terça-feira, 13 de setembro de 2011

Guiné 63/74 - P8768: Agenda cultural (152): Lisboa, Mouraria, Festival Todos - Caminhada de Culturas 2011, 8-11 de Setembro de 2011 (Parte I)


Lisboa, Festival Todos - Caminhada de Culturas, 11 de Setembro de 2011... 3ª edição do festival. Atuação do grupo, indiano, Jaipur Maharaja Brass Band... Arruada pela Praça do Martim Moniz, Rossio, Praça da Figueira com regresso ao Martim Moniz... Um dos momentos altos do dia, juntamente com a atuação, à noite, da nova orquestra de Lisboa, a Orquestra Todos, com músicos de rua, dirigida pelo maestro italiano Mario Tronco...

No vídeo, aparece a portuguesa Ruth Plácido, que mora em Algés, uma "espontânea"  que contracena com a dançarina da fanfarra indiana... A Jaipur Maharaja Brass Band é uma explosão de cor, alegria, ritmo, música,  dansa, humanidade ... O grupo anda em digressão pela Europa, tem habitualmente 9 músicos, um faquir e uma dançarina.

Ver o seu sítio oficial: http://www.jaipurmaharajabrassband.com/accueil_en.html


Vídeo (6' 21''): Luís Graça (2011). Alojado em You Tube > Nhabijoes

 

Lisboa, Festival Todos - Caminhada de Culturas, 11 de Setembro de 2011... 3ª edição do festival. Atuação do grupo, indiano, Jaipur Maharaja Brass Band... Praça do Martim Moniz.



Lisboa, Festival Todos - Caminhada de Culturas, 11 de Setembro de 2011... 3ª edição do festival. Atuação do grupo, indiano, Jaipur Maharaja Brass Band... Praça do Martim Moniz.


Lisboa, Festival Todos - Caminhada de Culturas, 11 de Setembro de 2011... 3ª edição do festival. Atuação do grupo, indiano, Jaipur Maharaja Brass Band... Praça do Martim Moniz. 


Lisboa, Festival Todos - Caminhada de Culturas, 11 de Setembro de 2011... 3ª edição do festival.   Praça do Martim Moniz, ao meio da tarde.

Lisboa, Festival Todos - Caminhada de Culturas, 11 de Setembro de 2011... 3ª edição do festival. Rossio. Um grupo de africanos, possivelmente guineenses, surpreendidos com a arruada da Jaipur Maharaja Brass Band... Ao fundo o Largo de São Domingos, local de encontro dos africanos de Lisaboa...

Lisboa, Festival Todos - Caminhada de Culturas, 11 de Setembro de 2011... 3ª edição do festival.  Início da Rua da Palma...



Lisboa, Festival Todos - Caminhada de Culturas, 8-11 de Setembro de 2011... 3ª edição do festival.  Um festival que se pretende inclusivo, de todos, por todos, para todos, e que tem por cenário um das zonas (Intendente / Mouraria) de Lisboa até há pouco tempo mais social e espacialmente segregadas... Ainda hoje, muitos lisboetas têm algum preconceito em andar em sítios como o Largo do Intendente ou Rua do Bem Formoso... 4 dias de festival onde se puderam conhecer e apreciar inúmeras artes e artistas, desde a fotografia à música, da performance ao teatro de rua...

Vídeo, fotos e legenda: ©  Luís Graça / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné  (2011). Todos os direitos reservados.

1. Num bilhete postal que eu mandei ontem ao Torcato, que está no Fundão e tem "saudades de Lisboa", eu escrevi que "só há um património, comum a toda a humanidade... O menir do Alentejo e o bagabaga da Guiné-Bissau provocam-me a mesma emoção... Tal como o cheirinho (e o gosto) das 'Portuguese small female clams with coriander and garlic oil', vulgo Ameijoas à Bulhão Pato, que são, para mim, uma das maravilhas gastronómicas da humanidade... (Tenho o pequeno orgulho, eu e a Alice, de ter posto  os meus tabanqueiros da Tabanca de Candoz a gostar de coentros, há mais de  anos atrás; diziam, no início, que sabiam mal, a "fedelho"...).

"É também por isso que eu daqui a bocado vou até ao Intendente / Martim Moniz, ainda tão mal afamado e estigmatizado, para dar uma vista de olhos pelo festival Todos - Caminhada de Culturas... e se calhar comer uma cachupa ou um chabéu de galinha [, embora não sendo o sítio ideal para as comidas africanas, aqui predominam os temperos asiáticos, o caril, o açafrão...]...
 
"Louvo e apoio a ideia e a iniciativa (que é da cidade de lisboa)... Já era no nosso tempo (e ainda hoje continua a ser...) considerada um zona da cidade socioespacialmente segregada e estigmatizada... À semelhança do Pilão, em Bissau, no nosso tempo... Ora lá vive, come, respira, trabalha, transpira, dorme, ama, canta, dança, sonha, fala... gente de todos os quatro cantos do mundo... Gente como eu, como tu, como todos nós, amigos e camaradas da Guiné, gente que pertence à única raça humana que existe no planeta azul, a espécie 'Homo Sapiens Sapiens'...Temos todos o mesmo genoma de há 100 mil anos... Só não sei se as térmites da Guiné-Bissau nos vão ganhar na luta pela sobrevivência... Acho que elas estão melhor posicionadas do que nós...

"Que cada dia seja uma experiência nova e inovadora para ti, camarada e amigo!"...

E noutro postalito, enviado já ao fim do dia, eu acrescentava:

"Torcato: Falo, logo existo, diria o Descartes, se fosse vivo e tivesse ido ao Festival Todos - Caminhada de Culturas 2011... Pois eu, passei lá tarde toda, e só regressei a casa às 23h... Nada como andar a pé, ao fim de semana, para a gente descobrir a nossa cidade...Ando cá, há perto de 40 anos, e ele há sítios em Lisboa ainda por descobrir ou para ver com olhos de ver, ou com outros olhos, livres do preconceito e da intolerância... Por exemplo, a gente tem a mania que conhece os bairros populares de Lisboa, só por lá ir de vez em quando, no tempo (breve) dos Santos Populares... Qual quê!... Já mal  reconhecia o Intendente / Martim Moniz, a Mouraria, a aldeia multicultural de Lisboa, onde as comunidades indianas (ou indo-portuguesas), paquistanesas, chinesas e, em menor grau, africanas, brasileiras... têm um crescente peso nas actividades empresariais e na ocupação do território...

