terça-feira, 30 de abril de 2019

Guiné 61/74 - P19729: A galeria dos meus heróis (29): 'Disculpen las moléstias"... Ou uma história que mete vítimas e carrascos (Luís Graça)





Pemiche > Museu Nacional da Resistência e Liberdade , o  15º Museu Nacional > 27 de abril de 2019


Fotos: © Luís Graça (2019). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


A galeria dos meus heróis >  'Disculpen las moléstias"...  Ou uma história que mete vítimas e carrascos 

por Luís Graça



1. Peniche, ou melhor, o forte de Peniche, era talvez o sítio mais improvável para reencontrar um dos poucos camaradas, do tempo do Curso de Sargentos Milicianos, em Tavira, de quem eu guardava uma nítida (falando da sua fisionomia) e sobretudo grata recordação (no que dizia respeito ao convívio): o Sarmento.

Tínhamos em comum o gosto pela escrita, pelo jornalismo. Ele era do 
Fundão, de uma terra chamada Alpedrinha, sabê-lo-ei mais tarde. E chegara a colaborar, enquanto jovem, no prestigiado "Jornal do Fundão", criado em 1946, por António Paulouro, e um dos raros jornais independentes que existia no Portugal desse tempo... Eu também vinha do jornalismo regionalista, onde aprendi a fintar a censura…

Em Tavira, no quartel da Atalaia, no CISMI, o Centro de Instrução de Sargentos Milicianos, colaborávamos no jornal de parede. Recordo-me que tínhamos uma equipa editorial, composta por vários soldados-instruendos que tinham dado como profissão o jornalismo… 
 
E, claro, tínhamos,  um "diretor". O comandante da unidade, um tenente-coronel ou coronel, já não me recordo qual era o posto, zelava pela "orientação editorial do jornal" e, claro, pelo moral da tropa (e a moral da Nação). Miúdas de peitos fartos, generosos, de bicos espetados, e "bundas" largas e redondas, loiraças, provocantes, anglo-saxónicas ou escandinavas, era bem vindas e aclamadas: afinal de contas, os instruendos estavam na flor da idade, precisavam de ter sonhos cor de rosa à noite... Sim, porque os sonhos verde-rubros das grandezas do império não davam tanta "pica"...

Também o rádio CISMI, se bem me lembro, que nos acordava em altos berros logo pela madrugada… Mas eu era do jornal de parede.. Tínhamos alguma liberdade, todavia havia limites para a "desbunda": recordo-me de, um belo dia, ele, comandante, director, censor-mor, lídimo representante do Exército e da Nação, ter-nos obrigado a mandar para o lixo uma vasta e luxuosa edição especial, uma verdadeira enciclopédia, ilustrada, com dezenas e dezenas de fotos, mapas e recortes, dedicada à II Guerra Mundial e ao "nazifascismo" (que palavrão!). Foram horas e horas de trabalho, roubadas ao sono,  que acabaram ingloriamente no caixote do lixo!

O argumento do censor-mor era de peso, e até de bom senso, definitivamente pedagógico e sobretudo retumbante: "Meus senhores, para guerra, já basta a nossa, a do Ultramar!"... Como, de resto, iríamos comprovar dentro de escassos meses... 



2. Quis o destino que tirássemos, os dois, eu e o Sarmento, a especialidade de armas pesadas de infantaria, e que depois fôssemos mobilizados para a Guiné, não sem antes termos ido ainda dar uma rápida recruta, como 1ºs cabos milicianos, em Castelo Branco, no BC 6, se não erro... Estávamos lá os dois quando foi o terramoto de 28 de fevereiro de 1969...O "nosso" já acontecera umas horas antes, com a ordem de mobilização para a Guiné...

Embarcámos no mesmo dia e no mesmo navio, o "Niassa",  três meses depois. Convivemos bastante nesses cinco dias de viagem, especulando sobre o incerto mundo que nos esperava. Mas, chegados a Bissau, cada um seguiu o seu inexorável destino, depois de dois ou três dias nos Adidos. 

Apesar das promessas de irmos dando notícias por carta ou aerograma, acabámos por perder o rasto um do outro. Como aconteceu com outros efémeros amigos que íamos fazendo pelas estações do calvário da tropa: Caldas da Rainha, Tavira, Castelo Branco... Em todo o caso, não tenho qualquer memória da passagem do Sarmento pelo RI 5...


3. Foi preciso esperar meio século para, num bambúrrio de sorte, nos encontrarmo-nos e nos reconhecermo-nos, aos 72 anos !... O pretexto foi a celebração dos 45 anos da saída dos presos políticos da cadeia de Peniche, dois dias depois do 25 de Abril de 1974.

Fui lá com a minha mulher que queria recordar os momentos, de grande ansiedade e euforia, em que fora dar um abraço a um dos seus amigos, colega de trabalho, que estava preso. Ela não tinha a certeza que ele viria à cerimónia de sábado passado, eventualmente com a filha e a neta. Mas a verdade é que veio, e a minha mulher voltou a fazer uma festa, abraçando-o e beijando-o efusivamente. A seu lado estava, nem mais nem menos, o Sarmento e um seu amigo.

Segundo ela me contou, há 45 anos foram longas horas de espera e mesmo assim não sairam todos os presos. Os fuzileiros tinham instruções, da Junta de Salvação Nacional, para não deixar sair os presos condenados por "crimes de sangue" (sic)... Enfim, acabaram por sair todos, graças à força. mobilização e resiliência da multidão que se juntou na fortaleza de 
Peniche, e que foi gritando, até ao fim do dia do dia 26 e princípios do dia 27, "ou saem todos ou não sai nenhum"...E a verdade é que saíram todos na madrugada do dia 27...


Eu não estive lá nessa altura, trabalhava e vivia em Mafra, e nem sequer namorava ainda com a minha futura mulher. Mas, ao que parece, um dos tipos que foi solto era também um amigo, conterrâneo ou familiar do Sarmento, alegadamente preso por pertencer à LUAR.

Quarenta e cinco anos depois, na comemoração dessa efeméride, e de entre os mais de dois mil e quinhentos presos políticos, que passaram por Peniche, entre 1933 e 1974, estavam alguns, talvez algumas dezenas, dos sobreviventes, agora todos eles de cabelos grisalhos... Lá estavam, aparentemente felizes e orgulhosos, de cravo ao peito, no passado sábado, dia 27 de abril de 2019. A fortaleza agora é monumento nacional e sede do Museu Nacional da Resistência e Liberdade, o 15º museu nacional.


4. Curiosamente, entre os VIP presentes, sentados, frente ao palco,   estava o Jerónimo de Sousa, deputado e secretário-geral do PCP (e, que eu saiba,  nunca foi preso pela PIDE/DGS). Há uns anos atrás é que eu vim a saber, que ele foi mobilizado para o TO da Guiné, tendo embarcado no "Niassa", em 24 de maio de 1969, comigo e com o Sarmento e mais uns mil setecentos e tal militares, sem sabermos naturalmente nada dele nem ele de nós. Éramos uma série de  companhias independentes, além de vários pelotões, incluindo uma companhia de polícia militar a que pertencia o camarada,  ex-soldado condutor auto, da companhia de polícia militar, a CPM 2537, Jerónimo de Sousa.

O Sarmento não sabia, nem sequer suspeitava,  dessa coincidência, de resto já aqui relatada no nosso blogue. Fui eu quem lhe revelei esse segredo de Polichinelo, talvez uma hora depois de sermos apresentados um ao outro pelo ex-preso político, amigo e colega de trabalho da minha mulher.

Palavra puxa palavra, falou-se do blogue do Luís Graça & Camaradas da Guiné. Mas o Sarmento só me conhecia por Henriques... Afinal o Graça e o Henriques era a mesma e única pessoa... Na realidade, o Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande, conclui eu, embevecido. Caímos, naturalmente, nos braços um do outro!


5. Diga-se, em abono da verdade, que o Sarmento já em tempos tinha sabido do meu paradeiro através do blogue, e estava para me contactar, até porque queria trazer os netos à Lourinhã, para uma visita ao DinoParque, o parque dos dinossauros que é o maior da Europa, e está justamente localizado na terra onde eu hoje moro e onde nasci. (Enfim, perdoem-me a publicidade, mas é por uma boa causa!)... Não foi preciso, afinal: reconhecemo-nos em Peniche, por um feliz acaso... 


Enquanto os ex-presos políticos ficaram a partilhar as suas doridas memórias da cadeia de Peniche, eu e o Sarmento pusemos a "escrita" em dia, falando dos tempos de Tavira, de Castelo Branco, da nossa memorável viagem no "Niassa" e das nossas desventuras por terras da Guiné, eu no leste, ele no sul... 

Não sei qual de nós teve mais sorte, no TO da Guiné: mais emboscada menos emboscada, mais mina menos mina, andámos os dois na porrada, eu numa companhia africana, ele numa companhia independente. Nada do que aprendemos em Tavira nos serviu. E a arma que nos distribuiram foi a G3. Nunca tivemos nem manejámos armas pesadas, canhões sem recuso, morteiros, bredas, brownings...

Antes de despedirmo-nos, trocámos emails e números de telemóvel e prometemos encontrarmo-nos na Lourinhã, no próximo verão, nas férias grandes escolares dos netinhos... Eu prontifiquei-me a fazer-lhe uma visita guiada pelo DinoParque, para cuja criação, de resto, também dera a minha pequena, modesta, contribuição enquanto sócio e membro, há uns largos anos atrás, dos corpos sociais do Grupo de Etnologia e Arqueologia da Lourinhã (GEAL) que está na génese do "museu da Lourinhã" e, mais recentemente, do DinoParque.

O Sarmento, que vive hoje nos arredores do Fundão, numa quintinha cheia de belas cerejeiras, depois de ter feito uma carreira como professor de filosofia, no ensino secundário, prometeu-me mandar um pequeno texto para o blogue, para esta minha série, "A galeria dos meus heróis"... Prometeu e cumpriu. Com a seguinte mensagem:

"Henriques, ou melhor Graça, velho amigo e camarada de armas (pesadas): Não me peças mais para escrever sobre a tropa e a guerra. Já fechei há muito esse departamento. Por amizade e apreço pelo teu trabalho de mineiro das nossas memórias, mando-te este texto que me saiu de rajada. Vê se era isso que tu querias. Até ao próximo verão, no Dino Parque da Lourinhã. Sarmento"

___________


A melhor ditadura é sempre pior
que a pior democracia

por J. Sarmento


Os portugueses, soturnos e fatalistas, escrevem nas portas interiores das casas de banho: "Isto é uma merda". Os espanhóis, cínicos mas encantadores, escrevem um bilhetinho e põem-no na porta do elevador: "Disculpen las moléstias".

O pequeno almoço é uma merda, casqueiro com marmelada, e a Internet não funciona, o quarto do hotel é horroso,já passaram por aqui milhares de motoristas de camiões TIR. As paredes estão pintadas a cor de vómito e de esperma requentado. Mas o gerente não tem que ser simpático, apenas tem que saber gerir o bordel espanhol que a agência de turismo me arranjou à beira da estrada, na periferia de Cáceres.

Com a violência de género a aumentar exponencialmente em Espanha, são as espanholas que agora gritam, em manifestações de protesto na rua: "Disculpen las moléstias..., pero nos están matando".

Que pena, eu nunca ter estado em Espanha antes do 25 de Abril, nem conhecer nenhum espanhol e muito menos nenhuma espanhola. Minto, conhecia alguns galegos, que tinham tascos e carvoarias em Lisboa ou eram amola-tesouras. Ia-se a Espanha, nesse tempo, só com passaporte. Há séculos que havia uma fronteira, com gajos façanhudos, armados,  de um lado e do outro, como em todas as fronteira.

Mas a maior parte dos portugueses deu-se ao luxo de dispensar o passaporte e o controlo fronteiriço e foi "a salto", com a mala de cartão às costas. Só lhe interessava chegar aos Pirinéus franceses. A partir daí, era outra vida, outro mundo, o eldorado...Isto é, o "bidonville" e os "chantiers", o bairro de lata e os estaleiros de construção. Nunca ninguém ofereceu, em nenhuma parte do mundo, que eu saiba, o paraíso aos imigrantes...

Dava-me jeito ter aumentado o meu léxico com essa deliciosa expressão idiomática: "Disculpen las moléstias"... Dava-me jeito quando fiz a tropa e fui mobilizado para a Guiné para defender uma parte da Pátria que não era minha. Estava disposto (ou pelo menos fui educado para isso, na escola de Alpedrinha) a dar a minha vida pela parte da Pátria que era minha, a minha terra, a terra dos meus pais, avós e demais antepassados...

Faço a minha declaração de interesses: não fui faltoso, nem refratário, muito menos desertor. Também não fui herói. Nunca me bati à cruz de guerra. O tenente Esteves, no CISMI, Tavira, ainda bem tentou cantar-me a cantiga do bandido: "Eu sou devedor à Pátria, / E a Pátria me está devendo, / A Pátria paga-me em vida, / Eu pago à Pátria em morrendo"...

Quem disse que "é doce morrer pela Pátria", que dê primeiro o exemplo... Eu nunca consegui perceber os seus discursos patrióticos, dizendo-me que eu, o Henriques e mais uma chusma de instruendos do CSM, o Curso de Sargentos Milicianos, vindos dos quatro cantos de Portugal, éramos "a fina flor da Nação"... Gajos que tinham o 5º ano dos liceus ou equivalente. Outros o 7º ou o 7º incompleto. Sempre tinham mais letras do que a grande maioria da população, é verdade. Mas quem é que frequentava o liceu naquele tempo ? Só nas capitais de distrito havia liceus, nas vilórias como as nossas havia alguns colégios particulares, incluindo seminários (como o do Fundão onde estudou o grande escritor Virgílio Ferreira, e foi essa experiência que o inspirou, e o levou a escrever a "Manhã Submersa").

Para mim, desde os quinze anos, em 1965, quando comecei a escrever e a interessar-me pela vida política, tinha a estranha perceção de que era "a fina flor, sim, mas... do entulho". Na terreola onde nasci, lá nas berças... E era isso, que escrevíamos, por outras palavras, nos jornais de caserna em Tavira... Eu, o Henriques e outros soldados-instruendos de quem já não recordo nem nomes nem caras.

Fiz questão, há uns largos anos atrás, de visitar o antigo quartel da Atalaia, em Tavira, depois de lutar durante mais de quarenta anos contra a minha fobia em relação às coisas da tropa e da guerra, que me deixaram um amargo de boca e um sentimento antimilitarista. Os preconceitos têm raízes fundas, daí não ser fácil extirpá-los. No fundo, baseiam-se em experiências mais ou menos desagradáveis de cada um de nós (e, muitas vezes, na ausência efetiva de contacto com o objeto do preconceito).

