Foto nº 1 > Guiné > Bissau > Praça do Império > Monumento "Ao Esforço da Raça! > Novembro de 1965 > Dpsi alferes que estuveram em Porto Gole : o Alf António Maldonado, falecido no ataque de 3 de Março de 1966, descrito a seguir; e o Alferes Jorge Rosales, que esteve 18 meses neste destacamento de Porto Gole, antes da chegada da CCaç 1439 a Enxalé. Comforme escreveu onosso saudoso Jorge Rosales (1939-2019): "O alf mil Maldonado, meu camarada desde Mafra e meu substitulo em Porto Gole, (...) faleceu em março de 1966, em consequência do rebentamento de uma morteirada IN que o atingiu em cheio, no aquartelamento de Porto Gole". De seu nome completo, António Aníbal Maia de Carvalho Maldonado, era natural da Sé Nova, Coimbra, foi inumado no cemitério da Conchada.
Foto (e legenda): © Jorge Rosales (2010). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: João Crisóstomo / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
Foto nº 3 > Guiné > Região do Oio > Porto Gole > CCAÇ 1439 (1965/67) > Junto do monumento de Porto Gole, (i) de pé, da esquerda para a direita, Alf Sousa; Alf Crisóstomo e furriel Bonifácio; (ii) sentados da direta para a esquerda. Furriel Neiva e Alf Matos e na esquerda um condutor da CCaç 1439, de quem me não lembro o nome.
Foto nº 4 > Guiné > Região do Oio > Porto Gole > CCAÇ 1439 (1965/67) > Sem desprimor para os aqueles que não posso identificar , pode-se ver no canto direito fazendo exercício de preparação o Furriel Eduardo, profissional de futebol em Portugal ; e em primeiro plano, embora me lembro de todos eles , não consigo alguns nomes: de pé da esquerda para a direita : eu, Furriel Bonifácio, e no meio o Manuel Açoreano. Esta é a única foto que tenho dele, bem identificável. era o único soldado não madeirense e foi vítima duma mina no dia 6 de Outubro de 1966.
Foto nº 4 > Guiné > Região do Oio > Porto Gole > CCAÇ 1439 (1965/67) > Um dos “abrigos' de Porto Gole ; o João, do Bombarral (padeiro em Porto Gole) e eu numa altura em que tinha tempo para tudo, até para deixar crescer a barba…
Foto nº 5 > Guiné > Região do Oio > Porto Gole > CCAÇ 1439 (1965/67) > A cozinha e a padaria ( o edifício branco ) de Porto Gole . Na caso de dúvida, o indivíduo de pé , de mãos nos quadris sou eu.
Fotos (e legtendas): © João Crisóstomo (2021). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar. Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
1. Continuação da publicação da publicação das memórias do João Crisóstomo, ex-alf mil, CCAÇ 1439 (1965/67)
Parte IXa: Março de 1966: A CCaç 1439 em Enxalé (e seus destacamentos de Porto Gole e Missirá)
Dia 3 de Março de 1966: Ataque do IN a Porto Gole
Porto Gole e Missirá eram os dois “destacamentos” de Enxalé. Em princípio os quatro pelotões e seus alferes eram supostos revezarem-se -se em estadias de um mês nestes destacamentos.
Para o destacamento de Porto Gole porém havia quase sempre um alferes de outras origens que não era o Enxalé, como se pode ver pela presença do Alferes Jorge Rosales, antes de nós e durante o nosso tempo a presença do Maldonado, António Carvalho e Henrique Matos. Quando por qualquer razão isso não sucedia, então a CCaç 1439 no Enxalé preenchia a lacuna até esta ser de novo atendida. Esta foi a razão porque estive em Porto Gole várias vezes durante a minha comissão na Guiné.
Quanto às estadias, que supostamente eram de um mês, nunca sucedeu assim e demoravam mais ou menos tempo conforme a situação e circunstâncias o permitiam ou exigiam. Houve mesmo ocasiões, embora de pouca duração em que tanto Missirá como Porto Gole estiveram algum tempo sem tropas regulares, ficando a segurança das mesmas entregues aos Régulos, os respeitados Abna na Onça em Porto Gole e Malan Soncó em Missirá, com suas milícias de nativos.
Não sei sequer em que data estive em Porto Gole pela primeira vez. Da minha primeira estadia lembro da minha surpresa por ir encontrar em Porto Gole várias casas tipo europeu, onde cabo-verdianos e mesmo portugueses que no passado faziam a sua vida aqui e que agora apareciam ocasionalmente. Havia um Posto Administrativo que servia também de residência para o encarregado deste, um Cabo-verdiano e sua família; uma "Casa Gouveia" para o comércio do arroz que era abundante na região..
