1. Em mensagem do dia 19 de Maio de 2009, recebemos de António G. Matos (*), ex-Alf Mil MA da CCAÇ 2790, Bula, 1970/72, este texto referente à Operação Restolhada efectuada no Choquemone:
Há nomes que, só de se ouvirem pronunciar, causam náuseas e mal estar.
Exemplos são, Hitler, Alzheimer, Parkinson, e, mais recentemente um tal de AB que no entanto não tem a categoria dos anteriores que o catapulte para a notoriedade.
Ficará rasteiro, ao nível do chão em terra batida, emporcalhado com um mergulho que o obrigaram a dar na caca que ele próprio largou, mal cheiroso e envergonhado com uns óculos de marca cujas lentes teriam já caído.
Perdeu completamente o estatuto de tio AB e deixou-nos o terreno livre para falarmos dos outros.
Desses, Hitler personifica o Mal;
Alzheimer e Parkinson ligam-se à medicina e às doenças do foro neurológico como sabemos.
Não me sinto minimamente habilitado a dissertar sobre tais figuras, mas são conhecidas as maleitas das doenças que são catalogadas pelos seus nomes; esquecimento, falta de controlo de movimentos, apatia crescente, tudo em crescente e, finalmente a morte.
Ora, enquanto somos poupados a tal diagnóstico, vamos brincando com uma ou outra dificuldade que se nos vai deparando, tentando com isso justificar a falta de ideias para escrever mais posts para o blog.
Seviu toda esta divagação para dizer que tenho apreciado a memória que muitos dos camaradas demonstram ter ao referirem nomes de operações, datas, pormenores, etc., quando comigo não se passa isso.
É claro que recordo as cenas de pancadria, fogachada, acidentes, mas os nomes e as datas, vai lá vai, até a barraca abana !!!...
Por outro lado sempre achei muita piada aos nomes com que se baptizavam as ditas operações e a mim calharam-me algumas cuja designação não associo ao objectivo.
Uma delas foi a "Restolhada" que teve variadíssimas sub-empreitadas uma das quais ao Choquemone.
Se não foi, não vem daí mal ao mundo, mas vamos admitir que foi, ok?
Essa operação tinha como objectivo travar-nos de razões com os lindinhos (agora parece mal dizer nharro, turra, ou escarumba, mas na altura era assim mesmo que eram conhecidos os nossos irmãos e, por outro lado, não parecem nada mal os nomes com que eles nos mimavam, claro, mas isso agora não interessa nada) e depois de os desalojar da toca, apareceriam as tropas especiais (?!) para os apanhar à mão. Manga de ronco!
Mas a estória pretende relatar a aproximação final ao objectivo e tentar dar uma ideia, pálida que seja, às pessoas que não tendo passado por experiência semelhante, tenham a curiosidade de entender o contexto.
Depois de várias horas de progressão durante a noite, fez-se a pausa final, não tanto para descansar, mas para tornar o dispositivo controlável e eficaz.
Uma das artes da guerra era baralhar o inimigo e surpreendê-lo na sua própria casa.
Os nossos handicaps para além de não conhecermos o terreno era a circunstância de não abandonarmos os feridos nem os mortos no local da contenda enquanto essa era a metodologia deles.
Havia, pois, que usar da astúcia considerada mais adequada às circunstâncias e nesse dia (ou melhor, nessa noite), nos momentos anteriores ao assalto final, foi pedido o apoio dos obuses de Bula numa táctica parecida com os miúdos da aldeia que mijam para as tocas dos grilos para eles saírem, sabem?
O problema foi localizar o objectivo do tiro.
Às perguntas do artilheiro de Bula, demos-lhe o que entendemos ser a melhor mira possível mas, pelo sim pelo não, pedimos alguma folga não fosse a canhoada caír-nos na cabeça!
A coisa foi arriscada!
A primeira fogachada caíu entre nós e os lindinhos!
Porra que isto está muito perto!
Eh pá, alarga o tiro senão ninguém chega hoje ao quartel!
De alarga-o-tiro-encolhe-o-tiro, conseguimos desalojá-los e pô-los em debandada.
Não nos coube a missão de correr atrás deles e considerámos isso a cereja no topo do bolo que oferecemos aos especiais.
Havia agora que sair dali antes que o prego torcesse o bico.
Chegados a Bula, houve abraços e uma sensação extremamente agradável de estarmos vivos!
O dia já ia alto e havia que recuperar forças pois a restolhada ia prolongar-se ...
Ainda hoje há muita restolhada por aí .....
António Matos
__________
Nota de CV:
(*) Vd. poste de 24 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4407: Meu pai, meu velho, meu camarada (4): Não é um elogio fúnebre que te quero dedicar... (António G. Matos)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário