Foto do 1.º Cabo Henrique Manuel da Conceição Joaquim
In: "Os eternos esquecidos". Almada, Trafaria, Junta da Freguesia da Trafariam, 2009. p.127
Jorge Alves Araújo, ex-Fur Mil Op Esp/Ranger, CART 3494 (Xime-Mansambo, 1972/1974);
coeditor do blogue desde março de 2018
ENSAIO SOBRE AS MORTES POR AFOGAMENTO DE MILITARES DO EXÉRCITO DURANTE A GUERRA NO CTIG (1963-1974) - ACTUALIZAÇÃO
O CASO DO 1.º CABO HENRIQUE MANUEL DA CONCEIÇÃO JOAQUIM, DO BENG 447, AFOGADO EM 31JUL1974 NA ILHA DA CARAVELA
(CORPO NÃO RECUPERADO)
1. INTRODUÇÃO
No âmbito do projecto de investigação titulado de "ensaio" sobre o número de militares do Exército que morreram afogados nos diferentes planos de água existentes na Guiné, durante o conflito armado (1963-1974) (*), deixei expresso no primeiro fragmento – P11979 – que os resultados entretanto apurados, através da consulta a fontes oficiais, poderiam vir a ser alterados em função de outros casos particulares, "estranhos" ou "não considerados" no domínio institucional.
Cabe neste cenário a situação do 1.º Cabo Henrique Manuel da Conceição Joaquim, militar pertencente ao Batalhão de Engenharia [447], sedeado em Bissau, com a especialidade de Pedreiro, que viria a morrer afogado em 31 de Julho de 1974, 4.ª feira, na Ilha da Caravela, Arquipélago dos Bijagós, cujo corpo não foi recuperado.
Como este episódio ocorreu no CTIG, ainda que depois do "25Abr74", no período de retracção das nossas Unidades no terreno, porque não consta a morte (por afogamento) do camarada Henrique Manuel Joaquim no número de baixas oficiais do Exército?
O que terá acontecido?
Entretanto, a informação que abaixo de reproduz, e que serviu para estruturar a presente narrativa, faz parte do livro editado, em Setembro de 2009, pela Junta de Freguesia da Trafaria, pertencente ao Município de Almada, no qual constam pequenas biografias de militares, nascidos ou residentes naquela Freguesia, que estiveram nos diferentes "Teatros de Operações", como é o exemplo do camarada Henrique Manuel Joaquim.
Esta colectânea nasceu, como sucedeu noutros contextos, da conversa informal entre camaradas, ex-combatentes, onde vieram à "baila" histórias vividas por cada um, nas ex-Províncias Ultramarinas onde efectuaram o respectivo serviço militar.
No caso em análise, foi eleita uma Comissão, constituída por: Alfredo Pisco (CCaç 2321; Moçambique); António Oliveira Bentes (1946-2007 - CCav (?); Guiné): Euclides Soares (BA 12; Guiné); Ezequiel Pais (CArt 2521; Guiné); Ilídio Pinheiro (CArt 698; Angola - pesquisa e análise); João Freitas (BCP 31; Moçambique - coordenação gráfica); José Manuel Martins (AgEng; Moçambique) e Manuel Fernandes (PInt 2161; Angola).
Dessa conversa inicial e informal "começou a nascer a ideia, ainda que sem consistência, de fazer algo para homenagear todos esses bravos militares, apenas lembrados por familiares e amigos, (e eternamente esquecidos por todos os governantes) alguns dos quais, infelizmente, desaparecidos nessas terras longínquas. Ao fim de muito trabalho e muitas pesquisas, foi-nos possível reunir todos os dados para começarmos a pensar na possibilidade de compor um livro".
Este livro, publicado em Setembro de 2009 [, imagem da capa a seguir], "é uma homenagem a todos os militares falecidos em combate, e os que felizmente ainda vivem, nascidos ou a habitar na Trafaria há mais de dez anos" [na data em que a ideia foi aprovada].
Quem tiver conhecimento deste triste episódio, faça o favor de comunicar. Obrigado!
Capa do livro, editado em Setembro de 2009, pela Junta de Freguesia da Trafaria, pertencente ao Município de Almada. Referência bibliográfica na PorBase: Os eternos esquecidos / comis. Alfredo Pisco... [et al.] ; colab. Câmara Municipal de Almada... [et al.]. - [Trafaria : s.n.], 2009 ([Charneca da Caparica] : Jorge Fernandes). - 173, [3] p. : il. ; 30 cm
Imagem de satélite do Arquipélago dos Bijagós, com a situação geográfica da Ilha da Caravela e Bissau, e da sua relação entre si.
