segunda-feira, 14 de maio de 2012

Guiné 63/74 - P9898: Excertos do Diário de António Graça de Abreu (CAOP1, Canchungo, Mansoa e Cufar, 1972/74) (16): Guidaje foi há 39 anos...

1. Sobre Guidaje, há uma referência apenas do Diário da Guiné (1972/74) (*), da autoria do nosso camarada e amigo António Graça de Abreu. Vem na entrada "Mansoa, 26 de Maio de 1973"... 

Colocado com alf mil de secretaria num CAOP1 (Mansoa), o António Graça de Abreu  estava relativamente bem colocado para ir sabendo das novas da guerra... Muito  melhor colocado do que qualquer um de nós, que fomos operacionais mas atuámos sobretudo a nível de setor ou subsetor, com uma visão necessariamente fragmentada e parcelar da situação operacional e político-militar...

Este documento diarístico vale também, para a historiografia da guerra colonial na Guiné,  por nos dar uma outra visão, e aliás bastante interessante, a  do estado de espírito ou do moral das nossas NT... Neste caso há referência explícita a tropas especiais, uma companhia do BCP 12 que regressa de Guidaje, e a 38ª CCmds (adida ao CAOP1) que parte para Guidaje...

Amigos e camaradas, leitores do nosso blogue: O "inferno de Guidaje" começou justamente a 8 de maio de 1973, faz agora 39 anos... Dizem os historiógrafos militares Aniceto Afonso e Carlos Matos Gomes que a operação de auxílio a Guidaje, reabastecimento e contra-ofensiva durou um mês (de 8 de maio a 8 de junho de 1973), e envolveu mais de mil homens das NT (na sua maioria, tropas especiais, comandos, fuzileiros e paraquedistas). Nunca é de mais evocarmos, nestas efemérides, o pesado sacrifício que foi pago pelos combatentes, de um lado e de outro, envolvidos nesta e noutras batalhas sangrentas da Guiné, ligadas a topónimos estranhamente começados por G (Guidaje, Guileje, Gadamael, Gandembel)...

 Recorde-se, mais uma vez,  para os eventuais leitores interessados,  que há uma edição comercial do livro do AGA. Referência completa: António Graça de Abreu - Diário da Guiné: Lama, Sangue e Água Pura. Lisboa: Guerra & Paz Editores, 2007, 220 pp. (*) (LG) 


Mansoa, 26 de Maio de 1973

[, Na foto, o AGA, na estrada Mansoa- Porto Gole, em 1973, a G3 numa mão e a máquina fotográfica na outra]

A Guiné ferve, até de boatos. Tenho a vantagem de estar razoavelmente bem informado sobre o que vai acontecendo. 

O PAIGC, confiante e moralizado, passou à ofensiva. Começaram há quinze dias atrás por se concentrar em Guidaje (**), na fronteira norte e agora sobre Guileje, na fronteira sul, as duas povoações trissilábicas, ambas começadas por “Gui”, sinónimo de desespero e morte. 

Um alferes pára-quedista meu amigo que passou agora por aqui com os seus homens vindos de Guidaje a caminho de Bissau, rotos, sujos, barbas de dias, os olhos afundados no nada, disse-me: “Lá para cima é só ferro, não se pode ir.” 

Guidaje, embora flagelada continuamente há mais de duas semanas, tem-se aguentado. Não se pode ir para lá, mas ontem quase toda a 38ª. Companhia de Comandos partiu para Guidaje. Os quarenta homens que lá haviam estado, com o nosso David Viegas que aí morreu, permaneceram em Mansoa. Já tinham tido um morto e o soldado Tavares sem um pé. Foi triste ver partir os restantes. Formaram a Companhia, saudaram toda a gente.

Antes houve bebedeiras, risadas secas a tentar afugentar o medo, a incerteza de voltarem vivos. A zona de Guidaje está cheia de guerrilheiros, a terra fica a quinhentos metros do Senegal – dizem-me que a pista de aviação entra por dentro do território do Senegal, – e, do outro lado, em Cumbamori no país do Senghor, os combatentes do PAIGC têm uma grande base militar. 

A partir de Bissau, lançou-se uma operação com o batalhão dos Comandos Africanos, cerca de 500 homens, sobre Cumbamori. Saiu um comunicado especial das Forças Armadas onde se refere a destruição do quartel de Cumbamori, só não se diz que este quartel fica no Senegal, tudo mais está mais ou menos correcto. O número de elementos IN abatidos, cento e sessenta e sete no total, é que pode criar algumas confusões porque engloba civis, às vezes mulheres e crianças, tudo o que aparece à frente e é suspeito de estar com os guerrilheiros, é frequentemente abatido. Na retirada, os Comandos Africanos foram atacados por blindados senegaleses e sofreram vinte e tal mortos.

O pessoal anda amedrontado. Ontem na messe, ao jantar, quase todos saltaram das cadeiras, ouviu-se um rebentamento. Afinal era a porta do frigorífico.

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Nota do editor:


(**) Sobre Guidaje temos mais de 140 referências no nosso blogue. Sobre a intervenção da CCP 12/BCP 12 bem como da 38ª CCmds ver aqui os seguintes postes de camaradas nossos:

Victor Tavares (CCP 121/BCP 12) [, foto à direita]:

25 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1212: Guidaje, de má memória para os paraquedistas (Victor Tavares, CCP 121) (1): A morte do Lourenço, do Victoriano e do Peixoto

9 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1260: Guidaje, de má memória para os paraquedistas (Victor Tavares, CCP 121) (2): o dia mais triste da minha vida

26 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1316: A participação dos paraquedistas na Operação Ametista Real: assalto à base de Kumbamory, Senegal (Victor Tavares, CCP 121) 


Amílcar Mendes (38ª CCmds) [, foto à esquerda]

27 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1123: Um espectáculo macabro na bolanha de Cufeu, em 1973 (A. Mendes, 38ª Companhia de Comandos)

22 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1201: A vida de um comando (A. Mendes, 38ª CCmds) (3): De Farim a Guidaje: a picada do inferno (I parte)

23 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1203: A vida de um comando (A. Mendes, 38ª CCmds) (4): De Farim a Guidaje: a picada do inferno (II Parte)


23 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1203: A vida de um comando (A. Mendes, 38ª CCmds) (4): De Farim a Guidaje: a picada do inferno (II Parte)

23 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1205: A vida de um comando (A. Mendes, 38ª CCmds) (5): uma noite, nas valas de Guidaje
 

24 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1210: A vida de um comando (A. Mendes, 38ª CCmds) (6): Guidaje ? Nunca mais!...

Aniceto Afonso  [, foto à esquerda,] e Carlos Matos Gomes, [, foto à direita,] historiógrafos militares [, tendo o segundo participado na Op Amestista Real, como oficial do BCA]


21 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1198: Antologia (53): Guidaje, Maio de 1973: o inferno (Aniceto Afonso e Carlos Matos Gomes)

(...) "Para cercar Guidaje, o PAIGC começou por cortar o itinerário de Binta e instalar sistemas antiaéreos com mísseis Strela. O isolamento aéreo de Guidaje iniciou-se com o abate de um avião T-6 e de dois DO-27 e o terrestre acentuou-se em 8 de Maio, quando uma coluna que partira de Farim, escoltada por forças do Batalhão de Caçadores 4512, accionou uma mina anticarro e foi emboscada, sofrendo 12 feridos. 


"Em 9 de Maio, a mesma força foi de novo emboscada, mantendo-se o contacto durante quatro horas.

"A coluna portuguesa sofreu mais quatro mortos, oito feridos graves, dez feridos ligeiros e quatro viaturas destruídas, deslocando-se então para Binta, em vez de subir para Guidaje" (...).

(...) "Em 23 de Maio, saiu uma coluna de Binta para Guidaje protegida por uma companhia de pára-quedistas [, a CCP121]. A coluna regressou ao ponto de partida, porque a picada estava minada em profundidade, e a companhia de pára-quedistas, apesar de ter sofrido violenta emboscada feita por um grupo de cerca de 70 elementos, que lhe causou quatro mortos, chegou a Guidaje " (...). 

(...) "Em 29 de Maio, foi organizada uma grande operação para reabastecer Guidaje. Constituíram-se quatro agrupamentos com efectivos de companhia em Binta e dois agrupamentos em Guidaje, estes para apoiar a progressão na parte final do itinerário. A coluna alcançou Guidaje nesse dia, tendo sofrido dois mortos e vários feridos" (...).

(...) "Em 12 de Junho, considerou-se terminada a operação de cerco a Guidaje. Uma coluna partiu desta guarnição para Binta, trazendo o tenente-coronel Correia de Campos, que comandara o COP3 durante este difícil período.

"Baixas das colunas de e para Guidaje, entre 8 de Maio e 8 de Junho de 1973: Mortos: 22; Feridos: 70; Viaturas destruídas: 6.

"Em suma, o primeiro objectivo do PAIGC foi isolar Guidaje, o segundo foi flagelar a posição e destruir o espírito de resistência das forças portuguesas e o último seria conquistar a povoação. 

"Guidaje sofreu, entre o dia 8 e o dia 29 de Junho, 43 flagelações com artilharia, foguetões e morteiros. Logo no dia 8 esteve debaixo de fogo por cinco vezes, num total de duas horas, em 9 sofreu quatro ataques, em 10 três, e até ao final todos os dias foi atacada. No total dos 43 ataques, a guarnição de Guidaje sofreu sete mortos, 30 feridos militares e 15 entre a população civil. Foram causados estragos em todos os edifícios do quartel" (...).

Sobre Op Ametista Real, ver ainda:

16 de Agosto de 2005 > Guiné 63/74 - CLXXV: Antologia (16): Op Ametista Real (Senegal, 1973) (João Almeida Bruno)

Ainda sobre Guidaje, vd aqui tambémo depoimento de José Afonso, que pertenceu à CCAV 3420:

Guiné 63/74 - P9897: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (52): Encontro o Leopoldo Amado na Feira do Livro de Lisboa, 4 anos depois de Bissau: está agora no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, como investigador no programa de pós-doutoramento (Luís Graça)



Lisboa > Parque Eduardo VII > 82ª Feira do Livro de Lisboa, 2012 > 12 de maio de 2012 > O nosso amigo Leopoldo Amado, ladeado pela Alice, Luís, João e Joana... Mais uma prova de que o Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande!... Tanto o Leopoldo como a família Graça (com exceção da Joana) têm morança na Tabanca Grande.





1. Imaginava-o em Cabo Verde, na cidade da Praia, transmitindo aos seus alunos caboverdianos o seu largo e profundo saber de guineense, português, cidadão do mundo, em matéria de história contemporânea, e mais exatamente da história recente da nossa amada e sofrida Guiné-Bissau... Mas, não, o Leopoldo está, no ano letivo em curso, a trabalhar na Universidade de Coimbra, no prestigiado Centro de Estudos Sociais, onde é investigador no programa de pós-doutoramento.


Andava eu, mais o João, acabado de chegar de umas férias na Índia, a visitar a feira do livro, mais a Alice e a Joana (enfim, não é todos os dias que se reúne a família toda!), quando dou de caras com o nosso grã-tabanqueiro Leopoldo Amado, amabilíssimo, como sempre, e que de imediato nos reconheceu a todos. Já não o via pelo menos desde Março de 2008,  na altura em que estivemos junto no Simpósio Internacionald e Guiledje (Bissau, 1-7 de março de 2008).


No sábado passado, dia 12 de maio, às 18h30, tinha-se realizado, no auditório da APEL - Associação Portuguesa dos Editores e Livreiros, na 82ª Feira do Livro de Lisboa, no Parque Eduardo VII,   uma "Mesa Redonda sob o tema: História e Literaturas em Língua Portuguesa: Expressões da Diversidade" (que eu lamentavelmente perdi)... O nosso Leopoldo Amado era um dos oradores, a representar a sua terra natal... Já agora tome-se boa nota dos restantes escritores lusófonos que participaram nesta iniciativa inserida no âmbito da Semana Cultural da  CPLP - Comunidade dos Países de Língua Portuguesa,

Oradores: 


Pires Laranjeira (moderador) – Portugal; 
Luís Kandjimbo - Angola; 
Luís Carlos Patraquim – Moçambique; 
Luis Costa – Timor; 
José Luís Hopffer Almada – Cabo Verde; 
Maria Esther Maciel – Brasil. 


 E já agora, que estamos em maré de lusofonia, acrescente-se que a CPLP também marcou presença marcada no último dia da Feira do Livro de Lisboa, domingo, 13,  com uma sessão de lançamento de livros de autores lusófonos residentes em Portugal, entre outros originários dos Estados-membros da CPLP, sessão que decorreu no Pavilhão da Câmara Municipal de Lisboa,   na 82ª Feira do Livro de Lisboa. Obras apresentadas com respectiva sessão de autógrafos:

“Marcas da guerra” e “Lexical Doutrina” de Lopito Feijó  [n. 1963, poeta e ensaísta angolano]
"Paraíso Apagado por um Trovão" de José Luís Tavares [n. 1967, poeta caboverdiano, a residir em Portugal]
“O Processo dos Cinquentas - Tempo e Memória (1940-1962) - Considerações Históricas” e “Américo Boavida – Tempo e Memória” de Fernando Correia, pseudónimo literário de do angolano Fernando Edviges Chasse
“Antologias de Poesia da Casa dos Estudantes do Império – 1951-1963 – Angola, S. Tomé e Príncipe e Moçambique I e II Volume” de Aida Freudenthal [, investigadora reformada do IICT - Instituto de Investigação Científica Tropical], edição da Associação Casa dos Estudantes do Império.






2. Recorde-se que o Leopoldo Amado é, historicamente,  o segundo guinense, depois do  Pepito, a integrar o nosso blogue. É um dos nossos mais antigos grã-tabanqueiros. Está neste neste momento como investigador no programa de pós-doutoramento da UC.  Achei-o bem, de boa saúde, e otimista q.b., em relação à atual crise guineense. "Há uma nesga de oportunidade de que esta seja a última crise de reime, levando de facto à reforma das forças armadas e, se não mesmo, à sua abolição e refundação".


