terça-feira, 3 de novembro de 2015

Guiné 63/74 - P15322: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (100): Reencontrando o comandante Pombo, em 17/10/2015, na sede da AFAP - Associação da Força Aérea Portuguesa, em Lisboa, 41 anos depois da viagem que fiz com ele no seu Cessna dos TAGP, de Bissau até Catió, em 31/3/1974 (António Graça de Abreu)



Lisboa, sede da AFAP - Associação da Força Aérea Portuguesa > 17 de outubro de 2015 > Ao centro, o nosso grã-tabanqueiro, António Graça de Abreu, proferindo a conferência "Entender a China 2015. Viajar pelo mundo chinês”. Ele foi o convidado especial da AFAP na comemoração do seu XXXII aniversário (*). Foto: Cortesia da página da AFAP. [Edição: LG]



Mensagem do António Graça de Abreu [ex-alf mil, CAOP 1, Teixeira Pinto, Mansoa e Cufar, 1972/74, poeta, escritor e conhecido sinólogo]:


Data: 19 de outubro de 2015 às 15:28
Assunto: Com o comandante Pombo, na Guiné 1974 e em Lisboa, 2015


1. Sábado passado, dia 17 de Outubro, fiz uma conferência sobre a China (entusiasmante e participada) na Associação da Força Aérea, na Av. Gago Coutinho, Lisboa. Havia mais de vinte generais, e outros tantos coronéis. Até eu, pobre alferes, me senti importante com tão excelente assistência.

E estava lá o Pombo, dos TAGP (Transportes Aéreos da Guiné Portuguesa), o Pombo, grande senhor dos aviões e da vida, voando como um príncipe nos céus da Guiné no seu Cessna branco e vermelho dos TAGP.

Um abraço fortíssimo a esse homem de eleição, voando um dia comigo, ou melhor, eu com ele, em Março de 1974, desde Bissau até Empada e depois Catió.

O grande Pombo, excepcional piloto e extraordinária figura dos céus guineenses, antes e depois da guerra, agora algo alquebrado pela inevitável passagem dos anos, encostado por bem, à sua fascinante e colorida vassourinha brasileira.

Que gosto, que prazer estar, mesmo ao de leve, com esta boa gente, pedaços à solta de todos de nós! (**)


2. Do meu Diário da Guiné (Lisboa, Guerra e Paz ed., 2007, pag. 209), respigo o texto que escrevi na altura sobre voar com o comandante Pombo..


Cufar, 31 de Março de 1974

Prometi que só regressava a Cufar depois de ter resolvido o problema do meu substituto. Pois agora é verdade, já desencantaram o homem. É o alferes Lopes, apenas com quinze dias de Guiné. Tem a especialidade de Secretariado, estava exactamente destinado à 1ª. Repartição, em Bissau, e ou porque têm gente a mais ou porque eu os chateei demasiado nestes últimos dez dias, desviaram-no para Cufar. 

Encontrei-o na piscina do Clube de Oficiais, almocei com ele, animei-o –- está um bocado abalado com a vinda para o mato,–-  disse-lhe que Cufar é mauzinho mas se ele fosse atirador de Infantaria e tivesse sido colocado em Cadique ou Jemberém ou Gadamael, seria bem pior.

Tentei trazê-lo comigo mas não foi possível, vim na avioneta civil, o Cessna dos TAGP (Transportes Aéreos da Guiné Portuguesa) e só havia cinco lugares, todos ocupados. O Lopes chegará assim que houver disponibilidade de transporte.

Ainda não tinha experimentado voar nestes aviões pequeninos, mais bonitos e confortáveis do que as DOs. De manhã, no Depósito de Adidos onde se trata das viagens dentro da Guiné, ouvi falar num avião civil fretado pelo exército para transportar oficiais com destino a Empada e Catió. Agarrei-me logo. De Catió a Cufar podia fazer os dez quilómetros por estrada.

O Cmdt Pombo aos comandos do seu Cessna dos TAGP,
c. 1972/74  (Foto de Álvaro Basto, 2008)
Saímos de Bissau, voámos sobre Tite e a região do Quínara, atravessámos o rio Grande de Buba direitinhos a Empada, um aquartelamento importante já no sul da Guiné. Descemos em Empada, onde saíram dois alferes e entrou o meu coronel que estava na povoação numa espécie de visita de inspecção.

Fiquei admirado com a forma como voam os aviões civis. Já havia constatado que não tomam aquelas precauções todas contra os mísseis terra-ar do PAIGC, ou seja voar a mais de dois mil metros ou a "rapar", logo acima do solo, ou subir e descer em parafuso sobre as pistas de aviação. Foi a vez de experimentar pelos céus do sul da Guiné um voo quase normal, embora estivéssemos perfeitamente ao alcance dos mísseis IN, tanto mais que sobrevoámos à descarada zonas onde os guerrilheiros se movimentam com algum à vontade. Deve ser verdade, eles não atacam aviões civis e a avioneta, vermelha e branca é facilmente identificável cá de baixo. Se nos tivessem mandado abaixo seria um grande "ronco", éramos quatro alferes e, de Empada para Catió, ainda um coronel, o meu chefe (coronel pára-quedista João José Curado Leitão). Estas avionetas civis continuam a voar quase como nos bons velhos tempos e como o Cessna vinha relativamente baixo, distinguiam-se  trilhos utilizados pela população e pelos guerrilheiros nas áreas que controlam. Semi-escondidas nas florestas, adivinhavam-se umas tantas aldeias.

Em Catió, enquanto aguardávamos a escolta, bebi uns whiskies velhíssimos com o meu coronel e o tenente-coronel comandante do batalhão de Catió. Depois viemos para Cufar por estrada com vinte homens armados da CCaç 4740 a guardarem-nos as costas. Se tivéssemos sofrido uma emboscada, eu, que nem espingarda tinha, ficava logo ali como um passarinho. Esta deve ter sido a minha última "saída" para o mato.

António Graça de Abreu

___________________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 15 de outubro de 2015 > Guiné 63/74 - P15253: Agenda cultural (430): Conferência de António Graça de Abreu, "Entender a China 2015. Viajar pelo mundo chinês”, sábado, dia 17, pelas 11h30, em Lisboa, na sede da AFAP - Associação da Força Aérea Portuguesa, nas comemorações do seu 32º aniversário

1 comentário:

Anónimo disse...

Tantos Generais
Seria a General Elétrica?

M.R.P.Pinto