"No Arquivo Fotográfico de Lisboa - Núcleo Fotográfico, fui encontrar, a tocar Kora, o nosso amigo Braima Galissa, do Gabu... Tirei fotos com ele e a Alice para mostrar no blogue...

"Momento alto do dia foi a atuação, à noite, no Largo do Intendente, da nova orquestra Todos, com músicos de diversas nacionalidades (incluindo a Guiné-Bissau), sob a direção do maestro italiano Mário Tronco (que tem um projeto semelhante, em Roma, a já famosa Orchestra di Piazza Vittorio)... Dei-me conta (ou reforcei a minha convicção de) quanto a música tem esse poder mágico de aproximar povos, culturas, comunidades, com muito mais rapidez e eficácia do que mil e um discursos muito bonitos...


"Embora o festival já vá na sua 3ª edição, foi a minha estreia por estas bandas... Para o ano espero que haja mais, e que possa ir,  desta vez sem o meu feio joanete  a destoar fora da sandália... Prometo fazer um poste com vídeos e fotos sobre esta iniciativa olissiponense que pretende reforçar a ideia de que Lisboa é uma cidade de todos e para todos, depois de ter sido consagrada em 1998 como a "cidade da tolerância"...


"PS - Tive pena de não ter encontrado, por lá, o nosso Alfero Cabral... Possivelmente desencontros, ele na Rua Bemformoso e eu no Beco do Jasmim"...


Luís Graça

[ Texto em conformidade com o Novo Acordo Ortográfico]

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Nota do editor:

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Guiné 63/74 - P8767: Cem pessos, manda de patacaão, pessoal! (5): O que se podia comprar em Bissau: Os produtos e as marcas que não havia em Lisboa... ou eram "proibitivos" - Parte III (Augusto Silva Santos / Hélder Sousa / Juvenal Amado / Luís Borrega / Luís Dias / Rui Santos)



Uma carta de condução "paga" com o patacão da guerra...

Foto: © Augusto Silva Santos (2011). Todos os direitos reservados



1. Mensagem, com data de ontem, do Agusto Silva Santos, relacionado com o último poste aqui publicado (*):


Olá Luís, boa tarde!


Ainda falando sobre o que se comprava na Guiné, nomeadamente em Bissau, com o patacão da guerra, lembrei-me que recentemente ao ter necessidade de renovar a minha carta de condução, fui descobrir no meio de muitas coisas que tenho arquivadas (algumas relíquias), um documento datado de 07-12-1973, relacionado precisamente com este tema.


Estando eu colocado em Brá, portanto muito perto de Bissau, e a muito pouco tempo de acabar a comissão e do desejado regresso à metrópole (o que efetivamente aconteceu em 22-12-1973), resolvi investir o patacão que me restava para tirar a carta de condução.
O documento,  em anexo, foi aquele que me permitiu, aqui chegado, fazer a troca para a carta como então a conhecíamos.


Ainda tentei encontrar o documento (fatura/recibo) sobre o que então paguei (seria interessante), mas já não sei onde ele pára. Passados quase 40 anos, sinceramente também já não me recordo da quantia, mas tenho noção que não foi muito se comparado com o que teria de pagar aqui.


O que eu posso dizer, é que naquela altura o patacão da guerra me deu imenso jeito.
Por certo esta situação foi também comum a muitos dos nossos camaradas, ou seja, aproveitar para tirar a a carta de condução na Guiné.  Era o aproveitar do tempo e do dinheiro para alguma coisa útil.


Se achares interessante,  p.f. edita.


Um Abraço
Augusto Silva Santos


2. Seleção de comentários  ao postes P8766 (*) e P8764 (**)


2.1. Hélder Valério Sousa [, foto à esquerda, ex-Fur Mil de TRMS TSF, Piche e Bissau, 1970/72]
Realmente, dos polos ou camisetas já não me lembrava, mas é verdade que também comprei pelo menos uma Fred Perry. Quanto aos relógios havia quem gostasse mais dos Ómega e dos Tissot (comprei um destes na casa Salgado & Tomé, dum tio do então Cap Cav  Mário Tomé).

Das bebidas, o Zé Martins lembrou o Dimple de que depois vi fazerem-se muitos candeeiros com aplicação de abajur nas garrafas vazias.

Das estatuetas que o Magalhães Ribeiro mostra,  também tenho algumas em madeira preta. E trabalhos (roncos) com missangas. E pulseiras.

Quando regressei também lá vim com serviços de chá e de café do chamado "bago de arroz".

Uma outra coisa que carreguei e que já tinha trazido de Piche,  foram duas peles de cobra que foram destinadas a sapatos.

2.2.  Luís Borrega [, foto à direita, ex-Fur Mil Cav e MA da CCAV 2749/BCAV 2922, Piche, 1970/72]

Eu, em Bissau, quando lá estive por ocasião de férias (2 vezes), a aguardar embarque para o CIM de Bolama para dar instrução de Minas e Armadilhas, e aguardar o regresso, passei pelo Taufik Saad, e comprei uma OLYMPUS Trip 35 , na 1ª vez, (onde tirei muitos slides e que continua a funcionar), um relógio YEMA Rally, um rádio relógio SHARP (só funciona a parte do rádio), além de imensos roncos chineses para oferecer. E lá se foi o último patacão...

PS – Lembro-me que foi comprado na Casa YEMA em Bissau.

2.3. Juvenal Amado [, foto à esquerda, ex-1.º Cabo Condutor da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74]
Eu ganhava 960 pesos por ser 1º cabo e já com prémio de viatura. Se não estou em erro,  era obrigado a deixar parte na Metrópole, com o que paguei a minha viagem em Outubro de 1972. O resto mal dava para o tabaco e ir uma ou duas vezes a Bafatá.

Por isso roncos, máquinas fotográficas e aparelhagens de som... KÁ TEM.