Como estamos "proibidos" de falar, no blogue,. da atualiddae política (entenda-se: político-partidária) dos nossos dois países, a nossa conserva fica só por aqui.


Da página da CES/UC recolhemos, entretanto,  os seguintes elementos biográficos a seu respeito:

 Universidade de Coimbra > CES > Leopoldo Amado

 (i) Nasceu em 1960 no Sul da Guiné-Bissau. 

(ii) Licenciou-se em História em 1985 pela Faculdade Letras de Lisboa - Universidade Clássica de Lisboa. 

(iii) Antes de voltar à Guiné-Bissau em 1989, concluiu em 1987 o Curso de pós-graduação em Relações Internacionais (Estudos Islâmicos) pela extinta Universidade Internacional de Lisboa e frequenta entre os anos de 1987-1989 o curso de mestrado em Estudos Africanos no Institituto de Ciências Sociais e Políticas da Universidade Técnica de Lisboa. 

(iv) Na Guiné-Bissau, tornou-se investigador do INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas).

(v) Nesse país, desempenhou, sucessivamente, as funções de: Director do mensário "Baguera"; Director Comercial do Geta-Bissau (empresa privada);Vice-Presidente da Liga Guineense dos Direitos Humanos; Director do "Tcholoná", única Revista Cultural então existe no país. 

(vi) Trabalhou ainda na Guiné-Bissau como consultor nacional e internacional, destacando-se, entre outros, os trabalhos em matéria de gestão de projectos e planificação estratégica, desenvolvidos com a UNICEF, PLAN INTERNATIONAL, PNUD, FNUAP, RADDA BARNEN e AMNISTIA INTERNACIONAL, para além das funções de correspondente e de comentador político da BCC, Rádio France International, Voz de América, RDP África e RTP África. 

(vii) No além-fronteiras, com sede em Cabo Verde, e cobrindo outros países como Senegal, Guiné-Bissau, Gana, Guiné-Conacri e Gâmbia, trabalhou ainda como Director do SPHAC - Projecto da UNESCO para a Salvaguarda do Património Histórico da África Contemporânea, entre os anos 1995 à 2001. 

(viii) Posteriormente, em Portugal, antes de concluir um Doutoramento em História Contemporânea pela Universidade de Lisboa (2007), trabalhou como Secretário Executivo da “Guineáspora” (Fórum Mundial dos guineenses na Diáspora);

(ix) Tendo posteriormente regressado a Cabo Verde, onde, desta feita, trabalha junto da Uni-CV (Universidade Pública local), desde 2008 à esta parte, desempenhando aí, designadamente, as funções de docência em cursos de graduação (licenciaturas em História e Ciências Sociais) e em cursos de pós-graduação(mestrado em Ciências Sociais), para além de outras funções que assumiu, concomitante e alternadamente, como sejam as de Coordenador de Curso de História (Chefe de Departamento) e de Presidente do Departamento (Faculdade) de Ciências Sociais e Humanas. 

Guiné 63/74 - P9896: Notas de leitura (360): Marcello Caetano, Silva Cunha e a Guiné (1) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) com data de 10 de Abril de 2012:

Queridos amigos,
Às vezes faz bem retornar sem pressas às fontes escritas e rever o que os dirigentes políticos propuseram para a questão guineense. É curioso verificar que todos aqueles que se pronunciam sobre o assassinato de Cabral não cuidem de atender às súplicas de Spínola a Caetano para ter um encontro com Cabral, documento político da época, o que nos leva a perguntar se era imaginável que alguém que implorava conversações com um dirigente político tivesse alguma responsabilidade com a sua morte. E Silva Cunha, como veremos, também nos reserva surpresas.

Um abraço do
Mário


Marcello Caetano, Silva Cunha e a Guiné  (1)

Beja Santos 

É fundamental carrear para o blogue elementos doutrinais e informativos provenientes dos ideólogos políticos do regime deposto em 25 de Abril de 1974 e dos seus críticos.
A descolonização da Guiné possui ainda meandros de interpretação confusa e que requer o cruzamento de leituras, de olhares. Nesta aceção, é indispensável cruzar o que se disse antes do 25 de Abril com o que se escreveu depois. Por exemplo, no seu “Depoimento”, a primeira obra que Caetano escreveu no Brasil, ele refere uma reunião do Conselho Superior da Defesa Nacional em que questionou se a Guiné era defensável, tendo escrito que o marechal Costa Gomes respondera afirmativamente. Na longa entrevista que este oficial deu à historiadora Manuela Cruzeiro, afirmou perentoriamente que a Guiné era defensável nos termos da nova manobra do dispositivo que iria ser recuado até os aquartelamentos das nossas tropas não ficarem ao alcance dos morteiros 120. E mais afirmou que teria dito que a Guiné era defensável desde que não entrasse em ação a aviação que iria ser posta à disposição do PAIGC. Ficámos igualmente a saber que as atas deste Conselho Superior de Defesa Nacional desapareceram misteriosamente.

Enfim, é da maior utilidade pôr em cima de mesa os argumentos e deixar os historiadores falar. Na sequência do “Depoimento”, Marcello Caetano concedeu entrevistas que apareceram sobre o título “O 25 de Abril e o Ultramar”, sobre os quais é muito raro os estudiosos pronunciarem-se. Ora este texto é, a vários títulos, da maior importância. Logo a páginas 12, Caetano admite que a política que estava a executar “deveria conduzir à independência dos grandes territórios, criando condições para se tornarem Estados”. Os documentos que anexa incluem uma carta ao General Spínola, datada de 26 de Fevereiro de 1973, que é uma peça de filigrana da epistolografia política, onde quer que seja. As relações mútuas arrefeceram, Caetano justifica-se pelo facto de ter proibido uma entrevista de Spínola a um periódico nacional, bem como o litígio decorrente do estatuto da Guiné. Spínola responde em 6 de Março e justifica o seu desapontamento por sentir que a “autonomia progressiva” é alvo de calúnias e que o próprio presidente do governo dela se está a afastar. E há um trecho que pode ser uma mais-valia para perceber como os dois entraram em rota de colisão: “Afirmou-me Vossa Excelência que tendo os africanos optado pela intolerância face à presença do branco, qualquer solução política corresponderia a apressar a nossa saída de África; ouvi também a Vossa Excelência a opinião de que mais facilmente aceitaria uma derrota militar do que uma solução política que implicasse quaisquer concessões; e, anteriormente, já Vossa Excelência, perante a perspetiva de um cessar-fogo, me tinha expressado opinião de que considerava inconveniente o termo da guerra da Guiné por tal facto originar a deslocação da luta para o arquipélago de Cabo Verde”.

E Spínola brande um argumento que irá funcionar nas justificações que levarão ao 25 de Abril: “Uma tal hipótese, a meu ver, só nos oferece como alternativa o prolongamento da atual situação de desgaste até que a Nação se esgote ou, a exemplo da Índia, sobrevenha uma derrota militar, pois não vejo, no quadro da análise ponderada da situação militar, que outras alternativas se nos oferecem na hipótese de rejeição das outras soluções políticas. Não ignoro que uma derrota militar possa ser encarada em certos sectores como fatalidade solucionadora; mas se a derrota militar pode oferecer à expiação os seus responsáveis imediatos, a história não deixará de julgar quantos a não souberam evitar”. E depois espraia-se sobre o federalismo, as negociações que deviam ter continuado com o presidente Senghor, reafirma a fórmula de autonomia progressiva e o esforço desenvolvido na Guiné quanto à africanização das instituições, conservando no seu seio os germe de portugalidade.