Achei o quartel ainda muito mais pequeno do que no meu tempo. Aquilo parecia o Portugal dos Pequenitos. Não sei como é que, naquele espaço diminuto, cabiam tantas cabeças e pernas e braços, fardados, éramos algumas centenas de jovens na flor da idade, já com carimbo na caderneta e destino marcado: "Mobilizado para servir a Pátria na províncias portuguesa ultramarinas de... Angola, ou Guiné, ou Moçambique".

Por muito que eu me esforçasse, não consegui reviver os dois meses e meio que aqui passara, no último trimestre de 1968... Não consegui chamar até mim os fantasmas de alguns instrutores e comandantes de companhia, como o Robles, o Trotil e o Esteves a quem batíamos a pala com temor e reverência... Não me recordo do Robles, mas o seu fantasma pairava no ar... Eram heróis, cacimbados, da guerra de Angola, dizia-se...

Do Esteves, que foi meu comandante de companhia, meu e do Henriques, e tinha o posto de tenente, recordo-me da sua única frase de antologia: "Vocês são a fina flor da Nação"... E a malta repetia, baixinho: ... "fina flor do entulho"... Fina flor da merda da feira do gado da cidade, onde rebolávamos às quintas-feiras, fina flor da merda das salinas de Tavira, fina flor da merda das bolanhas da Guiné...

Nunca me passou pela cabeça, a não ser agora, que estou reformado, mas eu devia ter apresentadp, no regresso a casa, um "pedido de desculpas"... Devia ter devolvido a massa que o exército me pagou. O que era complicado: o "patacão da guerra" que ficou amealhado no banco, foi para a vida de estroina dos primeiros meses, na peluda, em Coimbra e depois Lisboa, e para pagar dívidas da família: as propinas do colégio da mana mais nova, num colégio de padres, na capital de distrito; um adiantamento para as despesas da boda da mais velha; um adiantamento ao velhote para o compensar dos calotes dos clientes...

Deviam-me ter pedido desculpas e aceitar de volta o "patacão sujo da guerra" (a expressão, acho que era do Henriques), que me pagaram a troco da intrujice de me considerarem parte integrante da "fina flor da Nação"... 

Acho até que fui vítima de um erro de "casting", devem ter-se enganado no nome e morada... Eu devo ter ido em lugar de um gajo qualquer da elite, da fina flor da Nação,   que, esse, sim, é que devia ter combatido (e até morrido, em caso de necessidade...) pela Pátria ou pelo menos pela parte da Pátria que lhe pertencia. Para mim a Pátria está dividida em duas partes: a que não era minha e a que era minha...Confesso, no entanto, que a linha divisória não era facilmente percetível...

"Fina flor do entulho" voltei a sentir-me eu, quando fui preso pela PIDE/DGS, depois dos acontecimentos da Capela do Rato, logo nos primeiros dias de janeiro de 1973. Ainda hoje estou para saber qual foi o meu crime e o móbil do meu crime...

Tinha vindo da Guiné há um ano e tal, em março de 1971. Completei o sétimo ano e matriculei-me na Faculdade de Letras, em filosofia, no ano letivo de 1972/73. Nunca me filiei em nenhuma "organização subversiva" (como então se dizia), contrariamente ao meu amigo da LUAR, que estava preso em Peniche no dia 25 de Abril de 1974. Muito menos andei a pôr bombas e sabotar os navios de transporte de tropas, ou as Berliet do Tramagal, ou os helis de Tancos. Estava demasiado cansado da guerra para voltar a "pegar em armas"... mesmo que a causa fosse justa.

Como é que eu fui parar à António Maria Cardoso e depois a Caxias, ainda hoje não sei, essa informação está omissa na ficha da PIDE/DGS que eu consultei na Torre do Tombo. Iu oura e simplesmente desapareceu. Estive detido três meses e tal,  sem culpa formada, e fui submetido à tortura do sono, como era uso e costume na António Maria Cardoso... Queriam nomes e moradas!... Por muito boa vontade que eu tivesse, não tinha nomes para dar, aos pides, sobre a "rede" a que eu alegadamente pertencia: chamavam-lhe "O Grito do Povo", uma organização que se destacava, na altura, pela denúncia da guerra colonial e pelo apoio aos desertores e exilados políticos...

Devo acrescentar aqui um pormenor caricato: quando já estava há vários dias e noites, na tortura do sono, à beira da exaustão, na véspera de ser interrogado por mais um inspetor da PIDE/DGS, há um novato que vem fazer o "turno" da noite... e que, de repente, me reconhece do tempo de Guiné:


- Meu furriel!... Sarmento?!...

O homem era da minha companhia e parecia mais incomodado do que eu pelo insólito da situação: eu, vítima, e ele, carrasco. Senti um frémito de horror só de pensar que ele estava quase tentado a abraçar-me:


- O que é faz... aqui ?


- Eu é que te pergunto!...Afinal, sou teu hóspede... Inverteram-se os papéis.


