quinta-feira, 5 de março de 2015

Guiné 63/74 - P14324: Efemérides (182): 5 de março de 1973, Guileje: a morte de um herói, o alf mil Victor Paulo Vasconcelos Lourenço, da CCAV 8350, natural de Torre de Moncorvo (Hélder Sousa / Manuel Reis)

Hélder Sousa, Bissau, c. 1970/72
1. Mensagem do nosso colaborador permanente, Hélder Sousaa, com data de 3 do corrente:

Caros camaradas Editores

Em anexo envio um texto em que pretendo recordar a efeméride da morte do Alf. Lourenço, para mim um verdadeiro herói, ocorrida em 5 de Março de 1973.


É, também, um apertado abraço público, solidário, ao Manuel Reis, amigo do malogrado Lourenço e a quem ainda hoje esta recordação 'mexe' profundamente.

Caso vejam que pode ser publicado, seria bom fazê-lo no dia 5 de Março.


Não tenho fotos a acompanhar mas penso que se pode usar a foto n.º13 do "P11908" do cooperante Carlos Afeito e uma foto do Manuel Reis.

Abraços

Hélder Sousa


2. Efemérides: recordando o dia 5 de março de 1973: Homenagem ao alf mil Victor Paulo Vasconcelos Lourenço... Ou quem é ou o que é um herói ?

por Hélder Sousa


Várias coisas me levaram a fazer este texto.

O factor mais recente foi uma homenagem prestada pelo nosso camarada Armando Faria às vítimas das minas em Cufar em 2 de Março de 1974. Mas já há muito que um outro acontecimento, ocorrido um pouco mais a sul mas cerca de um ano antes, concretamente em 5 de Março de 1973, me tinha impressionado e que várias vezes me assaltava à mente. Refiro-me à morte trágica do Alf. Mil. Lourenço, o último Alferes a morrer na Guiné, segundo uma listagem que já vi publicada, pertencente à CCAV 8350, “Piratas de Guileje”, e que foi uma das 9 baixas mortais que essa Companhia sofreu.

O seu nome foi recordado em placa colocada pelos seus camaradas, dando assim o nome de “Parada Alf. Lourenço” em sua homenagem àquele pedaço de chão, conforme se pode ver na foto n.º 13, da autoria de Carlos Afeitos, ex-cooperante na Guiné entre 2008 e 2012 e que se encontra no “P11908”.





Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Núcleo Museológico Memória de Guiledje > c. 2011 > Memorial à CCAV 8350 (1972/1974) e ao alf mil Lourenço, morto por acidente em 5/3/1973.

De seu nome completo Victor Paulo Vasconcelos Lourenço, era natural de Torre de Moncorvo, está sepultado na Caparica. Foi uma das 9 baixas mortais da companhia também por "Piratas de Guileje" e um dos 75 alferes que perdeu a vida no CTIG.

Foto:  © Carlos Afeitos (2013). Todos os direitos reservados



Um outro factor foi a facilidade com que se denominam ‘heróis’. Hoje em dia, por tudo e por nada, e principalmente por questões relacionadas com o desporto, surgem ‘heróis’ como cogumelos. Pois muito bem, há actos relevantes que fazem com que determinadas pessoas se possam distinguir das demais? Tudo bem! Mas, ‘heróis’? Não serão heróis todos aqueles que no seu dia-a-dia lutam enfrentando as enormes dificuldades que a vida lhes (nos) oferece, para conseguirem ter, quantas vezes, o mínimo?

Às vezes, também, restringindo o ‘heroísmo’ a tempos e a acções de guerra, temos tendência para dar essa classificação a quem foi “muito bom a matar”, deixando de lado aqueles que, como eu entendo ser o caso deste Alferes Lourenço, que em vez de tirar deram literalmente a sua vida em prol de outros. Nos registos, a morte do nosso camarada Lourenço ocorreu por “acidente” e não “em combate”, sendo que isso, para o resultado final, não tem qualquer diferença.

