sexta-feira, 22 de outubro de 2021

Guiné 61/74 - P22651: "Diário de Guerra, de Cristóvão de Aguiar" (texto cedido pelo escritor ao José Martins para publicação no blogue) - Parte IX: Bissau e Contuboel. Consulta de psiquiatria. Poema "O Menino de Sua Mãe". Nascimento do primeiro filho. Exame em Bafatá de militares sem a instrução primária. Sedução da senhora professora, cabo-verdiana... (Set - dez 1966)


Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Contuboel > 16 de Dezembro de 2009 > O João Graça, médico (, hoje psiquiatra e psicooncologista)  e músico, posando ao lado do dignitário Braima Sissé. Por cima deste, a foto emoldurada de Fodé Irama Sissé, um importante letrado e membro da confraria quadriyya [, islamismo sunita, seguido pela maior parte dos mandingas da Guiné; tem o seu centro de influência em Jabicunda, a sul de Contuboel; a outra confraria tidjanya, é seguida pela maior parte dos fulas].

O Braima Sissé foi apresentado ao João Graça como sendo um estudioso corânico, filho de uma importante personalidade da região, amigo dos portugueses na época colonial [, presume-se que fosse o próprio Fodé Irama Sissé].

Foto: © João Graça (2009). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Continuação da (re)publicação do "Diário de Guerra", do nosso camarada açoriano e escritor Cristóvão de Aguiar (1940-2021), que faleceu na passada dia 5, aos 81 anos (*).

Organização: José Martins; revisão e fixação de texto (para efeitos de publicação no nosso blogue): Virgínio Briote (,a partir da parte VI, Carlos Vinhal).

Estes excertos, que o autor cedeu amavalmente ao José Martins, para divulgação no blogue, fazem parte do seu livro "Relação de Bordo (1964-1988)" (Porto, Campo das Letras, 1999, 425 pp). (**)



Cristóvão de Aguiar.
Foto: Wook (com a devida vénia...)


Diário de Guerra

por Cristóvão de Aguiar

(Continuação)


Bissau, 20 de Setembro de 1966


A Otília embarcou hoje para Lisboa. Viemos de cima, do mato, há três dias. Seguiu há pouco num avião militar, com uma bar­riga enorme de quase sete meses. Deve nascer o pimpolho em fins de Novembro, princípios de Dezembro. Vou ficar em Bissau durante mais uns tempos para me tratar, que não consegui aguentar-ne nas canetas psicológicas.

Bissau, 26 de Setembro de 1966

Poema para minha Mãe, que faz hoje quarenta e sete anos de vida:

“O MENINO DE SUA MÃE”

- Mãe, que é do teu menino,
Tão breve,
Brincando no caminho,
Em corridas de pé leve,
Guindando as poças da chuva,
Que caía em desatino
E logo estiava num instantinho?
- Que será feito do arco e do pião
E da fieira que se apertava no bojo como uma luva
Que o teu menino, à mão, zunindo, o lançava,
E da Lua clara que nem lampião,
Que, vagarosa, no céu viajava?

- Onde o marulho do mar
Que aquietava o teu menino,
E dos barcos de papel
Nas valetas rasas de água a cirandar?
Que lhe destinaram do destino
De flores e mel
Que lhe afian­çaste outrora?
E da Paz das noites benditas,
Do Deus em que ainda acreditas
E que o teu menino foi esquecendo,
Não O compreendendo
Por desdita agora?

- Onde o berço
Em que o embalavas,
E das preces da hora do deitar
- Nunca o terço! 
-
(Com Deus me deito, com Deus me levanto...)
E dos casos que lhe con­tavas,
E das cantigas soando a mar
(Assim era o teu canto!)
Que devagarinho en­toavas
Para teu menino nanar?
- Dize-me, Mãe, onde morreste
O teu menino?, em que desvão o escondeste
Para o ir procurar?

- Sabes, Mãe, o teu menino está tão di­ferente:
Velho e absorto
E sobretudo tão ausente
(Dir-se-ia quase morto)...
O teu menino
Já não salta ao eixo
Rebaldeixo
No adro paroquial,
Nem no ci­mento da Avenida...
Nem tão-pouco joga (o que é o destino),
O seu pião de fieira colo­rida,
Que há tanto tempo se rachou...
E o arco de ferro forjado,
Com a sa­pata feita do mesmo metal,
Foram-se enferrujando num recanto
Da encantada casa-de-trás...
Depressa 
- o tempo foge -,
O teu menino tornou-se rapaz
E dá a viva ideia de que é hoje
Uma visão alucinada de soldado...