Intencionalmente, tratei-o por tu, tive esse rasgo extremo de lucidez. Enfim, conhecia-o bem, era o "escritas", o 1º cabo escriturário da companhia... Um tio, padre, aconselhara-o, a entrar para a PIDE, agora rebaptizada como DGS - Direção Geral de Segurança... "Tinha cama, mesa e roupa lavada. E vencimento de funcionário público ao fim do mês". Nada mais seguro, nos incertos tempos que corriam. E a "situação estava para durar"... Disse-me que ainda era "estagiário"...e estava a "aprender os truques" (sic) para poder integrar uma brigada de investigação.

O  meu guarda dessa noite era, afinal, um antigo camarada de armas!... Eu não podia crer!... 

Afinal, tínhamos ido e vindo no meu navio. E, naturalmente, sempre que eu ia à secretaria da companhia, lá estava ele a bater à máquina de escrever, no teclado HCESAR. E a tirar cópias a "stencil"... Confesso que nunca fomos amigos. De resto, éramos mais de 160 na companhia, e vovíamos em abrigos diferentes. Mas eu não tinha nada a apontar-lhe por eventuais palavras, ações ou omissões. Era um gajo igual a tantos outros, contando os dias do calendário que faltavam para acabar a comissão. Nem sequer sabia o que é que ele pensava da guerra ou da situação política, ou deixava de pensar. Se calhar nem pensava nada, como muitos outros, a grande maioria.

Pois é, a vida dá muitas voltas e é preciso "fazer pela vidinha"... Para alguns, a PIDE/DGS era um emprego, "seguro", tal como era a GNR, a Polícia de Trânsito, a Guarda Fiscal, a PSP, as finanças, os tribunais... 

Enfim, o "escritas" tentou ser "gentil" comigo, ao tentar justificar a sua opção de emprego no pós-guerra...Bêbedo de sono, ofendido e humilhado, acabrunhado, não conseguia manter qualquer diálogo com  o meu novo carrasco, de quem no entanto, devo acrescentar, sentia um misto de asco e curiosidade mórbida... Como é que um gajo que me parecia "minimamente decente", como era o "escritas" da companhia, um antigo camarada de armas, da Guiné, de 1969/71, se tinha tornado um pide ?

O cabrão do "escritas", que ainda tinha o sotaque nortenho, teve um tímido e atabalhoado gesto de compaixão, ao ver-me no mísero estado em que eu estava, um autêntico farrapo humano... Continuou sempre a tratar-me por furriel:

- Meu furriel, não fique de pé, sente-se aqui nesta cadeira. Enquanto o pau vai e vem, folgam as costas... E assim retempera forças. O inspetor tem horário de funcionário público. Só volta às nove horas, nove e tal, de amanhã, par não dizer dez. Até lá, o senhor tem a minha autorização para dormitar. Eu velo pelo seu sono. Estamos aqui os dois, sem ninguém nos ver, eu empresto-lhe a minha cadeira. Por mor dos tempos passados na Guiné... Por mor da nossa camaradagem... Se eu ouvir passos, dou-lhe um empurrão e acordo-o. Mas está tudo a bater sorna a esta hora da noite. Fique descansado...

Não foi, confesso,  o melhor sono da minha vida. Não consegui dormir em cima da cadeira do pide, meu ex-camarada de armas. Mas descansei as pernas, que estavam um trambolho, depois de tantos dias sujeito à tortura do sono. O meu medo era aparecer, de rompante, o filho da puta do inspetor e perceber a marosca... Espantoso, sem o querer, era eu que estava a vigiar o pide, e não o pide que me estava a guardar...Por volta das oito e tal, ele sacudiu-me e eu abri os olhos, esbugalhados... Só me disse:

- São horas de se preparar... Boa sorte. E desculpe lá qualquer coisinha.

Nunca mais, na vida, lhe pus a vista em cima ... Entretanto, às dez horas em ponto, como mau funcionário público, o senhor inspetor, bem barbeado, bem dormido, ainda a cheirar a café, a cigarro e a água de colónia barata, 
 veio-me fazer a sua visita matinal e trazer-me notícias, "uma boa e outra má, ou menos má":

- Também estive na Guiné, afinal fomos camaradas de armas, se bem que desempenhando papéis diferentes, eu na guerra da inteligência, em Bissau, e você de G3 em punho no mato. Ambos lutámos pela Pátria. Eu, ainda no tempo do general Schulz (ele dizia Schultz...), você do nosso general Spínola. Dois grandes chefes militares.

E prosseguiu, cínico, provocador, ameaçador e enigmático:


- A boa notícia é que vou soltá-lo. Não tenho mais razões por o manter aqui detido. E depois está a ocupar uma vaga no nosso hotel de cinco estrelas (referia-se aq Caxias...) que nos está a fazer muita falta. Não faltam clientes... Não temos, em boa verdade, nenhum facto, substancial, que comprove, de maneira clara e inequívoca, a sua ligação ao "Grito do Povo". 

Fez um silêncio de alguns segundos, respirou fundo e voltou, solene, a ser o dono do jogo:

A má notícia... é que você vai continuar a ficar debaixo de olho. Do nosso, claro. Se lhe posso dar um conselho, como ex-camarada da Guiné, não se meta com essa canalha, acabe o seu curso, e trate da sua vidinha. E, já que anda em filosofia, fique com esta máxima que eu lhe dou de borla: "Mais vale uma boa ditadura do que uma má democracia"... Estamos em guerra, lá fora, em África. Somos o bastião da defesa da liberdade do mundo ocidental. O apoio, direto ou indireto, à deserção e aos desertores é um crime de lesa-Pátria. Vista-se, recomponha-se... E desculpe lá qualquer coisinha.

Não sem antes de me ter posto ao ridículo, pela enésima vez, lembrando-me o "crime" de eu ter dado, ingenuamente, a minha morada para a entrega do correio, a um gajo meu conhecido da faculdade, que tinha passado à clandestinidade (sem eu o saber)... A correspondência passou a ser intercetada pela PIDE/DGS e eu caí que nem um patinho nos braços dos gajos...

... Ainda voltei a Caxias, para fazer o "check out"... Pequei na minha trouxa, com um nó seco na garganta, apanhei o comboio até ao Cais do Sodré e voltei ao meu quarto, numas águas furtadas da rua da Misericórdia, que estavam inteiramente por minha conta (tal como a caixa do correio). Tomei um banho, demorado, e fui ao Trindade comer o melhor bife da minha vida... No dia seguinte, voltei à Faculdade para dar uma explicação sobre as minhas "férias" de 3 meses tal por conta da PIDE/DGS... Não tiveram com contemplações. Chumbei por faltas nesse ano. Felizmente que um ano depois aconteceu o 25 de Abril.

E hoje,  ao fim de uma vida, só posso discordar do pide que me torturou, ao mesmo tempo que me dava lições de ciência política... Afinal, a melhor ditadura é sempre pior que a pior democracia. Os democratas é que são parvos, tratam os seus inimigos com tolerância e clemência...

Tanto quanto soube, mais tarde, tanto o "escritas" como o "senhor inspetor", estiveram na prisão de Alcoentre e foram uns dos tais 89 pides que fugiram pela porta do cavalo, em 29 de junho de 1975... Para Espanha, seguramente. E de lá estou a vê-los a mandarem, cinicamente,  um bilhetinho para as suas antigas vítimas:

- Disculpen las moléstias!...

J. Sarmento, Fundão, Quinta das Cerejeiras, 29/4/2019 

15 comentários:

José Saúde disse...

Camaradas Luís e Sarmento,

Sabeis que encontro vários pontos de semelhança nas vossas narrativas com a minha pessoa?... Passámos pelo CISME de Tavira, conheci alguns dos nomes citados de graduados naquele quartel, ao meu tempo (1972) acrescento o nome do tenente "Caguei", conhecemos a guerra na Guiné, vivemos os implícitos horrores da ditadura, tive familiares políticos presos quer em Peniche, quer em Caxias, falavam-me da tertúlia do sono, de entre muitas outras, enfim, tempos que já lá vão mas que continuam a fazer parte das nossas histórias de vida.

Gostei em ler o texto e deixo explícito que o reencontro entre dois velhos camaradas se pautou pela simplicidade do rever um passado que jamais voltará.

Luís, "disculpem las moléstias" mas o Sarmento será um nome a acrescentar à lista dos nossos tertulianos.

Abraço aos dois,

Zé Saúde

Valdemar Silva disse...

José Saúde, tertúlia do sono??
Quer dizer que os presos e os pides adormeciam quando estavam todos juntos a conviver e a tratar de assuntos comuns e até se embebedavam?
Esta eu não sabia e até ponho em duvida.

Valdemar Queiroz

José Saúde disse...

Valdemar Queiroz, meu caro camarada

Apliquei o termo de tertúlia em sentido simbólico, ou seja, fictícias "assembleias" no interior de quatro paredes onde o opressor exercia domínio total sobre o oprimido. Sei o que foi, porque me fora dito, o quanto o homem sofria com tamanhos maus tratos. A intenção passava por "sacar" informação ao detido político.

Além do "sono" havia também a "estátua", por exemplo. Tive familiares próximos que passaram por essas situações nas masmorras do então Estado Novo.

Fica, como é óbvio, o teu oportuno reparo. Espero que a informação adicional sirva para o compreender a razão que me levou a utilizar a palavra "tertúlia" mas em sentido nefasto.

Abraço, camarada

Zé Saúde

Valdemar Silva disse...

Meu caro camarada Zé Saúde.
Não percebi o sentido simbólico da 'tertúlia', só faltava jogarem à sardinha.
Aliás, só podia ser, exatamente, 'tertúlia' no sentido irónico.
Desculpa não ter percebido.
Um abraço e saúde da boa
Valdemar Queiroz

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Tabanca Grande Luís Graça disse...