A diferença está, isso sim, nas circunstâncias em que ocorreu.

Esse relato está colocado em comentário que o nosso camarada Manuel Reis publicou no acima referido “P11908” (*).  Em traços gerais, o que sucedeu foi que, aquando duma acção para (re)utilização duma picada entre Guileje e Mejo, verificou-se que num determinado local havia uma granada desarmadilhada mas não em segurança, o que o Alf. Lourenço se preparava para fazer, tendo ele dito ao Manuel Reis, que estava junto dele, que haviam duas em cada trilho e que já tinha colocada a primeira em segurança.

Subitamente a alavanca saltou e naquelas fracções de segundo a decisão que o malogrado Lourenço tomou foi a de proteger os seus camaradas que se encontravam próximos, oferecendo o seu corpo para ‘amortecer’ o impacto da deflagração tendo ficado, em consequência, ‘completamente esventrado’, como indicou o Manuel Reis.

O que o levou a tomar essa decisão? Tanto quanto nos apercebemos do relato do Reis, que se encontrava a um passo, havia mata cerrada na envolvente, havia o seu grupo de combate à frente a montar segurança, havia os capinadores e o Régulo atrás, pelo que atirar a granada para longe, fosse para onde fosse, essa tentativa provocaria, talvez, muito mais ‘estragos’. Mesmo com o seu gesto, para além da morte imediata do Lourenço, ainda se produziram 6 feridos evacuados para o Hospital, entre os quais o Régulo em estado grave.

Volto a interrogar-me: o que teria levado o Lourenço a decidir assim? O sentido da responsabilidade? O sentido do ‘peso’ do comando que determinou a necessidade de proteger os seus homens em detrimento da sua possível segurança? Como conseguiu, naquela fracção de segundo, decidir não seguir o ‘instinto de defesa’ e lançar a granada para longe? Será possível alguma vez responder a estas questões seriamente?

Será que classificar o gesto altruísta (e fatal) do Lourenço de “acto heróico” é injusto?

Para mim, não é injusto! É inteiramente merecido! Que mais poderia ter dado, para além da própria vida?

Por isso aqui deixo a minha comovida homenagem, neste dia do 42º aniversário do seu sacrifício, de modo a que a sua memória e a memória do seu gesto possam ser do conhecimento de mais gente. (**)

E também não quero deixar de dirigir umas palavras ao nosso camarada Manuel Augusto Reis, ‘amigo do peito’ do Lourenço, a quem a sua morte, em si mesma e nas circunstâncias referidas, muito abalou, naquele tempo e que ainda hoje fazem “doer”. Companheiros de quarto, confidentes, com cumplicidades cimentadas nos tempos da Universidade onde idealizavam um País mais igual, mais justo, mais solidário, no qual a guerra estivesse excluída, o Reis sabia da intenção do Lourenço casar quando viesse a Portugal (à Metrópole, como se dizia) nas próximas férias. Não veio!

Também calhou ao Manuel Reis a ingrata tarefa de reunir os haveres do Lourenço e tentar estabelecer o diálogo com a mãe dele, tendo ideia de que era filho único. Se relacionarem a data, Março de 73 e os nomes de Guileje e Gadamael (que, dizem, causam ‘cansaço’ a alguns) pode-se perceber que esses contactos através de cartas não seriam muito ‘eficazes’. Tanto quanto sei, as cartas da mãe eram de revolta e choro e que nunca chegou a ‘aceitar’ a morte do filho, pelo menos nesses tempos.

Portanto, na efeméride deste acontecimento, deixo aqui expresso o meu respeito e admiração no gesto heroico do Alferes Miliciano Víctor Paulo Vasconcelos Lourenço, natural de Torre de Moncorvo e sepultado na Caparica e também o meu abraço solidário ao sobrevivente Manuel Augusto Reis que, cumulativamente, é igualmente merecedor do meu enorme respeito pela forma cordata e paciente como tem ‘aguentado’ todas as odiosas ‘observações’ com que alguns ‘heróis de pacotilha’ o tentaram enlamear.

Honra ao Alferes Lourenço!

Um abraço para toda a Tabanca!

Hélder Sousa
Fur MilTransmissões TSF (Piche e Bissau e 1970/72)



Guiné > Região de Tombali > Guileje > Abril de 1973 > CCAV 8350 (1972/73), Piratas de Guileje > O Alf Mil Reis junto ao monumento erigido à memória do Alf Lourenço, dos "Piratas de Guileje", morto em 5 de março de 1973, na explosão de uma armadilha. Segundo nos conta o J. Casimiro Carvalho, "um dia, o alferes Lourenço, a manusear uma granada duma armadilha , e rodeado de militares - eu estava emboscado com o meu grupo -, a mesma explodiu-lhe na mão, tendo-o morto instantaneamente. Ficou sem meia cabeça e o abdómen aberto. Eu, já no quartel, ao ajudar a pegar no cadáver, este praticamente partiu-se em dois… Que dor!... Chorei como nunca, e isto foi o prenúncio do que nos esperava".

Foto: © Manuel Reis (2009). Todos os direitos reservados

3. Comentário do Manuel Reis [ex-alf mil, CCAV 8350, Guileje, 1972/743] ao poste P11908 (*)


Então aí vai amigo Luís. Já a contei imensas vezes, talvez não o tenha feito no Blogue, e tão pormenorizada. Não vou ocultar qualquer facto, julguem-me como entenderem.

Lourenço era o meu melhor amigo e após a sua perda se tivesse por onde me furtar, em segurança, e com garantia da minha integridade física, adeus, Guiné.

Estava prevista a reabertura da estrada Guileje-Mejo, para posteriormente se reabrir um aquartelamento em Quebo, mais próximo do Cantanhez. A localização do possível aquartelamento já fora por nós visitado, num patrulhamento que Coutinho e Lima comandou. Nesse dia a sorte estava do nosso lado, quando exaustos, descuidámos a proteção. O PAIGC estava no local, mas nunca imaginou que pisássemos aquele terreno, controlado por eles. A maré do rio começou a encher e tivemos de regressar, sem qualquer percalço.

Por volta das 8 da noite, dia 4 de Março, o Lourenço recebe ordem para fazer proteção à reabertura da referida picada ( estava limitada a um pequeno trilho pela imensa mata que a ladeava) no dia 5 de Março, logo que a visibilidade o permitisse.

Como sempre fazíamos, dada a nossa grande intimidade, abordámos a situação da reabertura da estrada e concluímos que aquela picada brevemente se transformaria num campo de minas, o que se veio a concretizar.

Estava de serviço ao aquartelamento, colaborando na limpeza, ajuda na cozinha, recolha de água e qualquer outra tarefa, que se tornasse necessária.

Depois de orientado o serviço,  dei uma saltada à picada que estava a ser reaberta. O trabalho era feito pelos capinadores recrutados na população.

Constatámos os dois que os trabalhos tinham avançado imenso, a que era atribuído à presença, quase permanente, do Coutinho e Lima. Alertei-o para a granada, que estava desarmadilhada, mas não em segurança. Respondeu-me que sabia, cada trilho tinha duas e ele já colocara em segurança a primeira.

Depois de um pequeno bate papo solicitou-me que lhe pegasse na arma e que iria pôr a granada em segurança. Fumava um Português Suave (sem filtro  e pegou na granada para a colocar em segurança. A alavanca saltou e o Lourenço para proteger os outros ficou completamente esventrado.