2.4. Luís Dias [, foto à direita, ex-Alf Mil At Inf da CCAÇ 3491/BCAÇ 3872, Dulombi e Galomaro, 1971/74]


Na verdade, na Guiné comprávamos muitos objetos que não tínhamos oportunidade de adquirir na metrópole, nomeadamente aos preços que lá se praticavam.

Tenho também estatuetas do tipo que o Eduardo apresenta  na foto (trouxe montes delas, para distribuir pela família), machadinhas (símbolo da fertilidade - uma macho e outra fêmea), espadas e punhais fulas, anéis e alfinetes de peito ou para colar trabalhados em prata (Bafatá) e colares e pulseiras em missangas.

Em matéria de bebidas,  tínhamos a Coca cola (Coke), que na metrópole não existia - só aquela que refere o José Marcelino Martins - e os Whisquies para todos os gostos e preços (Monks, President, Dimple, Logan, Martins, Balentines, Something Special, Antiquary, Old Parr, etc.).

Como o Helder Valério também trouxe uma pele de jiboia, já curtida mas, mesmo assim, acabou por se estragar ao fim de alguns meses.

Saudosos tempos para esse tipo de compras.


2.5. Rui Santos [, foto à direita, ex-Alf Mil da 4.ª CCAÇ, Bedanda, 1963/65]

Embora em 1963/64/65 não houvesse muitas ofertas dos produtos já mencionados, afora os whiskies, as máquinas fotográficas, binóculos, máquinas de filmar, em especial vendidas, se não me engano, na Casa Tauffik Saad perto da Amura.

Tenho um serviço de café,  irmão gémeo do que o Edurado nos mostra em suas excelentes fotos, duas máscaras e dois bustos em madeira negra, e aquelas peças de artesanato que adquiri em Bedanda,  feitos do material dos invólucros das balas, por sinal alguns muito mal executados, mas tinha dois muito bonitos que ofereci a amigos, quando cheguei à metrópole.

Há que não esquecer aqueles produtos que vinham da África do Sul, belos chocolates, leite creme e enlatados diversos, muito superiores aos nossos... à época.

Muito obrigado por me terem feito recordar...

[Revisão / fixação de texto, em conformidade com o Novo Acordo Ortográfico]: L.G.

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Notas do editor:

domingo, 11 de setembro de 2011

Guiné 63/74 - P8766:Cem pesos, manda de patacão, pessoal ! (4): O que se podia comprar em Bissau: Os produtos e as marcas que não havia em Lisboa... ou eram "proibitivos" - II Parte (Magalhães Ribeiro)

O que se comprava em Bissau, com o patacão da guerra?
  (por Eduardo Magalhães Ribeiro)


1. Em 1974, Bissau fervilhava de gente de várias cores e povos, e toda a espécie de trânsito motorizado, deslocando-se entre os diversos estabelecimentos da cidade, tratando das suas vidas e outros negociando os seus produtos das mais variadas espécies e origens. Se bem me lembro, além dos portugueses e da população local guineense, cuidavam das suas rotinas e negócios: libaneses, indianos e cabo-verdianos.

Entre os objectos e equipamentos na moda então e, por isso, mais procurados por nós, contavam-se, tal como já referiu o nosso Camarada Helder de Sousa os uísques Old Parr, Monks, White & MacKay, President, Martin's e outras de uísque velho e/ou de malte, bem como os novos Passaport, J. Walker de 'labels' de várias cores, etc. Outros artigos que despertavam a nossa cobiça, eram os rádios e gravadores das marcas Sony, Aiwa e Grundig, bem como as máquinas fotográficas Reflex, Pentax, Canon, Casio e outras marcas japonesas.

Também o nosso Camarada Augusto Silva Santos acrescentou, que no seu tempo, estavam na moda: as máquinas fotográficas Olympus, relógios Cauny, whisky Antiquary, polos da Lacoste e Fred Perry.

O Luís Graça, ainda se lembra da grande procura dos isqueiros Ronson, óculos de sol Ray Ban e o uísque Old Parr.

Em 1974, o artesanato que mais me atraía era o que nos era oferecido em prata de Bafatá, mas continuava a grande procura de quase todos os artigos atrás mencionados, que tendendo para o fim do ano (com a rápida retirada do dispositivo militar português) se foram esgotando irreversivelmente.

Eu ainda consegui, antes de regressar, comprar vários artigos, tais como tapeçaria no Mercado Municipal, serviços de louça na Casa Gouveia e Manga de Ronco nos Cafés Portugal e Ronda. Desses artigos, que ainda por aqui andam hoje em casa, e dos quais anexo as seguintes fotos;


Máscara em madeira vermelha

Máscaras em madeira negra

Machadinhos em madeira e alumínio


Rolos de parede (Made in Japan)

Tapetes (creio que Senegaleses)

Tapete (creio que Senegalês também)

Serviço da café, com a foto da chinesinha no fundo das chávenas (Made em Japan)

Serviço de café (Made in Italy)


Artesanato diverso
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Nota do editor:

Guiné 63/74 - P8765: Blogoterapia (189): ... i-guerra... (José Marcelino Martins)

1. Em mensagem do dia 8 de Setembro de 2011, o nosso camarada José Marcelino Martins* (ex-Fur Mil Trms da CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70), enviou-nos este divertido texto de alta ficção tecnológica, que é como quem diz, como seria se assim fosse, o que não é o caso, antes pelo contrário.


… i-guerra…

Recostei-me no sofá, e pensei: Vou recordar! Boa. O quê?
Este tipo tem cada ideia! Recordar o quê? Olha, meu velho, batatinhas!
Bem. O melhor é não fazer esforços com a massa cinzenta, porque ainda pode resultar, do esforço, uma “hérnia no cérebro” e não é nada aconselhável que isso aconteça, até que o inchaço é bastante desconfortável.

Pus um “olhar em branco”, virado para o mais longe possível, na esperança de não ver nada, e assim nada me surgiria para pensar. Mas não. Deixar de dar ocupação, à massa que temos dentro da caixa craniana, é um bocado difícil.


Mesmo à minha frente, numa mesa especialmente comprada para o efeito, estava o meu portátil, daqueles pequeninos que, se não tivermos muito cuidado, estamos a teclar em duas letras ao mesmo tempo. E veio-me à memória os meus tempos de bancário, nos remotos anos setenta do século passado [século passado, é sempre uma expressão que fica bem em qualquer texto].