Onde já lá vão as guer­reias
Tra­vadas na Canada da Sabina
Em que havia muita pedrada,
Baba e ranho, alarido e arengada,
Chegando o sangue a esguichar das veias?...

Ficava a Canada quase em frente
Da casa de madrinha Rufina,
Que um dia se despediu da gente
E se foi para a Amé­rica no voo da carreira...
Tudo então se passava entre o rapazio:
Os de Cima e os de Baixo, que, cheios de brio,
Defendiam à tapona e à porrada
A rigorosa fron­teira
Que separava os de cada lado da Canada...

Entre­tanto toda a vida se en­rodi­lhou,
E ela tem agora um travo a puro fel...
Só da noite mais noite é te­cido o teu menino,
Vive ainda em maior escuridão que o destino,
Que se não cum­priu e ficou em ruínas
- São as nossas sinas 
-
Mas nunca se há-de ele es­quecer
Que um dia que já não existe
De teres prometido ao teu menino
(Ele não se lem­bra agora se já então era triste),
Embarcado em seu batel de ilusão
E de papel,
O tal des­tino
Que, como vara de condão,
O haveria de transmu­dar em flores e mel...
Todavia, cá dentro, ele perma­neceu e continua refém...
Há-de ser resgatado, quem sabe, na Banda do Além...

A tua bênção me cubra, minha Mãe!


Bissau, 27 de Setembro de 1966

Aqui estou há mais de uma semana em trata­mento psiquiátrico. Vejo tudo envolto numa película de sono saboroso! Comecei por matar vacas e carneiros a tiro de Walter e de G3. Faziam barulho, mééé, e eu não su­portava o mínimo ruído, sobretudo de noite. Havia, porém, quem matasse carreiros de formigas com a G3. Mas eu pagava o prejuízo aos seus donos. Se era alta noite, gri­tava pelo cozinheiro e seus ajudan­tes e mandava que esquarte­jassem os animais, para que depois a carne servisse para o nosso sustento. Chamava depois os indígenas, seus do­nos, logo de manhã ao quartel, per­guntava-lhes o preço dos ani­mais e pagava o que me pediam. Matava gatos também, mas esses ti­nham sete fô­legos e levavam muito tempo a morrer: esper­nea­vam e miavam de tal ma­neira, que quase me en­doideciam. O pior foi o ensaio de pancadaria com cavalo mari­nho que dei num furriel. Mandei a Otí­lia para casa de um comerciante cuja mulher convivia por vezes com a minha, pre­tex­tando-lhe que queria ter uma conversa em particular com um militar. 

Foi a gota de água que fez com que o médico da com­pa­nhia me vi­es­se a sugerir, com muito bons modos, que, quando fosse a Bissau levar a Otília, ficasse por lá, a fim de des­cansar. Estava com o meu grupo de com­bate em Sonaco há mais de um mês. Ali era o re­pouso do guerreiro. Tinha um cachorro lindo, arra­çado de setter. Andava um dia a passear, ao lusco-fusco, na rua com­prida de So­naco, quando ouço atrás de mim o jipe da patrulha. Não deram por mim, que an­dava na berma. Só enxergaram o cachorro, que vinha no meio do caminho. E ouço então o furriel a dizer para o con­dutor: "Mata o cão do nosso alferes. " Não foi pre­ciso mais nada. Denunciei a minha pre­sença e ordenei-lhe que se apre­sen­tasse no quartel imediatamente. Obedeceu. Depois levei-o até à minha palhota. E foi en­tão que lhe toquei a pavana com o ca­valo marinho. Mas, não há dúvida, os medica­mentos que estou to­mando estão produzindo bom efeito. Já vou exercendo autocrí­tica sobre os meus actos passa­dos.


Bissau, 5 de Outubro de 1966

ALMA DOLENTE

A tristeza das coisas ao sol poente,
Falando, muda, numa voz precisa,
Escuta-a quem tem a alma dolente
E a dor de uma ânsia que se eterniza.

O Universo absoluto é uma ferida,
Lateja, arde, geme, sem compasso...
Dói tudo no silêncio, e a própria vida
Escorre vagarosa em gotas de cansaço...

Oh negrume tropical, noite africana,
Oh escuridão do medo em cada esquina
Com a vida enforcada em pó e lama,

Arranca do ventre tuas vinganças
E este ódio que as almas assassina
E deixa o Sol brincar com as crianças...


Contuboel, 7 de Outubro de 1966

O Dakota militar, vindo de Bissau, fez-se à pista térrea de Bafatá. Mas, quando tocou no solo, foi-se desviando para o mato, meio desasado. Parou a tempo de não haver desgraça. Tinha rebentado um pneu de uma das rodas do trem de aterragem. 

Como era dia de santo correio, estavam um jipe e um Unimog da minha companhia no aeródromo e assim aproveitei a boleia e vim logo para casa, que já tinha saudades dos meus cães e dos serões ouvindo a Voz da Liberdade e das tertúlias poéticas, em que lia, em voz alta, para um grupinho muito restrito, os versos da Praça da Canção, de Manuel Alegre, e também da Antologia da Poesia Erótica e Satírica, organizada por Natália Correia, que, por tal facto, teve de responder em tribunal, tendo a obra sido apreendida. Mandou-ma um elemento do Movimento Nacional Feminino, quando aqui esteve uma delegação de três meninas universitárias. Pedi-a no gozo. Nunca julgava que, ao fim de um mês, tivesse nas mãos uma obra proibida pela PIDE, enviada por quem foi.

[Imagem à esquerda: Capa da 1ª edição da "Poesia Portuguesa Erótica e Satírica", Lisboa, Afrodite,  organizada em 1965 por Natália Correia (1923-1993), com ilustrações de Cruzeiro Seixas (1920-2020). O atrevimento da açoriana, também de São Miguel, valeu-lhe, em 1970, a condenação a 90 de prisão correccional, no Tribunal da Boa Hira, com pena suspensa por 3 anos, por ofensa aos bons costumes. Editor e autores também foram condenados. Lembro-me. nos meus 18 anos,  da corrida à 1ª edição, de 1965,  que rapidamente se esgotou antes de ser apreendida pela PIDE. Cortesia de Livraria Trindade]. 


Contuboel, 10 de Outubro de 1966

Chegou há semanas, estava ainda em tratamento em Bissau, uma ordem do comando-chefe, via batalhão de Bafatá, destinada a todas as unidades do mato, sobretudo àquelas prestes a partir, avisando que os soldados que não sabem ler nem escrever terão de embarcar da Guiné pelo menos com o exame do primeiro grau, ou seja, a terceira classe da instrução primária; caso contrário, quando chegarem à Metrópole, não poderão ser desmobilizados e ficarão nas respectivas unidades até concluírem aquele exame. 
O mesmo acontecerá àqueles que, tendo embora o exame do primeiro grau, saírem daqui sem o diploma do exame da quarta classe. 

É uma ordem injusta, não por ela em si nem pelo seu alcance, mas pelo facto de estarmos a pouco mais de três meses do regresso e não haver tempo suficiente nem condições psicológicas para uma intensiva preparação escolar dos soldados em tamanho estado de indigência cultural. 

Por outro lado, também não se percebe muito bem o súbito interesse das hierarquias militares pelos seus homens analfabetos e pelos outros que só têm a terceira classe. Deve ser para dar alimento às estatísticas. O capitão pôs logo mãos à obra, isto é, nomeou alguns voluntários e já se começou há tempos a dar escola. Dois furriéis milicianos e um alferes (eu próprio, que me juntei há pouco), iniciaram então a tarefa de mestre-escola. 

Garanto que toda a gente irá embarcar com o seu diploma na mão, custe o que custar. Por desmobilizar é que não ficam, não senhor. Era o que faltava, depois de uma comissão desta natureza, permanecerem os pobres coitados retidos no Regimento de Infantaria 15, em Tomar, até completarem os estudos. Os alunos são em número de dez: seis que não enxergam uma letra e os outros quatro pouco mais sabem, pois têm um primeiro grau muito atrasado e esquecido.


Contuboel, 23 de Novembro de 1966

Estava sentado no estabelecimento do comerciante português, lendo O Arauto, o pasquim da província, e fumando intensivamente cigarro atrás de cigarro, quando chega o nosso capitão com um papel numa das mãos. Era um telegrama que tinha vindo via rádio, anunciando-me que era pai. Fiquei néscio e sucinto. Pai! E escrevi, num aerograma amarelo, um poema ao meu filho José Manuel, a primeira missiva que recebe na vida, que ainda agora principiou...


Bafatá, 12 de Dezembro de 1966

Exame dos alunos da Companhia de Caçadores 800. Cometi um acto sacrílego, mas não havia outra escapatória. Sacrilégio maior seria deixar que estes homens ficassem na tropa mais alguns meses, ou um ano, sei lá bem, depois de terem sofrido o que sofreram nesta guerrilha diabólica de nervos e do resto, que foi ainda pior. 

Falei com a senhora professora, uma cabo-verdiana lindíssima, de fazer refrear a respiração. Disse-lhe da minha justiça e das minhas intenções. Ela, com o seu brio profissional à flor da pele sedosa:

- Não, senhor alferes, não posso consentir numa palhaçada dessa natureza, pelo amor de Deus. 

Principiei a seduzi-la e ela foi caindo de tal modo na esparrela, que, quando a convidei a sair da sala de exame, obedeceu, sem pestanejar. Depois. Olha, depois! Depois, encarreguei-me eu próprio de fazer o exame escrito, com caligrafia de principiante, a condizer, dos seis semi-analfabetos, que o tempo de aprendizagem e a disposição de ensinar foram mesmo muito escassos, enquanto os meus camaradas se incumbiram dos restantes. 

No fim, ficaram todos aprovados e a professora, ao entrar na sala após ter sido avisada de que terminara a prova para lhe entregarmos as respostas, lançou-me uns olhos tão doces, que me deu vontade de lhe tomar lições de qualquer disciplina.

Contuboel, 25 de Dezembro de 1966

Uma noite de Natal já com um grão de esperança no seu ventre e outro bem pesado na asa. Daqui a menos de um mês, vamos de abalada. Até parece mentira. As cruzinhas estão chegando ao fim. (**)

(Continua)

10 comentários:

Antº Rosinha disse...

A instrução primária para adultos naqueles anos da professora caboverdeana, e nos quarteis havia as "aulas regimentais", isto em África, mas penso que na metrópole era idêntico, constava para o exame da 4ªclasse, de um Ditado, Redacção e Problema.

Como a 4ª classe era indispensável a partir de certa altura, que desde trabalhar para o Estado (policia, jardineiro da câmara, contínuo por esemplo) ou para a carta de condução, ou mesmo para ser futebolista profissional, tornou-se indispensável, imagine-se o corrupio de pequena "corrupção" para doutorar tanto analfabeto que havia nos anos 50 e 60.

O alferes Cristóvão de Aguiar, não foi pela corrupção, foi pela sedução.

A tropa ajudou muito na campanha nacional de alfabetização.

Era nesta alfabetização que os caboverdeanos se gabavam que foram os primeiros a eliminar os analfabetos desde o Minho a Timor.

Aliás, os "estudantes do império", eu chamo estudantes do império a tudo o que não fosse "indígena", mas aqui julgo que apenas eu tenho esse direito, porque estou nos antípodas,
mas diziam esses estudantes, anos antes de Março/61, que era uma vergonha sermos colonizados por analfabetos, dêem-nos a independência que nós governamo-nos melhor sabemos melhor o que fazer.

Vivi de perto em Luanda essa campanha de alfabetização, familiarmente, Luanda parecia um depósito de analfabetos desde o Minho ao Pico passando pela Camacha.

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Rosinha, já tenho recordado aqui os tempos do meu querido e saudoso meu pai,Luís Henriques (1920-2012), que fez a 4ª classe aos 9 anos e, orfão de mãe aos dois, arranjou logo um emprego (até aos 13) como "caixa registadora" e "máquina de calcular", na Pria da Areia Branca,em 1929... Em 1941 foi mobilizado, pelo RI 5, para Cabo Verde, São Vicente... E no Mindelo (a única ilha que tinha liceu) dava conta desta cena: rapazes cabo-verdianos, com o 7º ano, a engraxar as botas as "expedicionários" metropolitanos, e a ler-lhes as cartas que chegavam do vapor (de três em três meses)...A percentagem de analfabetos entre o contingente militar era elevada, o meu pai era o "escrba de serviço": escrevia, "pro bono", vinte e tal cartas por semana, a pedido dos camaradas que tinham mais dificuldades com as letras...

Enfim, quantos dos nossos "heróis nacionais" não foram analfabetos, para não falar das "grandes mulheres" que estavam por detrás dos "grandes homens"...

E a própósito da atitude (, algo insólita, mas corajosa e coerente) do alf mil Cristóvão de Aguiar, "menino de sua mãe", devo notar que tiveram mais sorte os homens da CCAÇ 800 (1965/67) do que os meus fulas da CCAÇ 12 (1969/71), que foram explorados até ao tutano como combatentes, não lhes sobrando tempo para frequentar as famosas "aulas regimentais"...De resto, não ficavam no quartel, quando vinham do mato, estoirados, iam direitos à tabanca, para junto das mulheres e filhos...

Valdemar Silva disse...

Não tenho a certeza, mas julgo que os analfabetos apurados para o serviço militar eram obrigados a frequentar escola pra adultos na tropa. Ou era essa a "norma de intenções" sem grande tratamento nos Quarteis e de difícil cumprimento em teatro de guerra.
Na minha CART11 "Os Lacraus", pelo menos no meu 4º. Pelotão, ensinamos a ler/escrever aos soldados que seriam potenciais escolhidos para Cabos. Nós chamava-mos a escola de cabos e eu fui o professor, com um exame final feito por um militar que veio não me lembro donde. O exame foi interessante, com uma cópia e um ditado. Eu lembrei-me escrever no quadro "Cópia" e a transcrição do texto a copiar. Como o examinador estava a tratar da sede, resolvi fazer o ditado do mesmo texto da cópia, que era só substituir cópia por ditado. Um dos meus soldados, escolhido pelos outros por ser mais velho e ter alguma importância junto deles, não sabia/aprendia nada do que tinha sido ensinado. Ele escrevia as palavras "desenhando" sem saber o significado e até percebia mal português, conclusão: foi reprovado por ter dado muitos erros, ao ponto de escrever Ditado e a seguir o texto começando com a palavra Cópia que era assim que estava do quadro.
Visionando o P12820 pode-se observar a "Sala de Aulas" e o prof. Queiroz, numa extraordinária fotografia do meu camarada e amigo ex-fur.Cândido Cunha. Uma fotografia exatamente igual a esta foi publicada no livro "Fotobiografia-Guerra Colonial", de Renato Monteiro e outro, com uma diferença, quase indetectável, ser o Cunha a fazer de professor.

Abraço e saúde
Valdemar Queiroz

Antº Rosinha disse...

Luis Graça, o teu pai ao fazer a guerra de 1940, nasceu por volta de 1920, ao ter feito a 4ª classe era como que um doutor no nosso tempo da tropa, ou seja havia tanta gente com a 4ª classe no tempo dele, como havia doutores no nosso tem
Eram muito raros uns e os outros.

Hoje há mais doutores do que pedreiros e canalizadores para mandar para a frança com a mala de cartão.

Mas o teu velho pai não teve o privilégio de estudar naquelas belas escolas nossas, espalhadas pelo país inteiro vinte anos depois, as escolas do centenário.

No tempo do teu pai, o professor que quisesse dar escola em qualquer aldeia, daquelas povoadíssimas aldeias daquele tempo, o próprio professor é que tinha que arrendar ou desenrascar uma sala para dar as suas aulas.

Idade média.

O pai ou a mãe, ou os dois, nascidos em 1920 em qualquer aldeia de Portugal, poucos viram uma escola na sua aldeia.

Cherno Baldé disse...

Caros Editores,

Nesta recente republicaçao do Diario de Guerra do Cristovao de Aguiar nao vi a parte em que ele descreve o tratamento dado nestas operaçoes ao Carresse e Oio aos Guias Prisioneiros e que, depois, resultou no livro com o titulo de "Braço tatuado", era interessante reler esta parte das suas memorias e conhecer o Capitao, Oficial do Quadro, que sentia prazer em liquidar sistematicamente os prisioneiros transformados em Guias ocasionais durante as operaçoes, pois ha quem pense que os tais "excessos" da Guerra eram apanagio dos militares Nativos "medalhados". Espero que nao tenha sido passado a lapis azul pelo Blogue com receio de eventuais reacçoes dos leitores mais sensiveis.

Com um abraço amigo,

Cherno Baldé

Anónimo disse...

Antecipando parte de um capítulo das Memórias de Guerra de um Tigre do Cumbijã:
….
Contudo, havia escola com alguns graduados a prepararem um grupo de soldados para realizarem o exame da 4ª classe. Exame esse que se realizou no Cumbijã com a deslocação de um professor primário, creio que de Bissau.

Reza a história que a coisa não estava a correr nada bem aos examinandos pelo que foi necessário simular um ataque ao destacamento fazendo dois disparos de obus com o professor a fugir em pânico, deixando tranquilamente acontecer a ajuda aos nossos bravos soldados acabando todos, obviamente, por passar…

...Adaptando as estratégias do “copianço” às circunstâncias!…

Um abraço
Joaquim Costa

Valdemar Silva disse...

Rosinha
'...belas escolas nossas, espalhadas pelo país inteiro vinte anos depois...', ou seja 1940 vinte anos depois de 1920 havia belas escolas espalhadas pelo país inteiro.
Mas trinta anos depois de 1940 estávamos em 1970 e tínhamos o seguinte registo:
- 49,8% dos 6.372.232 habitantes com 14 anos ou mais sem a instrução primária.
Quer dizer, quem tivesse nascido em 1956 teve o azar de estar longe do país inteiro com belas escolas. Essas belas escolas não foram construídas nas milhares de aldeias que foram sendo abandonadas devido, também a não haver escolas, a melhores condições de vida.

Abraço e saúde
Valdemar Queiroz

Anónimo disse...

Lembro-me que quando dei instrução no Quartel de Chaves, a última hora da tarde estava reservada para a escola cujo professor era um colega Furriel. Creio que havia um toque do corneteiro a chamar o pessoal. Do meu pelotão só 4 é que ficavam comigo o resto ia tudo para a escola...

Enfim!... contas de outro rosário...
Um abraço
Joaquim Costa

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Não, querido amigo e irmãozinho Cherno, aqui não funciona o "lápis azul",de má memória... Todas as censuras são más, castradoras, e em última análise contra-intuituivas ou contra-producentes... A força da liberdade é sempreor do que a da mordaça.

O que estamos a publicar é o que o escritor, ainda em vida, entregou ao José Martins (, um excerto do seu diário) e que consta (na parte relativa à tropa, à guerra e ao regresso à vida civil...) no seu livro "Relação de Bordo (1964-1988), edição Campo das Letras, Porto, 1999, 425 pp.).

"Braço Tatuado" é um livro de ficção, embora baseado na experiência de guerra do autor (CCAÇ 800, Contuboel, 1965/67).

Matenhas. Obrigado pela tua chamada de atenção. Luis

____________

Braço Tatuado,
de Cristóvão de Aguiar
Lisboa, Dom Quixote,2008

SINOPSE
Romance em torno das vivências do autor na guerra colonial, ferida que se mantém aberta na sua memória, após uma experiência traumatizante de dois anos na Guiné.
Um texto de ecos e lembranças que de forma onírica e fantástica dá conta do absurdo desse conflito armado.

O cenário de horror, as emboscadas, as atrocidades cometidas, a voz da liberdade, as saudades e a perplexidade perante uma guerra que era obrigatório viver, fazem deste texto uma das mais interessantes narrativas sobre a guerra colonial.

https://www.wook.pt/livro/braco-tatuado-cristovao-de-aguiar/201189

Vd. também o poste de:

25 DE FEVEREIRO DE 2008
Guiné 63/74 - P2580: Notas de leitura (8): Braço Tatuado-Retalhos da Guerra Colonial, de Cristóvão Aguiar (Victor Dores / Amaro Rodrigues)

https://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/2008/02/guin-6374-p2580-brao-tatuado-retalhos.html

Fernando Ribeiro disse...

Aqui está um livro escolar da 1.ª classe, de 1972, para a Guiné:

http://memoria-africa.ua.pt/Library/ShowImage.aspx?q=/geral/L-00000012&p=1


Os correspondentes cadernos de apoio para uso dos professores:

http://memoria-africa.ua.pt/Library/ShowImage.aspx?q=/geral/L-00000015&p=1

http://memoria-africa.ua.pt/Library/ShowImage.aspx?q=/geral/L-00000016&p=1