segunda-feira, 4 de dezembro de 2017

Guiné 61/74 - P18045: Estórias do Juvenal Amado (58): os meus heróis do 1º de dezembro


Foto nº 1 >  Vários escriturários sendo o penúltimo,  do lado direito, o Silva


Foto nº 2 > Aqui o cap Pamplona a dar conhecimento básicos do morteiro 81 mm a dois escriturários entre eles o Fortes. (O outro camarada não é o Narciso, mas o Silva, 1º cabo escriturário, manda dizer o autor da foto, com pedido de correção da legenda...)


Foto nº 3 >  O André (Russo), maqueiro

Guiné > Região de Bafatá > Galomaro > CCS/BCAÇ 3872 (Galomaro, 1971/74)

Fotos: © Juvenal Amado (2017). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Texto enviado em 3 do corrente  pelo o nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º cabo condutor auto rodas, CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74),  a propósito da efeméride do 1º de dezembro (*)


HISTÓRIAS DO JUVENAL AMADO (**)

58 - Os meus heróis do 1º de dezembro 



A defenestração do Miguel de Vasconcelos
em 1/12/1640. Imagem de banda desenhada,
cuja autoria não  conseguimos apurar.(M. Gustavo?)
Durante a minha vida passei este dia em diferentes circunstâncias como toda a gente ou quase toda porque o que é importante para uns não é para outros.

Também para mim esta data teve grande importância numas alturas,  e noutras era só mais um feriado aproveitado para descansar .

Serviu de mote a discursos inflamados de nacionalismos, onde altos médios ou pequenos dignatários do pode  despejavam verborreia de palavras num português rebuscado e, muitas vezes ficávamos sem saber o que é que eles tinham dito na verdade. 

Não me lembro de ter retido nada do que se disse a não ser, que falavam da restauração da independência mais do conde de Andeiro e da famigerada Leonor Telles [, na crise de 1383-1385], mas lembro-me bem do frio que passava em calções, de bata branca, no largo junto ao Mosteiro de Alcobaça sob o olhar severo da nossa professora, que de maneira nenhuma aceitaria, que algum de nós faltasse na formatura . Mas o pânico dela seria de que nós fossemos sujeitos a reparo por falta de atenção e garbo infantil na parada onde estavam fardados os membros da Mocidade Portuguesa e da Legião Portuguesa, mais os bombeiros etc.

Juvenal Amado
As diferenças de opinião entre esta professora e minha mãe, que a conhecia de ginjeira por ter sido aluna dela, levou o meu pai agarrar nos parcos haveres mais família e vai dai fomos morar para a Vestiaria, terra onde a efeméride teve sempre pouco que contar. Acabei lá a 1ª  e fiz a 2ª e 3ª classes.

Só regressei à escola de Alcobaça para fazer a 4ª classe e aí tive como professor um já alto graduado da Mocidade Portuguesa, que ia fardado para a escola nos dias importantes e sempre aos sábados.

Como ele tinha já filhos da nossa idade, não percebia como que ele era da Mocidade Portuguesa, mas há uns anos apareceram as juventudes partidárias em que, são jovens militantes ou jotas até quase serem avós e aí estabeleci a comparação finalmente. 

Não merece a pena aqui exemplificar com nomes em que essa juventude partidária prolongada acabou com o dito feriado para desgosto de republicanos, monárquicos e do povo em geral, que passaram a lastimar o facto.

Mas lá diz o ditado, que não há bem que sempre dure e mal que nunca acabe e assim, como Portugal viu a sua independência restaurada no 1º de dezembro de 1640, a tão insigne data foi restaurada como feriado nacional em 2016, com a curiosidade de que até quem acabou ou ajudou a tirar o feriado, vir hoje a terreiro congratular-se com a reposição do mesmo e dizer Muito bem! Muito bem!! Muito bem!!!

