quarta-feira, 10 de agosto de 2022

Guiné 61/74 - P23512: Notas de leitura (1473): Eduardo Lourenço (1923-2020): afinal, quem são os portugueses, e o que significa ser português? (José Belo, Suécia)


Eduardo Lourenço (Almeida, 1923 - Lisboa, 2020).
Foto da Agência Lusa (2020). 
Cortesia de Wikimedia Commons


1. Mensagens do José Belo:

(1) Data - 6 ago 2022 11:31
Assunto - Talvez o menos estrangeirado

Caro Luís

O nosso Eduardo Lourenço soube, talvez melhor,  que muitos intelectuais contemporâneos, pôr o dedo na ferida quanto aos nossos grandiosos mitos lado a lado com profundos complexos.

Vou enviar-te um texto resultante de leitura muito atenta a alguns ensaios do mesmo

PS - Espero sinceramente que quanto às saúdes todos nós continuemos sem estar... ”piorzinhos”!

Um abraço, JBelo

(ii) Data - 6 ago 2022, 12h39

Assunto - Estrangeirados

Francamente que não sei se o tema, e texto, terá cabimento (ou interesse) para os seguidores do blogue. Os parâmetros são distintos.

A ser publicado fico grato se indicares uma data aproximada que possa permitir um debate… caso este venha a surgir.

A fins deste mês volto para Key West e, por lá,  os meus tempos dedicados à “com-puta-gem” perdem prioridade frente ao Sloppy Joe’s Bar.

Um abraço com votos, para ti e família, de Boas Férias! JBelo

 

"Lisboa é o sítio ideal para acreditar que as Caravelas continuam a existir" (Eduardo Lourenço). Foto: José Belo (2022).

2. Eduardo Lourenço:  “As palavras que definem uma Nação “ (*)

Um dos maiores intelectuais portugueses contemporâneos que, e segundo as suas palavras… ”se afastou do País para respirar liberdade”. (**)

Nascido na pequena aldeia de São Pedro do Rio Seco, passou longo período da sua vida no estrangeiro. 
Primeiro como professor na Alemanha e, posteriormente, como professor nas universidades francesas de Grenoble e Nice.

Regressou a Portugal no período final da sua vida.

O jornal “Le Monde” descreveu-o como um intelectual liberto da rigidez política das ideologias,  que soube sempre seguir o seu próprio caminho.

As suas obras mais conhecidas foram escritas nos anos setenta, antes, durante e depois da “revolução dos cravos“: Tempo e Poesia (1974); O Labirinto da Saudade (1978). Obras que o tornaram conhecido fora dos círculos literários e académicos.

Importante parte dos seus ensaios foram dedicados a Luís de Camões e a Fernando Pessoa.

No “Labirinto da Saudade“ afirma que a literatura histórica portuguesa se pode ler como uma busca de resposta às perguntas:
  • Quem são os portugueses?
  • O que significa ser-se português?
Com início em Camões, Eduardo Lourenço identifica todo um irrealismo que engloba o espírito português. Uma mistura de grandiosidades lado a lado com profundo complexo de inferioridade.

Segundo ele, a imagem histórica de Portugal não é resultante de observações baseadas em realidades. Resulta antes de sonhos político-ideológicos criados por uma minoria urbana, como referido pelo realismo de Eça de Queiroz. Uma aristocracia (e burguesia) endinheirada sempre com o pé no estribo do "Sud-Express", arrastando-se para uma Europa onde se produz a verdadeira cultura e o conhecimento.

A existência de um mítico “povo simples” torna o diálogo literário entre estes polos opostos num… monólogo literário limitativo.

É neste espaço (ou contradição) entre a “falta” e o “regresso” que, segundo ele, surge a palavra “saudade”.

Afirma também que, em Portugal, tanto o neo-realismo como o comunismo (verdadeiros polos opostos à ditadura do Estado Novo tanto nas artes como na política) se dedicaram ao mesmo tipo de “mitologia” no modo como integraram na sua visão mundial os mesmos clichês quanto ao “Povo simples”, em tudo semelhantes aos usados por intelectuais da Direita. Mitos que serviram, e servem, como conveniente “manta de cobertura “ sobre um tipo de fragilidade histórica.