2. OS DADOS DO "ENSAIO" ACTUALIZADOS (*)
- QUADROS ESTATÍSTICOS
Em função da alteração dos resultados anteriormente divulgados, organizados em quadros de distribuição de frequências, simples e acumuladas, tomei a iniciativa de os corrigir, apresentando, de imediato, a respectiva actualização [gráficos e quadros], levando em consideração os objectivos que cada contexto encerra.
Quadro 1 e Gráfico 1 – Da análise supra, verifica-se que o número total de militares do Exército que morreram por afogamento no CTIG (1963-1974), e que constituíram a população deste estudo, é de 145. Verifica-se, ainda, que desse total, 113 (77.9%) eram soldados; 23 (15.9%) 1.ºs cabos; 7 (4.8%) furriéis; 1 (0.7%) 2.º sargento e 1 (0.7%) major.
Quadro 2 e Gráfico 2 – Da análise supra, verifica-se que o número total de militares do Exército que morreram por afogamento no CTIG (1963-1974) cujos corpos não foram recuperados é de 64 (44.1%). Verifica-se, também, que desse total, 48 (75.0%) eram soldados; 11 (17.2%) 1.ºs cabos; 4 (6.2%) furriéis e 1 (1.6%) 2.º sargento.
Quadro 3 e Gráfico 3 – Da análise supra, verifica-se que o número total de militares do Exército que morreram por afogamento no CTIG (1963-1974) cujos corpos não foram recuperados é de 64 (44.1% do total). Quanto aos corpos não recuperados, verifica-se que a CCaç 1790, com 26 (40.6%) casos, e a CCaç 2405, com 19 (29.7%) casos, foram as Unidades Militares que contabilizaram maior número, sendo estes consequência do acidente da «Jangada de Ché-Che» em que elementos das duas Companhias de Caçadores estiveram envolvidos. Segue-se o Pel Mort 980, com 3 corpos não recuperados, no Rio Cacheu, na «Operação Panóplia", e a CArt 3494, com dois, no Rio Geba (Xime), durante uma missão, não cumprida, a Mato Cão, situado na margem direita desse rio. Das 17 Unidades Militares que não conseguiram recuperar os corpos dos seus naufragados, 12 (18.8%) tiveram apenas um caso.
Quadro 4 e Gráfico 4 – Distribuição de frequências segundo a relação entre as variáveis "ano das mortes por afogamento", "corpos não recuperados" e "corpos recuperados". O estudo mostra que durante o período em análise (1963-1974) em todos os anos ocorreram mortes por afogamento. No final foram contabilizados cento e quarenta e cinco náufragos. Durante os doze anos em que decorreu o conflito, por quatro vezes (1/3) o número de mortes ultrapassou a dezena de casos, com destaque para o ano de 1969, onde os números ultrapassaram a meia centena, em consequência do «desastre da Jangada do Ché-Ché». Para esses valores globais muito contribuíram os "acidentes" nos rios da Guiné - Cacheu, Corubal e Geba.
Nota:
Para efeitos de comparação estatística devem ser consultados os P19679; P19710; P19788 e P19822 (*).
Termino, agradecendo a atenção dispensada.
Com um forte abraço de amizade e votos de muita saúde.
Jorge Araújo.
05Jul2019.
___________
Nota do editor:
(*) Vd. poste de 24 de maio de 2019 > Guiné 61/74 - P19822: Jorge Araújo: Ensaio sobre as mortes por afogamento no CTIG: Os três acidentes na hidrografia guineense (IV e última Parte)
Vd. postes anteriores:
23 de abril de 2019 > Guiné 671/74 - P19710: Jorge Araújo: Ensaio sobre as mortes por afogamento no CTIG: Parte II - Os três acidentes na hidrografia guineense
14 de abril de 2019 > Guiné 671/74 - P19679: Jorge Araújo: Ensaio sobre as mortes por afogamento no CTIG: Parte I - Corpos 'recuperados' e 'não recuperados'
14 de abril de 2019 > Guiné 671/74 - P19679: Jorge Araújo: Ensaio sobre as mortes por afogamento no CTIG: Parte I - Corpos 'recuperados' e 'não recuperados'
5 comentários:
Infelizmente o Estado que nasceu após o 25A74, simplesmente esqueceu os seus militares.
Isto é que é incrível...
Grande trabalho do camarada Jorge Araújo.
Os meus parabéns.
Virgilio Teixeira
Mário Miguéis
15 jul 2019 22:34
Por coincidência, hoje mesmo estive a falar com o José Sargaço, ex-1.º cabo operador cripto da CCAÇ 2701 (Saltinho), a propósito de uma fotografia por ele afixada no Solar do Marquês, em Cantanhede, onde, no mês passado, decorreu o último convívio da Companhia. Na foto, que vou remeter a/c do Vinhal, para eventual publicação, estão presentes três 1.ºs cabos da CCAÇ 2701, a bordo do navio que os levou à Guiné em Maio/70: José Simão,José Sargaço e Manuel Andrade. Este último é precisamente o morto por afogamento no R. Corubal em 09/08/70.
Um abraço,
Mário Migueis
Jorge:
Para já, o meu/nosso muito obrigado por este inventário, doloroso mas precioso, tratando-se de camaradas mortos, por afogamento, no CTIG...
Mas, se eu bem li os teus postes (, pelo menos fui que, contigo, os editei, ainda não és totalmente autónomo para o fazer à distância...), há mais um caso omisso: o sold at cav, José Henriques Mateus (1944-1966), que pertenceu à CCAV 1484 (Nhacra e Catió, 1965/67), e que desapareceu em combate em 10/9/1966, no rio Tompar, afluente do rio Cumbijã, no decurso da Op Pirilamp, no setor de Catió, região de Tombali... Estive há tempos, na sua terra, Areia Branca, Lourinhã, justamente a participar numa homenagem póstuma à sua memória... Houve camaradas da sua companhia que chegaram a ponderar a hipótese de ele não ter morrido, mas antes ter sidoo feito prisioneiro pelo PAIGC... A verdade é que o corpo nunca foi encontrado.
Dá aqui um vista de olhos a este poste:
12 DE MAIO DE 2014
Guiné 63/74 - P13129: In Memoriam (189): José Henriques Mateus (1944-1966): uma singela e tocante homenagem das gentes da sua terra, Areia Branca, Lourinhã, na manhã de domingo, 11 de maio... Um exemplo a ser seguido por outras terras deste país.
O José Henriques Mateus tem cerca de duas dezenas de referências no nosso blogue:
https://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/2014/05/guine-6374-p13129-in-memoriam-189-jose.html
Caro Luís,
Bom dia.
Antes de mais agradeço estas tuas informações, as quais considero de elevada importância para este meu/nosso estudo. Aliás, sempre o considerei (e considero!) incompleto, daí o ter baptizado de "ensaio". Nesse sentido, lancei um apelo aos camaradas para me fazerem chegar novos elementos, como este, de modo a identificar os casos "omissos" ou "não identificados" nos documentos oficiais.
Nos postes já publicados, a fonte que utilizei foi o livro da CECA; 8.º Volume, Mortos em Campanha, Tomo II, Livro 1, e, após uma rápida consulta que agora fiz, confirmei que o nome do camarada José Henrique Mateus, da CCav 1484, não consta na p 208, local onde deveria estar em função da data do seu óbito (10.09.1966).
Porém, no P2821 é referido, na Cópia do Ofício do Arquivo Geral do Exército nº 112/STAG, Proc.6.2, de 23 de Maio de 2007, que o José Henriques Mateus foi "dado como morto em combate". De facto, assim fica mais difícil a nossa missão.
Vou ver se consigo "descobrir" algo de novo. Se sim, darei notícias logo que as tenha.
Quanto aos "corpos não recuperados em combate" é um tema diferente dos "afogados não recuperados", em função da taxonomia estabelecida para as diferentes "causas".
Em relação ao primeiro grupo, tenho em cima da mesa alguns exemplos que darei conta oportunamente.
Talvez te faça chegar, ainda hoje, um desses casos investigado, este relacionado com a morte do Capitão Pilav João Cardoso de Carvalho Rebelo Valente, cujo corpo não foi recuperado (?).
Segue um abraço colectivo para o Fórum, com votos de boa semana.
Jorge Araújo.
Jorge Araújo
Mais uma excelente pesquisa.
Sabemos que todo o território da Guiné era considerado palco de guerra, como tal qualquer militar que por lá morresse era considerado morto em combate e é assim que o seu nome aparece em monumentos (memoriais) erigidos em muitos locais por todo o País.
Evidentemente, nem todas as mortes foram em combate, p.ex. desastres e doenças não relacionados, propriamente, com acções de combate, mas as mortes e desaparecidos por afogamento são difíceis de 'especificar'.
No 'Monumento aos Mortos na Guerra do Ultramar' erigido na zona de Belém, em Lisboa, inaugurado em 15-01-1994, estão lá todos dolorosa e infelizmente lembrados.
Todos morreram na guerra.
Valdemar Queiroz
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