quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Guiné 63/74 - P13784: Agenda cultural (343): Curso livre TODA A CHINA, no Museu do Oriente, Lisboa, todos os sábados, das 10h00 às 13h00, de 26/10 a 20/12/2014, ministrado pelo ilustre sinólogo e nosso camarada António Graça de Abreu


Texto e imagens: © António Graça de Abreu  (2014). Todos os direitos reservados.


1. Mensagem que recebemos do nosso camarada e amigo António Graça de Abreu, com pedido de divulgação entre os amigos e camaradas da Guiné e demais leitores do nosso blogue:

António Graça de Abreu
abreuchina@netcabo.pt

Estoril, 12 de Outubro de 2014

Meus caros amigos
Iniciar-se-á a 25 de Outubro mais um Curso sob minha orientação no Museu do Oriente. Envio-vos a introdução e o sumário das duas primeiras aulas do Curso. Tinha todo o gosto em ter-vos comigo, ou aos vossos amigos, nesses nove sábados que se aproximam, na fascinante viagem de descoberta e encontro com TODA A CHINA.

No site da Fundação/Museu do Oriente encontrarão todas as necessárias informações [Clicar aqui].

Conto convosco, ou com os vossos amigos.

Toda a amizade do

António Graça de Abreu



2. Lisboa > Museu do Oriente > Curso TODA A CHINA 

25 de Outubro de 2014 a 20 de Dezembro de 2014
Doutor António Graça de Abreu

Introdução

“Os anos vão passando. E, com o passar dos anos, a não ser a China, tudo na terra passa.” [Eça de Queirós (1845-1900), Os Maias, cap. XVIII ]


Quando se fala ou se escreve sobre a China prevalece amiúde a ideia de que nos referimos a uma entidade única, o velho Império do Meio, uniforme, consolidado e consensual. Nem sempre será assim. A China, com 9,6 milhões de quilómetros quadrados é um vasto território – tem o tamanho da Europa –, com incontáveis diferenças de natureza económica e social, diferenças entre Norte e Sul, entre Leste e Oeste, entre as zonas costeiras e o interior, diferenças climáticas e de fixação humana, desde as imensas planícies de terras férteis cortadas por canais e rios, aos desertos e majestosas montanhas.

 A China é um país multi-étnico (55 minorias nacionais) com usos e costumes diversos, com vivências, trajes, comidas, cores e cheiros díspares, eivados de mistérios e fascínios. Prevalecem os han, os chineses propriamente ditos, 95% da população da China, com oito dialectos principais.

Nos nove módulos deste curso, de tudo isto iremos falar, e ver, nas excelentes fotografias de António Graça de Abreu (mais algumas da net, não muitas…), resultado de trinta e sete anos de jornadas que se estenderam rigorosamente a toda a China, viagens completas por todo o mundo chinês que António Graça de Abreu concluiu em Setembro de 2013 e tem continuado a fazer, já com mais duas viagens à China neste ano de 2014.




Numa súmula que se pretende concisa e abrangente, temos agora o seu testemunho que irá ser partilhado, comentado, discutido com os participantes do curso. Semana após semana iremos visitar todas as 22 províncias chinesas, as cinco regiões autónomas (Tibete, Xinjiang, Ningxia, Guangxi e Mongólia Interior), os quatro municípios centrais (Pequim, Tianjin, Xangai e Chongqing), mais Macau, Hong Kong e Taiwan, a Formosa.

A proposta é abrir caminhos para um possível conhecimento da China, viajando com o olhar, as sensibilidades, os entendimentos pela História, a civilização, a cultura, as mentalidades, os quotidianos, passado e presente das gentes do mundo chinês, povo imenso ora habitando as grandes cidades ora espalhado por aldeias perdidas nos confins do Império. 

Em cada semana a viagem estender-se-á por três ou quatro províncias, por regiões autónomas, ao encontro do diferente e do único, ao encontro das gentes do mundo chinês, das realidades duras e difíceis de um povo imenso, da imponência da paisagem. Tudo acompanhado por textos escritos, referentes a cada uma das províncias, regiões ou lugares visitados, da pena de António Graça de Abreu. Para fruir e tentar compreender. Porque, como nos diz o grande sinólogo belga Simon Leys (1925-):

“C’est seulement quand nous considérons la Chine que nous pouvons enfin prendre une plus exacte mesure de notre propre identité et que nous commençons à percevoir quelle part de notre héritage relève de l’humanité universelle, et quelle part ne fait que refléter de simples idiosyncrasies indo-européenes. La Chine est cet Autre fondamental sans le rencontre duquel l’Occident ne saurait devenir vraiment conscient des contours et des limites de son Moi culturel.”[ Simon Leys ( 1925?- )]

E também, porque como recordava há cem anos atrás o francês Vítor Segalen (1878-1919), outro grande mestre no desvendar dos entendimentos do mundo chinês:

“A viagem à China é uma viagem ao fundo do conhecimento de nós próprios”

Programa [duas primeiras sessões]

25 de Outubro de 2014

1. Os quatros municípios centrais. Pequim 北京, Tianjin 天津, Xangai 上 海e Chongqing 重庆

1.1.- Pequim, cidade do poder, da política, capital do Império.

1.2.- Tianjin, um dos motores da indústria e economia chinesas.

1.3.- Xangai, a megacidade, original, única, diferente. História e quotidianos.

1.4.- Chongqing, a maior metrópole (30 milhões de habitantes) da China.


1 de Novembro de 2014

2. A singular Manchúria. Províncias de Heilongjiang 黑龙江, Jilin 吉林, Liaoning 辽宁, mais a província de Hebei 河北

2.1.- As terras “siberianas” do nordeste. Harbin, a fascinante cidade “russa”.

2.2.- Japoneses na Manchúria. O estranho reino de Manchukuo.

2.3.- Matérias-primas, indústria, o celeiro agrícola da China do norte.

2.4.- Relações e fronteiras com a Coreia do Norte.

2.5.- Changchun e Shenyang, as falsas primaveras. Quotidianos, prazeres e desprazeres por terras manchus.

2.6.- Chengde, barroquismos, templos, embaixadas e fantasias.

2.7.- Rio Amarelo e Grande Muralha da China. Importância na História da China.


3. Informação adicional

Local e contactos: 

Museu do Oriente
Avenida Brasília, Doca de Alcântara (Norte)
1350-352 Lisboa

Telefone: 213 585 200
E-mail: info@foriente.pt
Data e horas:
de 25 de Outubro de 2014 a 20 de Dezembro de 2014
Sala Beijing do Museu do Oriente, 4º. Piso, 
todos os sábados, 

Guiné 63/74 - P13783: In Memoriam (201): Manuel Simões (Bolama, 1941-Jugudul, 2014): amava a sua terra como ninguém tinha especial carinho pelos balantas, era uma figura muito popular, e de grande generosidade (Manuel Amante, Praia, Cabo Verde)


Manuel Simões (Bolama, 17/5/1941- Jugudul, 21/10/2014). Cortesia de Manuel Amante



1. Mensagem do Manuel Amante da Rosa [, foto à esquerda]:

Data: 22 de Outubro de 2014 às 07:46

Assunto: Manuel Simões (1941-2014)

Meu Caro Luís:

Só agora posso responder-te.

O Manuel Simões, meu primo, nasceu em Bolama, em 17 de Maio de 1941 (*). O Pai, o velho Manuel Simoes, empresário conhecido de Bolama e do sul da Guiné, era originário de Moimenta da Serra, Portugal onde faleceu nos finais dos anos sessenta.

O filho Manuel estudou alguns anos no Colégio Moderno, ao tempo do pai do Dr. Mário Soares, como interno, mais o irmão Januário, após o que retornaram à Guiné para ajudar o pai nas casas comerciais que tinha no sul da Guiné e Bijags (Darsalame, Empada, Bolama e Embana na ilha das Galinhas).

Ambos os irmãos distinguiram-se no desporto, no futebol, tanto como jogadores como dirigentes desportivos.

Com o início da guerra o Manuel Simoes, mais conhecido por Manelito, recolheu, como muitos, a Bissau e dedicou-se ao transporte fluvial. Cumpriu parte do serviço militar obrigatório. Fez parte do primeiro curso de Sargentos Milicianos, dado na Guiné, nos inícios de sessenta. Foi desmobilizado após o assassinato do irmão [, Januário Simões, em Empada, c. 1962].

Foi dirigente do Ténis Clube de Bissau durante muitos anos. Seu clube de eleição. Enveredou pela indústria da destilaria da cana de açúcar, em Jugudul, após o fim da guerra.

Era pessoa muito conhecida, de trato fácil e popular por toda a Guiné. Sempre generoso durante toda a sua vida. Ajudou muita gente sem nunca fazer disso nenhum alarde. A porta sempre aberta para amigos e carenciados.

Amava a Guiné como ninguém e identificava-se plenamente com tudo o que dissesse respeito a os hábitos e costumes da sua terra amada.

Conhecia bem toda a Guiné, especialmente a região e etnia Balanta. Região onde passou os últimos anos da sua vida e que sempre o acolheu com muito carinho.

Recebe um forte Abraço.