E dizem em alto e bom som, como se a verdade os tivesse iluminado e viesse de como um raio só para eles; “Era um direito do povo português ver este dia começar ainda deitado, como num feriado que se preze”. Sim porque em pleno inverno, não se podendo ir fazer ski (ou sku) à Serra Nevada, resta-nos o prazer de ficar no quentinho mais uma ou duas horas.

Não há nada mais certinho e direitinho , que os direitos do povo … bem, nem sempre como se sabe.

Mas a data passou a ter para mim outro significado, há 45 anos, pois precisamente neste dia o meu destacamento foi violentamente atacado ao arame pelos guerrilheiros do PAIGC, felizmente só com algumas escoriações e muita valentia, que não tinha nenhum patriotismo mas sim vontade de sobreviver.

Ontem faltavam 10 minutos para as 22 horas, relembrei aquela noite em que estando tão perto da malvada, constatei de quanto é estreita a linha que nos separa da vida e da morte.

Veio-me à memória os nomes dos camaradas que estavam comigo e os que, mais prontamente, reagiram ao ataque bem como os que estavam no mato, que podiam ser atingidos quer por fogo inimigo como amigo .

Ao Lourenço,  1º cabo mecânico auto, que deu as rajadas que obrigou o inimigo a denunciar-se cedo de mais, ao André, maqueiro, mais o Silva, escriturário, que usaram o morteiro 81 de forma evitar o pior, mais os que, de uma forma ou outra o melhor que puderam, reagiram com G3 e puseram em fuga os guerrilheiros,  renovo com muito obrigado. Para mim, foram os heróis desse 1º de dezembro...

Mais tarde uma pessoa muito importante para mim, também faz da data um dia de comemoração bem mais agradável.

Um grande abraço para todos tabanqueiros

PS - Na CCS foi ministrado um frugal treino de manuseamento dos dois morteiros 81, bem com da MG 42, a cozinheiros e corneteiros e escriturários já que os pelotões operacionais saíam em colunas ou patrulhas ora uns, ora outros, e os seus abrigos eram longe das referidas armas. Possivelmente terá sido assim noutras CCS.
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Notas do editor:


(**) Último poste da série > 16 de outubro de 2017 >  Guiné 61/74 - P17866: Estórias do Juvenal Amado (57): A minha avó Deolinda Sacadura, uma mulher do 5 de Outubro

4 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Caro Juvenal, obrigado pela tua resposta ao desafio dos editores sobre o 1º de dezembro...

Cada um tem as suas "efemérides" de predileção... É engraçada a coincidência, que deve ser mais do que isso: o ataque a Galomaro em 1 de dezembro de 1972 (ou 1973 ?)... Tenho ideia que alguns ataques e flagelações aos nossos aquartelamentos, destacamenos e tabancas em autodefesa também obedeciam a um planeamwento "político"... Não era por acaso que o PAIGC escolhia datas como o 1º de dezembro ou o 28 de maio ou o 10 de junho... Eles conheciam bem a nossa história, estudaram (o Amílcar Cabral e os demais dirigentes do PAIGC) pelos mesmos manuais escolares que nós...Eles conheciam quais eram os nossos feriados nacionais no tempo do Estado Novo...

Quanto ao efeito disuasor do nosso morteiro 81...Não se podiam comparar ao morteiro 120 (que o PAIGC usou contra algumas das nossas posições fronteiriças), mas era talvez bem mais mortífero, e sobretudo flexível, quando bem manuseado, pelas NT, na resposta a ataques e flagelações com a guerrilha espalhada pelo perímetro dos nossos aquartelamentos...

Tínhamos a vantagem do espaldão, do municiameneto e dos planos de tiro... O morteiro 81, arma de tiro curvo, fez muitos estragos aos homens do PAIGC, quando se arriscavam a vir perto do arame farpado...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Um dos nossos problemas é que as unidades de quadrícula estavam dependentes dos esquadras dos pelotões de armas pesadas... Havia um pelotão de morteiros (e mais raramente de canhões s/r) em cada batalhão... As esquadras (equipas ou seções) eram enviadas para as unidades de quadrícula...

