sábado, 10 de outubro de 2020

Guiné 61/74 - P21437: Fotos à procura de... uma legenda (133): Levantamento de um campo de minas A/P: chão felupe, setembro de 1974, uma notável sequência fotográfica do António Inverno (ex-alf mil Op Esp / Ranger, 1º e 2ª CART / BART 6522 e Pel Caç Nat 60, São Domingos, 1972/74)



Foto nº 1


Foto nº 2


Foto nº 3


Foto nº 4



Foto nº 5


Foto nº 6



Foto nº 7

Guiné > Região do Cacheu > Chão felupe > 1974 > BART 6522/72 (1972/74)


Fotos (e legendas):  © António Inverno (2010). Todos os direitos reservados.[Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. A propósito do Poste P21435 (*), achámos oportuno voltar a reproduzir uma notável sequência fotográfica de uma "desminagem", feita pela nosso camarada António Inverno (ex-alf mil Op Esp/Ranger, 1.ª e 2.ª CART / BART 6522 e Pel Caç Nat 60 (S. Domingos, 1972/74). As imagens foram hoje reeditadas e melhoradas. Não sabemos quem foi o fotógrafo, que também correu riscos: talvez tenha sido o fur mil Ferreira, que integrava o pequeno grupo de sapadores...

O poste P7480 (**)  tem já quase dez anos, e na altura não se pode dizer que tenha passado despercebido, uma vez que tem até agora cerca de 370 visualizações, mas sem qualquer comentário. Esperamos que desta vez os nossos leitores sejam mais generosos...


(...) A seguir anexo uma sequência de fotos de uma desminagem, efectuada por mim num campo de minas anti-pessoal, que eu havia montado numa zona descampada e que servia de protecção estratégica contra eventuais infiltrações do IN, por aquela parcela de terreno entre S. Domingos e Susana.

A instalação do dispositivo foi concretizada seguindo os habituais ensinamentos assimilados na instrução prática e teórica do CIOE [, Centro de Instrução de Operações Especiais].  partindo de um ponto de referência seguro e obrigatoriamente de fácil identificação no terreno, para melhor permitir, em dias futuros, também de modo perfeitamente seguro, o posterior efeito de levantamento.

A selecção de um ponto de referência único e inequívoco, e o desenho de um preciso e claro croqui, foi sempre a minha principal preocupação, pois podia dar-se o facto de não ser eu, quando necessário fazê-lo, a efectuar a sua desinstalação ou levantamento, com queiram chamar-lhe.

A instalação do campo em apreço, decorreu normalmente, mina a mina, calculando e preservando sempre o perigoso risco que representava o cumprimento rigoroso de uma missão destas.

Este sistema havia sido montado aquando da nossa chegada a Susana, em fins de 1972, e teve que ser levantado antes da nossa retirada em Setembro de 1974.

Penso que não era preciso dizer aqui que,  se a montagem foi, de algum modo, facilmente implantado no terreno, já não posso dizer o mesmo quanto ao acto de levantamento.

Quem sabe e/ou viu os efeitos físicos e psíquicos,  num ser humano, do rebentamento de uma mina anti-pessoal,  sabe do que eu falo.

Assim, lá parti para o terreno ciente que não podia errar, pois o lema que aprendera em Lamego com o monitor de Minas e Armadilhas, dizia que, com os explosivos deste género, só se podiam falhar 3 vezes: a primeira, a única e a última!

Tomadas todas as precauções e apesar da adrenalina e dos suores frios que nos causavam estes “trabalhinhos”, tudo correu bem felizmente.

Na última foto [, nº 7] podem ver um buraco com as ossadas de um pequeno animal, que morrera ao fazer detonar umas das minas.

Legendagem das fotos [, reproduzidas acima]:

"Melhor que uma excelente picagem, e tínhamos homens altamente especializados nessa matéria, era ter um detector de minas (metais)" [Foto nº 1]

"Rapidamente começamos a decobrir (eu, o fur Mil Ferreira, o sold "Castiço" e o Mulata) a primeira das piores e mais traiçoeiras assassinas da guerra" [, Foto nº 2].

"Dá-me aí uma faca se faz favor" [Foto nº 3]

"Aqui está a gaja" [Foto nº 4]

"Com cuidado... muito cuidado! ]Foto nº 5]

"Aqui está ela fora da terra, vou retirar-lhe a espoleta e pronto, já não fará mal a ninguém" [Foto nº 6]

"Esta não preciso levantá-la. Só um buraco e uns ossitos, como último sinal de que aqui acontecera uma morte." [Foto nº 7]

Um abraço, António Inverno Alf Mil Op Esp/Ramger, BART 6522/72 e Pel Caç Nat 60 (1972/74)



O António Inverno,   com a sua "inseparável AK 47,  ao fim do dia, na magnífica e sempre bela Ponta Varela".



Emblema do Batalhão de Artilharia nº 6522/72. Cortesia de Carlos Coutinho

 
Sobre o BART 6522/72 (1972 - 1974), ver a ficha de unidade.

Resumindo:

(i) mobilizado pelo  RAL 5,  Penafiel;

(ii) divisa: " Por uma Guiné Melhor":

(iii) comandante: ten cor art João Corte-Real de Araújo Pereira;

(iv) embarcou em Lisboa em 6 de dezembro de 1972, tendo desembarcado em Bissau a 13 desse mesmo mês; a  3ª Companhia embarcou por fases, via aérea, entre 7 e 15 de dezembro de 1972;

(v) receber a IAO . Instrução de Aperfeiçoamento Operacional, em Bolama; 

(v) guarneceu os seguintes aquartelamentos e destacamentos:  Ingoré, São Domingos, Susana, Sedengal, Varela, Antotinha, Apilho, Gendem, Barro, Bigene, e Ganturé;

(vi) a 1ª companhia esteve em São Domingos; a 2ª em Susana e Varela; a 3ª em Ingoré e Sedengal; a CCS, em Ingoré e Antonina;

(viii) coube-lhes já na retração, a desativação e entrega de diversos aquartelamentos e destacamentos ao PAIGC;

(ix) regressaram para Bissau, de onde embarcaram a 30 de agosto e 3 de setembro de 1974

________

10 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

António, na altura, há 10 anos atrás, talvez muitos tenham gostado da tua sequência fotográfica, a avaliar pelo número de visualizações... Mas ninguém parou oata te escrever um simples comentário a dizer: "Bravo, camarada, gostei do teu sangue frio!"...

Parabéns, ao fotógrafo, que não sabemos quem foi (o fur Mil Ferreira ?), que também correu riscos, a para do Sold Castiço e do Mulata)...

NO meu tempo, no setor L1, em 1969/71, não me lembro de ver detetores de minas (metálicas)...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

António0:

António: não estou seguro de que o teu antigo mail funcione... Se calhar, já te reformaste da Sumol Compal, e tens outro endereço de email. Em todo o caso, espero que o nosso MR, o nosso coeditor e teu "padrinho", tenha o teu contacto atualizado.

É para te saudar e te dizer que fui recuperar a tua notável sequência fotográfica da desmontagem de um campo de ninas, no fim da tua comissão...Melhorei a qualidade das fotos e voltei a dar-lhe o devido destaque...

Parabéns pela tua tua coragem, sangue frio e competência... Mas também gostava de saber: (i) quem foi o fotógrafo (o fur mil Ferreira ?); (ii) e em que subunidade estavas na altura (Pel Caç Nat 60 ou 2ª CART / BART 6522/72 ?)...

Enfim, podes escrever algo sobre a história destas fotos...Onde moras, entretanto ? Tens o meu telemóvel, se me quiseres contactar.

Muita saúde e longa vida. E traz mais malta tua conhecida para a nossa Tabanca Grande. Precisamos de "sangue novo". E precisamos de mais fotos, se tiveres, das tuas boas e más memórias da Guiné. Um abraço também para o nosso sempre generoso e magnífico MR.

Luís Graça

António J. P. Costa disse...

Olá Camaradas

Sei de camaradas de M/A que usavam as "carapaças" das AUPS (italianas) para as poderem apanhar com o detector. Conheço a mina A/P que o sapador está a levantar. Não sei a nomenclatura, mas era uma invenção portuguesa do final da guerra e que tinha aquele bocado de ferro que "potenciava o efeito" com estilhaços ou facilitava a a localização. Este tipo de acção permitia uma localização fácil e, como o In, em princípio não sabia onde elas estavam podíamos dizer que se atingiam os dois fins.
A natureza alterava-se muito rapidamente, pelo que era problemático o lançamento de campos. Para a elaboração dos croquis era difícil encontrar pontos de referência seguros. Os baga-baga podiam servir, mas era necessário saber exactamente donde se tomavam as medidas e azimutes. As árvores tinham de ser muito bem conhecidas e marcadas, enfim, cada caso era um caso. Infelizmente não tenho conhecimento de qualquer tentativa de uso de fotografias nestas actividades, mas poderia ter sido uma tentativa de melhoria. Contudo, durante muito tempo, na Guiné só se revelavam fotos a P/B e fazer fotos à "Metrópole" e fazê-las regressar para base de dados não era muito viável...
Pessoalmente, como deixo dito noutro local não apoiava o lançamento de minas com a profusão com que se fez. Os explosivos comandados e as minas Claymore (mesmo em versão nacional na "Fábrica das Minas") eram outro caso. Colocávamo-las onde queríamos e eram relativamente fáceis de manusear especialmente em defesa próxima dos aquartelamentos.
E atenção às armadilhas que, de todo, nunca montei nem permiti que se montassem.
Já bastavam as que o In montava e cujos resultados estão à vista, especialmente em Angola.
É que as minas não distinguem uniformes nem cores de pele...

Um Ab.
António J. P. Costa

Tabanca Grande Luís Graça disse...

... É verdade, Tó Zé, todas "as guerras são sujas", subsersivas ou contrassubsversivas... De um lado e do outro, do PAIGC e das NT, nunca ninguém teve "problemas de consciência" (, muito menos de ética) pelo uso de minas e armadilhas...que não distinguiam combatatentes, civis ou animais...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

E as malditas granadas vermelhas que mataram turras, tugas e macacos-cães ?|...

5 DE JANEIRO DE 2014
Guiné 63/74 - P12544: Estórias do Xitole (David Guimarães, ex-fur mil, CART 2716, 1970/72) (6): Armadilhe-se tudo à volta!... Ou as malditas granadas vermelhas que mataram turras, tugas e macacos-cães...

António J. P. Costa disse...

Eh pá! Esta das granadas vermelhas não conheço?
Terá que ver com as eleições do Bunfas?
Ora particulariza...
Um Ab.
António J. P. Costa

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Explica o David Guimarães (, residente em Espinho, ex-fur mul, at inf, minas e armadilhas, da CART 2716, Xitole, 1970/1972, um dos primeiros camaradas a aparecer, a dar cara, a escrever no nosso blogue, nos idos anos de 2005, e presença habitual nos Encontros Nacionais da Tabanca Grande):

(...) Quando ocupámos o Xitole, em substituição da CART 2413 que lá se encontrava [, no período de 1968/70], procedemos de imediato ao armadilhamento da zona limítrofe do quartel. Foram colocadas muitas minas antipessoais, de fabrico português, com espoletas de pressão, reforçadas com mais cargas explosivas ou não, conforme a maior ou menor importância do local. O objetivo era impedir a aproximação e a infiltração do IN, criando um zona de segurança à volta do quartel..

(...) Quanto às minas e armadilhas, essas, sabíamos que estavam muito bem colocadas e, essas sim, davam uma certa segurança... Apesar de tudo eventualmente fazíamos armadilhamentos temporários, a mais longa distância, usando para isso a granada armadilha instantânea que qualquer combatente da Guiné conhecia.

Todas as granadas eram formadas por cápsula fulminante, 3 cm de cordão lento e um detonador que fazia explodir a carga base... Todos nós nos lembramos da mina defensiva, de composição B, e do seu uso, bem como das ofensivas, cilíndricas, de carga de trotil (TNT).

A que estou a referir era exactamente cilíndrica, como a ofensiva, só que enquanto as outras tinham a cor verde azeitona, esta era vermelha e mais de metade era envolta com espiral de metal.

A maior diferença, e por isso se chamava instantânea, era não ter os três cm de cordão lento. O percutor, acionado, logo fazia explodir o detonador e a carga base.

Esta mina era altamente mortífera devido ao seu poder de fragmentação, provocado pelas espiras em aço. (...)

António J. P. Costa disse...

Olá Camaradas

Numa medida inteligente, nessa altura, Exército usava 5 tipos de granada cujo princípio de funcionamento era o mesmo: um percutor rebatido e mantido fixo pela alavanca que se apertava com a chave da mão. Numa delas, a alavanca estava cortada e, logo que o respectivo topo saltava, o percutor batia na cápsula e a granada explodia. Era a granada-armadilha.
Nas outras havia um atraso de 2 a 3 seg. para as granadas lacrimogéneas (com corpo de plástico branco) e incendiárias (com corpo de lata), 3 a 4 para as ofensivas, (com corpo de plástico, de cor verde-azeitona) e 4 a 5 seg. para as defensivas (com corpo de metal). Havia pessoal que conseguia colocar uma alavanca na granada-armadilha. Depois metiam-nas numa lata de leite c/chocolate das rações e montavam uma armadilha retirando a cavilha de segurança. A alavanca ficava retida pela parede da lata. Depois era arranjar uma posição para a colocar de forma a que a lata se virasse e a granada caísse. Também podia ser simplesmente abandonada, como se se tivesse perdido em território onde o In se movimentasse. A utilização prevista era com arame de tropeçar que retirava a cavilha e o disparo dava-se imediatamente. O anel de fragmentação fazia o resto... Todavia o corpo desta granada era idêntico ao da ofensiva. A cabeça das granadas tinha um orifício de lado a lado que, teoricamente, servia para lhe introduzir uma cavilha de segurança, que permitiria a desmontagem...
Nunca usei estas granadas-armadilha nem soube de quem as utilizasse e creio que a força necessária para que o arame de tropeçar fizesse saltar a cavilha era demasiado grande para que o sistema fosse eficaz... Além disso a granada tinha de ficar solidamente fixada num sítio qualquer.
Usei apenas granadas ofensivas, defensivas e incendiárias que, nos golpes de mão davam muito jeito para incendiar rapidamente as cubatas.
Não sei como era garantido o tempo de atraso, mas parece-me que 2 a 5 cm de comprimento de cordão lento era demasiado para caber no interior de uma cabeça pequena e com as mesmas dimensões para todas as granadas. As granadas de instrução com invólucro de plástico azul e cheias de serradura(?) tinham um atraso de 3 a 4 segundos.

Um Ab.
António J. P. Costa

Valdemar Silva disse...

A propósito dos croquis da colocação das nossas minas, antes duma operação para os lados duns rápidos do rio Corubal, entre Cabuca e Canjadude, aconteceu na nossa CART11 uma situação engraçada, quando estávamos em Nova Lamego.
'Quem souber nadar bem, inscreva-se na Secretaria para umas provas de natação', disse o Cap. Pinto Cmdt. da Companhia. Por desconfiança ou por haver poucos nadadores não se inscreveu ninguém.
Um dia depois começaram os preparativos para uma operação junto do rio Corubal a nível de dois Pelotões. Afinal tratava-se de fazer a segurança a sapadores da Batalhão ao levantamento (ou verificação?) das minas colocadas meses antes. Julgo que o fur. Abílio Duarte também fez parte dos sapadores na procura/verificação das minas devidamente assinaladas num croqui, mas devido às chuvas o caudal do rio deveria ter subido e deslocado as minas da localização em relação ao croqui. Não me recordo se chegaram a localizar as minas e, afinal, qual era a necessidade de bons nadadores.
Dessa vez, o percurso foi quase todo feito em viaturas, que a partir de certa altura iam aparecendo vários trilhos do rodados de passagens anteriores e nós também seguimos a corta-mato, vendo-se "esqueletos" de várias viaturas abandonadas por avarias, ataques ou minas.

Ab. e saúde da boa
Valdemar Queiroz

António J. P. Costa disse...

Bom dia Camaradas

Esqueci-me de dizer que, cada granada-armadilha tinha enrolados num pequeno carretel instalado junto à base uns metros de arame de tropeçar. Tenho ideia de que o "carretel" também era metálico e poderia reforçar a projecção de estilhaços do anel de fragmentação.

Um bom dromingo para os que ainda estiverem na cama a esta hora.
António J. P. Costa