Manuel

Enviado do meu iPad
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Nota do editor:

Último poste da série >  21 de outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13779: In Memoriam (200): Manuel Simões (c. 1939 - 2014), um português de Bolama, que foi a Conacri ao funeral de Amílcar Cabral, e que andou na escola com 'Nino' Vieira, e que recebia, em Jugudul, de braços abertos, os seus amigos, fossem de Cabo Verde, fossem de Portugal (Manuel Amante / A. Marques Lopes / Xico Allen / António Camilo / José Teixeira)é 

Guiné 63/74 - P13782: Os nossos médicos (84): Memórias do Dr. Rui Vieira Coelho, ex-Alf Mil Médico dos BCAÇ 3872 e 4518 (14): Onde se fala de doenças sexualmente transmissíveis (con destaque para a blenorragia) mas também de perturbações psíquicas como a depressão e o stresse pós-traumático de guerra




Guiné > Zona leste > Setor L5 (Galomaro) > c. 1973 > BCAÇ 3872 (1072/74) > A camimnho de Cancolim e posto médico de Cancolim.


Fotos do álbum do ex-alf mil médico Rui Vieira Coelho, disponíveis na página do grupo (fechado) do Facebook Galomaro, destino e passagem (Criado em 23/3/2011, e editado pelo Rui Vieira Coelho, tem já cerca de 90 membros, pretendendo "convergir pelo trato afectivo todos os ex-militares que permaneceram em Galomaro, na Guiné-Bissau, ou por lá passaram em trânsito").


Fotos (e legenda): © Rui Vieira Coelho (2014). Todos os direitos reservados [Edição de L.G.]


1. Quartz e última parte do texto de Rui Vieira Coelho, desta vez correspondendo a uma "sugestão", minha,  de 17 do corrente, para nos falar das doenças sexualmente transmíssíveis:


Rui, estou encantado com a tua "frescura" de memória... É verdade que "só esquece a quem não sabe"... Mas há aqui uma riqueza de informação médico-sanitária, que só agora consegui reunir, a parrtir de uma fonte autorizada (que é um médico com o teu saber, sensibilidade e experiência)...

É um testemunho muito importante da tua parte, para esta série "Os nossos médicos"... Também não é por acaso que tu, para além de médico do batalhão, não ficavas fechado no quartel, e foste subdelegado de saúde do Cossé (, regulado donde provinha uma parte dos meus soldados, fulas, da CCAÇ 12, constituída em 1969)...

Sem querer abusar da tua paciência, diz-me mais coisas:

(i) Então, e quando a rapaziada aparecia com o vulgaríssimo "esquentamento" ou blenorragia (, na tropa não se falava caro) ? Eu sei que a malta se desenrascava melhor com o enfermeiro, já que a doença era sempre vista como "vergonhosa" à luz da nossa cultura judaico.cristã... Eventualmente havia outros problemas de doenças sexualmente transmissíveis mas já existia a "bala mágica", o antibiótico, a penicilina, coisa que não existia em Cabo Verde, no Mindelo, no tempo do meu pai (1941/43), e onde a sífilis era um problema sério...

ii) E os problemas do foro psíquico, depressões, perturbações emocionais, surtos psicóticos, parassuicídios, automutilações...? A população à tua guarda era pequena, mas de risco...

(iii) Sei que tu eras um jovem médico, provavelmente ainda com pouca experiência clínica... Galomaro (e por extensão a Guiné) foi uma escola para ti ? Temos ouvido mais os cirurgiões, que faziam "milagres", nomeadamente no HM 241, em Bissau..


Rui Vieira Coelho, médico reformado, ex-alf mil médico BCAÇ 3872 e BCAÇ 4518 (Galomaro, 1973/74, e subdelegado de saúde da zona de Galomaro-Cossé [, foto à direita, em 1973, no Saltinho]] (*). Texto enviado em 20 do corrente:



2. Em relação a doenças de transmissão sexual, já falei de Pediculus Pubicus, Piolho do Púbis, ou vulgo Chato em português vernáculo.

A situação mais frequente era a blenorragia, com a sintomatologia habitual com dificuldade de micção, ardência uretral e supuração em que o seu agente era a Neisseria Gonorreia. A terapêutica á base de Penicilina resultou sempre eficazmente nesta patologia.

Por vezes aparecia uma ulceração na glande peniana o que pressupunha de imediato o diagnóstico de uma sífilis com a sua lesão primária (cancro duro) e que era imediatamente tratado com Penicilina Benzatinica 1200000( 1 milhão e duzentas mil unidades ) em injecção intra-muscular por semana durante 3 semanas seguidas.

Por vezes associada a estas situações apareciam as prostatites que na maioria dos casos tratavam-se de infestações por múltiplos agentes, como Neisseria, Estreptococos, Clamydia Trachomatis, Echerichia Cólica. etc, etc.

O Cancro Mole ou vulgo Mulas produzido pelo Bacilo Ducrey era pouco frequente na zona onde estava inserido

O Herpes genital já era mais frequente e com uma certa regularidade com irritação balano-prepucial, prurido e com rasgadas e escoriações. Na altura tínhamos a tintura de iodo ,e a solução álcool iodada (ardia até de mais)-. Tinha uma característica recidivante e não havia terapêutica como hoje em dia com o Aciclovir.

Da parte do pessoal não havia,  como dizes, uma grande reserva em relação ao Médico, no encobrimento da patologia sexualmente transmitida, isto no que me dizia respeito. Fui sempre aberto a todas as situações e nunca manifestei qualquer desagrado ou dei qualquer sentido pecaminoso a uma necessidade quasi fisiológica e de escape e de desanuviamento do pessoal militar tão novo.

Confiavam em mim e no segredo profissional a que estava subordinado, servindo de intermediário válido entre eles e o comando e sempre que necessitavam de aconselhamento.

O medo e em alguns a ansiedade permanente levavam por vezes a depressões, quase todas de carácter reactivo, á situação de guerra por que passavam, que se agravava exponencialmente, com mortos e ou feridos como resultado de ataques, com a falta de notícias dos familiares ou dos amigos, doenças e stress por antecipação. O sentido de perigo constante fazia com que entre camaradas a amizade e a solidariedade fossem a melhor terapêutica para um bom equilíbrio emocional, não obstante o stress pós traumático de guerra seja uma realidade.

Não é por acaso que o pessoal militar que passou pela Guiné, tem um sentido tão gregário,  é uma solidariedade por vezes sem limites, veja-se a quantidades de Tabancas existentes em Portugal . E também não é por acaso que nestas "Tabancas",  apesar de tudo o que sofreram,  se crie um desejo de ajudar "onde estivemos", e  é por essa gente que é no fundo humana como nós, com ideias e culturas tão diferentes,mas com um desejo enorme de não ter fome, de ter cuidados de saúde, de aprender, de ter esperança no futuro.

Também não é por acaso que se formam ONG ,a partir das "Tabancas" e no fundo o " Encontro de um Caminho " solidário, é por vezes uma Terapêutica Comportamental para o Stress pós traumático de que muitos foram e são vítimas, mas encontram um sentido,  é um objectivo de real importância para as suas vidas,que se sobrepõem aos factores negativos do psico-drrama que a querra lhes trouxe. Tudo serve como catarse para uma Integração plena e o readquirir de uma auto-eEstima perdida por todos nós, uns mais que outros.

O suicídio existia como solução final para pôr cobro a todos os problemas que uma guerra de guerrilhas trazia, nos deprimidos, pelo isolamento, pela solidão, pelo temor e medo constante, pela incerteza, pelo reviver de situações de emboscadas, de explosões, de mortos e feridos que com ele conviveram de perto, por exaustão e perda de fé fosse no que fosse.

Quanto a auto-mutilações,na Guiné enquanto estive no mato não tive conhecimento de nenhuma. Já na metrópole foram-me referidas algumas como secções de dedos do gatilho para não serem mobilizados para o Ultramar.

Espero ter respondido a tudo o que pediste e envio-te um Grande Alfa Bravo

Rui Vieira Coelho
Enviado do meu iPad
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Nota do editor:

(*) Último poste da série > 19 de outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13759: Os nossos médicos (83): Memórias do Dr. Rui Vieira Coelho, ex-Alf Mil Médico dos BCAÇ 3872 e 4518 (15): Todos (ou quase todos) apanhámos o pé de atleta, a flor do Congo, onicomicoses, chatos, matacanhas... Mas o que me preocupa hoje, como amigo daquele povo, é a doença por vírus Ébola... Vamos ajudar a ONGD "Ajuda Amiga" a mandar um contentor suplementar no 1º trimestre de 2015, com sabão, sabonetes e lixívia!... NIB: 0036 0133 991 000 251 3826

Guiné 63/74 - P13781: Aqui prós meus botões (Nelson Herbert, VOA - Voice of America)

1. Em mensagem do dia 9 de Outubro de 2014, o nosso amigo guineense, Nelson Herbert(*), que vive nos EUA, onde trabalha na VOA - Voice of America, Voz da América, enviou-nos este seu texto que intitulou de:

Aqui prós meus botões

Ainda na fase de digitalização de alguns documentos do meu espolio pessoal de todos estes anos de jornalismo, alguns bem confidenciais, outros nem tanto, e num misto de perspicácia e de curiosidade, não é que a mente fugaz impele-me para uma tentativa de desconstrução de um recalcitrado "sofisma" que por sinal tem servido de argumento uno e justificativo aos males vividos nas casernas militares bissau-guineenses?