A situação era complicada e o tempo escasso para decidir. Estava junto dele e o sexto sentido aconselhou-me que a que recuasse um passo (não havia espaço para mais) e me baixasse com a arma dele. Em frente tinha a mata cerrada e o risco de lhe cair junto aos pés era grande. Atirá-la para a frente era arriscado, encontrava-se o seu grupo de combate a montar a segurança. Atirá-la para trás era impensável, lá se encontravam os capinadores e o Régulo que já se encontrava a dois metros de distância de nós.

A situação resumiu-se à morte imediata do Lourenço e à evacuação, para o hospital de 6 capinadores e do Régulo, este em estado grave.

Não cheguei a ver o estado do Lourenço, era fácil deduzir como se encontrava. Fiquei em estado de choque e refugiei-me na messe dos Sargentos.

Com o Lourenço partiu metade de mim. Para agravar todo este estado anímico, nessa hora, fomos visitados por camaradas sediados em Bissau que vinham planificar as obras a realizar no aquartelamento e que acabaram por me melindrar por me encontrarem num estado debilitado e em sofrimento.

Obrigado,  Amigo. Descansa em Paz. Não esquecerei a data trágica de 5 de Março e recordar-te-ei para sempre.

Manuel Reis

_____________________

Notas do editor:

(*) 6 de agosto de  2013 > Guiné 63/74 - P11908: Memória dos lugares (243): Núcleo Museológico Memória de Guileje - Parte II (Carlos Afeitos, ex-cooperante, 2008/2012)

11 comentários:

Anónimo disse...

JOSÉ CARVALHO
5 mar 2015 15:28


Sou (fui) um dos intervenientes desse triste e doloroso episódio na História da CCAV 8350.

Decidiram reabrir a estrada para o Mejo. Tinham que "capinar",por esse motivo havia que manter a segurança aos trabalhos (eu estava com o meu Grupo emboscado, ali, bem na ZA). De repente ouvi/senti, uma violenta explosão. Fui-me inteirar do sucedido. Deparei com o corpo do malogrado Alferes Lourenço estendido, sem metade da cara, e com as "tripas" expostas (já estou a chorar)...

Que aconteceu ????...obviamente, conjecturas, muitas, só ele poderia explicar o que se passou, o resto são isso mesmo, conjecturas.

No entanto depois de me inteirar "in loco" do sucedido, fiquei com dois ou três "filmes"...

Ao desarmadilhar/desactivar uma granada/armadilha, em que é necessário reintroduzir os dois pernos/cavilha, ao mesmo tempo que se segura a alavanca da granada, pode ter havido uma falha na pressão da mão e ter activado o percutor do fulminante.

«In dúbio», ele deve ter-se apercebido que "algo não estava bem", tinha duas opções, atirar a granada para longe dele, e ferir dezenas de militares e civis, ou naquele nano-segundo optar por segurar...sempre com a 2ª hipótese, que era, não havia problema "estava tudo bem".

Morreu com esse glorioso alferes...a resposta. Eu penso que ele , ao afastar a granada da cara, estendendo o braço, sem largar a mesma, poderia ter ficado na dúvida do eminente perigo, ou não.

Para mim ele foi/é um Mártir/Herói da guerra. Provavelmente tentou minimizar "os danos colaterais", não pensando em si, e é essa imagem que guardo.

O que se seguiu, é digno da "bolinha vermelha", já no Quartel, fui um dos voluntários para pegar no cadáver e transportá-lo/depositá-lo...na Capela. Eramos dois, eu peguei nos braços, outro camarada nas pernas, ao levantar o corpo, o mesmo dividiu-se em dois.... Que dor, eu fiquei com a cabeça, os braços e o torso, o outro camarada, com as pernas e a bacia.

Encostei-me na Capela a chorar e com convulsões, que ainda hoje, transporto comigo.

O meu respeito e a minha memória estão com o "Alferes Lourenço" .

Quanto a ser o Último Alferes a morrer, não é verdade. O Último foi o Alferes Branco, que o veio substituir, morreu , numa patrulha que fez comigo (a primeira que fez), em Gadamael...

