© ADÃO CRUZ
O AR FRESCO DA TRISTEZA
A vida havia-lhe ensinado
que o mais belo poema
se faz de gestos e palavras simples
quando dois corpos amantes se unem
como a clara e a gema.
Fora da jaula e com a ponte ao longe
sentia-se voar
e dizia que o ar fresco da liberdade
acendia nela o desejo ardente
de fugir e não voltar.
O céu abria-se dentro de casa
quando ele a via frente ao espelho
provando a blusa que lhe trouxera de fora.
Tocar ao de leve a sua pele de seda
coberta apenas pela blusa que vestia
sentir nos dedos a maciez do sexo
que à luz dos olhos se oferecia
era um poema…
que em versos de fogo se fundia.
Para lá da beleza e da lacrimosa melancolia
era a ternura da infelicidade
o que mais lhe prendia aos olhos
aquele corpo de sonho e magia.
Os seus beijos
não tanto pela sensualidade
como pela necessidade de fuga
para um qualquer lugar de paz e segurança
tornavam mais dolorosa
a hora que viria a seguir sem ela
e sem esperança.
A alegria que tinha ao vê-la entrar era tão grande
quanto a tristeza que sentia ao vê-la sair
contando-lhe os passos.
Era como se o mundo caísse ao chão e se partisse
e não houvesse forma de unir os pedaços.
adão cruz
********************
© ADÃO CRUZ
A grávida mais linda que já vi
Foi a grávida mais linda que já vi.
Tinha olhos aguados de ternura
olhos mansos de sonho e distância
olhos de sexo infinito.
Tinha estrelas pequeninas nas maçãs do rosto
e os lábios frutavam de carnudos
com gosto a sol e a sal.
A grávida mais linda que já vi
dormia no ventre da serra-mãe
entre asas e desejos
cabelos mortais sonhados de horizonte
hálitos de feno e maresia
que o sol acordava no acordar de cada dia.
O seu corpo nascia das ondas eternas
e ondeava como seara madura.
A grávida mais linda que já vi
na paisagem lisa e amarga do tempo
dormia na areia branca
e tinha flores brancas
na raiz branca das coxas
dos beijos da espuma branca
que do mar sobrava.
adão cruz
____________
Nota do editor
Último poste da série de 14 DE AGOSTO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23524: Blogpoesia (781): "Na Foz do Douro" e "Uma andorinha do Arctíco", poemas ilustrados da autoria de Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547/BCAÇ 1887 (Canquelifá e Bigene, 1966/68)
Sem comentários:
Enviar um comentário