Refiro-me pois a natureza não republicana das Forças Armadas e aos efeitos do Narcotráfico!
E explico-me!

Da análise de alguns dos OGE (Orçamento Geral do Estado) das ultimas décadas, ressalta à vista desarmada o quão substancial foi sendo, com a independência do país, o incremento da dotação orçamental, destinada às Forcas Armadas e às Forcas de Segurança, isto sem que para o efeito, tal investimento resultasse na modernização de 'pora" alguma nos dois sectores siameses! E estamos aqui a falar de um país que se limitou durante todos estes anos, a investir numa tropa que se entretinha, guerreando-se consigo próprio!

Folheio o folder" de documentos e os olhos se me arregalam perante os montantes em causa!
Compenetro-me na análise de alguns relatórios e documentos da Dinfomil, a contra-inteligência militar guineense, e deparo-me com um cortejo de casos flagrantes de corrupção, detectados, investigados, submetidos à consideração das tutelas e dos governos, denúncias que entretanto resultaram impunes.

Dos contratos de compra e venda da sucata militar, a munições obsoletas ou simplesmente condenadas à caducidade, para que delas rendessem "trocos", a carga de implicação de tais práticas na oneração das finanças públicas e no próprio desguarnecimento dos paióis militares, experiência de má memória - entenda-se pelo caso do tráfico de armas para os rebeldes independentistas do Casamance, qual rastilho para a Guerra Civil de 1998/99, a surripiada de bens e géneros alimentícios das cantinas militares, aos contratos fictícios de fornecimento aos quartéis, com a intendência militar a provar o seu primor na arte da "contabilidade criativa".

Enfim, a "sorte" das inspeções e relatórios produzidos a propósito, foi caindo invariavelmente num "balaio furado", por promíscuas conveniências de uns tantos governantes, com destaque para alguns dos ministros do sector (por sinal bem identificados) ou de chefias militares superiores e intermédias, useiros e vezeiros na arte da rapinagem.

Enfim um historial de "camuflagem" e de impunidade face ao antro de corrupção em que se transformara as instituições castrenses bissau-guineenses, com reflexos na anarquia que lhe é hoje peculiar, maleitas que entretanto para gáudio da impunidade, o Narcotráfico nas casernas e a natureza não republicana das FAA em boa hora prontificaram a perfilhar!

Nelson Herbert
USA
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Nota do editor

Último poste da série de 19 de Outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13762: Viajando numa estrada em guerra (Nelson Herbert, VOA - Voice of America)

Guiné 63/74 - P13780: Biblioteca em férias (Mário Beja Santos) (13): Em Castela-e-Leão, para me prostrar em duas catedrais assombrosas

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 2 de Outubro de 2014:

Queridos amigos,
A magnificência destas catedrais não faz perder de vista como a nossa história tem aqui as suas raízes, há que regressar para visitar Segóvia e Ávila, Salamanca e Valhadolid.
As catedrais de Burgos e Leão são muitíssimo diferentes, Burgos é o fausto extremo, a opulência com marcas de muito bom gosto; León é o somatório de um espaço airoso que aloja quilómetros de vitrais, estão entre os mais belos da humanidade.
Senti-me compensado e decidido a regressar aos solos dos avós de Portugal.

Um abraço do
Mário


Biblioteca em férias (13) 

Em Castela-e-Leão, para me prostrar em duas catedrais assombrosas

Beja Santos

Sai-se de Logroño, já não há mais o Ebro, depois de Miranda de Ebro, vamos a caminho da região mais extensa da União Europeia, Castela e León, um pouco maior que Portugal, aqui o Douro pontifica, pela via ferroviária avistam-se cordilheiras ao fundo, aos poucos a vegetação torna-se rala, sigo para Burgos, mas depois do que li e das imagens que vi iria com igual vontade até Ávila, Salamanca, Segóvia ou Valhadolid, referências incontornáveis da nossa História, por aqui andaram reis e príncipes e diplomatas portugueses a fazer tratados ou a preparar casamentos. Paciência, tudo tem o seu tempo. Aqui começou a Espanha, aqui houve as capitais que antecederam a Madrid, aqui se erguem as inconfundíveis e gigantescas catedrais de Burgos e León, móbil desta visita. Zamora já conhecia, quando fui visitar a Miranda do Douro o Abel Rodrigues, da CCAÇ 12, com quem convivi e fiz estima em Bambadinca, levou-me a Zamora expressamente para visitar a catedral e as faustosas tapeçarias flamengas. A estação ferroviária fica a alguma distância de Burgos, impôs-se uma viagem de táxi, arrumei os pertences e ala que se faz tarde, a partir de agora a cidade está por minha conta, amanhã de manhã, por inteiro, será a visita da catedral. Começo pelo passeio de Espolón, virei à esquerda depois de passar pelo monumento ao Cid, cujos restos mortais e os de Jimena, estão debaixo da fabulosa abóbada da catedral. E paro no Arco de Santa Maria, vou aproveitar a última luz para ficar com a sua imagem.


Dizem os livros que é o arco mais bonito da cidade, encerra um salão de exposições e um museu de farmácia. No seu interior, que contém excelente artesanato e estuques mudéjares, esteve instalado o Concelho de Burgos até ao século XVIII. E parti para a catedral, àquela hora começava um concerto na Plaza Mayor, fui pelas ruas laterais, as paredes gigantescas da catedral estão à mostra, já sei que amanhã vou entrar pela Porta Real ou do Perdão, com o seu magnífico frontão, um conjunto flanqueado por altas torres que terminam em agulhas finas. Estou embasbacado, é pesado e leve, é denso e diáfano, é desmesurado e íntimo.


Desculpem a imagem atabalhoada, cortei uma das agulhas, trata-se de uma porta lateral, não é a Porta Real, não posso perder tempo, está cada vez mais escuro, vou circundar a ver se apanho uma outra boa imagem.


O templo religioso, Património da Humanidade desde 1984, é simétrico, ao longo dos séculos evolui-se do gótico para o plateresco, enxertaram-se capelas, abriram-se e fecharam-se portas. Gostei muito desta torre, confrontada com património urbano civil, não sei porquê lembrei-me da Sé de Braga, associação disparatada, não faz mal, esta imponência a caminho dos céus será a última imagem do dia. Mas não foi, vi ali ao pé uma fonte, devia ter matado a sede a muito peregrino, ao longo dos séculos, ainda estamos na rota para Santiago, gosto muito da rusticidade das figuras:


Esta fonte poligonal atraiu-me pela conjugação feliz com o tardo-gótico como pano de fundo. Não há turistas, a esta hora devem estar a encaminhar-se para os comedouros, aqui pontifica a morcela de arroz, também estou interessado em prová-la.


Venho com o tempo contado, há ainda que tomar um táxi até à estação, o comboio para Leão parte às 13h30, antes de entrar pela Porta Real cirandei e captei este ângulo das torres, são imponentes de onde quer que se avistem. E agora vou encafuar-me no tesouro mais valioso de Burgos.


Não fosse eu um tosco fotógrafo amador e teria captado esta extraordinária cúpula, um dos pontos fundamentais da visita. Se acaso o leitor acreditar no que lhe digo é certo e seguro que numa das suas próximas saídas virá até aqui. Por fora, já se viu que este maciço é flanqueado por altas torres, por dentro este edifício gótico tem por base a cruz latina, de nave transversal e três longitudinais e dezanove capelas, um cadeiral soberbo que tem o grave senão de cortar a perspetiva ao viandante que se posiciona na entrada e que supõe que toda aquela majestade só ganharia com o absoluto desafogo, são assim as coisas da ostentação. É pena não poder registar imagens, esta velha câmara tem o flash proibido. Já me deliciei com o “Papa-moscas”, personagens do mecanismo de relojoaria, depois entrei no golfão dos sepulcros, retábulos, dentro e fora das capelas, sentei-me extasiado na capela do Contestável, dedicada a Pedro Fernández de Velasco, Condestável de Castela, detive-me na Escadaria Dourada e bem estiquei o pescoço para ver se não perdia detalhe da abóbada com a estrela de oito bicos, filigrana em pedra nunca vi assim. Está na hora de partir, saí zonzo de tanto esplendor e antes de rumar para o hotel apanhei esta igreja ali ao lado, parece que íamos ter cerimónia:


Lembrou-me uma igreja italiana que vi em Florença, mas o que me impressionou foi estar ali bem pertinho da catedral e ter esta escadaria boa para penitentes, apropriada para quem vai pedir perdão. Adeus Burgos, hasta la próxima…


Não guardei impressão da viagem, seguramente que dormitei, tal o peso das emoções. Sei muito bem que saí da estação de Leão e encaminhei-me para o objetivo por uma avenida monumental, era uma tarde aprazível, a temperatura tem vindo ligeiramente a arrefecer. Fiz ao auto na Casa de Botines, ela aqui está, obra modernista do genial Antonio Gaudí, felizmente que não vinha distraído e sabia da existência desta joia arquitetónica. Desculpem a imagem não estar bem centrada, não há muito a esperar deste fotógrafo remendão, mas confessem que o Gaudí está sempre a pregar partidas.