Aqui ninguém tinha tido instrução de armas pesadas de infantaria... E mesmo os "especialistas de armas pesadas de infantaria", como eu, tiveram muito pouco treino de "fogo real"... NO meu tempo, em Tavira, no CISMI, no 4º trimestre de 1968, a ordem era já para poupar até ao "último tostão"...

Em boa verdade, a nossa instrução nilitar era quase toda ela feita... a "papel e lápis", como alguns muitos dos cursos (quer de formação profissional, quer universitários, de pós-graduação, etc.) que se tiram por aí... Quem, em boa verdade, sabia operar, com perícia, destreza, competência, sangue-frio, o morteiro 81, o canhão s/r 75, as metralhadoras pesadas Breda e Browning ?... Reparem, todo este equipamento era já "obsoleto", eram restos da II Guerra Mundial...

O morteiro (médio) 81 mm Brandt m/1931 tinha já 4 décadas...E o morteiro (ligeiro) 60 mm M2 m/952, bem manuseada (por quem tinha unhas---), era um arma temível a bater o arame farpado e imediações...

Quem, nas nossas unidades, tnham tido treino como apontador ou municiador d emorteiro ?...

Não admira, por isso, que o teu capitão Pamplona tenha decidido, e bem, dar instrução de morteiro aos "básicos" da CCS (sem ofensa, para vocês, escriturários, maqueiros, mecânicos, condutores...). Quando se tratava de defender a "nossa casa" (e as nossas vidas...), em caso de ataque ao aquartelamento, todos os militares eram operacionais, dos aijudantes de cozinheiro ao "escrita"...

Juvenal Amado disse...

É como dizes os operacionais em Galomaro não eram disponibilizados para a defesa do quartel. O abrigo dos Sapadores bem como do PELREC estavam virados para a tabanca por isso a quem cabia o ónus da defesa eram os abrigos virados para a pista de aviação e para o campo de futebol. Eram esses os cozinheiros, corneteiros, mecânicos condutores, transmissões, escriturários etc. Um dos morteiros estava entre a enfermaria e abrigo dos escriturários dos o outro mesmo ao lado do meu abrigo onde conviviam condutores, mecânicos, cozinheiros, corneteiros do outro lado era o abrigo da MG42 . A localização das duas armas estratégicas levou que o meu abrigo fosse duramente atingido com 5 roquetes tendo penetrado a nível do tecto que cortou as barras de ferro que sustinham o tecto . Outra curiosidade foi o morteiro que estava ao pé do meu abrigo ter ficado com a primeira granada encravada pois o cano estava quase meio de terra. Para isso deve ter contribuído o Jamba um balanta que tinha livre transito e que se veio a saber depois que era do PAIGC.

Para finalizar Por erro mencionei como sendo o Narciso um dos camaradas que está a aprender a utilização do morteiro mas é o Silva escriturário que como o Russo manobraram o morteiro que estava ao pé da enfermaria.

Outra curiosidade acaba por ser os festejos feitos em Cancolim por termos sido atacados. Deveu-se isso ao facto de o comandante os ter acusado de serem atacados por não fazerem os patrulhamentos devidos. Ora tomem lá pensaram eles.

Anónimo disse...

Olá Juvenal,
Bonita história sobre o 1º de Dezembro, onde os herois foram efectivamente outros que não os de 1640.
Na cidade de Évora sempre foi essa data celebrada com pompa e circunstância pelo menos pelos estudantes. Era, não sei se ainda continua a ser, uma noite de farra, a noite de 30 para 1 de Dezembro. Durante alguns anos, depois de já estar em Lisboa, voltava lá para celebrar com a rapaziada que tinha ficado, depois foi-se esfumando e acabou.
Um abraço.
BS