O Régulo de Porto Gole, Abna na Onça era um indivíduo enorme em estatura e importância: a sua autoridade era respeitada e temida no grande número de tabancas da vasta região predominantemente da etnia balanta, embora a sua influência se estendesse mesmo em áreas de outras etnias e com outros régulos. Abna na Onça nunca perdoou que logo no início das hostilidades as forças do PAIGC lhe tivessem roubado duas das suas dez mulheres e elevado número de cabeças de gado.
E se a sua posição foi sempre a favor dos portugueses, a partir desse momento declarou guerra sem quartel aos que queriam uma nova ordem e independência. Tinha uma milícia bem organizada, a nível de pelotão permanente em Porto Gole, alguns deles, se eram todos nunca o cheguei a saber, armados com espingardas Mauser fornecidas por Bissau.
Do General Schul recebeu uma G3 e um relógio de pulso de ouro que ostentava com orgulho, assim como o título de "Capitão de Segunda.” Exercia autoridade completa na grande extensão do seu domínio num total estimado de cinco mil balantas, passando julgamentos e veredictos que eram respeitados e aceites sem qualquer discussão. Mais do que uma vez ouvi dizer da vinda de indivíduos que se apresentavam para receber os castigos impostos, por vezes dolorosas reguadas nas palmilhas dos pés aplicadas com uma régua especial que tinha para o efeito.
Não faltava espaço e
lembro que havia mesmo um improvisado campo de futebol que nos ajudava a
esquecer problemas e passar o nosso
tempo
Não me recordo quanto tempo fiquei, mas ao fim da minha primeira estadia tinha já um bom relacionamento pessoal com ele. Vim a saber mais tarde que o mesmo sucedia já antes de eu chegar, a ajudar pelo testemunho deixado neste blogue. No poste P19517 lê-se:
"(i) o Jorge era muito amigo do mítico capitão de 2ª linha, o Abna Na Onça, chefe espiritual, poderoso, da comunidade balanta da região, a quem o PAIGC havia cometido o erro fatal de “matar duas mulheres e roubar centenas de cabeças de gado”;
(ii) o prestígio, a influência e e o carisma do Abna Na Onça eram tão grandes que ele sabia tudo o que se passava numa vasta região que ia de Mansoa a Bambadinca (nomeadamente, importantes informações militares, como a passagem de homens e armas do PAIGC);
(iii) jovem (teria 72/73 anos se fosse vivo, em 2009), era um homem imponente, nos seus 120 kg.
(iv) Schulz tinha-lhe oferecido um relógio de ouro e uma G3 como reconhecimento pelos seus brilhantes serviços;
(v) mais tarde, seria morto, em Bissá, em 15/4/67, com
seis dos seus polícias admin, todos eles residentes em Porto Gole"
Foto nº 6 > Guiné > Região do Oio > Porto Goloe > CCAÇ 1439 (1965/67) > Não me lembro dos nomes: dois sargentos ( do quadro) a meu lado; do lado esquerdo furriel Tony e o filho do encarregado do posto.No lado direito de costas Abna na Onça, um cabo-verdiano, encarregado do posto e sua esposa
Foto nº 7 > Guiné > Região do Oio > Porto Goloe > CCAÇ 1439 (1965/67) > Eu e o Abna na Onça em Porto Gole
Fotos (e legendas): © João Crisóstomo (2021). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar. Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
Foi um choque grande para mim quando soube da morte de Abna na Onça. Como havia sucedido com o Alferes Rosales que me precedeu em Porto Gole, também eu tinha já um bom relacionamento, direi amizade com ele.
Pelo que compreendi a estadia de Rosales em Porto Gole era a título permanente; depois de Rosales acabar o seu tempo, Enxalé continuou encarregado de Porto Gole, mas como expliquei atrás, em princípio nós revezavamo.nos cada mês um pelotão à vez e houve durante o nosso tempo três alferes que não eram da CCaç 1439 que vieram para Porto Gole. Na realidade os alferes da CCaç 1439 em Porto Gole eram mais um "tapa buracos” ; mas como estes foram frequentes e longos , estivemos lá bastantes vezes.
Antes de copiar o que consta sobre o primeiro ataque a Porto Gole, em 3 de março de 1966, quero deixar algumas recordações que tenho de Abna na Onça e outras memórias de Porto Gole que acho pertinentes.