Quando se fala da catedral de Leão a primeira referência vai para os 1800 metros quadrados, só tem rival com Chartres, perto de Paris. É uma injustiça não elogiar a sumptuosa fachada, aquelas torres que encimam as três entradas, uma delas corta a respiração, é um rendilhado de pedra, não sei porquê ocorreu-me pensar no Pórtico da Glória, em Compostela, os fiéis ficam pequeninos com o arrojo destes escopos e cinzéis que bordaram a entada principal. Felizmente que não há dezanove capelas para visitar, como em Burgos, só os vitrais dão imenso trabalho, sai-se daqui com a alma atestada, vou tirar as últimas fotografias, e despedir-me de Leão e da sua catedral, foi visita de médico.


Surpreende as tonalidades da pedra, o perceber-se sem qualquer dificuldade que há aqui diferentes intervenções ao longo dos séculos, deve ser um mistério bem guardado como esta grandiosidade de pedra, que terá custado uma fortuna na época foi feita em tempo recorde, coisa da fé dos homens. E antes de virar as costas a esta construção tão delicada e à imersão no banho de vitrais, não resisti a mais um pormenor escultórico desta faustosa entrada da catedral:


Simulei que tinha dons para regressar ao passado, supus que era assim que o crente medieval olhava a bíblia de pedra e entrava reconfortado no tempo. Mesmo que tenha suposto erradamente, esta obra-prima é um documento de fé empolgante. E digo adeus a Leão, sigo para a província de Lugo, vou até Monforte de Lemos, e de lá parto para Vigo. Depois conto.
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Nota do editor

Último poste da série de 15 de Outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13738: Biblioteca em férias (Mário Beja Santos) (12): Viagens pelo Norte de Espanha: Em Logroño, e já a pensar nas catedrais de Burgos e León

terça-feira, 21 de outubro de 2014

Guiné 63/74 - P13779: In Memoriam (200): Manuel Simões (1941 - 2014), um português de Bolama, que foi a Conacri ao funeral de Amílcar Cabral, e que andou na escola com 'Nino' Vieira, e que recebia, em Jugudul, de braços abertos, os seus amigos, fossem de Cabo Verde, fossem de Portugal (Manuel Amante / A. Marques Lopes / Xico Allen / António Camilo / José Teixeira)


Guiné-Bissau > Região do Oio (Mansoa) > Jugudul > Abril de 2006 > Recebendo os amigos portugueses, Xico Allen, A. Marques Lopes & companhia. O Manuel Simões, aqui à direita, fazendo as honras da casa. O almoço foi leitão,,, à moda de Jugudul. (À esquerda, de perfil, o A. Marques Lopes).

Foto: © Inês Allen (2006). Todos os direitos reservados


Guiné-Bissau > Região do Oio (Mansoa) > Jugudul > Abril de 2006 > O leitão da região do Oio, feito à moda de Jugudul, em casa do Mauel  Simões (aqui de pé, a presidir à mesa), não ficava atrás, bem pelo contrário, do letão à moda da Bairrada. Foi comer e chorar por mais, garantiu o A. Marques Lopes. À direita, em primeiro plano, o jovem Hugo Costa, filho do Albano Costa, de Guifões, Matosinhos. Na comitiva do Porto (um jipe!) também ia a Inês Allen, filha do Xico Allen (que não aparece nestas fotos).

Foto: © Inês Allen (2006). Todos os direitos reservados


Guiné-Bissau > Região do Oio (Mansoa) > Jugudul > Abril de 2006 > O A. Marques Lopes, de pé, mais elementos do grupo do Porto, sentados (onde reconheço o Armindo Pereira e o Manuel Costa), em casa do Manuel Simões.

Foto: © Inês Allen (2006). Todos os direitos reservbados



 Guiné-Bissau > Região do Oio (Mansoa) > Jugudul > Abril de 2006 > O antigo aquartalemento das NT, em Jugudul, cujas instalações foram cedidas, a seguir à independência, ao Manuel Simões, guineense branco de Bolama, para a sua fábrica de aguardente de cana. O Manuel conhecia o 'Nino' Vieira do tempo da escola, presumindo-se que fossem mais ou menos da mesma  idade.


Foto: © A. Marques Lopes (2006). Todos os direitos reservados. [Edição: LG]


1. Telefonou-me, esta manhã, da Praia, Cabo Vrede, o nosso camarada Manuel Amante da Rosa, dando a triste notícia de que o seu primo Manuel Simões, de Jugudul, tinha acabado de morrer. 

As notícias tristes espalham-se depressa.  Mas, assim, de chofre, eu não estava a ver quem era o Manuel Simões. Nem reconheci de imediato a voz do Manuel Amante da Rosa que conhecera pessoalmente em Lisboa, uns anos antes, e com, quem já não falava há muito tempo aoa telefone.

O Manuel Amante disse-me que o Manuel Simões era irmão do Januário (se bem percebi. ao telemóvel) e que era conhecido da malta do blogue. Também tinha barcos, tal como pai do Manuel Amante e trabalhou para a tropa durante a guerra. Pedi-lhe para fazer uma pequena notícia, e com uma resenha biográfica. Mas depois, de repente, lembrei-me dele: o Xico Allen, o A. Marques Lopes, a Inês Allen, o Hugo Costa e outros camaradas e amigos tinham estado em abril de 2006 a comer leitão na casa dele... Temos um poste publicado pelo A. Marques Lopes sobre esse memorável visita da malta do Porto a Jugudul (*).

Sei muito pouco sobre o Manuel Simões, para além, daquilo que foi publicado no blogue... Mas é mais um amigo, lusoguineense,  que desaparece. Um resistente. Um português, ou um descendente de portugueses das sete partidas. Entrei em contacto com alguns camaradas que eram visita da sua casa, pedindo-lhes que escrevessem qualquer cois mais para completar as minhas notas, e fazer um In Memoriam...  Sabemso que nasceu em Bolama em 1941.

De qualquer modo e qualquer que fosse a sua crença, e a crença dos seus amigo, só espero que Deus, Alá e os Bons Irãs o guardem em paz. LG

PS - Num outro poste, mais recente (2013), do José Teixeira, eu já tinha encontrado outra referência ao Manuel Simões:


(...) "A pista de Amedalae, ou a estrada transformada em pista de aviação para descarga da malfadada droga, o Matu Cão, do Alfero Cabral, a Ponte dos Fulas, ou o Sr. Manuel Simões. do Jugudul, o senhor que geria a empresa, à qual o exército português fretava os barcos para levar os mantimentos às suas tropas no interior. Amigo do Amílcar Cabral, a cujo funeral foi, transportando a bandeira do clube onde ambos eram associados e não foi preso quando regressou a Bissau. No fim da guerra comprou ao 'Nino' Vieira o quartel do Jugudul e montou um alambique de aguardente de cana". (...) (**)



2. Mensagem, de resposta ao meu apelo, enviada pelo José Teixeira [, foto à direita], às 13h41


Paz à sua alma.

A história que escrevi, sobre a sua ida ao funeral do Amílcar Cabral, foi-me contada pelo próprio Manuel em 2011, quando estive em casa dele, com os meus filhos. Voltei lá o ano passado e notei-o muito acabado e com problemas de saúde, mas como enquanto há vida há esperança...

Conheci-o em 2005, quando voltei à Guiné e, a partir desse primeiro encontro, sempre que fui à Guiné, passava pela casa dele para conversar um pouco

Era um homem extremamente simpático e sabia acolher muito bem. Sempre alegre e bem disposto. Tinha sempre uma história para contar, sobre a vida dele e da família. Antes da guerra, ele, o pai e um irmão comerciavam arroz das bolanhas do sul. O pai e o irmão foram mortos logo nos primeiros tempos de guerra, segundo consta, pelo PAIGC, ficando ele com o negócio.

Como tinham vários barcos, começou a negociar com as Forças Armadas Portuguesas no transporte de mantimentos paras tropas do interior. Era uma pessoa importante no eixo militar pelos serviços que prestava e dava-se bem com todos, tendo naturalmente muitos amigos ligados ao PAIGC, o que não escondia.

Sobre a compra do quartel de Jugudul, eis o que ele mesmo me disse: quando acabou a guerra, telefonou ao 'Nino' Vieira, seu conhecido desde os tempos de escola, e mostrou interesse em comprar o quartel de Jugudul, o que o Nino aceitou, transformando-o numa destilaria.

Em 2013, quando estive com ele, disse-me que tinha encerrado o fabrico de aguardente, devido à abertura de uma destilaria em molde modernos nos arredores de Bissau com produção a custos mais baixos, o que estava a arruinar os fabricantes antigos.

Um bom amigo, cuja morte lamento

Paz à sua alma.

José Teixeira


3. Comentário de LG:

Falei ao telefone com o A. Marques Lopes e o Xico Allen. O Xico era amigo do Manuel Simões, já  de longa data. Ele e o António Camilo,  que ainda há tempos tinha falado com ele ao telefone. O Camilo tinha um jipe, em Jugudul, à guarda do Simões. Ele ter-lhe-á dito, ainda recentemente,  que era preciso as mudar velas do jipe. O Simões tinha ido a Dakar fazer uma intervenção cirúrgica, regressou a casa e parecia estar a recuperar bem. A criada encontrou-o morto esta manhã. O Xico já sabia da notícia através do Camilo.

