quarta-feira, 24 de abril de 2019

Guiné 61/74 - P19713: Fotos à procura de... uma legenda (115): os nossos aposentos "bunkerizados"... com "climatizadores de pesadelos"!


Foto nº 1 > Guiné > Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca) > Mansambo > CART 2339 (1968/69) > O alf mil at art Torcato Mendonça, ao centro, num dos abrigos subterrâneos do aquartelamento, onde as fotos das estrelas de cinema (,, "mulheres fatais" como Catherine Deneuve, por exemplo) ajudavam os jovens, nos seus verdes anos, a alimentar e a sublimar o ardente desejo... de viver (e sobreviver)!... Com Lisboa e o Porto, tão longe... e Bissau pelo meio, mas só para alguns privilegiados. Ah|, e ainda ficava longe, Mansambo, a 80 km, das garotas do Bataclã de Bafatá!... (*)

Foto (e legenda): © Torcato Mendonça (2006).  Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça  & Camaradas da Guiné]


Foto nº 2 > Guiné > Região de Gabu > Nova La,mego > CCS/BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) > O alf mil SAM Virgílio Teixeira escrevendo uma carta à namorada, a Manuela, sua futura esposa e mãe dos seus filhos (, vd. retrato em cima da mesa de cabeceira, à esquerda)  no seu quarto, cuja decoração era igual a tantas outras naquele tempo e lugar... A G3 ficava em cima, pendurada na parede, ou ao lado da cama. 

Foto (e legenda): ©  Virgílio Teixeira (2019).  Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça  & Camaradas da Guiné]


Foto nº 3 > Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > 3ª CART / BART 6520/72 (1972/74) > A estante do quarto (, de 3 x 2 m,) dos "Mórmones de Fulacunda": o Dino, o Omar, o Meira e o Lee. à esquerda e à direita, dois beliches (quatro camas). Foto do  álbum do José Claudino da Silva, ex-1.º cabo cond auto, 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74) (**)

Foto (e legenda): © José Claudino da Silva (2017). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Foto nº 4 > Guiné > Região de Tombali > Cufar > CCAÇ 4740 > 1973 > "Uma farra das NT"... O fotógrafo, o alf mil at inf Luís Mourato Oliveira,  é o segundo, a contar da esquerda para a direita

Foto (e legenda): © Luís Mourato Oliveira (2016). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


1. Qual a diferença entre as duas primeiras fotos de cima, tiradas a cerca de 140 quilómetros de distância uma da outra, mas sensivelmente na mesma época  (1968)? Mansambo ficava a sul de Bambadinca, a meio caminho, na estrada Bambadinca - Xitole - Saltinho (c. 60 km).  O "campo fortificado de Mansambo", como lhe chamava a "Maria Turra"... Foi construído de raiz, a pá e pica, pelos bravos "Viriato" da CART 2339.

Em geral, os alferes milicianos partilhavam um quarto a três, os furriéis a cinco ou seis, nas sedes de Batalhão (Bambadinca, por exemplo, onde só os oficiais superiores e os capitães tinham direito a "quarto privativo")... O "povo", esse, dormia a granel...

Nas unidades de quadrícula, uns viviam em "bunkers" (ou melhor, "bu...rakos"), em abrigos subterrâneos (caso de Mansambo). Mas a decoração não variava muito: fotos de "garotas", "pinups", modelos fotográficos, artistas de cinema, em poses mais ou menos ousadas, tanto quanto a moral e os bons costumes o permitiam nessa época... Eróticas q.b., mas não nunca pornográficas (sexo explícito)... 

A foto nº 3  tem já cinco/seis anos de diferença, bem mais próximas do fim da guerra, c. 1973/74... Já o puritanismo de Salazar & Cerejeira estava a passar à História...  É do quarto (partilhado) do nosso camarada José Claudino da Silva, um dos quatro "mórmones de Fulacunda"... Surpreendentemente, era um aposentotado, minúsculo (, d e 3 x 2 m),  austero, puritano,  com dois  beliche (4 camas ), e um espécie de móvel encostado à parede, a servir de mesa de cabeceira  e estante, e onde ao que parece, só entravam as fotos... das castas... namoradas dos "mórmones" (**).

A foto nº 4 faz parte de um conjunto a que o fotógrafo chamou "farra das NT",   muito reveladores do universo concentracionário em que se vivia na Guiné, nos aquartelamentos e destacamentos das NT. "É a caserna na sua intimidade"...