A "tortura do sono" é um dos métodos mais "civilizados", ao dispor das polícias políticas, para destruir um homem... Pode ser acompanhada ou não com espancamentos... O torturador não precisa de sujar as mãos com sangue... Baste-lhe ser paciente... LG

Anónimo disse...

E não foi isso que 'nós os Portugueses/Colonialistas/Fascistas/Ditadores/Opressores etc' fizemos aos 'coitados dos pretos/terroristas/colonizados/oprimidos, etc' ??

Então o mundo é assim, quem não quer sarilhos, não se mete neles. Oprimidos? quem?

Eu nos finais de 1966, já a uns dias de entrar em Mafra, fui passar uns dias a Espanha, passei a fronteira, mostrei os papeis, e lá fui. E depois voltei. Ninguém me bateu, nem fui para a cura do sono!

Há vários prismas de ver a mesma coisa, depende de que lado estamos, eu estou do lado certo.

As informações foram muito importantes no tempo do Estado legitimo, anterior ao 25A, só que a Policia Politica foi demasiado mole, e deu-se a desgraça que se deu. Se fosse uma Policia destas actuais, dos estados ditos 'democráticos/corruptos/de novos ditadores' nunca teríamos perdido o nosso Império, e agora andamos às esmolas dos outros, dos novos Colonizadores, ricos, a viverem daquilo que deixamos nas nossas Províncias Ultramarinas, ou ainda não se percebeu isso?

Isto é que é uma 'tortura do sono'!

Virgilio Teixeira,

(Em vésperas de mais um dia de descanso nacional, a bem do Golpe de Estado, e com tanta coisa para fazer a bem de todos)




Valdemar Silva disse...

Acabamos de conhecer a verdadeira história do cão que só tinha uma perna.
Coitado, quis mijar e caiu.

Valdemar Queiroz

Anónimo disse...

A PM foi um dos executores da repressão militar e não só.Metia-se em tudo e ultrapassava em muito os seus deveres,Cá e nas ex-províncias de então.Curioso que tenha mudado de agulha a seguir ao 25 de Abril e tenha continuado a sua repressão ao serviço das então forças democráticas.Até banhos de mangueira de água fria deu a civis no quartel de lanceiros na ajuda.
Já não vou falar de Angola em luanda, onde os fuzos os páras e os comandos tiveram que lhes dar correctivos muitos deles terminaram em batalhas campais com granadas e tudo,Até haver um general que criou as rondas mistas para acabar com a prepotência desta gente.E não digam que só só eu a escrever isto.Já o tenente Sá Nogueira se manifestou acerca dessa gente aqui no blogue.
C.Gaspar

Anónimo disse...

As verdades custam ler.

VTeixeira

Tabanca Grande Luís Graça disse...

José Saúde, obrigado pelo teu comentário que eu já deu a conhecer ao J. Sarmento, do Fundão Obrigado também pela tua sugestão de o convidar para integrar a nossa Tabanca Grande. Eu já sabia qualquer seria a resposta dele :

"Muito obrigado, camaradas, mas o tempo não volta para trás... E depois, os professores de filosofia, mesmo reformados, são chatos, e pior ainda, incómodos. Tenho as minhas cerejeiras para tratar. E os meus netos para ver crescer. As cerejeiras são árvores delicadas. E os meus netos são a maior riqueza que deixo, quando morrer. E não quero que eles passem o que eu passei. Quero para eles (e para os vossos netos) um país e um mundo muito melhor do que o país e o mundo em que eu nasci, vivi, penei e fui obrigado a fazer uma guerra. Por favor, não me peçam para voltar a falar desses tempos cruéis."

Zé, tenho pena mas tenho que respeitar a sua decisão. Não é o primeiro nem será o úkltimo que eu encontro e que ne diz, com amabilidade mas com firmeza: ' Por favor, não me peças para voltar ao 24 de Abril e à Guiné"...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Camaradas: este blogue é uma ponte, não é uma tribuna...É uma ponte sobre um rio. Os rios têm duas margens, esquerda e direita. Quem ficar só numa, não vê a "paisagem toda". Por isso é preciso atravessar o rio através da ponte. O blogue é um conviet para se atravessar a ponte. A ponte é segura, não cai. Pode-se ir à outra margem e voltar.

Por favor,usem a ponte mas não deem cabo dela. Já não tenho dinheiro, tempo e pachorra para construir outra.

Podemos discordar uns dos outros sem nos insultarmo-nos. Aqui não há "ismos"... Também não há delitos de opinião,felizmente vivemos hoje em liberdade, mas há opiniões extremadas, radicais, que podem ferir os sentimentos uns dos outros, a começar pelos nossos amigos guineenses.

Anónimo disse...

Citação indecente que retirei de um comentário atrás:

Acabamos de conhecer a verdadeira história do cão que só tinha uma perna.
Coitado, quis mijar e caiu.

Quem é o cão? Obrigado.

E, as pontes também caem, por exemplo a de Entre-os-Rios, e fez muitas dezenas de mortes.

Por favor, eu manifesto as minhas mais intimas convicções, não insulto ninguém, e não quero saber dos pensamentos dos outros.

Também não tenho muita pachorra para ler coisas que não me interessam, por isso passo à frente, que é o caminho.

Mas há pessoas que se julgam os donos da razão, e que este mundo, Portugal incluído e na linha da frente, é o Paraíso, mas só para alguns, corruptos que lançaram Portugal na miséria, mas 'uma miséria democrática'
Parece o que estou a ver na Venezuela....

O Blogue segundo me pareceu, é para juntar um Puzzle das experiências da nossa guerra na Guiné, mas pelo que vou vendo pouco ou nada se vê, comparado com coisas tão inúteis, como seja por exemplo, estas guerras de opiniões.

Luís, ontem estive a conversar com um amigo - daqueles do peito - que conheceu uma senhora, estes dias no Marco, que foi colega da 'Alice, que é casada com um grande poeta e que tem um blogue sobre a Guiné, diz que são boas pessoas e se encontram por vezes no Marco!.

Diste alguma coisa, ele não sabe o nome da outra senhora, lembrou-se de Armanda ou parecido!

Como ele disse, O Mundo é pequeno, e eu acrescentei, que a nossa Tabanca é grande...

Um bom dia de trabalho para todos os que ainda podem trabalhar, parece que não dá para ir aos supermercados comprar os nossos rebuçados.

VTEIXEIRA




Valdemar Silva disse...

Luis
Parabéns ao arquitecto, que bela e indestrutível Ponte é nossa Tabanca Grande.
'...A ponte é uma passagem prá outra margem. Desafio pairando sobre o rio,
a ponte é uma miragem...'
Mas, bolsonadas de apoio à tortura, mesmo que sejam macaquices de imitação, tenham paciência, vão dar a volta pra outra freguesia.

Ab.
Valdemar Queiroz

Anónimo disse...



O nosso ex-furriel miliciano, aqui algumas vezes assinado, já chamou- não sei a quem - de cão, macaco, o que falta agora?
É a ultima resposta a este senhor, que pelos vistos tem a sua 'panca' que não é igual à minha e não tenho mais paciência para ele.
VT/.











Anónimo disse...

Caro, Luís:

A tal amiga acima referida, chama-se então, 'Laura Fonseca'.

Mudando de assunto, hoje fui ao Porto, HSA - Dermatologia, que funciona no antigo CICAP - Centro de Instrução e Condução Auto do Porto, onde muitos dos nossos amigos 'Condutores' se formaram e foram para a guerra. Um deles parece-me que é o 'Dino', mas passaram por lá muitas centenas deles.
Acabada a consulta fui passear:
Depois em 3 horas a andar a pé, pela minha outrora cidade, hoje já minha desconhecida, com uma máquina de fotografias a pilhas, 'recordei' e passei para foto, alguns dos meus mais emblemáticos lugares por onde andei, na juventude e depois da tropa. Fiz 300 fotografias, só acabei porque as pilhas se esgotaram, já vi agora algumas delas que me fazem parecer mais velho do que sou. Isto apenas numa parte Ocidental e Central do Porto, e vou continuar, porque a minha cidade mudou muito, umas coisas para melhor, outras nem por isso. Ainda terei mais um milhar de fotos que quero passar para um novo álbum, ‘da minha vida na peluda’.
Tenho de ir ao centro nevrálgico, ribeira, porto e gaia, e a melhor parte ainda quase virgem, a zona Oriental, como era em Lisboa antes da Expo, Antas, Dragão, Fontainhas, Batalha, Campanhã, Heroísmo, o Museu militar onde funcionou antes a nossa PIDE, o cemitério ao lado de Ágremonte para onde, segundo dizem os velhos do Restelo, eram enterrados à noite, os mortos assassinados pelos torcionários da PIDE, Bonfim, Rio Tinto, Areosa, Amial, São Mamede, etc.
Este era o meu pequeno mundo, quando eu não pensava ainda, existirem fantasmas e pessoas diabólicas, tipo Hitler, Mao, Gengis Kan, Átila, Seku-Toré, Saddam, PolPot, Bogosora, Suarto, Idi Amin, Mussolini, Milosevic, Charles Taylor, Ceausescu, e outros pesadelos encabeçados pelo maior assassino em massa, da humanidade de todos os tempos, o carrasco Joseph Stalin. Salazar e seus seguidores serão uns Santos.
A minha pergunta era, se à semelhança de outros camaradas, poderíamos abrir uma nova 'Porta' para mandar as fotos da minha cidade, da minha vida, não é de outros países, das coisas que não nos dizem respeito, refiro-me mesmo, ao nosso querido Portugal.

Acabávamos então com as 700 fotos que faltam da guiné, que já deram o que tinham a dar, e poderíamos dar a conhecer ao mundo a minha cidade, e a de muitos, para aqueles que já não a conhecem, como eu não conheço.
À consideração do Editor do Blogue,

VTEIXEIRA.
Em, 2109-05-02