Obrigado a todos os seus amigos que quiseram compartilhar connosco, através do nosso blogue, estes elementso que ajudam a conhecer melhor um homem e um patrício que viveu toda a sua vida na Guiné, segundo creio. Dele pode dizer-se que foi (é) mais um dos fabulosos portugueses, ou descendente dos portugueses das sete partidas... Parte agora definitivamente para a última viagem,
aquela que já não tem retorno. Espero que o barqueiro de Caronte seja gentil com ele.

Obrigado, Xico Allen, A. Marques Lopes e Zé Teixeira (mas também Manuel Amante, seu prima e António Camilo, visita frequente da sua casa), pela vossa partilha de memórias e de afetos, O Manuel Simões, que andou na escola com o 'Nino' Vieira, era dlois anos mais novo. Morreu hoje aos 73 anos. (***)

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Notas do editor:


(...) vou acabar com uma coisa alegre: uma grande almoçarada (um leitãozinho!!) que o nosso amigo Manuel Simões nos ofereceu nas instalações da sua destilaria de aguardente de cana. Ele é o homem grande branco que eu indico nas fotografias tiradas pela Inês. É um guineense branco, nascido em Bolama, companheiro do Pepito e do Lúcio Soares, também nascidos em Bolama. Foi, mais novo, jogador de futebol e chegou a dirigir o clube Balantas.

Dedica-se à aguardente de cana, mas tem também uma ponta [herdade] onde explora caju. Após a independência conseguiu que lhe cedessem o aquartelamento de Jugudul para a sua fábrica de aguardente, deixando apenas uma parte destas instalações para ser montado um posto da polícia de viação lá do sítio... que ainda não existe.

É um amigo sempre de braços abertos, acolhedor, como vêem. Vale a pena visitá-lo. (...)



(**) Vd. poste de 1 de junho de 2013 > Guiné 63/74 - P11661: Crónicas de uma viagem à Guiné-Bissau: de 30 de abril a 12 de maio de 2013: reencontros com o passado (José Teixeira) (3): No antigo corrredor da morte: Gandembel, Balana, Mejo, Guileje ... E as novas tabancas do Cantanhez: Amindara, Faro Sadjuma, Iemberém... E as crianças a correr atrás de nós: Poooorto! Poooorto! (Leia-se: Portugueses, Portugal)


(***) Último poste da série > 6 de outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13697: In Memoriam (199): Lisboa, Cemitério dos Olivais: a última homenagem ao comandante Alpoim Calvão (1937-2014) (Vídeo de José Colaço, ex-sold trms, CCAÇ 557, Cachil, Bissau e Bafatá, 1963/65)... Missa do7º dia, hoje, às 19h15, na igreja paroquial de Cascais

Guiné 63/74 - P13778: Em busca de... (250): Camaradas do Esquadrão de Reconhecimento 2350 (Bafatá, 1966/68), com vista ao próximo Convívio de 2014 (António Bastos)

1. Mensagem do nosso camarada António Bastos (ex-1.º Cabo do Pel Caç Ind 953, Teixeira Pinto e Farim, 1964/66), com data de 20 de Outubro de 2014:

Caro Camarada Luis Graça
Venho solicitar-te se for possível, o contacto de algum ex-combatente que tenha feito parte do Esquadrão da Cavalaria 2350 que esteve em Bafatá entre 1966 e 1968 e que habitualmente faz o encontro anual em Dezembro.

O único contacto que eu tenho é do camarada João Silva mas o telefone que possuía indica que o mesmo está fora de serviço.

Um abraço
António Bastos
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Nota do editor

Último poste da série de 21 de Outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13777: Em busca de... (249): A verdade sobre um ataque simulado por um Grupo de Combate da CART 1659 a Ganturé (Luís Guerreiro)

Guiné 63/74 - P13777: Em busca de... (249): A verdade sobre um ataque simulado por um Grupo de Combate da CART 1659 a Ganturé (Luís Guerreiro)

1. Mensagem do nosso camarada Luís Guerreiro (ex-Fur Mil, CART 2410 e Pel Caç Nat 65, Gadamael e Ganturé, 1968/70), com data de 15 de Agosto de 2014:

Bom dia amigo Carlos
Já há algum tempo que tenho este assunto para esclarecer sobre Ganturé, e agora que há um camarada da CART 1659, o Mário Vitorino Gaspar, talvez ele possa confirmar ou não, se foi verdade o que vou relatar.

A minha Companhia, a CART 2410, chegou a Gadamael a 2 de Outubro de 1968, para render a CART 1659. O meu grupo de combate seguiu imediatamente para Ganturé, onde permaneceu 4 meses.
Depois de instalados e de fazermos o reconhecimento da população, sentimos uma certa reticência por parte dela, o que se manteve por umas semanas, mas como éramos novos no local, pensámos ser essa a razão.

Durante um almoço em que convidamos o régulo Habib, ele contou-nos o seguinte.
Aparentemente a relação entre a população e um grupo de combate da CART 1659, em Ganturé, não era o melhor, e o que se passou terá sido durante um batuque.
Segundo o régulo, um ataque ao destacamento foi simulado por esse grupo de combate, e uma granada de mão terá sido lançada para o meio da população. Faleceram algumas bajudas, ferindo outras que foram evacuadas para Bissau, devido à gravidade. A cavilha da granada foi encontrada no local do Batuque.



A bajuda da esquerda foi uma das feridas

Aparentemente houve uma investigação com pessoal vindo de Bissau, mas no final nada ficou esclarecido, porque a população dizia uma coisa e os militares do grupo de combate diziam outra, confirmando que tinha sido um ataque.

Passados uns tempos ganhamos a confiança da população e o meu grupo de combate passou quatro excelentes meses, apesar dos ataques sofridos.

Gostava que o camarada Mário Gaspar pudesse confirmar ou não o que se passou.

Por hoje termino com um grande abraço.
Luís Guerreiro
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Nota do editor

Último poste da série de 11 de Setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13596: Em busca de... (248): Pessoal do Pel Mort 2297 (Bula, 1969/71)... a que pertenceu o meu pai, Eurico Lopes Pereira, natural de Boticas...Quero levá-lo lá, em 2015 (João Pereira, a residir em Angola)

Guiné 63/74 - P13776: (Ex)citações (242): Água da bolanha... quem a não bebeu ?!... Abastecimento na poça da Tabanca de Padada, dia 15JUN69 (Fernando Gouveia)

1. Mensagem do nosso camarada Fernando Gouveia (ex-Alf Mil Rec Inf, Bafatá, 1968/70) com data de 17 de Outubro de 2014:

Carlos
Sobre a qualidade da água à nossa disposição durante a guerra na Guiné(*), mando esta fotografia da poça de água onde nos abastecemos, na antiga tabanca de Padada, numa operação em que participei no dia 15JUN69 (dia em que a Académica eliminou o Sporting na Taça de Portugal, perdendo depois com o Benfica).

Esta foto já foi publicada numa das minhas estórias sobre Madina Xaquili, tornando agora a ter actualidade.
Recordo-me muito bem que depois do cantil cheio lhe juntei um comprimido para matar a bicharada, julgando que seria de cloro.
Também descrevi que na ida para Madina nos abastecemos de água em Umaro Cossê onde referi que essa água parecia leite ou cal de pintar paredes. Terei também de referir que chegados a Madina Xaquili viemos a ter à disposição uma água óptima, de nascente, a correr de alto.

Em Bafata, como muitas vezes teria dito, a água em toda a cidade e nos quartéis era da Companhia, neste caso da Administração, e também da melhor qualidade.

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Nota do editor

(*) Vd. poste de 20 de Outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13766: (Ex)citações (240): Água da bolanha... quem a não bebeu ?!... Recordando aqui o pesadelo que foi a Op Jaguar Vermelho, no Morés, em 9 de junho de 1970... (Carlos Fortunato. ex-fur mil trms. CCAÇ 13, Bissorã, 1969/71, e presidente da direção da ONDG Ajuda Amiga)

Último poste da série de 20 de Outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13772: (Ex)citações (241): Carta Aberta ao camarada Mário Vitorino Gaspar sobre o livro "Guiné, a cobardia ali não tinha lugar" (José da Câmara)

Guiné 63/74 - P13775: Inquérito online: Resultados preliminares (n=133): um em cada dois teve o paludismo... Mas só um um terço tomava sempre ou quase sempre a Pirimetamina, comprimido oral, de 25 mg, do Laboratório Militar (LM), como profilaxia... 40% tomava o medicamento e mesmo assim teve o paludismo

Foto; Cortesia de António Tavares (2014)
A.  Resultados preliminares da nossa "sondagem", em linha (n=133),  quando faltam dois dias para encerrar a votação (*):

SONDAGEM:  NO TO DA GUINÉ TIVE O PALUDISMO E TOMAVA O MEDICAMENTO... (Resposta múltipla. Vd. blogue, no canto superior esquerdo)


1. Não me lembro se tive paludismo  > 3 (2%)


2. Não me lembro do medicamento para o paludismo  > 7 (5%) (**)


3. Sim, tive paludismo  > 64 (48%)


4. Não, nunca tive paludismo  > 26 (19%)


5. Não,  nunca tomava o medicamento    > 2 (1%)


6. Sim, tomava sempre (ou quase sempre)  > 45 (33%)


7. Sim, tomava, mas só às vezes  > 26 (19%)


8. Tomava o medicamento e tive o paludismo  > 53 (39%)


9. Tomava o medicamento e nunca tive o paludismo  > 19 (14%)


10. Nunca tomei o medicamento nem nunca tive paludismo  > 9 (6%)


Votos apurados: 133 (até às 6h00 de hoje). Dias que restam para votar: 2




Leiria > Monte Real > Ortigosa > Quinta do Paul > IV Encontro Nacional da Tabanca Grande  > 20 de Junho de 2009 >

Nada nos faltou, neste dia, nem o calor da Guiné (em sentido físico e figurado) nem o cheiro (inesquecível) do repelente anti-mosquito, da marca Lion Brand... Não sei quem trouxe a amostra, mas vi várias nas mãos do António Graça de Abreu e do José Casimiro Carvalho... Neste pequeno vídeo ouve-se várias vozes (Luís Graça, Joaquim Mexia Alves e sobretudo Álvaro Basto que conta aqui uma pequena história com um Lion Brand que pegou fogo aos lençóis da cama...).

