o mato. Como seria?

Que interessa isso? Será que eles sentiriam por aquela gente um misto de amor e ódio? Ou inveja? Nada disso. Cada um na sua e eles já não sabiam viver de outra maneira. Nem uns nem outros.

No dia seguinte, por vezes logo no final do primeiro, voltavam.

Vestiam e apertavam roupas, cinturões e cartucheiras, granadas e armas, afivelavam a máscara do ódio, do sempre pronto para tudo e partiam. Nunca olhavam para trás. A estrada asfaltada já era igual á picada de mil perigos.

Voltavam a ser números. Será que os homens da cidade, vestidos como eles eram também números? Certamente que sim, números felizes e que sabiam rir. Vidas. Tantas vidas, numa só vida.
Adeus Bafatá até á próxima… ###

Tenho uma saudade egoísta.Sinto mais saudades do rapazola militar do que da cidade. Ela e ele estão ambos decrépitos…c’est la vie…

Abraço Luis Graça e, através de ti a todos os nossos Tertulianos. Bom 2015 e riam pois hoje já disso são capazes…quanto á pátria está igual – ao rapaz e á cidade.
ab,T

Patricio Ribeiro disse...

Luís e João,
A cidade de Bafatá, está de acordo com as fotos do João, mas há algumas diferenças:
O filho do Diniz e da Célia, o Bruno, infelizmente faleceu a aproximadamente 2 anos, por acidente de moto o que deixou os pais muito abalados, continua a morar em Bafatá, depois de alguns meses passados em Portugal.
Abastecimento de água á Cidade. Desde há mais de 3 anos, foram instaladas duas bombas solares, estão extrair, 80m3 de água diários, para a canalizações na parte alta da cidade. Onde residem a maior parte da população.
Neste momento estão a ser instaladas outras bombas solares, para mais 250m3 diários, a partir destas novas bombas, a parte baixa da cidade também vai ter agua canalizada. Assim como a Ponte Nova.
Estes trabalhos estão a ser financiados pela União Europeia, em parceria com a Cooperação Portuguesa. A Coordenar os trabalhos está a ONG Portuguesa TESE, com o escritório em Bafatá.
A ONG Portuguesa FEC, há longos anos no ensino em Bafatá, reforçou a sua equipa, com apoio da Estado Português, com mais professores, neste momento moram em Bafatá, mais dezena de Portugueses nascidos em Portugal, a maioria são mulheres.
Tenho casa em Bafatá, que tem estado aberta a investigadores Portugueses, que na zona fazem os seus estudos. Por vezes também lá passo algum tempo.
Patrício Ribeiro

Antº Rosinha disse...

As colónias africanas, não só as portuguesas, antes das independências e das guerras consequentes, eram própsperas, muito prósperas em produtos agrícolas, pecuária e pescas.

A abundância era de tal ordem que não havia fome naquele sentido que nós conheciamos em Portugal de pedir de porta em porta ou à porta das igrejas ou nos pontos estratégicos das praças e feiras.

Talvez alguns conheçam as conversas revolucionárias de Amílcar, Samora, Agostinho Neto, e outros "portugueses" que se referiam constantemente à grande produção agrícola que caso fossemos independentes a «trabalhar para nós» produziamos muito mais.

E os comerciantes brancos ao fazer aquelas construções do tipo de cidades europeias, como a pequena Bafatá, era com os lucros da permuta comercial com os produtos agro-pecuários como amendoim, algodão, arroz, caju, oleo de palma, peles de caça, cana de açúcar, isto na Guiné que não havia riquezas minerais.

Aquela trabalheira da permuta, não era para qualquer um.

Porque aquilo de o branco enriquecer a «roubar o preto» tinha mais ciência e suor do que se possa imaginar.

Eu como retornado aviso sempre que quem vai para África que tenha cuidado com a árvore das patacas, ninguém vá em boatos.

Vejam só os 4 mil e muitos milhões do BES em Angola, foi gente que foi no boato, e caíram que nem patinhos.

Mas a decadência por falta de manutenção da parte urbanística de Bafatá, é porque aquilo não foi feito pelos guineenses, para os guineenses, nem ao gosto e necessidades dos guineenses.

Mas se aparecer petróleo, diamantes e cobre, como na Nigéria e em Angola, depressa aparecem, Portugueses, brasileiros, italianos e franceses e chineses a construir grandes cidades de asfalto e betão no lugar das casinhas coloniais dos transmontanos e minhotos e libaneses.

Claro que quem conheceu áfrica só de arma na mão, só pode falar tal como escreve o Torcato Mendonça.

Mas embora artesanalmente, e explorando especialmente a força de trabalho feminino, África (subsariana) era mesmo muito farta.

Daí as construções dos transmontanos, minhotos madeirenses...no Brasil, Angola e Guiné.

Mas não era fácil, era dificílimo abnar a árvore das patacas.

Muitos tugas já se lixaram estes 40 anos porque foram em boatos.

Fernando Gouveia disse...

Camaradas:

Tendo vivido dois anos em Bafata, só não sofri um choque ao visitar a parte colonial porque já tinha sido informado do estado de ruina de toda essa parte.
Muito teria a dizer sobre este assunto mas acho que em postes do passado já disse o bastante.
Como alguém pergunta, a quem pertencerá o edifício da Transmontana, direi que o proprietário era em 2010, quando lá estive, o empreendimento do Cápé.

Abraços
Fernando Gouveia