Com Salazar, o patriotismo jacobino dos convulsionados 16 anos da Primeira República, transformou-se em nacionalismo exaltado. O Estado Novo, com o seu aparelho de propaganda desde a escola aos meios de comunicação, cria uma verdadeira “Disneylândia” de portugalidades feita.

Como poderá a cultura de um pequeno país, isolado num extremo europeu, manter a sua originalidade, usar de um pensamento crítico quando a análises do passado, manter vivas as suas tradições ao mesmo tempo que se abre perante o mundo?

Segundo Eduardo Lourenço é fundamental para Portugal... ser europeu!

Um abraço do JBelo

Adenda - Talvez o menos… estrangeirado!

Abandona o país em 1953, mas recusa a condição de exilado. É apenas emigrado.

“Como é que um homem nascido em São Pedro do Rio Seco, pode ser outra coisa que não português?” Não aceita ser estrangeirado:” Não, não aceito!... Fico furioso. Fico desesperado.”

O seu método é o “de olhar de dentro mesmo estando fora”. No "Labirinto da Saudade" escreve:

“Pensar Portugal como vontade e como comunidade plural de destinos e valores, pondo em diálogo os mitos e a razão e… procurando afastar a maldição do atraso.”

“…é a hora de fugir para dentro de casa, de nos barricarmos dentro dela, de construir com constância o país habitável de todos, sem esperar de um eterno lá-fora ou lá longe a solução que, como no apólogo célebre, está enterrada no nosso exíguo quintal.

Não estamos sós no mundo, nunca o estivemos. A conversão cultural necessária passa por um olhar crítico sobre o que somos e o que fazemos.”

PS - E como Eduardo Lourenço escreveu: "Lisboa é sítio ideal para acreditar que as Caravelas continuam a existir"



José Belo, jurista, o nosso camarada luso-sueco, cidadão do mundo, membro da Tabanca Grande:

(i) tem repartido a sua vida agora entre a Lapónia (sueca), Estocolmo e os EUA (Key West, Florida); 

(ii) foi nomeado por nós régulo (vitalício) da Tabanca da Lapónia, recusando-se a jubilar-se do cargo: afinal todos os anos pela primavera, corre o boato de que a Tabanca da Lapónia morre para logo a seguir ressuscitar, como a Fénix Renascida; 

(iii) na outra vida, foi alf mil inf, CCAÇ 2391, "Os Maiorais", Ingoré, Buba, Aldeia Formosa, Mampatá e Empada, 1968/70); 

(iv) é cap inf ref (mas poderia e deveria ser coronel, se ele tivesse tratado da papelada a tempo) do exército português; 

(v) durante anos alimentou, no nosso blogue, a série "Da Suécia com Saudade"; 

(vi) tem 226 referências no nosso blogue.
 ___________

Notas do editor:

(*) Último poste da série > 8 de agosto de 2022 > Guiné 61/74 - P23506: Notas de leitura (1472): "Histórias da C. CAÇ. 2533" - Os belos testemunhos da gentes da CCAÇ 2533 (1) (Mário Beja Santos)

(**) Vd. também postes de:

2 de dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21604: Manuscrito(s) (Luís Graça) (195): In Memoriam: Eduardo Lourenço (1923-2020), pensador maior da nossa história, da nossa cultura, da nossa identidade como povo

17 de agosto de 2015 > Guiné 63/74 - P15013: Notas de leitura (748): “Do Colonialismo como Nosso Impensado", Organização e Prefácio de Margarida Calafate Ribeiro e Roberto Vecchi, Gradiva Publicações, 2014 (Mário Beja Santos)

21 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

O que é ser português ? Boa pergunto... Pergunta que os portugueses "cá de dentro" não fazem nem sequer sabem responder... É preciso ir para fora, para o "estrangeiro", para ganhar a suficiente distância e sentor a tal "saudade"... Veja-se esta reflexão de Telma Pinguelo.
__________

Crónicas Portugal Toronto > Revista Amar, Junho 9, 2021 > O que é ser português?

por Telma Pinguelo

https://revistamar.com/mundo/portugal/o-que-e-ser-portugues/

(Com a devida v+enia... Fixação de texto / negritos: LG)

O que é ser português? É a pergunta que volta e meia paira no ar e tema que ouvi ser inúmeras vezes debatido durante os anos em que tenho convivido com a comunidade lusa em Toronto.