Vídeo (1' 02''): © Luís Graça (2009). Todos os direitos reservados

Mosquito Anopheles gambiae.
Foto: cortesia da Wikipedia

Como prevenção e proteção contra o temível Plasmodium Falciparum (o mais perigoso dos quatro parasitas da malária, e que era  e é endémico na Guiné-Bissau, transmitido pelo mosquito anopheles, foto à direita), usávamos várias medidas quer individuais quer coletivas, como o uso correto de vestuário (sobretudo à noite: roupas largas, calça  e camisa compridas, "à boa maneira colonial"), protetores e repelentes (ainda não havia ou não estavam vulgarizados os aerossois, pelo que usávamos pomadas LM, no mato, horrorosas, mal cheirosas...), rede mosquiteira na cama, portas e janelas fechadas ou protegidas com rede (não havia ar condicionado fora de Bissau!), fumigações, desinfeções, remoção e tratamento do lixo, etc., para além da quimioprofilaxia...

Como se sabe,  apenas as fémeas dos mosquitos se alimentam de sangue... E picam (picavam)  essencialmente durante a noite, e logo nas zonas do corpo mais frequentemente  expostas (face, orelhas, pescoço, braços e pés)... Alguns de nós, não sei porquê, atraíam mais mosquitos (fêmeas) do que outros... Havia  a crença que o álcool (gin tónico, uísque, etc.) era um "bom repelente"... Pobre fígado!... (LG)

________________

Notas do editor.

(*) Vd. poste anterior: 18 de outubro de  2014 > Guiné 63/74 - P13753: Sondagem: Quem não apanhou o paludismo, que ponha o dedo no ar ?!...

(**) Sobre a Pirimetamina (substância ativa), ver aqui a informação do INFARMED [, folheto aprovado em 13/1/2104]. Segundo alguns camaradas (e nomeadamente o dr Rui Vieira Coelho,  médico), o comprimido, do Laboratório Militar (LM), era tomado duas vezes por semana (às 5ªs e domingos, em Galomaro, em 1972/74), em doses de 25 mg, como quimioprofilaxia do paludismo. (***). Não sabemos durante quantas semanas, mas presume-se que era durante a toda comissão. O medicamento (preventivo) não era (nem é) 100% eficaz.

Sobre a doença, sintomas e tratamento, vd aqui o Manual Merck [Biblioteca médica "on line". Edição de saúde para a família]

(***) Vd,. poste de 16 de outubro de  2014 > Guiné 63/74 - P13743: Os nossos médicos (80): Memórias do Dr. Rui Vieira Coelho, ex-Alf Mil Médico dos BCAÇ 3872 e 4518 (12): Até a Maria Turra dizia que o antipalúdico Pirimetamina, do Laboratório Militar, fazia mal à tusa...


(...) Na Guiné pedia aos operacionais para não se esquecerem de tomar um anti-palúdico do Laboratório Militar, de nome Pirimetamina, ás quintas e domingo, para evitar as crises palúdicas, que por vezes tomavam características graves como o Paludismo Cerebral.

Por vezes sentia-me a pregar aos peixes como Santo António, pois o pessoal achava que se tomassem os comprimidos teriam alterações negativas no seu desempenho sexual. (...)

Nas crises palúdicas o tratamento era feito com Resochina em soro polielectrolítico e aplicação endovenosa e dava sempre uma incapacidade de alguns dias, sobrecarregando os colegas e diminuindo a capacidade operacional do grupo de combate a que pertenciam ou levando á substituição por outro pessoal o que moral e eticamente era reprovável no caso de serem feridos em combate. (...) 

Guiné 673/74 - P13774: Os nossos camaradas guineenses (39): Calaboche Tchuda, apontador de bazuca do 4º pelotão da CCAÇ 13, e prémio Governador Geral...Preso e fuzilado de imediato, quando regressava da sua escola, em Nhacra, depois da independência... (Carlos Fortunato)


Guiné > Região do Oio > CCAÇ 13 (1969/71) > Viagem a Bissorã > 1970 > Da esquerda para a direita; Calaboche [Tchuda], Carlos Fortunato e Manuel Cuna na rua principal de Bissorã.

Foto (e legenda): © Carlos Fortunato (2003). Todos os direitos reservados. [Edição: LG]

1. Mensagem do editor LG enviada ontem ao  Carlos Fortunato  (ex-fur mil trms, CCAÇ 13, Os Leões Negros, Bissorã, 1969/71, e presidente da direcção da ONG Ajuda Amiga) [, foto à direita]:


Carlos:

Excelente texto que não conhecia, e que reproduzi com a devida vénia e referência ao autor e fonte (*)...

Uma dúvida: O teu (e nosso) malogrado camarada guineense chamava-se Calaboche Tchuda ou "Calabouche" Tchuda ? Tens ideia de quando e onde foi morto (, possivelmente fuzilado, ) pelo PAIGC ? Pelo nome e apelido, seria balanta...

Outra coisa: Podes e deves utilizar o nosso blogue para mensagens solidárias da Ajuda Amiga. "Rezemos" para que o ébola não chegue à GB, o que me parece quase impossível... Parabéns pelo teu excecional trabalho. Um abraço do Luis.


Calaboche Tchuda, apontador de bazuca, do 4º pelotão
da CCAÇ 13. Morto pelo PAIGC , Foto: Carlos Fortunato
2. Resposta pronta do Carlos Fortunato

Assunto: Op Jaguar Vermelho

 Amigo e camarada Luís:

O Calaboche Tchuda [, foto à esquerda,]  foi morto em Nhacra, quando se dirigia para a escola onde dava aulas como professor.

Segundo me contaram,  o PAIGC apanhou-o no caminho para a escola, amarrou-o a uma árvore e fuzilou-o.

Não estava envolvido em qualquer ação contra o Estado ou outra entidade, foi um puro ato de vingança, contra alguém cansado da guerra, e que queria que acabasse uma luta entre guineenses a matarem-se una aos outros, pois eram todos irmãos, como ele várias vezes me afirmou.

Tenho um texto sobre este assunto, no meu site que infelizmente tem sido abandonado, à espera de tempo, para ser melhorado:

 http://destaques.com.sapo.pt/GuineSoldados.html [Os massacres em Bissorã - por Carlos Fortunato] (**)

Obrigado pela disponibilidade do Blog e pelo vosso apoio [à Ajuda Amiga].

Infelizmente deixaram o ébola atingir estas proporções, e só agora começam a tomar algumas medidas.

1 alfa bravo romeo alfa charlie oscar

Carlos Fortunato (***)

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Nota do editor:

(*) Vd. poste de 20 de outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13766: (Ex)citações (240): Água da bolanha... quem a não bebeu ?!... Recordando aqui o pesadelo que foi a Op Jaguar Vermelho, no Morés, em 9 de junho de 1970... (Carlos Fortunato. ex-fur mil trms. CCAÇ 13, Bissorã, 1969/71, e presidente da direção da ONDG Ajuda Amiga)

(**) Alguns excertos, com a devida vénia:

(...) O crime pelos massacres é assim imputado a Luís Cabral, e a sua execução aos Serviços de Segurança,  dirigidos por Buscardini.

É do conhecimento geral que os fuzilamentos foram realizados por soldados, e nunca por elementos ligados à segurança.

A guerra era algo que os soldados africanos lamentavam constantemente, o seu desejo era que fosse feita a paz. Falavam que não podiam andar ali a matar os seus irmãos, e que todos se deviam sentar e conversar, para se chegar a um acordo.

A aspiração dos soldados africanos da CCaç 13 era apenas a de terem uma vida melhor, e o empenho de alguns deles para se desenvolverem era extraordinário. Apesar de apenas falarem balanta e algumas palavras de crioulo, dedicavam-se afincadamente ao auto-estudo, pegando em livros de leitura que decoravam, numa tentativa de aprender a ler.

Apresento a seguir uma imagem com o extracto de uma carta do soldado Calaboche, é apenas um exemplo de um homem simples, já cansado de guerra, que lutou leal e dignamente, na procura de um futuro melhor, acreditando que ele seria ao lado de Portugal.

Carta de 1971

"... Meu amigo Fortunato eu agora estou farto de guerra eu só quero tirar quarta classe depois foi em Bissau tirar carta de condução civil depois deu tropa cos pontapé..."

Calaboche nunca conseguiria ver os seus sonhos realizados, pois ele,  tal como muitos outros, foi abandonado à sua sorte, e fuzilado pelo PAIGC. Foi capturado e morto pelo PAIGC, quando se dirigia para a escola onde dava aulas como professor.

Houve quem fugisse para o Senegal, para salvar a vida, mas mesmo [aí] continuaram a ser perseguidos, e foram muitas as dificuldades por que passaram, alguns acabariam por morrer por lá.

Transcreve-se a seguir dois extractos de duas cartas relatando um pouco o que se passou em Bissorã, enviadas por outro ex-soldado africano que conseguiu escapar a esses massacres:


Carta de 1982


" ... Hora bem eu vou-te esplicar poucina en pouco . [explicar um pouco, ] de independencia da Guiné Bissau. O que se passou depois de independencia da Guiné, partido mata muitas pessoas na nossa grupo, mata Tenha Taga, Calabos Tchuda, Furrel Sora Nando, só na nossa grupo, também Caba Santiago, Sitafa Quebá, Bacai, José de mesa oficiais, cozinheiro Nhinde de Olossato. [Pontuei este parágrafo para ser compreensível, o nome do Tenha Taca, Calaboche Tchudá, Sitafá Camará, estão igualmente mal escrito, não consegui identificar se está correcto o nome do Furriel Sora Nando.]

Olha Fortunato eu não tem trabalho depois de independencia partido não deija nos trabalhar junto com eles partido disse que nosso tropa portuguesa luta contra eles. Se voce vem cá na Guiné com cooperante voce capaz de arranjar trabalho por favor amigo Fortunato. …"

Carta de 1988

" ... Os teus soldados chamados Jorge, Barra, Tancana  foi matados em furto em Senegal. ... "[ O 2º e 3º nomes estão mal escritos correctamente é: Birra e Tangana. Na primeira carta de 1982, é referido o nome de Cabá Santiago, conheci o Cabá Santiago, e posso contar um pouco da sua história, tendo por base aquilo que ele me contou, e o que eu conhecia a seu respeito.] (...)


(***)  Último poste da série > 1 de outubro de  2014 > Guiné 63/74 - P13676: Os nossos camaradas guineenses (38): Reportagem, com vídeo, da revista "Sabado", e tese de doutoramento sobre os comandos africanos, de Fátima da Cruz Rodrigues (Coimbra, UC, 2012) (Virgínio Briote)

Guiné 63/74 - P13773: Parabéns a você (804): Manuel Moreira de Castro, ex-Soldado Atirador da CCAÇ 2315 (Guiné, 1968/69)

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Nota do editor

Último poste da série de 20 de Outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13765: Parabéns a você (803): Fernando Súcio, ex-Soldado Condutor Auto do Pel Mort 4275 (Guiné, 1972/74) e Rogério Cardoso, ex-Fur Mil Mec da CART 643 (Guiné, 1964/66)

segunda-feira, 20 de outubro de 2014

Guiné 63/74 - P13772: (Ex)citações (241): Carta Aberta ao camarada Mário Vitorino Gaspar sobre o livro "Guiné, a cobardia ali não tinha lugar" (José da Câmara)

1. Mensagem do nosso camarada José da Câmara (ex-Fur Mil da CCAÇ 3327 e Pel Caç Nat 56, BráBachile e Teixeira Pinto, 1971/73), enviada ao nosso Blogue no dia 23 de Setembro de 2013:

Bom dia Carlos,
Recentemente o Beja Santos fez uma recenção sobre o livro do Fur Mil José Silveira da Rosa.(*)
Li o livro e só posso dizer que senti asco, para não dizer pior. O que lá está escrito é gravíssimo. Conheci o Rosa, mas não o Rosa que escreveu o livro. Quando escreveu o livro já era doente do foro psicológico.
Recentemente, nesta minha última deslocação à Horta, fui informado que o Rosa falecera numa instituição para doentes mentais. Verdade ou não, veio mais que de uma pessoa.
Porque eu estive envolvido no processo futebolístico dele, ainda antes de eu ir para a tropa, as acusações que ele faz aos dirigentes do Faial são no mínimo aberrantes. A verdade é que comentei o que ele escreve e mais alguns também o fizeram. Entre eles o nosso Hélder Sousa.
Agora aparece Mário Vitorino Gaspr, pela informação que tenho, talvez um furriel da mesma companhia ou especialidade, é boa pessoa, dizia, vem comentar mas é duro demais ao ponto de reclamar da veracidade do meu nome e da legitimidade do meu comentário. Esse que até é muito benovelente para com o Furriel Rosa, e até dou a entender que é bem possível que o livro já estando a ser escrito numa altura em que ele era acompanhado por um psiquiatra e psicologista podia conter inverdades que precisavam de esclarcimento. As acusações aos dirigentes do Faial Sport são inacreditáveis, mas isso seria uma longa história.
Eu junto o meu comentário aqui, mas não pretendo criar problemas no blogue, não é para isso que ele existe.

Abraço
José

************

2. Para que o texto enviado pelo nosso camarada José Câmara seja comprendido pelos leitores, aqui ficam as (ex)citações:


i) Comentário do José da Câmara no Poste 13716:

Meus caros amigos,
Conheci o José Silveira da Rosa, o Káká dos Flamengos, natural da Ilha do Faial, jogador do Fayal Sport Club, que um dia tentou o profissionalismo no Belenenses, tendo passado por outros clubes. Após o serviço militar regressou ao Fayal Sport Club. Fui eu que fiz o processo da sua transferência de jogador profissional para aquele Clube amador, facto que julgo sem precedente na altura. O José Silveira da Rosa, foi extremamente exigente nas condições pedidas aos dirigentes daquele clube faialense, entre elas um emprego compatível com as suas habilitações literárias, o 2.° Ano dos Liceus.

O José Silveira da Rosa como jogador de futebol era dotado de uma grande técnica para o meio faialense. Civicamente bem educado, afável, simpático, jovial e brincalhão, fazia amigos com muita facilidade. Eu fui um deles.

Após o meu próprio cumprimento do serviço militar, voltei a encontrá-lo na Horta, era ele ainda jogador do Fayal Sport. Tanto quanto sei, ainda jogou futebol vários anos, sem limitações físicas visíveis. Levava o desporto muito a sério, mesmo no amadorismo puro da época. Era em tudo uma pessoa normal, ou pelo menos parecia. O seu estado traumático visível terá acontecido alguns anos após a sua experiência militar.

Foi numa das minhas deslocações ao Faial que li o livro “Guiné, a cobardia ali não tinha lugar”. Fiquei enojado com o seu conteúdo. Chocou-me a contradição entre o homem amável que um dia conheci e o azedume da escrita. Na abordagem que faz ao seu regresso ao Fayal Sport é por demais ingrato, para não lhe chamar outra coisa, para com o Clube e os dirigentes que o ajudaram e que em minha opinião pessoal cumpriram com o que lhe prometeram, arranjando-lhe o emprego possível e com o qual ele concordou. Numa ilha pequena como o Faial não era tarefa fácil. Muitos outros, nas mesmas circunstâncias, viram-se obrigados a procurar noutras paragens o emprego que a ilha não tinha. Porque não vivi as experiências do Fur. Mil. José Silveira da Rosa não me debruçarei sobre algumas afirmações que faz no seu livro e que o Beja Santos muito bem sublinhou, mas a necessitarem de corroboração para serem credíveis. Até porque os camaradas do Furriel Rosa se inocentes merecem bem melhor que esta bofetada.

Fui recentemente informado que o José Silveira da Rosa passou os últimos anos da sua vida numa instituição de saúde. Que no seu eterno descanso ele encontre o profissionalismo futebolístico com que tanto sonhou em vida.