A  CCAÇ 4740, era constituída por pessoal açoriano.  Centena e meia de homens, machos, na flor da idade, cheios de testosterona, partilhavam espaços reduzidos, geralmente sob a forma de toscos "bunkers", semi-enterrados, construídos de troncos de palmeira, chapa, bidões, terra e argamassa, e onde coabitavam com os bichos (mosquitos e demais insector, roedores, répteis) e a atmosfera era muitas vezes irrespirável, devido à multiciplicidade de cheiros,  à humidade, ao calor, à semi-obscuridade, à sujidade, ao pó ou à lama (conforme a estação do ano: época das chuvas ou época seca)... Noutros casos, eram verdadeiros "armazéns de depósito de material humano", com cobertura de chapa de zinco, onde era quase impossível permanecer durante o dia, devido à temperatura e humidade tropicais...

A ventoinha  era um luxo, só para alguns, e só durante escassas horas da noite, quando se ligava o gerador... Nestas "casernas do mato", os homens viviam, conviviam, comiam e dormiam quase sempre em tronco nu, de calções e chanatas.. O álcool, o tabaco e as cantorias, além das jogatanas de cartas, eram dos poucos escapes que a malta tinha nas "horas vagas"... Os dias sucediam-se aos dias, perdia-se a noção do tempo... Deixa-se crescer o bigode, contra os regulamentos, para se parecer mais bravo e macho.

No meio de toda esta promiscuidade, salvava-se a amizade, a solidariedade, a camaradagem... E cada companhia que chegava procurava melhorar, para si e para os vindouros, as condições de vida que encontrava... Se a guerra tivesse durado 100 anos, como alguns queriam, estou ciente que em Cufar já haveria hoje painéis solares, ar condicionado,   bar aberto e umas "ervas"... (E claro, militares de ambos os sexos, se bem que em aposentos separados; no nosso tempo, as únicas camaradas que tínhamos eram as enfermeiras paraquedistas, que causavam sempre algum alvoroço sempre que  vinham a "terra", isto é, à sede de algum batalhão, presenciei isso em Bambadinca...).

Temos, no nosso blogue, uma série sobre "Os Bu...rakos em que vivemos" que pode ser revisitada e que queremos retomar... Na realidade, não eram "bunkers" de cimento armado à prova de canhão s/r ou morteiro 120 (com raras exceções, como era o caso de Gandembel e de Guileje), mas verdadeiros "bu...rakos" a que  chamávamos pomposamente... "abrigos"... De Cafal Balanta a Mato Cão, de Mampatá a Banjara, da Ponte do rio Udunduma a Ponte Caium, de Sare Banda a Missirá, de Madina do Boé a Copá..., a Guiné era, toda ela, uma terra "es...bu...ra...ka...da". 

Os "posters" / cartazes / capas de revistas com "meninas" mais ou menos "despidas" ajudavam-nos, ao menos,  a "climatizar" os nossos pesadelos (***)..

Vá lá, caros/as leitores/as, arranjem as vossas legendas para estas fotos... dos nossos verdes anos, passados lá na Guiné, quando ela ainda era "verde e rubra. Tínhamos, muitos de nós, "aposentos bunkerizados", daí o necessário  recurso aos "climatizadores de pesadelos" (****)... LG
_________________


9 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Espero não ofender o pudor das nossas queridas camaradas enfermeiras paraquedistas... mas a verdade é que, sempre que elas vinham a "terra", aterravam num aquartelamento, sede de batalhão, acabavam por provocar, involuntariamente, algum alvoroço... Havia tropa que não via uma "mulher branca" há muitos meses...

Estou a vê-las, de T-shirt branca, botas de lona e calça camuflada, a serem recebidas, na pista, com todos os salamaleques, pelos senhores oficiais superiores (tenente-coronel, major...), verdadeiros oficiais e cavalheiros, e encaminhadas delicadamente até ao bar, para se "refrescarem"...

A atitude nã seria a mesma se, em vez delas, fossem "eles", enfermeiros paraquedistas... Afinal, o "género" faz diferença, tanto na guerra como na paz... LG

Tabanca Grande Luís Graça disse...

O "Dino" nunca nos explicou porque é que ele e os seus cmaaradas de quarto se intitulavam os "mórmones de Fulacunda"!... Que raio de nome, sem ofensa para os "mórmones"!... LG

Tabanca Grande Luís Graça disse...

O Torcato Mendonça tem aqui, no nosso blogue, um dos mais fabulosos álbuns fotográficos... É pena que os postes sejam já muito antigos... E que ele ande tão calado, há anos... Ele e muitos outros dos nossos camaradas séniores... os da primeira hora do blogue. A guerra cansa e o blogue ainda mais...LG

Anónimo disse...

Em relação aos nossos aposentos, posso mostrar umas dezenas de fotos deles. Esta aqui representada, é uma delas, não a minha eleita.
Os aposentos para uma dúzia de alferes milicianos, em S. Domingos, eram todos num mesmo quarto, a antiga maternidade daquela vila. Havia um WC, sanita â caçador, um bidão de água, uma lata de fruta vazia para fazer de chuveiro, e está tudo. Quando enchia com todo o pessoal, era mais complicado, mas havia o essencial, Quem quis arranjou uma mesinha de cabeceira, e um armário ferrugento. A ornamentação era, julgo eu, igual à de todos, sargentos e praças incluídos, pois conhecia aquilo tudo.
A arma, ora estava por cima da cabeceira, ora pendurada na cama. Tinha um candeeiro pequenino com mola para segurar no ferro, e ventoinhas, cheguei a ter 3 a trabalhar ao mesmo tempo, quando havia energia claro.
Em Nova Lamego, os quartos eram mais pequenos, para 2 3 gajos, nem me lembram as instalações sanitárias.
Em todos os sítios, nunca estive num abrigo, tinha claustrofobia talvez,

por isso nem nas alturas de ataques, a única coisa que fiz um dia, foi descair para debaixo da cama, mas por pouco tempo, achava aquilo ridículo.
As únicas vezes que estive em abrigos e trincheiras, foi para tirar fotos, nada mais.

A foto 1 parece perfeita, a nº 4 lá está a aguardente Antiqua, a melhor para mim é a do Dino, a nº 3, aquele móvel parece um 'altar'.

Fico por aqui, neste dia chato sem nada para fazer ou ver.

Virgilio Teixeira

Em Vila do Conde, Portugal,

Dia, 25Abr2019


Anónimo disse...

Luís, o pessoal já não comenta nada, nem sei se ainda vou lendo alguma coisa, mas está a ficar feio, não sei se valerá a pena Postar mais!

Com pena claro, e as minhas mais de 700 fotos e relatos que tinha para serem vistos pelos nosso ainda vivos camaradas?


Só algumas estórias vão dando para alguns debates 'tecnico-politicos-filosoficos-sociais' e outros mais.

Ab, Virgilio

Anónimo disse...

Luis, como já tinha dito, o melhor é não se publicar mais fotos do meu Álbum, isto está a levar um andamento que não me está a agradar nada.
Vão publicando o inesgotável álbum de fotos actuais das ruas e estátua por essa Europa fora.
Devem ter muitos seguidores, nos antigos combatentes da II guerra mundial, não os portugueses porque não estiveram lá.

Virgilio

Anónimo disse...



E já agora não compreendo o 'sentido' das observações feitas pelo Sr. José Camara, não admito fazer aqui comparações de assuntos sérios com cartazes de prostitutas de luxo espalhadas pelas paredes das casernas, isto não é para aqui chamado, é preciso ter bom senso...». Faço-me entender.
Realmente para isto, o melhor é não comentar nada, fica-lhe melhor.

Essa conversa pode tê-la com os nossos camionistas de longo curso, com o devido respeito e consideração que me merecem, alguns claro.

Sem mais, acabou-se a conversa, não tenho pachorra para isto, e não o conheço de parte nenhuma...

Insisto com o Luis para 'limpar' as fotos e este tipo de comentários indesejáveis, basta!

Sem cumprimentos,

Virgilio Teixeira

Carlos Vinhal disse...

A pedido do nosso camarada, e meu particular amigo, José da Câmara, retirei o seu comentário, considerado ofensivo pelo visado, o outro nosso camarada Virgílio Teixeira. Uma vez que o comentário "ofensivo" não existe mais, também removi o pedido de desculpas feito pelo José.
Carlos Vinhal
Coeditor

Anónimo disse...

O meu problema é não ter assim, 'camaradas e particulares amigos' e assim estou só nesta Magnifica Tabanca Grande.

Só hoje li isto, depois de sair da primeira página, já não procuro mais nada.

VT.