Os nossos clubes e associaçōes têm de momento em mãos a difícil tarefa de passar as suas casas, tão árduamente construídas, para as mãos das novas geraçōes. É difícil porque os modelos de organização e também muitas tradiçōes que alegravam os nossos pais e avós estão a cair em desuso e já não cativam os jovens. Independentemente do que agrada a uns e a outros, o certo é que, seja qual for a idade ou situação, todos partilhamos do mesmo sentimento: amamos ser portugueses. Se há tantas diferenças de como celebramos, do que gostamos e do futuro que envisionamos… o que é, afinal, esta coisa de ser português?

Se pergunto ao condutor do Uber que me leva a casa, ele diz “portuguese chicken”, os meus colegas dizem “Cristiano Ronaldo”, num encontro de amigos falam-me das “férias com paisagens lindas, deliciosa comida e ainda melhores bebidas”, nos eventos fala-se de “fado” e nos jantares vem sempre à conversa o famoso pastel de nata, aqui batizado “portuguese custard tart”.

Mas então é isto? Será que ser português se resume a frango de churrasco, futebol, turismo, música, vinhos e bolos? Tenho a certeza de que existe muito além das belezas, sabores e conquistas deste nosso país plantado à beira-mar. O que mais faz de nós portugueses? A língua, o território, o passaporte?

O povo português nunca teve, nem tem, problemas de identidade. Ainda que a resposta não esteja na ponta da língua, não é por isso que ela deixa de existir. Antes pelo contrário. Esta é uma daquelas situaçōes em que andamos à procura das chaves pela casa toda e depois damos conta que afinal estiveram sempre no bolso do casaco que temos vestido. É o que eu vejo acontecer com esta pergunta. Esquecemo-nos de olhar para dentro.

Eu digo que ser português está naquilo que não se saboreia, não se vê nem se toca. A portugalidade está no nosso caráter. O etnólogo português Jorge Dias publicou na década de 50 um livro chamado “Os Elementos Fundamentais da Cultura Portuguesa”, no qual faz um resumo daquilo que seria a nossa personalidade geral. Jorge Dias diz que o português é “ao mesmo tempo sonhador e homem de ação” ou seja, “um sonhador ativo que mantém sempre um olhar realista sobre os seus objetivos”. Ele continua, defende que “o portugués é humano e sensível, amoroso e bondoso, contudo, sem ser fraco. Não gosta de fazer sofrer e evita conflitos, mas quando ferido no seu orgulho pode ser violento e cruel. Tem um grande sentido de fé e tem uma ligação muito forte com a sua natureza e herança. É individualista, mas tem uma forte solidariedade humana. Tem espírito crítico e trocista e uma ironia pungente”.

Pegando nas palavras de Jorge Dias, eu acrescento: o português traz na alma a inspiração de Luís Vaz de Camōes, a ousadia de Bocage, a inquietude de Saramago, leva no peito a libertação da Revolução dos Cravos, a coragem dos navegadores dos Descobrimentos e pratica diariamente o verso de Fernando Pessoa “tudo vale a pena quando a alma não é pequena”.

(Continua)

Tabanca Grande Luís Graça disse...


Crónicas Portugal Toronto > Revista Amar, Junho 9, 2021 > O que é ser português?

por Telma Pinguelo

https://revistamar.com/mundo/portugal/o-que-e-ser-portugues/

(Com a devida v+enia... Fixação de texto / negritos: LG)

(Continuação)

Mesmo com a globalização e os crescentes fluxos migratórios, os portugueses espalhados pelo mundo continuam a manter a essência da sua identidade. A verdadeira portugalidade acontece nos empregos em que somos conhecidos como um povo trabalhador, nos nossos círculos sociais em que somos calorosos e acolhedores, acontece em cada uma das nossas mesas em que há sempre espaço para mais uma pessoa.