Tenho tudo isso gravado na minha cabeça. Nunca me esquecerei dos meus Heróis.

José Carvalho
ex fur mil Op Esp

Hélder Valério disse...

Caro José Carvalho

Estamos de acordo.
O Alf. Lourenço é (foi) de facto um herói e como tal deve ser recordado e homenageado.
Ao conhecer, ainda que não na totalidade e muito menos 'in loco' as situações que geraram o acontecimento e que bastante me impressionou, achei por bem prestar-lhe esta homenagem para que a sua memória se possa 'estender' no tempo.

Quanto ao "último", pois já sei que tens razão. Se esse Alf. Branco foi substituir o Lourenço e se faleceu, só pode, obviamente, ter sido depois. Mas essa do 'último' foi o que recolhi da listagem que tinha sido publicada.

Já agora, não deixa de ser intrigante que o substituto do Lourenço também viesse a 'dar a vida pela Pátria', sendo que era ainda um 'periquito'.

Abraço, amigo
Hélder S.

jpscandeias disse...

Caro Camarada José Carvalho.

Quando em meados de maio de 1974 cheguei a lisboa, já não sei exactamente porquê, fui ao ministério do exército, localizado na Praça do Comercio, fui abordado por um furriel que ao saber que eu tinha chegado recentemente da Guiné me questionou se sabia alguma coisa sobre Alf. Branco. Disse-lhe que concretamente não sabia nada, apenas o que se dizia na província, que na essência era o seguinte: que tinha sido "apanhado à mão" e que posteriormente o corpo tinha encontrado e recuperado com sinais de extrema violência e crueldade. Depois o furriel acrescentou que a família do Branco queria, e compreende-se porquê, saber mais sobre a perda do filho. E que lá iam insistentemente na esperança de saber noticias. Também soube que o Branco tinha poucos meses de comissão, que era atleta do SCP e que era uma das suas primeiras saídas à mata.

José Carvalho, ao ler as tuas palavras recordei esse episódio que ocorreu há mais de 40 anos.
Um passado que partilhamos com alguns pontos em comum.

Desconheço se no blogue já foi feito alguma referência ao Branco. Eu não o faço por não ter conhecimento dos factos.

Um Abraço

João Silva, ex- furriel mil, at. inf. Ccv 3404, Cabuca, Ccaç 12, Xime e Bambadinca. 72-74

Anónimo disse...


Hélder Valério Sousa
5 mar 2015 19:01


Caros amigos

Obrigado pela publicação no dia.
Era isto que eu queria 'oferecer' ao Manuel Reis que, como escrevi, ainda hoje, e para mais 'na data', fica bastante abalado.
Do texto dele percebe-se bem as razões: amizade, cumplicidade, sonhos comuns, desempenhos complementares, convivência nos mesmos aposentos, envolvimento deles e suas então namoradas em jantar de despedida, o facto de estar literalmente ao lado, etc. Tudo isto seria mais que suficiente para explicar as emoções do Reis.
Mas acresce ainda que lhe calhou recolher os seus haveres e fazer chegar aos familiares. E também a tarefa de manter o contacto com a mãe dele.
Como estávamos longe dos 'apoios psicológicos' que hoje, felizmente, existem!

Olhem, já agora, acho que no "P11908" a foto que está a seguir à que foi colocada, evocando, e bem, a CCAV 8350, é a da placa com o nome "Parada Alf. Lourenço" que eles, os seus camaradas, edificaram em sua homenagem e que penso também ficaria bem no post publicado.
Abraços
Hélder Sousa

Manuel Reis disse...

Amigo Hélder!

Não sei como agradecer-te. A ti, ao Luís, ao Carlos Vinhal e ao meu amigo e camarada José Carvalho o meu BEM-HAJAM.

Por mais de uma vez descrevi, neste espaço, a ocorrência do referido acidente. Não me é fácil falar disto, mas o Carvalho levantou algumas dúvidas quanto ao desenrolar dos acontecimento, que vou ajudar a esclarecer.