Depois do fatídico ataque IN a Porto Gole , durante o qual faleceu o Alferes Maldonado, o Capitão Pires chamou-me; que devido às circunstancias não tinha outra alternativa senão que eu voltasse para Porto Gole com o meu pelotão, até que o Batalhão encontrasse solução definitiva.
Voltei e soube então que o Alferes Maldonado tinha pensado em construir uma pista de aterragem mesmo junto a Porto Gole. Não sei se chegou a falar disso a alguém ou não. O facto é que havia uma grande superfície plana que se propiciava perfeitamente para isso. Eu nunca tinha pensado nisso antes , mas via que era possível e muito útil. O correio que recebíamos em Porto Gole era simplesmente deixado cair duma avioneta e depois recuperado nessa área; e a construção de uma pista de aterragem além de muitas outras vantagens, ajudaria a quebrar o sentido de muito isolamento a que estávamos sujeitos.
Matutei sobre isso muito tempo: para fazer uma pista de aterragem eu ia precisar de ajuda
pois haviam algumas árvores grande que era preciso arrancar e isso ia exigir maquinharia apropriada. E talvez eu devesse
consultar primeiro o Capitão Pires e
mesmo o Batalhão. Mas pensei, se eu lhes falar depois de o terreno já estar
limpo, talvez eles aceitem a idéia com
maior facilidade. Sei que
um dia resolvi falar sobre isso com Abna na Onça, não só porque precisava da
ajuda dele no caso de querer concretizar a idéia , como para o fazer sentir que
respeitava a sua autoridade; ao fim e ao cabo
ele era o Régulo da região.
Se ele já sabia da idéia não me disse, mas mostrou-se entusiasmado. Perguntei-lhe o que pensava, decidido a falar depois com o capitão Pires para alguma ajuda. Eu pensava que ele ia dizer que pelo menos seria preciso dar de comer a quem quer que viesse trabalhar na capinagem da extensa superfície. Mas não era o caso. Que Porto Gole era uma terra muito importante e com um campo de aviação ia ser mais importante ainda. Que eu arranjasse maneira de dar água para beber aos homens e que o resto era com ele. Perguntei-lhe então e ele disse logo que sim à minha idéia de pôr um jeep com um bidão a acartar água da povoação para o local. E à minha sugestão de enviar uma secção de soldados para fazer segurança, ele respondeu categoricamente que não. Que eu estivesse descansado que se o IN viesse atacar ele ia saber antes disso acontecer.
No dia combinado, que foi três dias depois, quando fui ao local já aí estavam umas dezenas de homens. à espera e continuaram a aparecer mais e mais… Quando o capitão Abna na Onça apareceu havia uma multidão que eu avaliei em cerca de duzentos a trezentos homens, todos com catanas.
No momento em que ele falou fez-se um silêncio total, mas mal ele acabou de falar foi um sussurro geral, parece que todos falaram ao mesmo tempo. Eu não soube o que disse , mas o resultado foi formarem imediatamente uma linha numa extensão enorme e a descapinagem e o corte de tudo o que era arbusto e árvores de pequeno porte começou. Eu só ouvia um murmúrio aqui e ali e a voz forte de Abna na Onça : Kuá , Kuá, Kuá… que ainda hoje não sei o que quer dizer, mas o que quer que fosse era um poderoso motivador. Nos dois dias seguinte foi a mesma coisa e o campo ficou a secar. Passados algum tempo o meu pelotão voltou a Enxalé sem termos feito mais nada no terreno.
Pelo que soube ainda recentemente, durante bastante tempo não sucedeu
nada no respeitante ao campo de aterragem.
Mais tarde houve “reorganização
militar do terreno" e Porto Gole deixou de ser dependente
de Enxalé, passando a ser a sede duma companhia e Enxalé passou a depender de Xime. Deve ter sido nesta altura que houve novos
trabalhos de preparação do terreno, pois algum tempo depois houve uma “Dornier”
que fez uma aterragem de emergência
nesta pista e depois conseguiu levantar
de novo e prosseguir voo.
(Continua)
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Nota do editor:
Último poste da série > 18 de maio de 2021 > Guiné 61/74 - P22210: CCAÇ 1439 (Xime, Bambadinca, Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67): A “história” como eu a lembro e vivi (João Crisóstomo, ex-alf mil, Nova Iorque) - Parte VIII: A partir de outubro de 1965, em Enxalé e seus destacamentos, Porto Gole e Missirá