Ser português é falar de uma História que não é perfeita, mas que nos tornou no que somos hoje. Somos lutadores, resilientes, somos um povo guerreiro, endurecido pelas batalhas travadas ao longo dos tempos e sofrido com a tão nossa saudade. O encanto é que embrulhamos tudo isso com a também muito nossa bondade, hospitalidade e fé.

Sim, há algo em ser português que é especial. É a nossa vocação de “estar no mundo como em casa”, assim o diz muito bem o autor Jorge Dias. Feliz Dia de Portugal!

Telma Pinguelo

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Joseph, era uma bela
pergunta para um inquérito por questionário "on line", por email, aos membros, ainda vivos, da nossa Tabanca Grande...

Eu é que não tenho tempo para pegar nesse projeto... Temos a lista de emails do pessoal.. Pode ser que haja um voluntário. Ab, Luis



Tabanca Grande Luís Graça disse...

Pergunta: "Amigo, camarada, o que é para ti, hoje, ser português? "

Anónimo disse...

Joseph Belo (by email)
Data - 10 ago 2022 09:22
Assunto - Ainda o ser-se português.para mim

Uma muitíssimo interessante leitura de livro agora publicado em inglês:”History of Water”. Escrito por Edward Wilson-Lee e publicado por William Collins.

Integra a epopeia dos descobrimentos nas origens da actual globalização dando especial destaque à vida,viagens,e não menos contactos pessoais, de Damiao de Góis com inúmeras personalidades tanto europeias como mundiais.(Até se sentou à mesa com Martin Luther.)

Vida riquíssima em acontecimentos que, obviamente, lá teve a Inquisição à espera nos últimos anos.

O livro custa cerca de 28 euros e pode ser comprado na *guardianbookshop.com*
com preço de portagem.

E mais uma vez cabe a um estrangeiro abrir uma profunda janela sobre importantíssima figura da cultura nacional.

Um abraço, JBelo

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Todos os povos são como a lua: têm um lado "diurno" e "nocturno", são claro-escuros... Não há retratos a preto e branco... Por exemplo, o que pensam (e sentem) os outros nórdicos em relação ao "Big Brother" sueco ? Os bascos em relação aos "Perros castellanos" ? Ou os indianos em relação aos britânicos ? Ou os magrebinos face aos franceses ?

Nós só somos o que somos em face do outro, visto pelo outro... Na "América Latina" as mães indigenas ou de origem afro, não põem a dormir as suas criancinhas com as histórias do lobo mau ou da malvada da fada má mas antes do "diabo blanco" que lhes come a "patita" se elas não se portarem bem... No meu tempo eram os comunas que comiam as criancinhas ao pequeno almoço.. Que histórias de terror deverão contar hoje as mães ucranianas ? Imagino que metam o "Big Brother" do urso russo... Nós por cá já nos esquecemos felizmente da Padeira de Aljubarrota até um dia em que se lembrem (quem ?) de a desenterrar...


Anónimo disse...



Do "Labirinto da Saudade" Camões não pertence a ninguém , mas na medida em que emprestou forma à existência e ao ser ideal da "pequena casa lusitana" e assim a subtraiu à informe existência histórica empírica, a ele pertencemos.
Pela poesia lírica e pelos "Lusíadas", o grande poema heroico português que ao cantar a história de um passado glorioso nos quer projectar para um futuro venturoso , eu na minha pequenez e humildade, considero-me um filho espiritual da Pátria que ele nos legou. Fernando Pessoa é uma águia que voou muito alto e que por vezes se torna difícil de interpretar, quando o conheci um pouco melhor, já tinha assimilado a lição de Luís de Camões.
Sou transmontano, orgulhoso por necessidade , como todos os homens das montanhas, onde há mais urze, silvas e torga, com raízes fundas nessa terra pobre, que me identifico mais com Portugal quando . raramente, estou lá fora.
Obrigado José Belo, obrigado Luís Graça. Gosto destes temas, aquecem-me o cérebro.
Abraço.