A minha cumplicidade com o malogrado Lourenço era de tal ordem, que à noite falámos sobre a reabertura da picada, que fazia a ligação ao Mejo e as possíveis consequências, que acabaram por se verificar posteriormente. Os nossos melhores africanos Camisa Conté e Sátala Colubali foram desfeitos por uma mina anti-carro lá colocada para o efeito.

Procurámos a melhor opção e essa passaria para nos afastarmos dos capinadores. O Major acompanhou os trabalhos desde manhã e os capinadores trabalharam a bom valer. Ainda de manhã, como estava de serviço ao aquartelamento, aproveitei para conversar com ele.Estava irritado com a situação, acalmei-o e a conversa foi curta pela existência de uma armadilha, já desactivada, mas cuja granada era necessário colocar em segurança. Fumava Português Suave ( sem filtro) e deu-me a arma.

A alavanca soltou-se sem fazer o habitual clik o que deve ter iludido o Lourenço. Das possíveis hipóteses que se poderiam questionar, apenas se pode afirmar que ele sacrificou a vida em detrimento dos seus camaradas, de modo muito particular a mim, que me localizava a um metro dele.

Do resto mais nada vi, o camarada Carvalho já descreveu o que aconteceu nos momentos seguintes.

Para todos um grande abraço e mais uma vez os meus agradecimentos ao Hélder, pela dedicação e carinho que colocou neste trabalho.

Manuel Reis

Torcato Mendonca disse...

Para vocês o meu abraço camaraqda e solidário.

Li e sem por isso dar estava a "ver" a morte de outros camaradas. Parei e só escrevi para o envio do abraço.

Foram mortes dsemais e um fulano, tantos anos dsepois, ainda fica...amarrotado.

Ab,T.

Anónimo disse...

O Torcato diz e bem: "passados estes anos ainda se fica amarrotado". O caso não é para menos, trazemos connosco os corpos esventrados e os olhos mortiços...trazemos connosco os sonhos interrompidos e os gemidos, os gemidos suplicantes. Estamos todos contigo Manuel Reis.
Eu ouvi, durante uma semana consecutiva, os bombardeamentos sobre Guiledge. Ouviam-se em Colibuia, onde estive destacado.

Um abração.
Carvalho de Mampatá

Vasco Pires disse...

Ficou a dor Manuel Augusto, porém, temos o privilégio de estar vivos e termos esta "janela"para mitigar a dor.
Forte abraço "Bairrradino".
VP

Anónimo disse...

O meu abraço solidário para todos os que viram e/ou sentem a dor dos camaradas que partiram por causa de uma guerra estúpida...

Um abraço especial para o Manuel Reis e para o Casimiro Carvalho.
BS

Luís Graça disse...

Obrigado a todos, e em especial ao Hélder Sousa, ao Manuel Reis e ao J. Casimiro Carvalho...Fui "desenterrar" o emocionado comentário do Manuel Reis, inserido no poste P11908, de 6 de agosto de 2013, que logo na altura deveria ter sido transforamdo em poste... Mas em agosto não é a melhor altura para o trabalho de edição.

Gostaria também que aparecesse mais informação sobre o nosso malogrado camarada Branco.

JOSE CASIMIRO CARVALHO disse...

Fui o ultimo a ver o camarada com vida, pois presenciei a cara a ser estilhaçado por uma rajada. Consta por aí que os Para quedistas me foram resgatar e aos mortos. Não é verdade. Embora muitos devam a vida ao Grandes Para Quedistas, aí não foi o caso. Os ultimos a aguentar a fogachada IN foram o Soldado Borges e eu, e só depois de eu dar ordem de retirar é que o Borges suspendeu o tiro a tiro e eu as rajadas e retiramos....estávamos sós. Chegados ao Quartel saíram os Para quedistas e recuperaram os 4 corpos...Dixit