José Câmara
sábado, Outubro 11, 2014

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ii) Comentário de Mário Vitorino Gaspar no mesmo Poste:

Eu, Mário Vitorino Gaspar, Ex-Furriel Miliciano, Atirador com a Especialidade de Minas e Armadilhas da Companhia de Artilharia 1659 – CART 1659 (ZORBA), com o lema “Os Homens não Morrem”, e fiz a Comissão em Ganturé e Gadamael Porto, de JAN67 a OUT68.
Percorremos toda a zona do “corredor da morte”, ou “corredor de Guileje”; Sangonhá; Cacoca; Cameconde e Cacine.
Mais tarde veio a tragédia – mais para aqueles que lá ficaram destacados – de Gandembel.
Conheci, e bem o Ex-Furriel Miliciano José Silveira da Rosa e acompanhei de perto a evolução do Livro “Guiné - «a cobardia ali não tinha lugar», lendo-o inclusive, visto ter-me pedido uma opinião. Ao mesmo tempo ele quis que colaborasse com um capítulo da minha autoria e dei-lhe um texto já escrito sobre a “Operação Rinoceronte”, efectuada a 14 e 15 de Julho de 1967 no famigerado “corredor da morte”, tendo perdido o contacto com a NT o Soldado N.º 00458266, António Fernandes da Silva de Oliveira do Conde – Carregal do Sal e que após inúmeras operações nunca conseguimos localizar. Houve empenhos da Aviação e de todas as Companhias, e felizmente apareceu no fim de 11 longos dias.
A minha opinião sobre o Livro – e recordo-o como se fosse hoje – disse-lhe que ele tinha um Processo a decorrer para que fosse considerado Deficiente das Forças Armadas em Campanha – isto do Deficiente em Serviço e em Campanha é uma história que gostaria de abordar, ou se é ou não Deficiente, sendo Deficiente nunca pode existir este aborto, tem de ser Deficiente das Forças Armadas – e aquilo que denunciava era gravíssimo e lhe poderiam trazer danos.
Muito embora considerasse e considero que essas situações deveriam ser denunciadas. Ele contou até outras. Eu tinha sido um dos fundadores da APOIAR – Associação de Apoio aos Ex-Combatentes Vítimas do Stress de Guerra em 1994 (cargo de Vogal e Secretário); em Novembro de 1996 eleito como Vice-presidente, e de Dezembro de1998 até Janeiro de 2005 fui Presidente.
Além de ter estado com ele, julgo que na Escola Prática de Engenharia em Vendas Novas, deve ter sido em 2002/3 que o reencontrei. Era acompanhado na APOIAR em Psiquiatria e Psicologia. Conversámos muito, e convidou-me para ir à cidade da Horta, no Faial ao Lançamento do Livro, talvez no Verão de 2003.
A APOIAR fez um Colóquio antes do Lançamento, que teve a presença da nossa Assistente Social, e Psicóloga Clínica, respectivamente Doutoras Sofia Pires e Susana Oliveira. Ainda houve um grande espectáculo, digno de se ver, antes do Lançamento, terminando com um beberete. Depois do Lançamento do Livro, foi poucas vezes à APOIAR e perdi o seu contacto.
Pelo que li, opiniões de camaradas, o Furriel Miliciano José Silveira da Rosa (trata-se de um Furriel Miliciano e não de um Furriel), não é mentiroso. Já passaram 11 anos desde o Lançamento do Livro, e ninguém se queixou.
Será que Portugal anda a dormir? Ninguém da CART 1688 falou. Agora é que se lembram de comentar o que desconhecem? Noto que nem todos, ou somente o Camarada Beja Santos e um anónimo (apanho sempre com os anónimos em cima), embora diga que é José Câmara leram o livro. Verdade que faz acusações gravíssimas.
Percebi hoje que ele entretanto morreu, gostaria que me informassem se é verdade. Sei que publicou dois livros, este e outro da sua vida como futebolista. Até me pediu uma opinião sobre se deveria fazer só uma edição ou duas, mas já tinha ideia formada sobre isso.
José Silveira da Rosa denunciou situações de cobardia básica. Perdi a minha oportunidade porque fui censor do meu próprio Livro. Risquei com um lápis azul, cobardias e incapacidades, não fui vítima da censura, mas omiti. E ao omitir sou censor, embora de mim próprio.
Para acabar também querem que eu fale de situações de pôr as mãos à cabeça. E não se esqueçam, embora um qualquer Governo tenha acabado com os Furriéis Milicianos eles existem, não são Furriéis. Quando éramos Cabos Milicianos, éramos Cabos no pré e Sargentos no serviço. Queríamos ser tratados pelo nosso posto. Agora é mais grave, sou Furriel. Repito, sou Furriel.
Um abraço ao José Silveira da Rosa.

segunda-feira, Outubro 20, 2014

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Anotações do editor:

- Em Vendas Novas a Escola Prática era de Artilharia e não de Engenharia. Esta estava sediada como toda a gente sabe, principalmente quem andou em Minas e Armadilhas, em Tancos.

- Para evitar mal entendidos, quem não tem conta no Google, sempre que faz um comentário aparece como anónimo, situação que se resolve escrevendo no fim o nome, o ex-posto militar e/ou residência.

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3. Passemos à "carta aberta ao camarada Mário Vitorino Gaspar", enviado ao Blogue pelo camarada José Câmara para publicação:

Camarada Mário Vitorino Gaspar,
Se me permite, vou por partes.
Depois de oitenta e duas intervenções neste blogue onde sempre me assinei por José Câmara, jamais pensei ser um anónimo nestas páginas. Nesse aspecto, para além da minha apresentação, de acordo com as regras ao blogue, aqui fica para que conste:
José Alexandre da Silveira Câmara, natural da Fazenda, concelho das Lajes, Flores, Açores.
Com a idade de dez anos fui morar para a ilha do Faial.
Fui Fur Mil na CCaç 3327/BII17 e no Pel Caç Nat  56, com comissão na Guiné entre Janeiro de 1971 e Janeiro de 1973.
Sou emigrante desde Julho de 1973, facto que, culpa minha e só minha, me impede de expressar com a fluidez linguística desejada.
Atesto não ter identificação no Google, daí o cabeçalho aparecer sempre como anónimo. E assim continuará.

Conheci muito bem o jovem cidadão José Silveira da Rosa, mas não conheci o Furriel Miliciano que ele foi. Tão pouco comentei o que desconhecia e desconheço da sua vida militar. Comentei, melhor questionei, algumas das acusações inseridas no livro que ele escreveu. Tenho toda a legitimidade para o fazer.
Fui seu amigo pessoal, jogámos futebol no mesmo clube, quase sempre em escalões diferentes, o Fayal Sport, da pequenina cidade da Horta. Ele era bem melhor atleta que eu. Pelo menos enquanto jovem, as mazelas físicas que ele afirmava terem sido impeditivas de uma carreira profissional, não o impediram de ter uma vida normal e de ser um desportista amador, diria o melhor do seu tempo. No amadorismo, o José Silveira da Rosa trabalhava como se fosse um profissional. Era um bom exemplo para todos nós.
Ao tempo, todo jogador do Fayal Sport era inscrito na FPF como amador e, como tal, ficava desvinculado do Clube no fim da época. O José Silveira só mudou de Clube anos mais tarde quando o Clube da sua terra, o F C dos Flamengos, se associou na Associação de Futebol da Horta.
Tão pouco acusei o José Silveira da Rosa de ser mentiroso, não o conheci por ser, ou de não sofrer de traumatismo provocado pela guerra. Apenas alertei que a visibilidade daquele traumatismo aparecera mais tarde na vida dele, situação que julgo ser normalíssima. E acrescentei as suas qualidades humanas e cívicas.
Tudo isso para fazer a clivagem entre o José Silveira da Rosa, o homem bom que eu conheci e atestarei em qualquer parte, e um irreconhecível, pelo menos para mim, José Silveira da Rosa, Furriel Miliciano com comissão militar na Guiné, Deficiente das Forças Armadas, que escreveu o livro em causa.

Os exércitos não são feitos propriamente de meninos de coro. São feitos por todo o tipo de jovens, com todas as consequências possíveis. Por isso mesmo, em todas as guerras sempre houve exageros em momentos pontuais de pouca lucidez, que normalmente a imaturidade ou mal formação ditava. E se é certo que todos os exageros são condenáveis, julgo que nenhum militar que se preze duvida disso, as acusações do Furriel Miliciano José Silveira da Rosa são gravíssimas, de acções premeditadas, de tortura, de fuzilamento em massa, de abusos sexuais em grupo. Põem em causa toda uma Companhia, a condecoração por ela recebida, o próprio Exército de Portugal.

Pedir credibilidade às acusações feitas pelo Furriel Miliciano José Silveira da Rosa, infelizmente um Deficiente das Forças Armadas Portuguesas, que estava a receber acompanhamento psiquiátrico e psicológico na altura em que o livro foi escrito, factos que o Mário Vitorino Gaspar reconhece e eu, pormenores aparte, não desconhecia, é um acto da mais elementar justiça. De qualquer justiça. Com todas as consequências que daí possam advir, não estão em causa as acusações, essas foram feitas, ou mesmo o bom nome do acusador, mas sim a presumível inocência dos acusados.

É verdade, eu li o livro numa das deslocações que fiz ao Faial, cerca de dez anos depois da sua publicação. Eu não julguei ou julgo as acusações do Fur Mil José Silveira da Rosa. Porém, como cidadão português que ainda sou, que fiz os possíveis para honrar o uniforme que um dia enverguei com dignidade, sem vergonha, julgo que tenho toda a legitimidade para pedir a verdade dos factos e não mais que isso.

Para que não restem dúvidas sobre a minha forma de pensar e estar na vida, é-me muito mais fácil engolir a inocência de um culpado do que a culpa de um inocente.

Cumprimentos.
José Câmara
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Notas do editor

(*) Vd. poste (e respectivos comentários) de 10 de Outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13716: Notas de leitura (640): “Guiné, a cobardia ali não tinha lugar”, por José Silveira da Rosa, edição de autor, 2003 (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 20 de Outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13766: (Ex)citações (240): Água da bolanha... quem a não bebeu ?!... Recordando aqui o pesadelo que foi a Op Jaguar Vermelho, no Morés, em 9 de junho de 1970... (Carlos Fortunato. ex-fur mil trms. CCAÇ 13, Bissorã, 1969/71, e presidente da direção da ONDG Ajuda Amiga)