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Francisco Baptista, grande transmontano de Mogadouro, ou melhor, de Brunhoso, Mogadouro, "Terra Fria", por lapso não a(ssa)ssinaste o teu comentário. Não preciso dizer que és sempre bem vindo, que o blogue é teu, é nosso. Bom querido mês de Agosto. Ab, Luis

Antº Rosinha disse...

O português lá fora é mais português e menos bairrista, se for transmontano pode ir às festas da casa do Minho ou das Beiras, se for algarvio pode ir ao clube transmontano e assim por diante.

Lá fora o lagarto pode torcer pelo Porto, cá é tudo contra o "Norte"...até os comemos!

Alberto Branquinho disse...


Olá José Belo,

Não consigo fazer contraditório nem "acrescentatório" ao teu texto. Venho só dizer (acrescentar, afinal) que, para além da necessidade de sair de Portugal para "respirar liberdade", que tu referes, há que não esquecer que a sua pequena aldeia do concelho de Almeida ("Alma até Almeida!")confina com Espanha e tem Vilar Formoso - a fronteira legal para ir para a Europa - ali mesmo à mão de semear - o que poderá fazer um adolescente sonhar. Não esquecendo os contrabandistas. Estes ficavam-se por perto, mas não os "passadores" (que, no devido tempo, ninguém me apresentou um).

- ** -
Mas decidi escrever para contar um episódio a que assisti na Gulbenkian, talvez em 2004, que envolveu E. L..
Presidia ele a uma Mesa de uma sessão sobre literatura francófona (salvo erro).
Apresentou o orador - um escritor dos Camarões - e fez um trocadilho com a palavra "camarões". A assistência achou graça. Sorridente (com aquele seu sorriso), deu a palavra ao orador-convidado.
O escritor camaronês fez os agradecimentos da praxe e, depois, virando-se para E.L., em tom seco, disse qualquer coisa como isto:
- Je voulais dire a M. Président q'il n'y a pas de crevettes dans mon país.

Foi nítido o incómodo de E.L. que agarrou (como era seu hábito) os óculos por uma das hastes e os rodava de olhos fixos no palestrante.

Abraço
Alberto Branquinho

Fernando Ribeiro disse...

Antº Rosinha, essa do lagarto torcer pelo Porto aconteceu mesmo. Em 1987, quando o Porto venceu o Bayern, eu estava em Viena. Um colega meu português, que também lá estava e que era lagarto de Caneças, conseguiu arranjar dois bilhetes para irmos ambos ver o jogo ao estádio do Prater (que já não existe; foi demolido). Disse-me o meu colega que iria torcer pelo Porto, porque se tratava de um clube português. «Nem que fosse o Benfica!», exclamou. Lá fomos ver o jogo, ele gritou pelo Porto do princípio ao fim, exultou com o célebre golo de calcanhar e, à saída, comentou: «Pronto, fiquei feliz com o resultado. Ganhou um clube português! Agora já posso voltar a dizer mal desse clube detestável que é o Porto...»

Valdemar Silva disse...

O que é ser português ?

Mas, depois de três dias de viagem a atravessar a França e, por não aguentar mais tempo, uma directa de San Sabestian pra chegar a Bragança. Uf! chegar a Portugal, e começar logo a sentir a diferença do calor, do cheiro, ver o céu azul, tudo diferente mas nunca esquecido, e ouvir 'bócê nem sabe o calor pro aqui'.
Depois, é só passar por Valverde, Vale do Porco, Vilar de Rei e chegar a Mogadouro, estacionar a autocaravana no Parque de Campismo e descansar para viajar em Portugal.
Parece que estes imigrantes dos anos 2000 já não se sentem imigrantes, antes vão trabalhar para outras paragens...mas a razão é sempre a mesma: um país com mais conventos que palácios e fábricas ter mar à porta de casa.
Assim cá chegaram os meus netos, filho e nora para passar férias vindos dos Países Baixos.

O que é ser português?