Caetano responde a 22 de Março, volta a justificar porque não aceitou a proposta do encontro de Spínola com Amílcar Cabral, seria um precedente de consequências incalculáveis: “E era quanto a esse precedente que eu dizia preferir perder a Guiné por derrota militar, mas combatendo pelo nosso direito, do que entregá-la em negociação mais ou menos feliz”. E desloca o teor da conversa para o facto de o PAIGC ser liderado por cabo-verdianos e que a independência da Guiné levaria a deslocação da guerra para Cabo Verde. Para Caetano, “É na África austral que se joga verdadeiramente o nosso destino ultramarino. Se fosse só a Guiné, tudo seria para nós muito mais fácil”.


Silva Cunha escreve o seu livro “O Ultramar, a Nação e o 25 de Abril” em 1977, publica-o na Atlântida Editora. Temos aqui outro documento de incalculável valor. O último ministro da Defesa Nacional de Caetano e que esteve no governo no Ministério do Ultramar durante 12 anos tece justificações sobre a grande opção ultramarina, dando uma panorâmica do ambiente internacional do pós-guerra, como se processou a subversão da África portuguesa e as diretrizes para a defesa militar. Aí a páginas 40, refere abundantemente a Guiné: as preocupações de Senghor, quer com a Guiné Conacri quer com a passagem de material do PAIGC pelo seu território. Fala também de preocupações da Nigéria, da incógnita da atitude dos EUA e da tentativa de Senghor contribuir para o cessar da luta na Guiné, isto logo em 1963 e afirma explicitamente: “O Doutor Salazar deu abertura à solução que infelizmente, porém, não chegou a concretizar-se”.

Mesmo depois do corte de relações diplomáticas entre Portugal e o Senegal não pararam as diligências para o fim da Guerra. Foi a Dakar o Dr. Alexandre Ribeiro da Cunha acompanhado pelo inspetor da DGS em Bissau, Matos Rodrigues. Senghor pedia a suspensão das operações militares para poder ter contactos com os chefes do PAIGC e encontrar uma forma aceitável para ambas as partes. “Foi decidido transmitir instruções ao Governador e Comandante-Chefe da Guiné para que evitasse lançar operações ofensivas, limitando-se à defesa contra eventuais ataques dos guerrilheiros”. Factos subsequentes levaram a crer que as diligências do Senegal não interessavam ao PAIGC. Houve ainda encontros entre autoridades senegalesas e portuguesas em Paris, com carácter altamente secreto. Sugeriu-se a escolha de uma personalidade imparcial que pudesse vir a fazer um juízo objetivo sobre a ação do PAIGC e das forças portuguesas com o objetivo último de evitar novos incidentes transfronteiriços. Os contactos seguintes fizeram-se por intermédio do General Spínola. O resultado da reunião foi transmitido em Lisboa: Senghor oferecia-se como medianeiro para obter uma suspensão nas hostilidades, primeiro passo para entabular conversações com o PAIGC. Discutiu-se politicamente o que seriam as consequências desse cessar-fogo. E veio a avaliação feita por Silva Cunha: “Embora se começasse a fazer sentir no país, mas especialmente nas forças Armadas, um certo cansaço da luta, a verdade é que a opinião pública não estava preparada para aceitar uma mudança radical na orientação da política ultramarina”. Realizou-se uma reunião do Conselho Superior de Defesa Nacional presidida por Américo Tomás para tratar da questão da Guiné. Todos os presentes concluíram não haver razão para seguir as sugestões de Senghor e que eram defendidas acerrimamente por Spínola.

(Continua)
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 11 de Maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9886: Notas de leitura (359): As grandes Operações da Guerra Colonial (3), edição do "Correio da Manhã" (Mário Beja Santos)

domingo, 13 de maio de 2012

Guiné 63/74 - P9895: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (5): As memórias dos familiares dos ex-combatentes da guerra colonial como trabalho de fim de Curso de Antropologia na FCSH da Universidade Nova de Lisboa



1. Mensagem de Marta Lima, estudante universitária do curso de Antropologia da FCSH da UNL, com data de 8 de Maio de 2012:

Muito boa tarde,
O meu nome é Marta Lima e sou estudante do curso de Antropologia.

Escrevo para pedir uma possível colaboração, e passo a explicar, como trabalho de final de curso estou a escrever um projecto sobre a Guerra Colonial, mais exactamente sobre as memórias dos familiares, dos filhos e filhas dos combatentes, que ficaram por cá, já que o seu papel nesta guerra nunca foi devidamente valorizado.
Para isso, necessitava de fazer algumas entrevistas, a filhos ou familiares de ex-combatentes, e na minha procura teórica para o projecto deparei-me com o seu blog e cá estou a pedir ajuda. Claro está que todas as informações e/ou materiais recolhidos nas mesmas serão apenas e só utilizados para o trabalho, e apenas aquilo acordado com o entrevistado(a).

Sendo assim, agradeceria imenso que se conhecesse alguém disposto a dar-me essa entrevista entrasse em contacto comigo, ou se puder divulgar o meu pedido junto de outros ex-combatentes.

Termino, agradecendo mais uma vez o tempo e disponibilidade.

Com os melhores cumprimentos,
Marta Lima
 martalimonete@gmail.com 
(+351) 967 166 871


2. Comentário de CV:

Aqui fica tornado público o pedido de colaboração de Marta Lima, que está no final do seu curso de Antropologia, e que está a elaborar um trabalho para o qual serão fundamentais os depoimentos dos familiares dos ex-combatentes, que na retaguarda sofreram e viram, à sua maneira, a guerra do ultramar.

Já serão poucos os pais vivos ou em condições de colaborar, mas há as esposas, os irmãos, as madrinhas de guerra e outros familiares que se podem disponibilizar a ajudar a nossa amiga Marta Lima.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 23 de Março de 2012 > Guiné 63/74 - P9648: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (4): O stresse pós-traumático de guerra, em estudo na Universidade Autónoma de Lisboa (UAL)

Guiné 63/74 - P9894: O Nosso Livro de Visitas (136): António Martins Alves, Regimento de Cavalaria 8 - Castelo Branco, 1967/70

1. Mensagem do nosso camarada António Martins Alves que prestou serviço militar no RC 8 de Castelo Branco entre os anos de 1967 e 1970, com data de 8 de Maio de 2012:

Meu caro,
Por acaso, andava a procurar fotografias do RC8, caí no vosso blog, " Blog Tabanca Grande.

Na leitura que fui fazendo encontrei o nome de um ex-furriel miliciano que esteve no RC8, António da Costa Maria e que foi para a Guiné /esquadrão Rec Fox 2640. Pela data (69/71) esteve comigo no RC8.

Eu estive no RC8 entre 67 e 70. Gostava de entrar em contacto com ele.

Há uma página no Facebook - amigos do ex-RC8. Uma das intenções, se ele tem página no FB seria adicioná-lo ao Grupo.

O meu mail: z.zeferino@gmail.com.

No FB a página António Martins Alves.

Agradeço que lhe faça chegar esta notícia.

Os meus parabéns pelo blog.
António Martins Alves


2. Comentário de CV:

Caro camarada António Alves
Já falei telefonicamente com o António da Costa Maria que entrará em contacto consigo.
Julgo que ele não tem página no FB.

Receba um abraço
Carlos Vinhal
Co-editor deste Blogue
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 8 de Maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9868: O Nosso Livro de Visitas (135): José Ferreira, ex-1.º Cabo (Bafatá e Teixeira Pinto, 1967/68)

Guiné 63/74 - P9893: Em busca de ... (187): Maria Luísa procura ex-combatentes da CCAV 1693 e do BCAV 1915, camaradas de seu marido, falecido recentemente

1. Telefonou, para o nosso editor Luís Graça, a Maria Luísa, natural de/ou a residir em Valpaços, Trás-os-Montes, viúva do nosso camarada António Maria Ambrósio Fernandes. Trabalha numa escola e ficou viúva recentemente.

Deseja voltar a ir aos “encontros da Guiné” do pessoal da BCAV 1915* (Tigres da Guiné), mas deixou de ter contactos. Nunca mais recebeu nenhuma carta sobre os convívios. Ainda foram, em vida do marido, ambos, a dois encontros, um dos quais na Lousã. 

O marido era o 1.º Cabo Telegrafista António Maria Ambrósio Fernandes. Foi mobilizado pelo RC 3 de Estremoz e pertenceu à CCAV 1693 (Companhia independente), Nova Lamego e Piche, 1967/69.

Tinha-se reformado em dezembro de 2011 e morreu em 4 de fevereiro de 2012.

Emocionada, Maria Luísa prometeu-nos mandar duas fotos do marido, para conhecimento dos antigos camaradas, quando a filha que vive algures na região centro (Condeixa ?), vier a Valpaços. A filha escolherá, digitalizará as fotos e enviará para o nosso blogue, já que está mais à vontade com o computador.

A Maria Luísa não tem email. Gostava muito de voltar a encontrar e a conviver com os antigos camaradas do marido. Viu o nosso blogue e pensou que a podíamos ajudar.

Tem o telemóvel: 963 603 480

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Divisa: ...na guerra conduta mais brilhante


BATALHÃO DE CAVALARIA N.º 1915 (BCAV 1915, GUINÉ 1967/69)


Mobilizado no RC 3, em Estremoz, desembarcou em Bissau em 14 de Abril de 1967, não dispondo de companhia operacionais no seu quadro orgânico.

Em 15 de Abril de 1967 rende o Batalhão de Caçadores nº 1856, assumindo o Sector L3, sediado em Nova Lamego, ao qual pertenciam os subsectores de Bajocunda, Canquelifá, Buruntuma, Piche, Madina do Boé e Nova Lamego.

Em 1 de Julho de 1967 o subsector de Piche foi integrado no Sector L3, tendo sido retirado ao Sector do Batalhão de Caçadores nº 1877. Foi rendido pelo Batalhão de Caçadores nº 1933 e transferido para o Sector O1, com sede em Bula.

Em 18 de Fevereiro de 1969 foi rendido pelo Batalhão de Caçadores nº 2861 e regressou à metrópole em 03 de Março de 1969.

Vd. página do BCAV 1915 "Tigres da Guiné" em http://josetito1.blogspot.pt/ do nosso camarada José Tito


COMPANHIA DE CAVALARIA N.º 1693 (CCAV 1693, GUINÉ 1967/69)

Mobilizada no RC3 de Estremoz, desembarcou em Bissau em 15ABR67.

Em 15ABR67 seguiu para Nova Lamego a fim de efectuar o treino operacional sob a orientação do BCAV 1915 e seguidamente constituir a subunidade de intervenção e reserva do Agr1980, em substituição da CCAV 1662.

Em 20SET67 foi rendida pela CART 1742, tendo seguido para Bula a fim de substituir a CCAÇ 1496 no sector do BCAÇ 1876 e depois do BCAV 1915.

Em 18 FEV69 foi substituída pela CCAÇ 2466 e recolheu a Bissau a aguardar embarque.

Regressou à Metrópole em 02MAR69
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 29 de Janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9417: Em busca de... (181): Camaradas que tenham pertencido ao BCAV 1915 ou BCAÇ 2861 (Bissorã e Bula, 1968/69)

Vd. último poste da série de 23 de Abril de 2012 > Guiné 63/74 - P9785: Em busca de ... (186): Esquadrão de Reconhecimento (EREC) 8740/72 (Bula e Bissau, 1973/74) (Nelson Manuel Maduro / Júlio Maduro Simões, Rio de Couros / Ourém)

Guiné 63/74 - P9892: Os nossos últimos seis meses (de 25abr74 a 15out74) (13): Em Bambadinca, em agosto de 1974, eu (e outros camaradas) fui sequestrado, feito refém e ameaçado de fuzilamento por militares guineenses das NT... Cerca de 40 horas depois, o brig Carlos Fabião veio de helicóptero com duas malas cheias de dinheiro, e acabou com o nosso pesadelo (Fernando Gaspar, ex-Fur Mil Mec Arm, CCS/BCAÇ 4518, 1973/74)

1. Mensagem do nosso leitor (e camarada) Fernando Gaspar, ex-Fur Mil Mec Arm, CCS/BCAÇ 4518 (1973/74) (*)






Data: 11 de Maio de 2012 22:30

Assunto: Bambadinca 1974


Boa noite, Luís


Fui furriel miliciano com a especialidade de mecânico de armamento e fui incorporado no Batalhão [de Caçadores] 4518 para a Guiné... [, imagem à esquerda: emblema do batalhão, disponibilizada pelo ex-Alf Mil Joaquim Tinoco, organizador do 
 XI Almoço Convívio da 1.ª Companhia do BCAÇ 4518/73, realizado em 28 de abril de 2012, em Montemor-o-Velho].

Após o 25 de abril de 1974, fui destacado para Bambadinca para receber material militar, viaturas, armas, etc.


Em agosto de 1974 (não consigo memorizar o dia), os militares presentes no destacamento de Bambadinca (eu incluído), foram surpreendidos com a presença de dezenas de militares do denominados Comandos Africanos(tropas nossas aliadas).

Todos nós (talvez duas dezenas),  ficámos perplexos... primeiro pensámos que vinham entregar as armas (o que nos facilitava o regresso a Portugal), mas não! Fomos encostados à parede e deram um prazo de 48 horas para serem pagos da indemnização a que tinham direito, ou então, seríamos fuzilados... 

Cerca de 40 horas após o sequestro, o brigadeiro Carlos Fabião chegou num helicóptero com duas malas carregadas de dinheiro... Terminou o sequestro!

Se através do teu blogue for possível reencontrar esses camaradas de armas, ficarei muito agradecido.

