quinta-feira, 3 de abril de 2014

Guiné 63/74 - P12928: Um Amanuense em terras de Kako Baldé (Abílio Magro) (12): Guerra copofónica

1. Em mensagem do dia 28 de Março de 2014, o nosso camarada Abílio Magro (ex-Fur Mil Amanuense. CSJD/QG/CTIG, 1973/74), reaparece com uma perigosa história de guerra (copofónica) vivida nas perigosas matas da cidade de Bissau.


Um Amanuense em terras de Kako Baldé

(Para quem não sabe, Kako Baldé era o nome por que era conhecido, entre a tropa, o General Spínola. Kako – (caco) lente que o General metia no olho. Baldé – Nome muito comum na Guiné)

12 - Guerra copofónica

Pelas tarefas que desempenhava na CSJD/QG/CTIG (Serviço de Justiça), fui-me apercebendo que muitas doenças, ferimentos e até mortes eram resultantes do abuso na ingestão de bebidas alcoólicas mas quem, durante a sua comissão, não apanhou a sua "tosgazita"?
Porém, quando estamos num TO e somos possuidores de uma arma de guerra, uns copitos com os camaradas e algum descontrolo, podem resultar em tragédia.

Este pequeno episódio que se passou comigo é bem elucidativo disso mesmo, e se o multiplicarmos por dezenas, ou até centenas (durante toda a guerra colonial, talvez milhares) e o transpusermos para uma qualquer Companhia do mato, não será difícil adivinhar a quantidade de incidentes com finais trágicos que ocorreram durante aquela guerra.

Numa das minhas muitas seguranças nocturnas que fiz às instalações da PIDE-DGS em Bissau, junto ao bairro do "Pilão", comandando um pequeno grupo de 6 ou 7 homens, deu-se um episódio que me deixou bastante incomodado e "acagaçado".

O pessoal que integrava estes pelotões pertencia à CCS/QG e apresentava-se à noite, para efectuar o "serviço", já bastante cansado das muitas picadas percorridas durante o dia entre gabinetes e, alguns, com muitas paragens para reabastecimento no Bar.

Por norma, estacionávamos numa pequena ruela, nas traseiras da DGS, que dava acesso ao Bairro do Cupilom e ali, junto a uma palhota, o pessoal "ferrava o galho" com uma "pinta do caraças"! Eu nunca dormia e não era por medo ..., não senhor! Era pelo meu elevado sentido de responsabilidade e pela obrigação moral de zelar pelo merecido descanso daqueles bravos militares.

Nessa noite, íamos talvez fazer o turno das 00h00 às 04h00 e tínhamos acabado de chegar ao "objectivo" quando entra na ruela um táxi conduzido por um negro e com um "pendura" negro também. De repente, um "fabiano" do pelotão manda parar o táxi, puxa a culatra atrás, e apontando a arma ao "pendura", indaga:
- Quem és tu, para onde vais!?

Oh balha-me Deus, carago, que é isto!? - Pergunto-me a mim próprio, completamente embasbacado.

Passados uns segundos logo me apercebi que o "fabiano" estava com uma valente "tosga", daquelas chamadas de "caixão à cova". Ai meu Deus se o gajo diapara aquela merda!

Com pinças e tentando manter a calma do "fabiano" (eu tremia todo e devia estar azul - ai s'aquilo dispara!), a muito custo, mas muito de levezinho, lá consegui retirar-lhe a arma e desarmá-la, apetecendo-me logo de seguida dar-lhe uma valente coronhada na "tola", mas lembrando-me de algumas "tosgas" próprias, lá pedi desculpas ao taxista & Cª e mandei-os seguir viagem.

Pelo "telemóvel" contactei o Alferes Miliciano de prevenção (um amigo dos tempos do QG de Lisboa) e, com receio de possíveis escutas, disse-lhe apenas que precisava da presença dele pois havia um pequeno problema.
Apareceu passado pouco tempo de Unimog e com mais um pelotão, meio embasbacado também por não perceber o que se estava a passar.

Chamei-o à parte e lá lhe contei o que acontecera. Substituiu-se o "fabiano" que seguiu de Unimog para o Quartel e tudo o resto decorreu normalmente.

Acordamos depois que não faríamos qualquer participação e o "fabiano" livrou-se duma valente "porrada".

Eu ..., apanhei mais um valente "cagaço".
____________

Nota do editor

Último poste da série de 24 DE SETEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12080: Um Amanuense em terras de Kako Baldé (Abílio Magro) (11): Djassi, o ordenança

8 comentários:

JD disse...

Caro Abílio,
Bom regresso ao meio tabancal. A minha intervenção agora tem a ver com o epíteto "fabiano". Retenho que foste contemporânio do Fabião, pelo que associo o termo ao nome do futuro comandante da entrega da Guiné.
Asim, peço-te para me esclareceres, se sim, ou não, a associação existe, e em que circunstâncias o pessoal recorria ao termo "fabiano".
Um abraço
JD

Abílio Magro disse...

Caro JD:
"Fabiano" nada tem a ver com o Brig. Carlos Fabião e trata-se de um termo que ouvi algumas vezes ser usado por militares do QP quando se queriam referir a um qualquer militar do QC e outras pessoas usam-no em vez de "fulano", por brincadeira, como é o meu caso.
Durante a minha passagem pela Guiné nunca me apercebi de que fosse comum entre os militares.
Abraço

Abílio Magro disse...

O texto que enviei terminava assim:
Eu ..., apanhei mais um valente "cagaço".
O camarigo Carlos Vinhal resolveu não incluir a última frase que, efectivamente, é perfeitamente desnecessária por se encontrar sobejamente implícita nos outros post's que enviei.
Sempre atento o nosso Editor-Mor!
Abraço

Abílio Magro disse...

fabiano
adjetivo
HISTÓRIA relativo a Fábio, general e estadista romano (275-203 a. C.)
nome masculino
1. HISTÓRIA antigo sacerdote romano
2. popular indivíduo indeterminado
3. popular indivíduo inofensivo
4. membro da associação socialista inglesa, Fabian Society, criada em Londres em 1863
(Do latim Fabiānu-, «Fabiano»)

fabiano In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2014.

JD disse...

caro Abílio,
Muito obrigado pela diligência explicativa. Com isto acabo de enriquecer o meu léxico.
Manda mais, que voltarei a pedir-te ajuda, se me esquecer da Infopédia.
Um abraço
JD

Carlos Vinhal disse...

Calma e pára o baile!!!
O editor não corta nada, pelo menos sem antes "conversar" com o autor dos textos.
Não consigo justificar a falta da última frase que já foi posta no seu sítio.
Ao camarada Abílio Magro as minhas desculpas.
Carlos Vinhal
Co-editor

Abílio Magro disse...

Ok, siga o baile!

Hélder Valério disse...

Caros camaradas

Já fazia tempo que não tínhamos recordações de Abílio Magro (amanuense, porra!), lembram-se?

E desta vez contempla-nos com um pedaço da sua vida atribulada em Bissau.
O 'pessoal do mato' costuma falar depreciativamente dos que estavam em Bissau. É natural, faz parte do modo de estar em zona de guerra, essa confrontação entre os que estão 'no mato' e os que estão no 'bem bom', no 'ar condicionado'...

Mas, a verdade, é que várias situações perigosas também aí sucediam. Quem não se lembra das questões, com vítimas, entre elementos das nossas "especiais"? Dos problemas com os fuzileiros? E os paraquedistas? E o Pilão (Cupilom)?
Portanto, este relato é apenas mais uma amostra de como nem tudo era 'pêra doce'.

Abraço
Hélder S.