Pois é. “In illo tempore”, também é de bom-tom meter expressões em latim, naquele tempo, dizia, os computadores ocupavam uma sala, de dimensões razoáveis e climatizada, e os técnicos que nela trabalhavam usavam bata branca. Ainda não havia sido descoberto o “H1N1”, porque senão trabalhariam, também, com luvas anticépticas e descartáveis.

Pois bem. Eram máquinas enormes, em que a informação era “metida” através de cartões perfurados. Os mais idosos ainda se devem lembrar duns cartões que eram distribuídos pela empresa que fornecia a electricidade, que de nada serviam, já que, lembro-me, “andou pendurado no contador da luz” até que o senhor que lá foi fazer a contagem, disse:
- Ainda tem isto? Pode rasgar e deitar fora. Não serve para nada!

Pois eram esses cartões, perfurados, que se utilizavam no banco onde trabalhei, para enviar informações para o computador central, e processar as transferências de emigrantes, secção onde prestava serviço.

Por causa disso, dos cartões, recordei-me do Sébola. Exactamente, cebola com “s”, bom colega, amigo do seu amigo, óptimo desenhador, mas, como sempre há um mas, um bom bocado conservador, especialmente no que respeita “às novas tecnologias da época”. Mexer em papéis, arquivá-los, ordená-los, tudo bem. Trabalhar com os cartões, é que não.


Um dia de menos trabalho, a meio do mês abrandavam as transferências do estrangeiro, aproveitei e contei-lhe uma história.

Disse-lhe que, no dia anterior, tinha ido jantar com os meus pais e, depois do jantar, fiquei à conversa com o “velhote” e, como não havia grande gama de assuntos, falámos de computadores, e de como se processava o serviço, desde a “chegada dos cartões à secção” até à “devolução dos mesmos” para serem processadas as operações correspondentes.

Fiquei maravilhado. O Sébola, já um bom bocado mais velho que eu, ouviu com todo o interesse a minha descrição, onde, não podia deixar de o fazer, enfatizava o interesse que o meu pai na minha discrição “computadicional”. No final do relato da “suposta conversa” havida no fim do jantar do dia anterior, diz-me com um sorriso:
- Oh, Martins. O seu pai nem bocejou nem nada?

Imaginem, também, que não tinha havido um determinado dia, de um determinado mês, de um determinado ano. Que a guerra tinha continuado. Que os nossos filhos, e d’alguns, os netos, não tinham ido à tropa, como aconteceu.

Comecei a imaginar o que seria a Guerra do Ultramar, chamo-lhe assim porque era o nome que tinha na altura, e que nós conhecemos por termos sido actores e não espectadores, mas com as tecnologias actuais.

Temos que lembrar que, há cinquenta anos, quando começou a última fase das campanhas de África de 1961 a 1974, [já que houve muitas mais, desde 22 de Agosto de 1415 com a conquista de Ceuta até 25 de Junho de 1975 com a independência de Moçambique], os nossos camaradas iam armados da velha Mauser, com arreios modelo “não sei quantos” e as fardas eram de cotim, tecido muito em voga à época e dos mais baratos e resistentes do mercado. Os oficiais iam armados de pistola Walther e os sargentos com a FBP, daquelas que ainda não tinham recebido a patilha de segurança. No terreno, as tropas “guiavam-se” pelas Cartas Topográficas, que foram produzidas antes do início dos conflitos finais.

Na minha “área de conhecimento”, nas Transmissões era usado o material “herdado da Guerra da Coreia” (25 de Junho de 1950 a 27 de Julho de 1953), ou seja os AN-GRC 9, os AN-PRC 10 e os AVF/THC 736, mais conhecidos por “Banana”. Bem, depois deu-se a evolução e começaram a aparecer os CHP 1 e DHS 1, e mais tarde os RACAL, que já não foram contemporâneos meus.

Na área do “cripto”, o local devia ser isolado e resguardado e, onde só podia entrar quem “estivesse autorizado” pelas NEP (Normas de Execução Permanente), havia aquela “quantidade” de maior ou menor dimensão de “Códigos”, para se poder cifrar e/ou decifrar as mensagens que corriam no espaço, entre dois postos, quer transmitidos em fonia e/ou grafia.

Dentro da área das Transmissões, mas noutro registo completamente autónomo, existiam as “Transmissões Pessoais” que não faziam mossa ou concorrência, às “Transmissões Oficiais”. Estas, as Oficiais, quando necessário, apoiavam as Particulares, com o envio ou recepção de correspondência particular “Zulo”, mais conhecidos por “Telegramas”. E é verdade. Este tema de telegramas dá, sem dúvida, para um texto autónomo que, entrosado com a área civil, facilitou e embarateceu a circulação de notícias, previamente padronizadas e “codificadas através de um número”.


Os milicianos que continuariam a existir e, não me admirava nada que, os actuais países da CPLP, que neste escrito continuariam a lutar pela sua independência, seriam Governados por um General Miliciano ou um Almirante da Reserva Naval.

Vejamos, para o caso da Guiné, que conhecemos melhor:

Os “velhos Petromax” já eram ligados por um sistema automático e, cada poste de iluminação de alta potência, dispunha de uma placa solar para alimentação.

Dispostos estrategicamente por todo o aquartelamento, ligados em paralelo entre si, existiam vários painéis solares que, mesmo que algum fosse atingido e/ou avariasse, não impedia que os outros continuassem a iluminar o posto de recolha e distribuição de energia.

A cozinha, já dispunha de excelentes equipamentos de confecção das refeições. O refeitório foi modificado e, sinais dos tempos, passou a ser “self-service”. Os pratos de alumínio desapareceram, para dar lugar a uns tabuleiros em aço inox que dispunham já do formato dos pratos para sopa e o “prato do dia”. Local para o copo, pão e fruta. Com água quente em abundância, pelo menos em comparação com o nosso tempo. O trabalho dos faxinas era um “louvar a Deus”, além da dispensa de operações.

A ideia do Zé Teixeira, o “nosso fermero”, foi adoptada e “isso” resolveu uma série de problemas. O velho poço ou o recurso à água da bolanha, foi ultrapassado. Furos “tecnológicos” foram efectuados pelos aquartelamentos e todos dotados de motor, accionados pela electricidade gerada por uma placa solar.


A existência de poços, permite que haja uma “agricultura de subsistência” em cada unidade, tendo-se algumas, tornadas auto-suficientes quer em produtos frescos quer mesmo em agropecuária.


No que respeita ao armamento ligeiro, a “velha Mauser” deixou de existir, tendo sido substituída pela G3, já de fabrico nacional, com autorização patenteada e passível de adaptações.



A G3, quase a completar 50 anos de idade, continua a existir, mas agora com cuidados ecológicos. A coronha e guarda mão, inicialmente em madeira e mais tarde de plástico, são agora fabricadas com materiais reciclados e recicláveis e, portanto, amigos do ambiente. A parte metálica, de uma nova liga mais resistente e muito mais leve, permitiu adaptar outros “adereços” que lhe dão outras possibilidades. Além de um “raio laser” para permitir um “tiro de precisão”, dispõe de uma lanterna led, alimentada por um acumulador, que é carregado quando a arma é colocada no armeiro. Se necessário, pode ser accionado o botão de um dispositivo que produz energia, com o movimento da arma. Estes dispositivos são um complemento aos “óculos de visão nocturna”, permitindo que as forças façam mais operações durante a noite, evitando o calor abrasador do dia.

Os velhos mapas, que agora ainda podem ser encontrados no blogue da Tabanca Grande, são uma preciosidade, por raros, e alvo de leilões na net. Esses mapas, dizia, são agora substituídos por ipad, que são carregados com os mapas e o plano de operações no dia anterior à operação e são dotados de uma pilha especial, fabricado para este modelo, com uma autonomia de 120 horas, o que é excelente.

Em cada operação é incorporada uma Equipa de Foto-cine, com a missão de filmar a operação, para posterior envio ao escalão superior, evitando “baldas” ou o inconveniente de estar a manuscrever o relatório para ser elaborado à máquina em “n” cópias. Agora vai, por mail, para as diversas entidades.
No entanto, antes de seguir para “distribuição”, o “Estado-Maior” da Unidade, mesmo ao nível de Companhia, reúne com os oficias e sargentos que tomaram parte na operação, num “briefing”, visionam a mesma, tecem os comentários aconselhados, e anexam ao vídeo, da operação, a filmagem da reunião. Serviço limpo e rápido.


As transmissões entre a força em operação e o aquartelamento e feito por telemóvel 3G, o que permite, inclusivamente, “conversação em privado” com o Comandante da Unidade e/ou do escalão superior. Permite o envio e recepção de SMS e, também muito importante, o envio de imagens, como trilhos descobertos, minas implantadas e descobertas, etc.

Aos elementos que constituem a força em operação, é que é vedado o uso de telemóveis, já que a opinião pública foi fortemente afectada pelo caso do soldado que, durante uma patrulha quando estava a falar com a namorada, foi atingido. Antes da força “sair para o mato” passa através de um “pórtico detector” que denuncia os “aparelho transportados indevidamente”.

Há também outras razões. Foram descobertos “infiltrados” nas unidades que, mais não eram, que jornalistas disfarçados e que, durante os patrulhamentos enviavam relatos em directo para rádios e televisões, incluindo, muitas vezes, imagens via MMS.

Continuando com as transmissões, deixaram de existir, nas unidades combatentes, não só os Radiotelegrafistas, que já eram uma minoria no nosso tempo, mas também os Radiotelefonistas. Os Operadores de Mensagens, também deixaram de existir. Agora, todas estas especialidades, foram substituídos por “Operadores de Informática”, credenciados pela Chefia das Transmissões, para poderem lidar com “material e informação crítica”.

Numa Parceria Publico Privada (PPP), foi assinado um protocolo entre o Ministérios das Forças Armadas e dos Combatentes e a Universidade Norte-Leste (sediada em Braga, ou, talvez um pouco mais abaixo) que, em cooperação estreita com a empresa “Verão Academy”, desenvolverem um programa para “criptar e descriptar” mensagens.

Esta parceria revelou-se de extrema utilidade, já que ao receber a mensagem, via e-mail, o Operador faz “Copy/Paste” para a aplicação “Cripto Translation” e, instantaneamente, aparece no monitor a “mensagem em claro”, tendo bastado para tal colar o texto a “trabalhar” na aplicação, indicar se é “tradução ou retroversão”, indicar o código utilizado e clicar sobre a janela "Executar". É mais ou menos, mas mais aperfeiçoado, do que o que fazemos quando queremos usar uma aplicação de “tradutor”. Seguidamente, e por circuito interno (seguro), a mensagem é encaminhada para o Comando que, depois de ler, não necessita de imprimir, bastando gravar na pasta destinada “aos assuntos” relacionado com o texto.

Quando se torna necessário, o Comandante escreve o texto que quer, directamente no seu PC (personnal computer, não Posto de Comando), e envia para o Operador de Informática que cifra o texto e o envia, por e-mail, para os destinatários.

Deixou de haver “Toque de Ordem” e, a “Ordem de Serviço” deixou de ser dactilografada. Esta é digitada na secretaria e enviada para a equipa de Foto-cine que a faz circular pelo circuito interno de televisão, não havendo, portanto, razão para que o pessoal desconheça o conteúdo da mesma. Quem dispuser de equipamento compatível e, desde que tenha subscrito essa funcionalidade, pode receber essas informações no telemóvel, ipad, mail, ou “descarregar", mediante pedido, directamente no seu ipod.

O Corneteiro já esqueceu o “Toque a Pré”, dado que esta cerimónia deixou de existir. Os pagamentos são efectuados por transferência bancária para todos os elementos da Unidade. A Cantina das Praças, o Bar dos Oficiais e Sargentos, assim como o Depósito de Géneros, dispõem de terminal Multibanco, onde pode ser efectuado o pagamento pelo cartão de “Identificação Militar” que dispõe de um chip, para poder ser utilizado como cartão de débito ou crédito, bastando para tal a introdução de um PIN. Os montantes, das operações, são movimentados, imediata e automaticamente, nas contas a que a cartão está associado.

Para uso no comércio local, agora bastante desenvolvido, existe junto da Secretaria um “terminal Multibanco” para levantamento de dinheiro. Esta caixa é abastecida pelos serviços do “Banco Tesouro/Militar”, pelo que os militares, com a Especialidade de “Bancorários”, visitam as Unidades para efectuarem o carregamento das máquinas, com dinheiro fresco. É nessa altura que são distribuídos os “extractos de conta”, mas são raros, porque além de caros, são incentivadas as adesões ao extracto “on-line”.

Como é um serviço que, além de caro, pode desenvolver uma “espécie de pirataria” por parte dos “movimentos de libertação”, como a detecção por aeronaves ou assaltos às “carrinhas de transporte de valores (anfíbias)”, encontra-se em estudo um convénio, entre o Banco Tesouro/Militar com o Banco Provincial, para a criação de um Instituto que faça a gestão das operações entre os bancos (militar e civil) digamos que uma espécie de SIBS, que assim criará mais alguns postos de trabalho para a população.


Também o Laboratório das Forças Armadas, em colaboração com as Universidades, nacionais e estrangeiras, estão a desenvolver um novo fármaco, com efeitos “rejuvenescedores e recuperativos de memória” (tipo “viagra”), que será distribuído em “unidose” [afinal sempre é exequível a unidose] para, em colaboração com as Associações de Combatentes, se encontre uma forma de fazer voltar ao activo aqueles que há muito se encontram desmobilizados, uma vez que, com a experiência destes e os novos equipamentos, se consiga, de vez, terminar com este conflito.

Afinal acabei por não recordar nada. Adormeci e tive um sonho incrível. Este sonho já foi há algum tempo, e ainda me pergunto se é realidade ou ficção.
Parece-me mais ficção, porque a verdade, verdadinha, é que parece que vamos ter de novo a forma de comunicar com fumo. Não será com aquelas “máquinas de fumo” que se usam em espectáculos tipo “Hollywood”, porque os produtos de consumo nestas máquinas, fundamentalmente a electricidade, vai aumentar de preço por causa do aumento do IVA, mas vamos usar os FUMOS DA HISTÓRIA, antes que estes se dissipem no ar.

José Marcelino Martins
08 de Setembro de 2011
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 24 de Agosto de 2011 Guiné 63/74 - P8703: Blogoterapia (187): Devaneios literários? (José Marcelino Martins)

Vd. último poste da série de 5 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8735: Blogoterapia (188): Encontros, ou como abrir o tal Capítulo da Vida (Torcato Mendonça)

Guiné 63/74 - P8764: Cem pesos, manga de patacão, pessoal ! (3): o que se podia comprar em Bissau: Os produtos e as marcas que não havia em Lisboa... ou eram "proibitivos" - Parte I (Helder Sousa / Augusto Silva Santos)

1.  Comentários ao poste P8762 (*), podemdo dar início a uma nova série para a qual se esperam muitos contributos...

(i) Luís Graça:

Isqueiros Ronson, óculos de sol Ray Ban, uísque Old Parr... Que outros produtos e outras marcas estavam então na moda, em Bissau, nas lojas onde a gente ia gastar o patacão... o Taufik Saad, a Gouveia. etc. ?

(ii) Hélder Sousa (ex-Fur Mil de TRMS TSF, Piche e Bissau, 1970/72),


Quanto a coisas que se compravam, que estavam na moda... bem, relativamente a uísque, para além do Old Parr, estavam na moda, no 'meu tempo', a Monks, White & MacKay, President, Martin's, e outras de uísque velho e/ou de malte e também havia os novos Passaport, J. Walker de 'labels' de várias cores, etc.

Haviam os rádios e gravadores: Sony, Aiwa, Grundig. As máquinas fotográficas 'reflex': Pentax como o expoente máximo, mas também as Canon, Casio e outras marcas japonesas.


De roupas não me lembro. Sei que comprei tecido e levei a fazer calças a profissionais no Cupilão.

 (iii)  Augusto Silva Santos ( E
x-Fur Mil da CCAÇ 3306/BCAÇ 3833, Pelundo, Có e Jolmete, 1971/73)


 A propósito de marcas... Para além do que já foi citado pelos anteriores camaradas, no meu tempo de Guiné estava também muito em moda adquirir-se o seguinte:

Máquinas fotográficas Olympus
Relógios Cauny
Whisky Antiquary
Polos da Lacoste e Fred Perry
 
Quando o pessoal vinha de férias ou acabava a comissão . . . É que aqui naquele tempo, muitas das coisas ainda não existiam.
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 Nota do editor:
  

sábado, 10 de setembro de 2011

Guiné 63/74 - P8763: Notícias dos nossos amigos da AD - Bissau (21): Cerca de 200 ecoturistas visitaram o Parque Nacional do Cantanhez, este ano, de Janeiro a Junho



Guiné-Bissau > Bissau > AD - Acção para o Desenvolvimento > Foto da semana > Título da foto: Ecoguias preparam-se para a nova época turística; Data de Publicação: 28 de Agosto de 2011; Data da foto: 3 de Dezembro de 2008; Palavras-chave: Ecoturismo

"A partir de Outubro [ deste ano] recomeça a nova temporada de ecoturismo em Cantanhez, onde as ofertas de itinerários é mais diversificada, onde existirão miradouros de animais selvagens (bebedouros), maiores aproximações ao animal mais emblemático deste Parque (o chimpanzé) e onde os passeios ao Ilhéu de Melo serão mais frequentes.

"O conjunto de ecoguias,  constituído por jovens das várias tabancas de Cantanhez, estão agora melhor preparados para receber os turistas que, à semelhança do ano passado, virão de Espanha, Holanda, Portugal, Itália, Alemanha, Estados Unidos da América, França, Bélgica, Senegal, China, Polónia, Inglaterra, Brasil, Filipinas e Guiné-Bissau.

"Aguarda-se que esta campanha turística ultrapasse os 193 turistas que visitaram Cantanhez de Janeiro a Junho deste ano, alargando-se a sua origem, uma vez que começam a ser feitos acordos de parceria com outras organizações turísticas, como a de Orango, nos Bijagós".

 Foto (e legenda): Cortesia de © AD - Acção para o Desenvolvimento (2011). Todos os direitos reservados.


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Nota do editor:

28 de Julho de 2011 >  Guiné 63/74 - P8614: Notícias dos nossos amigos da AD - Bissau (20): Rezando pela chuva, lá, no tempo dela; imprecando contra o vento, estival, cá... (Luís Graça)

Guiné 63/74 - P8762: Estórias avulsas (57): O 400 da CART 1746 (Manuel Moreira)

1. Mensagem do nosso camarada Manuel Vieira Moreira (*), ex-1.º Cabo Mec Auto da CART 1746, Bissorã, Ponta do Inglês e Xime, 1967/69, com data de 21 de Agosto de 2011:


Amigo e Camarada Luís,
Envio uma história das minhas "Memórias" no XIME. Se valer a pena, publica.


Um Abraço Camarigo para toda a Tabanca.
Manuel Moreira, ex. 1.º Cabo Mec Auto
CART 1746




O 400


O 400 era o Soldado que tinha o primeiro número de ordem da Companhia. De apelido Quinteiro, tinha muito vício de cravar cigarros a todos que fumassem.


Era como que o guarda costas do Alferes  Gilberto Madaíl, pelo que eram muito amigos. Tinha, além disso,  um farfalhudo bigode que fazia inveja.


Eu fumava SG Gigante, sendo os cigarros eram acesos com um isqueiro a gasolina que deitava muito fumo e ia passando despercebido.


Em finais de 1968, vim a Bissau fazer um estágio de mecânica diesel na Engenharia e comprei um isqueiro Ronson a gás muito bonito, que ainda hoje guardo de recordação porque tem gravadas as datas da minha "Guerra ".


Quando o 400 soube desta aquisição, com muito jeito me cravava todos os dia um cigarro, desta forma :
- Oh nosso Cabo, dê-me um cigarro dos seus que são grandes e acenda-mo com o seu Ronson.


Aquilo demorou muito tempo e, claro, comecei a pensar em tirar-lhe o vício da cravança.


Quando achei que já chegava, resolvi abrir a saída do gás no máximo ao isqueiro e queimei-lhe o bigode e parte da boca e nariz. Claro que me desfiz em desculpas pelo sucedido, argumentando que não fora por mal.


O certo é que poupei muitos cigarros a partir daí...


Já não fumo desde 1984, mas de vez em quando vou ver o isqueiro e lembra-me esta história.


Desde a nossa chegada, em 13 de Junho [ou Julho ?] de 1969, nunca mais soube nada do meu amigo Quinteiro que, salvo erro, é de Santiago do Cacém, e a quem mando um grande Abraço.  Caso ele leia esta História, que me dê notícias.


Saudações Camarigas, Manuel Moreira
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Notas de CV:


(*) Vd. poste de 5 de Maio de 2011 > Guiné 63/74 - P8226: Convívios (323): 13º Convívio da CCAÇ 2313 vai decorrer em 4 de Junho de 2011, Águeda (Manuel Moreira)


Vd. último poste da série de 6 de Agosto de 2011 > Guiné 63/74 - P8643: Estórias avulsas (115): Quando o Dulombi foi flagelado pelo PAIGC com “Armas Pesadas” (Luís Dias)

Guine 63/74 - P8761: Fotos a procura de... uma legenda (15): Bambadinca e o seu famoso bagabaga catedral... Álbum do Benjamim Durães





Guiné > Zona Leste > Sector L1  > Bambadinca >  Um dos ícones de Bambadinca (que quer dizer "a cova do lagarto", segundo o poeta Artur Augusto Silva)...  Este era  o famoso bagabaga de Bambadinca, ou um deles... Era muito fotografado... Quem, de resto,  não tirou uma foto em cima de um bagabaga para mandar para a metrópole, com  recuerdo da sua passagem por aquela "terra verde e vermelha"(Será que este, um verdadeiro monumento vivo da natureza, ainda está de pé, 40 anos depois ?)...

Na 1ª foto, a contar de cima, pode avaliar-se a altura do monumental bagabaga, por comparação com o Umaru Baldé, o puto, com o seu inseparável cachimbo (O Umaru deveria ter um metro e setenta de altura, este bagabaga é um dos mais altos que tenho visto, medindo cerca de 6 metros, da base ao topo).

O nosso "belo efebo" era filho de régulo, dizia-se. Teria 16 anos, na melhor das hipóteses quando se juntou a nós, CCAÇ 2590, e depois CCAÇ 12. A seguir à independência, terá andado fugido - com a cabeça a prémio, dizia-se -  tendo conseguido refugiar-se em Portugal. Morreu cá, há uns anos atrás, de doença  - Sida e tuberculose -, no hospital do Barro, em Torres Vedras ... Vários antigos camaradas, metropolitanos, da companhia ajudaram-no a sobreviver... Foi um bravo combatente, foi ferido em combate, como a maior parte dos soldados da CCAÇ 12... Não chegou a acabar a sua comissão na CCAÇ 12, segundo o seu amigo e protetor, o António Marques, terá sido transferido depois para Bissau.

Já em tempos, em 2006, tínhamos começado uma série com o título Concurso o Melhor Bababaga, de que se publicaram pelo menos 3 postes (*)... Recordo-me que trazia uma foto  com o Humberto Reis, garbosamente empoleirado num outro bababaga de Bambadinca. também do tipo catedral... 

Como eu então escrevi,  os bagabagas são aglomerados de terra e outros resíduos - material lenhoso, no essencial - , edificados pelas térmites e que constituem o seu ninho. São muito resistentes, mas infelizmente tal como a floresta tropical não resistem aos bulldozers e ao avanço do cimento (que confundimos com civilização, progresso, desenvolvimento)...

"Temos a obrigação de ajudar os guineenses a preservar estes monumentos vivos da natureza... Este pequeno concurso (fotográfico) é uma forma de sensibilizar os nossos tertulianos e demais visitantes para o património (natural e edificado) da Guiné-Bissau... Nós, ex-combatentes, quer portugueses, quer do PAIGC, temos um enorme respeito pelo bagabaga: ele fazia parte do nosso cenário de guerra... Hoje deve ser um símbolo da paz e da biodiversidade"... 

 Um das expressões que aqui usamos, é: "Não te escondas por detrás do bagabaga, dá a cara"... É o que temos feito desde Abril de 2004, alimentando e acarinhando este blogue... (LG)

Fotos: © Benjamim Durães (2010) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados


1. Continuação do nosso passatempo Fotos à procura de... uma legenda (**), que já não é de verão, é de outono... Os nossos leitores continuam a ser convidados (para não dizer desafiados...) a mostrar, aqui em público, o seu especial talento em matéria de legendagem (livre) de fotos... 

Aproveita-se para reproduzir, mais uma vez, um dos poemas do Artur Augusto Silva (1912-1983), pai nosso amigo Pepito, e que é um hino à sua amada Guiné, "terra negra" mas também "verde e vermelha"... (LG)


TERRA NEGRA

Ao Fernando Pessoa,
Poeta de Portugal

Terra negra que tremes em convulsões de parto,
Terra negra que a guerra devasta,
Terra negra que os ódios revolvem,
Terra negra que o Luar acaricia.

Oh terra negra da minha infância,
onde uma negra ama me aleitou,
com cuidados maternais
e um amor que vinha do íntimo dos séculos.

Oh terra negra da minha infância,
onde brinquei com meus irmãos negros,
onde nadei no rio com meus irmãos negros,
onde cresci de mãos dadas com meus irmãos negros.

Oh terra negra dos mais saborosos frutos do mundo:
do ananás, do caju, da papaia, do mango;
Oh terra negra dos maravilhosos contos infantis
que a minha ama negra me contava para adormecer.

Ali, naquela enorme árvore, estava o irã,
terrível espírito da floresta que metia medo aos meninos
e nos fazia fugir para longe.
Mais para lá, era o poilão de Santa Luzia
que vomitava fogo quando a santa queria orações;
e o terreiro onde o cumpô dançava
e os meninos se extasiavam,
era a cova do lagarto onde ninguém ia,
era a mata do fanado
com os seus mistérios terríveis.

Era a minha vida,
a vida dos homens simples
que amavam os seus semelhantes
e veneravam os velhos.
Agora, oh terra verde e vermelha da Guiné,
só te peço que todas as noites
deixes baixar sobre meu coração
o silêncio que cura os males da alma
e que quando os dias nascerem húmidos e tenros
como o barro das tuas bolanhas,
deixes o meu corpo
receber esse afago matinal
que foi o meu primeiro baptismo
e te peço seja a minha absolvição.

Bissau: Instituto Camões, Centro Cultural Português de Bissau. 1997. pp. 23-25.


2. Para os devidos, reproduz-se aqui, com a devida vénia, um pequeno texto sobre o bagabaga (substantativo, do género masculino e não feminino, sinónimo de térmite e de termiteiro, palavra que vem do crioulo lusófono, oral e escrito, segundo o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa): J. P. Cancela da Fonseca: As térmites na paisagem da Guiné: documentário fotográfico. Boletim Cultural da Guiné Portuguesa, Volume XIV, nº 56, Outubro de 1959 (Reproduzido, por sua vez, pelo A.Marques Lopes, no seu blogue Coisas da Guiné, em poste de 1 de Junho de 2011)... Fiquei a saber que há dois tipos de bagabaga, o vermelho que constroi termiteiras tipo catedral, e o bagabaga preto, cujas termiteiras são em cogumelo...
 
(...) Quem pela primeira vez pisa a escaldante terra africana; quem pelas suas digressões pelo «mato» se apercebe da cambiante duma paisagem como a da Guiné portuguesa, que os menos avisados classificam de monótona; quem pelos seus inte­resses humanos se fixa na evolução que a paisagem sofre pela acção cul­tural do Homem. - Vê aqui e além, espaçados ou agrupados, erguerem-se acima do solo montículos de forma estranha , que não são obra de gente, de planta ou de pedra; - são obra de animal. 
 
Esse animal, é o «senhor da terra»… africana. A ele paga o Homem pesado tributo em géneros e em habitação: as térmites aparecem destruindo a cultura no campo, o produto no armazém, a madeira na casa. Os tecidos lenhosos, vivos ou mortos, são o seu alimento predilecto. Para os alcançar cava túneis, constrói galerias, arquitecta ninhos. Adapta as suas necessidades à paisagem. Subordina a paisagem às suas necess­idades.

As termiteiras em catedral (baga-baga vermelha) do tipo Macrotermes spp., erguem-se majestosas nas suas perspectivas de gigante, nas florestas, na savana, no campo de cultura. Sobrepassam as culturas anuais, espreitam através dos arvoredos cerrados, e, à compita, elevam ao céu a mesma prece que o cibe ou a palmeira do chabéu: - Sou vida...

Rastejam em colónias graciosas, emprestando uma beleza subtil às paisagens cinzeladas do Boé e Nhampassaré e aos solos quase enxutos de seiva criadora, as termiteiras em cogumelo da baga-baga preta, do tipo Cubitermes spp.. Às dezenas, às centenas, aconchegadas na amplidão das crostas ferruginosas donde emergem, banhando-se dum pleno sol sob a protecção dos seus chapéus dum cinzento suave, parecem reclamar a protecção do céu, gritando na sua humildade: - Nós!... Somos tam­bém vida.

Quem se detiver e contemplar atento tão vastas áreas degradadas terá ocasião de meditar: - Sois vida! Mas também sois morte?! (...)
[Recomenda-se a ida ao blogue do A. Marques Lopes para ver as fotos que ilustram o texto aqui reproduzido].

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Guiné 63/74 - P8760: Parabéns a você (315): Rui Batista, ex-Fur Mil da CCAÇ 3489/BCAÇ 3872 e Tony Grilo, ex-Soldado Apontador de obus 8,8

Com um abraço da tertúlia e editores
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Notas de CV:

- Rui Batista foi Fur Mil na CCAÇ 3489/BCAÇ 3872 que esteve em Cancolim nos anos de 1971 a 1974

- Tony Grilo foi Apontador de obús 8,8, esteve em Cabedu, Cacine e Cameconde nos anos de 1966 a 1968 e, ao que sabemos, vive presentemente no Canadá.

Vd. último poste da série de 9 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8755: Parabéns a você (314): Carlos Silva, ex-Fur Mil da CCAÇ 2548/BCAÇ 2879 e Filomena Sampaio, viúva do nosso camarada Manuel Castro Sampaio, ex-1.º Cabo TRMS da CCS/BCAÇ 3832