"...Ser português é desenrascar. É encontrar caminho sem perguntar. Ser português é pedir indicações e ter logo a ajuda de vários estranhos. Ser português é tentar a borla seja do que for. Ser português é oferecer só porque se simpatizou com alguém. Ser português é ter os melhores lá fora porque é lá fora que se faz o melhor. Ser português é ter o mar no horizonte e nunca olhar para terra, é seguir em frente até o mar acabar, é descobrir, sonhar e inventar. Ser português é conquistar, é dar porrada na mãe, é dizer não e expulsar os mouros e os espanhóis. Ser português é esquecer....."
in Ser português é..., de Guilherme Duarte.

Saúde da boa
Valdemar Queiroz

Alberto Branquinho disse...


Ora aqui vão excertos de dois poemas de poetas contemporâneos (e vivos!)

SER PORTUGUÊS
(Paulo Costa)

é nascer com o fado ao pescoço
viver de olhos ancorados
ao alto mar, ansiar pela maré
de partir ou pela onda do regresso

viver enlatado entre mar e espanha
exportar sardinhas

ir à miissa e esquecer o sermão

(...)

rezar pela paz
admirar fátima e a batalha
na mesma santa visita

ser português é

amar o carro mais que a si próprio
bastante mais em conta

ser português é

partir para o estrangeiro josé
e regressar joe

ser pequeno mas de grande olho

ser português é
não ser castelhano

nascer com dores ali, pobrezinho, viver
com dores aqui do lado, senhor doutor,
e morrer com dores acolá, valha-nos deus

(...)

ser português é
não ser nada disto
mas á men

é discutir política
como quem discute futebol

ser português é

imortalizar poetas e heróis que inflaccionam o ego
desta nação de pueris e fictícios orgulhos

D. Henrique, o navegador que nunca navegou
Fernão de Magalhães o primeiro circum-navegante que jamais regressou

(...)

ser português é

(...)

gitano, judeu, escravidão do tráfego, extirpar urso, lince,
bacalhau, águia imperial, abutre quebra-ossos

é fazer queijo fresco
do leite azedo

(...)

____________

(Continua com o 2º. poema atrás anunciado)






















Alberto Branquinho disse...


Ora aqui vão excertos de dois poemas de poetas contemporâneos (e vivos!)

SER PORTUGUÊS
(Paulo Costa)

é nascer com o fado ao pescoço
viver de olhos ancorados
ao alto mar, ansiar pela maré
de partir ou pela onda do regresso

viver enlatado entre mar e espanha
exportar sardinhas

ir à miissa e esquecer o sermão

(...)

rezar pela paz
admirar fátima e a batalha
na mesma santa visita

ser português é

amar o carro mais que a si próprio
bastante mais em conta

ser português é

partir para o estrangeiro josé
e regressar joe

ser pequeno mas de grande olho

ser português é
não ser castelhano

nascer com dores ali, pobrezinho, viver
com dores aqui do lado, senhor doutor,
e morrer com dores acolá, valha-nos deus

(...)

ser português é
não ser nada disto
mas á men

é discutir política
como quem discute futebol

ser português é

imortalizar poetas e heróis que inflaccionam o ego
desta nação de pueris e fictícios orgulhos

D. Henrique, o navegador que nunca navegou
Fernão de Magalhães o primeiro circum-navegante que jamais regressou

(...)

ser português é

(...)

gitano, judeu, escravidão do tráfego, extirpar urso, lince,
bacalhau, águia imperial, abutre quebra-ossos

é fazer queijo fresco
do leite azedo

(...)

____________

(Continua com o 2º. poema atrás anunciado)
______________

(Continuação)

EU SOU PORTUGUÊS AQUI
(José Fanha)

Eu sou português aqui
em terra e fome talhado
rasgado pelo vento norte
amante certo da morte
no silêncio da agressão.

Eu sou português aqui
mas nascido deste lado
do lado de cá da vida
do lado do sofrimento
da miséria repetida
do pé descalço
do vento.

(...)

Nasci deste lado da ternura
do coração esfarrapado
eu sou filho da aventura
da anedota
do acaso
campeão do improviso
trago as mãos sujas de sangue
que empapa a terra que piso

Eu sou português aqui
na brilhantina em que embrulho
do alto da minha esquina
a conversa e a borrasca
eu sou filho do sarilho
do gesto desmesurado
dos cordéis do desenrasca.

(...)

Eu sou português aqui
o português sem mestre
mas com jeito
eu sou português aqui
e trago o mês de Abril
a voar dentro do peito.
______________


Cptos.
Alberto Branquinho










Tabanca Grande Luís Graça disse...

Já agora ver o poste (que só teve dois comentários... e logo do próprio autor; as questões então postas não tiveram eco ou resposta, na realidade nem o autor tinha respostas para elas... Há quem dia que mais importante do que responder a um questão ou problema, é saber formular a questão pu problema):


5 DE DEZEMBRO DE 2017
Guiné 61/74 - P18047: Fotos à procura de... uma legenda (97): O que é ser português hoje na "ponta mais o(a)cidental da Europa"? As coroas de flores, de muitas cores e feitios, das comemorações (oficiais) do 1.º de dezembro de 2017...

https://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/2017/12/guine-6174-p18047-fotos-procura-deuma.html


(...) Mas interrogo-me sobre o significado de tudo isto: as cores e os feitios das vistosas coroas de flores, deixadas de manhã pelas instituições que nos representam, da Presidência da República à autarquia, passando naturalmente pelas Forças Armadas... E que ainda estavam viçosas, à tarde, quando por lá passei...

Afinal, o que é ser hoje português? E o patriotismo, ainda existe e faz sentido? Pode ser uma reflexão (idiota) de um homem que um dia vestiu a farda do exército português para ir "defender a Pátria" a milhares de quilómetros de casa... Na Guiné, em 1969/71...

Qual a diferença e semelhança entre mim e os meus antepassados que lutaram na "guerra da restauração" (1640-1668), na sequência da rutura com a "monarquia dual" sob a qual Portugal viveu (entre 1580 e 1640), o mesmo é dizer sob o domínio do ramo espanhol da casa de Habsburgo.

Se a geração que fez a guerra colonial (1961/74) tivesse nascido por volta de 1620, teria lutado contra a Espanha dos Filipes em inúmeras batalhas por ex., Cerco de São Filipe (1641-1642); Montijo (1644); Arronches (1653); Linhas de Elvas (1659); Ameixial (1663); Castelo Rodrigo (1664); Montes Claros (1665); Berlengas (1666)... Mas também contra os holandeses no Brasil, em Angola, em São Tomé e Príncipe].

Que custo tem a independência de um país? O que é hoje ser independente? O que ganharam os aliados que nos apoiaram, e nomeadamente os ingleses? Sabemos que os ingleses ganharam um império e a autoestrada da globalização que lhes permitiu ser o 1.º país industrial do mundo... E os holandeses ocuparam boa parte das posições portuguesas na Ásia...

Não há alianças grátis...nem inimigos de borla... E nesse tempo, os portugueses tiveram mais sorte do que os catalães, debaixo da pata dos Filipes, como nós... Sorte?... Foi apenas a sorte das armas?...

Para o menino da foto n.º 14, que toca caixa na banda da sua terra (, já agora gostava de saber qual...), ter vindo a Lisboa neste dia, é coisa que ele nunca mais vai esquecer na sua vida... Como eu, quando vim pela primeira vez à "cidade grande", à "capital do império", com os meus 7 ou 8 anos... Mas eu não toquei, como ele, os 3 hinos: o da Restauração, o da Maria da Fonte e o Nacional, ao lado da Banda da Armada e mais 32 bandas civis, num total de 1900 músicos... (Tenho vídeos dessa atuação conjunta, que prometo pôr "on line")... Este menino estava na fila da frente, a 20 metros de mim, e é por estes meninos que temos de pensar que ser português hoje ainda vale a pena e faz sentido... Ele representa a geração dos nossos netos... (LG)

Fernando Ribeiro disse...

Talvez por causa da minha formação profissional na área da Ciência e da Técnica, estas questões (o que é ser português, etc.) passam-me um bocado ao lado. Sim, sou português, considero-me patriota e é tudo. Que mais é que querem que eu diga? Toda a discussão sobre o tema, que tanto apaixonou Eduardo Lourenço (e apaixona José Belo e Luís Graça, já agora), mostra-se-me sempre incompleta, simplista e puramente académica. Desculpem a minha opinião. As nações surgem e desaparecem, independentemente da nossa vontade e da especulação que possamos fazer sobre elas. A nação portuguesa talvez tenha surgido, não com D. Afonso Henriques (que era somente um senhor feudal), mas com a Revolução de 1383-1385 (magistralmente retratada por Fernão Lopes), e irá acabar um dia, não se sabe quando nem como. E então, qual é o problema? Tudo começa e tudo acaba.

Tabanca Grande Luís Graça disse...

É esquizofrénico querer saber quem somos ?

A nossa literatur alimenta-se dessa pergunta (que nunca terá uma resposta cabal e definitiva). De Camões a Fernando Pessoa. E depois, é verdade, vamos todos morrer...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Engenheiro Fernando Ribeiro, meu camarada:

Estou na praia, na esplanada, numa manhã magnífica de sol e maresia... E a folhear o António Gedeão (pseudónimo literário do prof Rómulo de Carvalho, um homem de "formação científica" como tu, ou o "estrangeirado" Jorge de Sena...). Um poeta de que eu e outros já gostavamos muito na Guiné...E que recitavamos em noites de copos e cantorias.

E nao resisto a citar o início do poema "Fala do homem nascido", do livro Teatro do Mundo (1958), de resto conhecido porque está musicado
(pelo Luis Célia, se não erro):

(...)

Venho da terra assombrada, / do ventre da minha mãe;/ não pretendo roubar nada / nem fazer mal a ninguém./ Só quero o que me é devido / por me trazerem aqui,/ que eu nem sequer fui ouvido / no acto de que nasci./ (...)

Um poema que tem muito a ver com o tema aqui em discussão... Um alfabravo, Luis.

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Pois é, Branquinho, "Não se nasce impunemente / nas praias de Portugal" (António Gedeão, "Poema da malta das naus", 1958.)

Antº Rosinha disse...

Ser português emigrado, é vir em Agosto, principalmente às festas do que resta da aldeia.

Por Bragança e por Vilar Formoso, estão a entrar milhares de beirões e transmontanos e Minho, vindos da França e arredores, e muitos da nossa geração, onde se podem contar imensa gente que foi refratária e que tiveram que aguardar pelo 25 de Abril para vir anualmente matar saudades.

Mas eram portugueses sempre, mandavam sempre a "remessa" para Portugal, o que hoje já não faz regra.

Das aldeias, grandes aldeias daqueles tempos, tanto beirões do interior como também transmontanos, em cada revoada de 30/40 mancebos, por alto, 10% mínimo, pisgavam-se d'assalto.

Mas já previamente, antes da inspecção, mais uma boa percentagem já tinha ido para junto do pai, com passaporte.

Com muito sacrifício e muitas privações, mas â portuguesa, falava-se em contas bancárias no Espírito Santo e outros menos santos, somas fabulosas, inimagináveis ao nivel do velho pastor e velho agricultor.

Esses portugueses escreviam para os primos na guerra que cada remessa deles equivalia ao pré de 10 soldados.

Hoje vivem muitos num dilema, os filhos e netos estão-se a desligar da aldeia, e muitos nem virão mais, logo que o velhos que estão no lar, batam a caçoleta.

Eu que nunca liguei à política, a não ser agora que ligo apenas à política daquele tempo, por curiosidade, ouvia esta frase a antigos daquele meu tempo de jovem, e achava muita graça, "a vida é muito ingrata para o português".

Mas agora acho que já não é tão ingrata, mas o português vai chorando.

antonio graça de abreu disse...

Eduardo Lourenço, pois claro. Acho interessante aparecer, via Zé Belo. A citar o jornal “Le Monde” que o descreveu como um intelectual liberto da rigidez política das ideologias, que soube sempre seguir o seu próprio caminho. Ora sabemos bem, Eduardo Lourenço e a maçonaria tão próxima, e o PS por quem deu a cara. Não tem mal nenhum, cada um é como é, mas não gosto que me contem histórias da Carochinha, mesmo quando o João Ratão0 é o príncipe.

Abraço,

António Graça de Abreu