Até sempre

um abraço
Fernando Gaspar

2. Comentário de L.G.:

Meu caro Fernando, muito obrigado pela coragem de vires, a público, revelar esse segredo, que possivelmente guardavas há muito na tua memória... De qualquer modo, o  que nos contas - ao fim destes anos todos - e que deve ter isso um pesadelo para ti e para os demais camaradas que foram feitos reféns, já não era segredo para mim... Já aqui transcrevi, ao de leve,  uma conversa que tive, em Monte Real, por ocasião do nosso VII Encontro Nacional, com o último comandante do Pel Caç Nat 52, o alf mil Luis Mourato Oliveira, filho de mãe lourinhanse [, foto à direita].

Ele também estava em Bambadinca, sentado tranquilamente no bar de oficiais, quando ocorreram os graves incidentes a que te referes...  Foi igualmente sequestrado como tu,  e mantido como refém até à chegada do brigadeiro Carlos Fabião, que, vindo de Bissau,  resolveu o problema com patacão... 

Isto ter-se-á passado não com o Batalhão de Comandos Africanos, como tu sugeres,  mas com o pessoal da CCAÇ 21, que era comandada pelo tenente comando graduado Jamanca, e onde havia antigos militares da formação inicial da CCAÇ 12 do meu tempo (1969/71)...  Disse-me o Mourato Oliveira que, depois da negociação com o Carlos Fabião, houve grande ronco, os nossos camaradas guineenses da CCAÇ 21 gastaram rapidamente a massa, trocando o último dinheiro português  por rádios, roupas, motorizadas  e outros bens de consumo...

Semelhantes incidentes (graves) deram-se em Paúnca, pela mesma altura, com a malta da CCAÇ 11, já relatado pelo nosso camarada J. Casimiro Carvalho. (**)

De qualquer modo, esperamos que tanto o Fernando Gaspar como o Luís Mourato Oliveira nos possam fornecer mais pormenores destes tristes acontecimentos que poderiam ter originado um tragédia imensa,  se as ameaças de fuzilamento dos reféns fossem levadas a cabo pelos militares revoltosos da CCAÇ 21. 

O alferes comando graduado Amadu Bailo Djaló [, foto à direita,] também pertenceu a essa companhia, que era inteiramente constituída por pessoal do recrutamento local (incluindo os quadros e os especialistas). No entanto, nas suas memórias (Amadu Bailo Djaló - Guineense, comando, português: 1º volume: comandos africanos, 1964-1974. Lisboa: Associação de Comandos, 2010, 299 pp.), não são evocados explicitamente os incidentes de Bambadinca (vd. pp. 276 e ss.). 

Talvez o nosso camarada Virgínio Briote [, foto à esquerda,] que o ajudou a escrever o livro, possa esclarecer o que se passou exatamente nesses dias de agosto de 1974 em que a CCAÇ 21 (ou parte do seu pessoal, possivelmente até à revelia do seu comandante, Abdulai Jamanca, que virá a ser fuzilado pelos nossos senhores da Guiné-Bissau, por altuiras do nosso 11 de março de 1975, segundo informação do Amadu Djaló, p. 281) tomou como reféns cerca de duas dezenas de militares metropolitanos que ainda restavam em Bambadinca.


sábado, 12 de maio de 2012

Guiné 63/74 - P9891: Contraponto (Alberto Branquinho) (44): Se estou grávido ou não, não sei, mas...

1. Mensagem do nosso camarada Alberto Branquinho (ex-Alf Mil de Op Esp da CART 1689, , Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69), com data de 7 de Maio de 2012 com mais um "Contraponto".

Olá Carlos, boa tarde.
Boa tarde, com esta chuva? Why not?
Aqui estou a enviar-te um texto escrito há uns dias, que creio deverá ser o 44. Ou não?
Espero inclui-lo no segundo e último livro sobre a experiência da Guiné: "Ultima CAMBANÇA".

Um abraço
Alberto Branquinho


CONTRAPONTO (44)

 GRÁVIDO?

O capitão miliciano, que comandava a Companhia ali aquartelada, acercou-se da mesa feita de tábuas de caixotes onde um alferes jogava à sueca com outros militares. Jogavam de forma agressiva, brandindo as cartas como se fossem armas, numa concentração total.

O capitão miliciano dirigiu-se ao alferes:
- Antunes, não se esqueça que é você a sair hoje à tarde, antes do jantar.

O alferes não deu sinal de ter ouvido nem manifestou o mínimo respeito hierárquico.

- Antunes, estou a falar consigo. É você que tem que sair mais logo, antes do jantar. Avise o seu pessoal.
- Está bem, chefe – disse sem levantar a cabeça. E continuou a jogar.

- Você ouviu o que eu disse ou não?

O alferes olhou-o, segurando uma carta:
- OK, chefe. Já ouvi.

O capitão afastou-se, com aspecto agastado.

Um outro alferes observava, de longe. Quando o capitão se afastava, seguiu-o com o olhar. Então recordou uma cena ocorrida em Mafra quase no período final da instrução, pouco tempo antes de receberem as divisas de aspirante.

Um grupo de cadetes, onde estava incluído, olhava de longe, com sorrisos irónicos, um grupo de militares com mais que trinta anos, cujas calças e camisas denunciavam serem novos na tropa. Toda a roupa era demasiado grande ou lhes assentava mal nos corpos. Para os cadetes, já inseridos na instituição militar, da qual já tinham absorvido os princípios e comportamentos, aqueles militares pareciam extraterrestres, caídos ali na parada da Escola. Um sargento, novo, aprumado, possivelmente motivado pela função que estava a desempenhar, estava a dar-lhes instrução designada “ordem unida”. Formados a três mantinham o mesmo aspecto desalinhado, mal acomodados dentro das fardas. Até as botas pareciam estar demasiado grandes. Se observados de perto, os rostos transmitiam raiva, indisposição e, até, desespero.

Depois de um período de marcha, durante a qual alguns seguiam de passo trocado, o sargento ordenou alto. A seguir: “Direita volver”. Uns quantos “volveram” para a direita, outros para a esquerda, ficando alguns face a face, cada um interrogando o outro com o olhar: “Estarei certo e tu errado?” Então, o sargento disse que se virassem para ele em “À vontade”.

Para os cadetes, que observavam de longe, aquilo era hilariante. As cenas que aqueles “velhadas” estavam a fazer! Passado pouco tempo, o sargento: “Firme! Sen… up!” Encaminhou-se, então, para a direita da formatura e berrou: “P’la direita – perfilar!”.

- Tronco para fora! Barriga para dentro!

Com a mão levantada foi verificando o alinhamento. Depois caminhou um pouco, para o meio da formatura e postou-se em frente de um, detentor de uma portentosa barriga e exclamou:
- Ó meu tenente! Parece que está grávido!

Inesperadamente, veio a resposta numa voz altissonante:
- Se estou grávido ou não, não sei. Mas que me foderam bem fodido, isso é verdade.

(Era um curso de capitães milicianos que começara nesse mesmo dia).
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 9 de Março de 2012 > Guiné 63/74 - P9587: Contraponto (Alberto Branquinho) (43): Guerra Colonial - Tarrafal 50 anos Depois

Guiné 63/74 - P9890: Estórias do Juvenal Amado (42): O arroz do nosso descontentamento

1. Mensagem do nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74), com data de 7 de Maio de 2012:

Carlos, Luís, Magalhães e restante Tabanca Grande
Este é um texto sobre um improvável interesse em relação a um produto que nos acompanhou de forma quase tão constante como as botas ou a G3.
Sobre os benefícios e malefícios do arroz muito foi escrito, mas o que chegou até nós, foi a memória de tempos difíceis como soldados naquela terra que se estranhou e que depois, se entranhou em nós até aos dias de hoje.
As fotos são do meu camarada Caramba e mostram o Restaurante da Morte Lenta em Galomaro, em todo o seu explendor.

Juvenal Amado


ESTÓRIAS DO JUVENAL (42)

NA GUINÉ O ARROZ DO NOSSO DESCONTENTAMENTO

Portugal é por herança dos árabes um dos países europeus que cultiva arroz no seu território. Devido ao Advento dos Descobrimentos onde cerca de 100.000 homens embarcaram nas caravelas à conquista de novos Mundos, foi necessária a importação de mão de obra africana, que colmatasse a falta de braços para cultivar os nossos campos e assim também o arroz. Este veio tornar-se da máxima importância, sendo a sua cultura depois distribuída pelos novos territórios das descobertas. Fácil de transportar e de armazenar, utilizável em qualquer situação, o arroz é consumido por mais de metade da população Mundial, com muita incidência no III Mundo onde é um poderoso antídoto contra a fome.

Esses mesmos trabalhadores possivelmente guineenses ou daquela região, fruto da escravatura, diluíram-se posteriormente nas sucessivas gerações e os descendentes, continuam por aí, como provam especialmente as mulheres de tez morena, lábios carnudos, belíssimos cabelos negros encaracolados e não menos belos bronzeados, quando apanham um pouco de sol.

A inegável beleza da mestiçagem bem patente.

Eu nunca fui grande apreciador de arroz, mas o dito é uma parte importante da nossa gastronomia e foi muito importante na guerra. Os exércitos só se movem de barriga cheia, isso quer dizer, que arroz e feijão estão em lugares cimeiros na dieta dos combatentes.

Em tempo de fartura ele come-se em sopa, quem não gosta de um arroz de feijão, malandrinho, de pimentos, de tomate, com grelos, com iroses, de lampreia, arroz doce, de marisco, de peixe, de polvo, com pasteis e no “Pó de Arroz” que o nosso malogrado Carlos Paião tão bem cantava.

Enfim, é um sem fim de iguarias que o nosso arroz tem por base.

Tempos houve que quase foi banido por ser considerado um perigo para a saúde pública, acusando a sua cultura de mais maléfica do que benéfica. Mudam-se os tempos e mudam-se os conhecimentos e aconselham-nos a ter cuidado com certezas e fundamentalismos. Como noutros casos que são bem actuais, misturou-se politica, saúde e interesses económicos, tendo estes sempre a última palavra.

A minha mãe também pegava na colher de pau e dizia, com um olhar carregado de ameaças: “Anda cá que eu já te dou o arroz”!

Mas com a minha ida para a Guiné, o dito atingiu outros patamares gastronómicos de qualidade “insuspeitável”. Lá era sempre branco. Acompanhava feijoadas, “Estilhaços à Chefe”, com gorgulho, com sardinhas de conserva, com salsichas, com Corned Beff, em alguns destacamentos com marmelada, etc, etc..

Era tão importante que quando ele faltava, tínhamos que por vezes com assinaláveis riscos por picadas pouco seguras e até de travessias de rios em canoas, (como aconteceu algumas vezes no Saltinho) de o pedir emprestado a um quartel vizinho, quase como quem pede hoje uma chávena de arroz à vizinha do 2.º esquerdo, salvo as distâncias da comparação.

Dificilmente os nossos cozinheiros: Nascimento, Esteves, “Risinho” e o ajudante Borrego, teriam pretensões a chegar às tão almejadas estrelas Michelin e se não fossem os conhecimentos dos ajudantes africanos, o caso atingiria foros de tragédia.

Ele ficaria como uma bosta branca tipo papa, que se pegava de tal maneira a tudo, e quando se virava o prato ao contrário ele nunca caía. Os nossos especialistas cozinheiros, confeccionavam-no mais ao menos como foi usado para construir a famosa Muralha da China, com os resultados que todos sabemos ou ouvimos falar.

Está lá há muitos anos e até a única coisa construída pelo homem, que é avistado pelos astronautas nas viagens espaciais.

Mas os ajudantes de cozinha africanos cozinhavam-no ao vapor com um sabedoria difícil de igualar, deixando-o solto, que até parecia milagre para quem ainda cá na Metrópole o tinha gramado da forma argamassa que a tudo se colava.

Galomaro City > Restaurante da Morte Lenta

Quando regressei cumprido que foi o serviço militar na Guiné, o dito cujo foi praticamente banido da minha alimentação durante anos, na companhia das tão celebradas latas de conservas. Hoje já o como nas variadas formas com moderação e há uns tempos de visita a uns amigos angolanos, fui surpreendido com arroz de atum superiormente confeccionado pela Dona Verónica, matriarca da família.

Acompanhado com banana, uma belíssima salada a fazer lembrar aromas e sabores africanos… não é que fiquei fã?

Só provando se pode dar o valor.

Um abraço para todos.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 31 de Março de 2012 > Guiné 63/74 - P9685: Estórias do Juvenal Amado (41): Um drama causado pelo esquecimento dum carteiro

sexta-feira, 11 de maio de 2012

Guiné 63/74 - P9889: O Nosso Livro de Visitas (136): Lázaro Ferreira, ex- fur mil art, GA 7, Bissau, Gadamael e Ingoré (de 23 de março a 8 de setembro de 1974), advogado em Braga



Guiné > Região de Tombali > Carta geral da província (1961) (Escala 1/500 mil) > Posição relativa de Cacine, Gadamael Porto e Guileje, junto à fronteira com a Guiné-Conacri.

1. Mensagem do nosso leitor (e camarada) Lázaro Ferreira:

De: Lázaro Ferreira 


Data: 8 de Maio de 2012 17:26
Assunto: Guiné 23/03/1974 a 08/09/1974


Luí
s Graça, Camarada.

Há dias recebi um telefonema de Manuel Vaz, da Póvoa de Varzim, que conseguiu o meu contacto através de um camarada dos lados de Barcelos que me conhecia.

Pediu-me umas informações sobre a Guiné e fez –me umas perguntas, ao que julga relacionadas com o ataque a Gadamael 1973, ao que lhe respondi que cheguei à Guiné, [já em 1974. ] em rendição individual, era da artilharia pesada e estive em Gadamael, depois em Ingoré, e em 8 de Setembro, 2 dias antes da independência, regressei a Portugal.

Gosto do teu blogue. Neste momento não tenho mais tempo para fazer algumas narrativas, mas num dia destes e. se possível ao fim de semana, procurarei contar algumas coisas porque todos nós temos sempre qualquer coisa a ser avaliável por leitor atento e se possível um qualquer historiador da grã-tabanqueira.

O Manuel Vaz [mostrou]  elevada simpatia e curiosidade por encontrar mais um dos piras que esteve nos lados da África Ocidental, em algures da Guiné, nos anos 74.

Algumas minhas referências: 

(i) bfui furriel miliciano (, ecusei ser oficial);
(ii) sou advogado, licenciado pro Coimbra;
(iii) tenho gabinete na cidade dos arcebispos e dos (…), em Braga, junto ao Banco de Portugal / Caixa Geral de Depósitos;
(iv) já estive em alguns casos mediáticos e procurei sair-me bem.

Contacto do escritório: telef. 253 617 048.

Um abraço e bem ajas.
 Lázaro Ferreira

2. Comentário de L.G.:

Já contactei o Lázero, por tefone... Pareceu-me um tipo porreiro, descontraído, com imensa vontade de contar história do seu tempo do GA 7 (Bissau), Gadamael e Ingoré. 

Pelo que me contou,  a sua partida para a Guiné foi adiada com a revolta das Caldas da Rainha, em 16 de Março de 1973. Partiu a 23. Antes disso, passou pelas Caldas da Raínha e Vendas Novas. Estudou no seminário de Braga, tinha habilitações e aproveitamento, na  recruta,  para ir para o COM. Não quis aceitar a proposta do comandante da companhia de instrução, no CSM, porque achava que corria o risco de ir parar a atirador de infantaria.

Passou pelo GA 7, e esteve três meses em Gadamael, julgo que de abril a junho... Pelas minhas contas,  pertenceu ao 23º (ou 15º) Pel Art, comandado pelo nosso camarada C. Martins. Acontece que o Lázaro não se lembra (o que é normal) do nome do alferes do Pel Art.  Apanhou os primeiros contactos com a malta do PAIGC. Diz que era um tipo popular, bom jogador de pingue-pongue, esquerdino... 

Relata-me um episódio que o marcou-..Já com os obuses desativados (possivelmente em junho de 1973), o nosso "pira" foi para fora do quartel, mais uns tantos melros, dar uns tiros ao alvo, no mato... O que causou, naturalmente, algum alvoroço no quartel... O que valeu é que tinham levado rádio... Podiam ter apanhado com umas obusadas, se a ariilharia não estisse já deativada... Falou-me de alguns nomes, como o cozinheiro Tin-tin, de um jogador de futebol (cujo nome não fixei)... Talvez o C. Martins se lembra deste seu furriel, o que também é pouco provável, dado o pouco tempo que estiveram juntos...

Depois disso, foi para Ingoré, na fronteira com o Senegal,  onde fez a retração do aquartelamento. Passou lá muita fominha, ele depois nos contará os detalhes,  Voltou à metrópole em 8 de setembro... Estudou e viveu em Coimbra (a partir de 1978). Ficou de mandar fotos de Gadamael. E de se inscrever no blogue, na sequência do meu convite pessoal.

Quero dizer ao Lázaro que foi um prazer  falar com ele e que à volta cá o espero... Cá o esperamos...

PS - A prova de que o Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande: quando estava a falar, disse-me que tinha, naquele momento, um cliente, que também tinha estado na Guiné, em 1967/69, em Mansoa... e que a sua esposa era  uma das libanesas da terra.

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Nota do editor:


Último poste da série > 8 de maiode 2012 > Guiné 63/74 - P9868: O Nosso Livro de Visitas (135): José Ferreira, ex-1.º Cabo (Bafatá e Teixeira Pinto, 1967/68)

Guiné 63/74 - P9888: (Ex)citações (178): Estrutura do campo de minas (António Matos)


1. O nosso camarada António Matos, ex-Alf Mil Minas e Armadilhas da CCAÇ 2790, Bula, 1970/72, enviou-nos uma mensagem a propósito da guerra das minas em Bula, publicada em 4 de Maio de 2012 no poste P9850, da autoria do nosso Camarada Luís Faria e onde havia colocado o seguinte comentário: 

"Caro Luís, viva!

Mais uma vez dou uma espreitadela ao blog, rodopio o botão do rato 1/2 dúzia de vezes e detenho-me nesta tua dissertação àquelas aventuras danadas que vivemos conjuntamente. 

Venho aqui para te mandar um abraço e faço-o com a possibilidade de ser extensível a toda a rapaziada que o queira receber.

Falaste de minas e provocaste-me aquele ódio de estimação que elas ainda hoje me causam.

Regredindo àqueles anos 1970/72, plantados que fomos em terra Balanta, acampados em Bula e na área que hoje chamaríamos de grande Bula (à semelhança do grande Porto ou grande Lisboa)- Augusto Barros, Mato Dingal e João Landin - dou por mim, uma vez mais, a suar frio e a acelerar o ritmo cardíaco enquanto desfilam em frente aos meus olhos fechados as mais dilacerantes cenas de gritos de dor por partes do corpo arrancadas brutalmente pela deslocação de ar e perante a impotência de evitar o mal que se instalara já...

Aproveito, entretanto, para mandar uma boca sobre o croqui que desenhaste sobre a disposição das minas nos cachos pois não está correcto.

A incorrecção está no facto de mencionares ( se bem entendo o desenho ) 5 minas por cacho quando elas eram apenas 4: a célebre portuguesa colocada na perpendicular à linha imaginária entre os dois pontos escolhidos como referência do troço e a 1 metro e 1/2 dessa linha; depois e em relação a esta mina, havia outra a 1 metro e 1/2 para a esquerda, outra a 1 metro e 1/2 para a direita e outra ainda a 1 metro e 1/2 para a frente.


Estas 4 minas desenhavam um semi-círculo cujo seguinte mantinha a mesma estrutura mas do lado oposto à tal linha imaginária e assim sucessivamente ao longo de 9 kms e em duas fiadas mais ou menos paralelas.


A densidade de minas por metro quadrado era imensa e tornava-se tarefa quase impossível atravessar o campo sem accionar uma delas.

Já muito se escreveu sobre o número que tu referes como tendo sido um total de 10.000 engenhos.

Eu faço um desafio: se calcularem haver 12 minas colocadas por cada 10,5 metros e se depois multiplicarem por 2 (foram 2 fiadas paralelas), verão que o total foi de 20.000 minas!

Quanto à finalidade daquele campo de minas, tens razão nos teus argumentos pois aquela arma de guerra tinha como finalidade primeira o dificultar dos reabastecimentos entre o IN instalado em Ponta Matar e o de Choquemone (este mais saltitão).

A esta distância ponho-me a pensar no confrangedor amadorismo com que encetámos aquela tarefa a qual era observada pelo inimigo empoleirado nas árvores de tal modo que só apanhámos indivíduos avulso enquanto o Nino passava com várias dezenas de guerrilheiros e não accionavam uma única!

Sirva-nos a experiência para sermos fervorosos pedagogos na abolição de tão execrável material de guerra nos conflitos que por aí andam..."

Camaradas,

Aproveito também para referir que ao reler um comentário que fiz ao poste P9850 do Luís Faria - "Viagens... 52"- convenci-me que pode ter ficado pouco clara a descrição que feita.

Peguei numa folha de papel e rabisquei a estrutura do campo de minas (Bula - S. Vicente) em complemento ao tal comentário.

Anexo esse papelucho pela curiosidade que possa provocar aos que não viveram este tipo de situações. 


Abraços fraternos,
António Matos
Alf Mil Minas e Armadilhas da CCAÇ 2790
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Nota de M.R.: