sexta-feira, 27 de maio de 2022

Guiné 61/74 - P23298 Convívios (930): 48.º almoço-convívio da Magnífica Tabanca da Linha, Algés, 19 de maio de 2022 - Parte II: caras (lindas) que não se viam há mais de 2 anos; outras aparecem pela 1º vez...

  


Foto nº 9 > Tabanca da Linha > Algés > Restaurante Caravela De Ouro > 48º Convívio > 19 de maio de 2022 > Caras lindas que não se viam por aqui há mais de 2 amos: primeiro veio a pandemia, depois vieramas  mazelas do corpo e da alma... A noossa Eisabete Silva, por exemplo, quem diz que em 2013 andava pelos matos e bolanhas da Guiné-Bissau, toda fresca, com o marido,  o nosso dr. Francisco Silva, cirurgião ortopedista, e que depois passou por um grave problema de saúde... Está de volta aos convívios da Tabanca da Linha e com ótima cara... Que bom, ver-te, Elisabete !




Foto nº 10 > Tabanca da Linha > Algés > Restaurante Caravela De Ouro > 48º Convívio > 19 de maio de 2022 > Que bom, rever-te, Francisco!.. Temos andado desencontrados, mas cada um à volta dos seus  problemas de saúde... e lambendo, como o cão do balanta. as suas feridas,   Dizem-me que não tens atendido os telefonemas de ninguém...Grande madeiresne, amigo e camarada, as tuas melhoras!... lLha, eu acabo de fazer uma artoplastia total ao joelho esquerdo, no Hospital Ortopédico de Sant'Ana, na Parede... Agora são dois meses de fisiatria...



Foto nº 11 > Tabanca da Linha > Algés > Restaurante Caravela De Ouro > 48º Convívio > 19 de maio de 2022 > Assim de repente estou a reconhecer o meu querido amigo e colaborador permanente do blogue, o José Martins, o homem que conhece o Arquivo Histórico Militar quase tão bem como aos cantos da sua casa em Odivelas.  À sua direita, tem  outro indefetível magnífico, que não costuma falhar os convívios da Tabanca da Linha, o ex-sol cond autorrodas da CCAV 2748, Canquelifá, 1970/72, Fancisco Palma... O terceiro elemento, à esquerda, é o José Manuel Lúcio Inácio (Caxias) que veio pela 1ª vez.


Foto nº 12 > Tabanca da Linha > Algés > Restaurante Caravela De Ouro > 48º Convívio > 19 de maio de 2022 > Domingos Robalo: também não costuma falhar, vem da outra banda, é só atravessar o Tejo... Ex-fur mil art, BAC 1 / GAC 7, Bissau, 1969/71, comandante do 22º Pel Art, em Fulacunda, tem 27 referências no nosso blogue...Respira saúde, o nosso artilheiro!



Foto nº 13 > Tabanca da Linha > Algés > Restaurante Caravela De Ouro > 48º Convívio > 19 de maio de 2022 > Da esquerda para a direita, o Arménio Santos, o nosso ex-deputado  e ex-dirigente sindical, que costumava ir a Monte Real, aos Encontros Naconais da Tabanca Grande, com o seu querido amigo, camarada e professor Jorge Cabral; (ii) o Silvério Dias, 1º srgt art ref, também conhecido como radialista do Pifas ou "senhor Pifas"; e, à sua esquerda, (iii) a "senhora tenente", a  esposa, outra voz muito popular do Programa das Forças Armadas, em Bissau...



Foto nº 14 > Tabanca da Linha > Algés > Restaurante Caravela De Ouro > 48º Convívio > 19 de maio de 2022 > Impecável nos seus suspensórios, o António Ramalho que vem "à Linha" sempre que pode,,, à sua direita, o Joaquim da Cruz Coelho (Lisboa) (1ª vez). Acrescenat o Ramalho eem email posterior: "O camarada que está comigo, é um Periquito nestas andanças, é o Fur. Mil Joaquim da Cruz Coelho, que consegui levar, da CCav 2639. Era do meu Gr Comb e desempenhou as funções de responsável pelo reordenamento de Capunga, foi a este nosso camarada que o Gen. Spínola disse:'Você tem mais cara de alferes do que muitos que por aí andam!'...... Os outros estão muito distantes da Linha, só um golpe de sorte os trará cá à capital"...


Foto nº 15 > Tabanca da Linha > Algés > Restaurante Caravela De Ouro > 48º Convívio > 19 de maio de 20
22 > Carvalho Guerra (Barreiro), vem pela 1ª vez.


Foto nº 16 > Tabanca da Linha > Algés > Restaurante Caravela De Ouro > 48º Convívio > 19 de maio de 2022 > Reconheço à esquerda  o cor inf ref Fernando José Estrela Soares (ex-comandante da CCAÇ 2445, Cacine, Cameconde e Có, julho de 1968 / dezembro de 1970). A seu lado, o António Belo (Cadaval), grande poeta que nos maravilha cos as suas poesias temáticas e publicadas na nossa página, acrescenta o Manuel Resende.

Foto nº 17 > Tabanca da Linha > Algés > Restaurante Caravela De Ouro > 48º Convívio > 19 de maio de 2022 > Aspeto geral do último andar do restaurante com magnífica vista sobre o Tejo...



Foto nº 18 > Tabanca da Linha > Algés > Restaurante Caravela De Ouro > 48º Convívio > 19 de maio de 2022 >  Outra vista da sala..



Foto nº 19 > Tabanca da Linha > Algés > Restaurante Caravela De Ouro > 48º Convívio > 19 de maio de 2022 > Zé Carioca, com o seu inconfundível bigode, mais a esposa Ilda (que também é "habituée" da Tabanca Linha, o casal vive em Cascais)



Foto nº 20 > Tabanca da Linha > Algés > Restaurante Caravela De Ouro > 48º Convívio > 19 de maio de 2022 > O nosso querido amigo e camarada Carlos Silva, gondomarense, a viver aqui no Sul, e ligado à ONGD Ajuda Amiga; mais o Zé Rodrigues, de Belas (Sintra), ao meio; e à direita o José Jesus (Trajouce / Cascais), que também raramente falha os convívios da Magnífic.


Foto nº 21 > Tabanca da Linha > Algés > Restaurante Caravela De Ouro > 48º Convívio > 19 de maio de 2022 > À esquerda, o Joaquim Nunes Sequeira, o "Sintra", que vive em Colares... Sempre afável, bem disposto, prestável, prazenteiro... É um dos "mais" da Tabanca da Linha... Ao seu lado, não sei quem seja, mas o fotógrafo logo dirá... O seu companehiro de mesa é o Alpoim Almeida Ribeiro (Algés), vem pela  1ª vez.



Foto nº 22 > Tabanca da Linha > Algés > Restaurante Caravela De Ouro > 48º Convívio > 19 de maio de 2022 > Raul Folques, um ds her´pis do CTIG, o cor 'comando' ref, que ostenta o peso (e brilho)  de uma Torre  e Espada, e à sua esquerda o veterano Hugo Moura Ferreira.


Foto nº 23  > Tabanca da Linha > Algés > Restaurante Caravela De Ouro > 48º Convívio > 19 de maio de 2022 >  O do meio é segu
ramente o Mário Fitas, um dos fundadores da Magnífica Tabanca da Linha. É nosso grã-tabanqueiro: tem 140 referências no nosso blogue. Os outros dois são o José Dionísio e João Coelho (de bigodito), os dois vêm pela 1ª vez.


Fotos (e legendas): © Manuel Resende (2022). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


1. Continuação da publicação de um seleção de fotos da reportagem feita pelo Manuel Resende (*). 

Como eu não estive lá, por  ter ainda há dias saído do hospital (onde fui fazer uma artroplastia total do joelho esquerdo), embora tenha sido também  "co(n)vidado",  "co(n)vi (t/d)  que declinei, por razões de saúde, ele há caras que não já não consigo identificar de imediato, tendo que recorrer aos "auxiliares de memória" que são os postes anteriores sobre a  Tabanca da Linha. 

Peço que me perdoem os visados e os nossos leitores. As fotos vão, arbitrariamente, numeradas para ajudar o Manuel Resende  (e outros) a completar, nalguns casos, as legendas. (**). Trabalho, entretanto, já feito...

Guiné 61/74 - P23297: Convívios (929): Almoço/Convívio do pessoal da CART 1742 - "Os Panteras", dia 18 de Junho de 2022, em Pedras Rubras - Moreira da Maia (Abel Santos, ex-Soldado At Art)


Almoço/Convívio da Cart 1742 “Os Panteras”

Nova Lamego e Buruntuma, 1967/ 69

Dia 18 de Junho de 2022 em Pedras Rubras - Moreira da Maia


Mensagem do nosso camarada Abel Santos, (ex-Soldado Atirador Art da CART 1742 - "Os Panteras" - Nova Lamego e Buruntuma, 1967/69), com data de 26 de Maio de 2022:


Após um interregno de dois anos devido à pandemia que assolou o nosso país, mas que felizmente no presente as coisas estão bem melhores, chegou a hora de voltarmos aos nossos encontros anuais.

Para que tal aconteça esperamos que compareças no dia 18 de junho de 2022 na localidade de Pedras Rubras (Largo da Feira) junto do restaurante Malheiros Eventos, local do ponto de encontro, cuja direcção é a seguinte: Praça do Exército Libertador, 114 - Pedras Rubras, Vila de Moreira da Maia.

Contactos:
Abel Santos - 919 253 200
Jaime Mendes - 962 485 855 + 253 271 390

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Nota do editor

Último poste da série de 26 DE MAIO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23296: Convívios (928): 48.º almoço-convívio da Magnífica Tabanca da Linha, Algés, 19 de maio de 2022 - Parte I: os "bandalhos" que se estão a tornar clientes...

quinta-feira, 26 de maio de 2022

Guiné 61/74 - P23296: Convívios (928): 48.º almoço-convívio da Magnífica Tabanca da Linha, Algés, 19 de maio de 2022 - Parte I: os "bandalhos" que se estão a tornar clientes...


Foto nº 1 > Tabanca da Linha > Algés > Restaurante Caravela De Ouro > 48º Convívio  > 19 de maio de 2022 >  Foto de  grupo, começando pelo lado esquerda, o Zé Ferreira, o Manuel Resende, o Mário Fitas e o Jorge Teixeira. Do lado direito, outro "bandalho", o José Sousa que veio integrado na "deputação" do Norte, o José Diniz de Sousa Faro, o Domingos Robalo, o António Duque Marques... O camarada, a seguir, de camisa amarela, estou com dificuldade em identificá-lo... Apesar de diversas desistências de última hora, com medo da sexta vaga da  Covid, a ala compôs-se e tudo parece ter corrido bem. 

Foto nº 2 > Tabanca da Linha > Algés > Restaurante Caravela De Ouro > 48º Convívio  > 19 de maio de 2022 >  Dois dos escritores de O Bando: tão bem dispostos quanto talentosos, o  Francisco Baptista e o José Ferreira

Foto nº 3 > Tabanca da Linha > Algés > Restaurante Caravela De Ouro > 48º Convívio  > 19 de maio de 2022 >  José Ferreira. Eduardo Moutinho Santos e Eduardo Campos (com ar de quem já está meio "covidado": foi um dos que adoeceu, a seguir)...

Foto nº 4 > Tabanca da Linha > Algés > Restaurante Caravela De Ouro > 48º Convívio  > 19 de maio de 2022 >  Outro dos escritores de O Bando, António  Carvalho, e o seu "assistente", o Zé Manel Cancela.

Foto nº 5 > Tabanca da Linha > Algés > Restaurante Caravela De Ouro > 48º Convívio  > 19 de maio de 2022 >  O bandalho-mor, o Jorge Teixeira, encantado por vir à terra dos mouros, e o seu assssor jurídico, Ricardo Figueiredo.

Foto nº 6 > Tabanca da Linha > Algés > Restaurante Caravela De Ouro > 48º Convívio  > 19 de maio de 2022 > Mais dois ilustres "bandalhos", o Fernando Súcio e o José Sousa.


Foto nº 7 > Tabanca da Linha > Algés > Restaurante Caravela De Ouro > 48º Convívio  > 19 de maio de 2022 > "Volta, Armando (Pires)... estás perdoado", parece querer dizer o Miguel Rocha, tendo à sua esquerda o Manuel Macias, cujo sorriso, tranquilizador, vale por mil palavras: "Armando, temos saudadrs tuas"-


Foto nº 8 > Tabanca da Linha > Algés > Restaurante Caravela De Ouro > 48º Convívio  > 19 de maio de 2022 > Faltaram também casais com "new look": o nosso Jorge Ferreira, vinte anos mais novo, e a sua nova companheira...

Fotos (e legendas): © Manuel Resende (2022). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].



1. Conforme foi notícia aqui no blogue (*), ao fim destes dois anos e tal de pandemia de Covid-19 que nos obrigaram a ficar sozinhos e tristes em casa,  a Magnífica Tabanca da Linha, com sede em Algés, Oeiras, abriu as suas portas de par em par, para receber os seus magníficos tababanqueiros e convidados, no "reservado" do Restaurante Caravela de Ouro.  

Estavam inscritos cerca de 9 dezenas de convivas, mas houve desistências de última hora devido  à nova vaga de Covid-19 que veio  estragar a nossa primavera de 2022...

Este convívio contou com uma belíssima representação do Porto, oriunda da mais famosa tertúlía literária, memorialística, cultural, recreativa, gastronómica, almocarística, jantarística e escursionista lá do Norte,  registada originalmente sob o nome de Bando do Café Progresso, das Caldas à Guiné e, mais familiarmente conhecida nas redes sociais como os "Bandalhos". O bandalho-mor é  o Jorge Teixeira.

Com fotos do Manuel Resende (o régulo e o homem dos sete ofícios da Magnífica Tabanca da Linha) damos aos nossos leitores uma primeria ideia do que foi este 48º Convívio. O adjunto, Armando Pires, embora ali a dois passos (mora em Mira Flores) optou por ficar em casa, acautelando a sua saúde. Mas a sua ausência foi notada e sentida...

(Continuação)
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Nota do editor:

(*) Útimo poste da série > 19 de maio de 2022 > Guiné 61/74 - P23276: Convívios (927): A Magnífica Tabanca da Linha reabre hoje, em Algés, no Restaurante Caravela de Ouro, ao fim de mais de dois anos de pandemia... Uma luzidia representação do Porto, de "O Bando" (incluindo 3 escritores), vem animar este 48º convívio, já histórico...

Guiné 61/74 - P23295: "A Minha Passagem pela Guiné-Bissau em Tempo de Guerra" (António Sebastião Figuinha, ex-Fur Mil Enfermeiro) Parte VII

1. Continuação da publicação do texto de memórias "A Minha Passagem pela Guiné-Bissau em Tempo de Guerra", de António Figuinha, ex-Fur Mil Enfermeiro da CCS/BCAÇ 2884 (BissauBuba e Pelundo, 1969/71)


A MINHA PASSAGEM PELA GUINÉ-BISSAU EM TEMPO DE GUERRA

António Sebastião Figuinha
Ex-Furriel Miliciano Enfermeiro
CCS/BCAÇ 2884
1969/1970/1971
Parte VII

O primeiro caso prende-se com mal-entendido entre mim e um dos meus Maqueiros, que encontrando-se adoentado, dei-lhe dispensa de trabalho durante uns dias. Porém, não cumpriria as regras determinadas para ter direito à despensa de trabalho, que era ficar em repouso e não andar fora no espaço do Quartel apanhar sol. 

Como o encontrei ao Sol e a dar instruções a outros Soldados que naquela altura cavavam uma vala e torno do Quartel e na parte interna deste, como de um capataz se tratasse,  disse-lhe que lhe iria retirar a dispensa já que, se estava bom para se armar em capataz, também já se encontrava com saúde para trabalhar no posto Médico. Amuou e, baixando a cabeça, retirou-se, acompanhando-me até ao nosso local de trabalho.

Chegou a noite e como me era habitual sempre que não me escapava para o bailarico, ia para o Posto Médico escrever para os meus familiares e namorada que tinha na altura. Devo já acrescentar que este Maqueiro dormia permanentemente neste local, devidamente autorizado. A certa altura da noite e, estando eu tranquilamente sentado à secretária escrevendo, reparo que ele se dirige para a porta de entrada e saída e a fecha. 

Achei estranho e, de repente, apanha a G3 que tinha distribuída, dirigindo-se para mim e, colocando-se em frente da secretária onde me encontrava sentado a escrever, qual não é o meu espanto, aponta-me aquela arma à minha cabeça, ao mesmo tempo dizendo-me que eu não gostava dele, que lhe queria estragar a vida e mais outras baboseiras. 

Como tremia demasiado com a arma apontada para mim apontada, eu encontrando-me com as minhas pernas impedidas de me poder levantar rapidamente, só via como hipótese de defesa usando a psicologia das palavras e, em último caso, usando a rapidez de um dos meus braços desviando e, ao mesmo tempo segurando, o cano da arma. Como poucos anos atrás tive aulas de judo, todas estas emoções passaram pela minha cabeça rapidamente. 

Felizmente que as minhas palavras surtiram efeito naquela cabeça tonta que, baixando a arma retirou-se para a sua cama chorando e, ao mesmo tempo dizendo, que tinha desgraçado a sua vida. Levantei-me da secretária com o meu corpo todo elétrico, não lhe dirigindo qualquer palavra. Abri a porta e saí para o exterior, respirando fundo e começando a pensar na atitude a tomar no dia seguinte com aquele esmiolado soldado.

Pouco ou quase nada dormi naquela noite. O caso não era para menos dada a sua gravidade. Ou participava o acontecimento aos órgãos superiores e ele iria a tribunal de guerra ou lhe teria que dar uma lição verbal reunindo todos aqueles que trabalhavam sobre as minhas ordens, contando o sucedido para ele se sentir envergonhado. Assim, ainda muito cansado física e moralmente, logo pela manhã e antes de começarmos o atendimento, tanto a consultas como a outros tratamentos de saúde, reuni todo o grupo e fechei a porta da entrada do Posto Médico.

O Anacleto, assim se chamava e penso que ainda se chama porque creio ainda se encontra vivo, mantinha-se enroscado na sua cama chorando. O meu pessoal olhava para todos os lados não percebendo do motivo da reunião e da porta fechada ao exterior. Coloquei-me em frente da secretária e, bem alto, perguntei a todos se algum deles tinhas razões de queixa sobre a minha forma de me relacionar com eles no trabalho e fora deste. Em coro repetiram que não e, o porquê da minha pergunta? 

Então, serenamente, lhes contei todo o sucedido da noite anterior naquele espaço. Revoltados, atiraram-se ao Anacleto chamando-lhe tudo e mais alguma coisa. Este, continuando num pranto, pedia perdão sobre o seu ato. Todos foram dizendo que ele não era merecedor do meu perdão. Desmobilizei-os dizendo-lhes que iria pensar na minha atitude a tomar para com o Anacleto. Resolvi não o enviar para a prisão perdoando-lhe. 

Até há três anos, data do último encontro de todo o nosso Batalhão, a última vez que o vi, me procura dar os maiores elogios e palavras carinhosas. Não estou arrependido de lhe ter perdoado. Fiquei triste sim, nos últimos dias de permanência no Pelundo, quando li em ordem de serviço um louvor dado pelo Comandante ao Anacleto. Apenas e só isto me deixou por momentos triste.

Outro caso um pouco semelhante aconteceu com o Furriel Miliciano e Vagomestre Martins.

O Martins, vinte anos após o nosso regresso da Guiné, aquando o nosso primeiro encontro vinte anos depois, ficou sendo um dos meus melhores amigos, enaltecendo para todos os outros as minhas qualidades como homem e como Enfermeiro que tinha sido para todos no Batalhão e não só.

Como no começo desta descrição narrativa da minha passagem pela Guiné em tempos de guerra, fora o pessoal de saúde que me acompanhava e que comecei a conhecê-los no navio Niassa, o Martins foi dos Furriéis Milicianos que primeiramente comecei a conhecer porque ficamos ambos a dormir no Quartel Seiscentos em Bissau juntamente com mais outros dois (um Segundo Sargento e um Furriel Miliciano que se identificou como meu colega de profissão) no mesmo quarto.

Cedo verifiquei quão jogador e ambicioso era este Vagomestre. Com frequência se gabava dos negócios que fazia e que lhe deixavam margens de lucros para ele, principalmente, na aquisição de frutas para as nossas refeições. Já no Pelundo, passados vários meses da nossa estadia nesta povoação, os Soldados traziam-me queixas sobre a qualidade e quantidade da alimentação que o Martins lhes fornecia. O meu Maqueiro Anacleto diariamente me fazia queixas sobre a alimentação no Quartel. Também já tinham passados uns meses depois do caso que tive com ele, atrás descrito, tendo-se tornado um colaborador nato disposto a fazer tudo o que lhe pedisse.

Por esta altura, o Vagomestre Martins adoeceu com paludismo. Muito febril e queixoso, entrou tremendo como varas verdes porta dentro do Posto Médico dizendo: 
- Figuinha tenho medo de vir a morrer. Ó minha mãezinha que já não te volto a ver! 

Pedi para lhe verificarem a temperatura ao mesmo tempo que lhe ia dizendo que de tão patife que ele era para a barriga dos Soldados, não seria desta que morreria. Perguntei aos outros Maqueiros e a um outro Soldado que lá se encontrava se era verdade o que à boca cheia se dizia no Quartel que o Vagomestre estava a roubar à barriga dos Soldados. Em coro foram dizendo que sim, embora o Martins fosse dizendo que era mentira, gemendo e tremendo devido ao seu estado febril.

Mandei sair o estranho ao Serviço de Saúde e mandei preparar uma injeção para lhe ser aplicada. Ao mesmo tempo disse ao Anacleto que fizesse o tratamento ao Furriel de acordo com a maneira como ele os alimentava. O Martins rogava para ser eu a dar-lhe a injeção ao que eu me recusei. Dei então ordem para lhe espetarem a agulha numa das nádegas e que aguentassem a introdução do líquido para o curar que se encontrava já na seringa para injetar na sua nádega, até quando eu o ordenasse. 

Entretanto fui dizendo ao Martins que estava merecendo aquela forma de ser tratado para que nunca mais voltasse a alimentar mal os nossos Soldados. O Martins sofrendo esta humilhação, começou logo a ameaçar-me de morte, caso ele não viesse a morrer primeiro do paludismo que naquele momento sofria. Não lhe dei resposta e, passados mais de dez minutos de ter a agulha espetada na nádega, ordenei que acabassem com o tratamento e passei-lhe dispensa de trabalho durante seis dias. Praguejando lá foi lentamente para a cama que se situava no mesmo abrigo onde eu também dormia.

Sempre que eu entrava no abrigo para descansar,  ele me fazia ameaças mas sem dizer das razões perante os outros Furriéis que lá dormiam. Gozavam era com ele por estar sempre com queixinhas.

Logo que lhe passou o estado febril, ia eu depois do almoço tentar descansar um pouco no nosso abrigo quando me aproximei da entrada deste que, tal como os outros abrigos não possuía porta de entrada, o Martins barrou-me a entrada, ao mesmo tempo apontando o cano da G3 ao meu peito. Enfrentei-o olhos nos olhos, ao mesmo tempo lhe ia dizendo que de tão cobarde que ele era, não teria coragem para me dar um tiro. Desviou-se e eu entrei para descansar um pouco na minha cama.

O Martins tal com a maioria dos Furriéis Milicianos do Batalhão, raramente saíam do arame farpado a não ser em serviço. À noite, então nem pensar. Preferiam ficar a jogar às cartas e a beber cerveja. Tudo faziam para não se misturar com a população. Dado eu ter um comportamento diferente, à surdina chamavam-me – Preto Branco! 

Estes nunca viram com bons olhos a minha maneira de proceder, mas que, talvez sem o pensarem, os ajudei a sobreviver durante aquele tempo. Muitos anos passados alguém bem alto disse a alguns deles que, de certo modo, saíram vivos do Pelundo devido à minha atuação junto da população.

Em 209 ou 2010, num dos nossos convívios, neste caso na Cidade da Guarda, o Martins convidou-me para lhe fazer companhia mais à esposa, ao jantar num dos restaurantes da Cidade que ele bem conhecia. Enquanto esperávamos pela refeição, resolveu contar à esposa, em modo de queixa, o que eu lhe havia feito na Guiné. Ela, incrédula, olhou para mim, perguntando-me se tinha sido verdade. Respondi-lhe que sim, mas que o marido lhe contasse das razões porque assim procedi. Voltou a negar aquelas razões, mas a esposa logo se calou acabando assim o tema. 

Nunca mais se falou do assunto, transmitindo-me sim uma grande amizade. Dei-lhe uma grande lição. Acrescento que por natureza, e porque um irmão meu em 1960 como Soldado veio para esta terra, me havia contado das privações alimentares e não só, que por cá tiveram. Não consegui durante toda a minha comissão aceitar e calar qualquer mau trato injustificado que este ou aquele Soldado sofresse.

Acontecia também que Soldados, com maus hábitos de jogo da batota, escreviam para a família dando notícias falsas com o objetivo de, com a lamúria, receberem pelo correio compensações para colmatarem o perdido no jogo. Tivemos pelo menos um caso destes na CCS. Tratou-se de um Soldado Condutor da região do Porto, já casado e muito sabido. Este era também vocalista do conjunto musical existente no Batalhão.

Pelo que me foi dado saber, por várias vezes perdia no jogo grande parte do vencimento, mal o acabava de receber. Escrevia então para a mãe e para a esposa pedindo-lhes dinheiro. Num dos casos, esqueceu-se de fechar o aerograma ficando este aberto em cima da sua cama. Um colega seu deitou-lhe os olhos e ficou perplexo com o conteúdo do texto. Nele relatava que se alimentava muito mal porque, além da comida ser escassa, era de má qualidade e, como tal, tinha que gastar o dinheiro do vencimento no bar para se alimentar melhor. Que quase todos os dias o Quartel era atacado, e que, mesmo naquele momento, teve que se ir refugiar numa vala com as balas a passarem-lhe por cima da cabeça! Esta descoberta deu azo a um gozo enorme que os colegas lhe fizeram, mas que pouco se importou. Era um Soldado com muita lábia!

Tive também um caso com ele relacionado com a saúde que por ser muito ridículo não o relatarei.

Enquanto estive fisicamente no Pelundo, só por uma vez e numa noite que estive de serviço ao Quartel, houve uma troca de tiros durante cerca de pouco mais de trinta minutos. Seriam cerca das dez horas da noite quando eu, encontrando-me no Posto Médico, comecei a ouvir troca de tiros. Como estava de Sargento de dia ao Quartel, procurei logo saber o que se estava a passar.

Apenas tinham passado poucos minutos, quando vejo chegar pela rua e estrada principal os militares que nessa noite tinham ido para o baile. De entre eles, o Médico que, dado ser de corpo gorducho, chegou deitando os bofes pela boca, juntamente com dois dos Maqueiros da minha equipa. Eu só não me encontrei nesta situação porque como já descrevi, encontrava-me de serviço e adoentado.

No Quartel apagaram-se as luzes interiores restando os holofotes dirigidos para fora do arame farpado. Passados poucos minutos tudo acalmou. Saiu logo um pelotão da Companhia Operacional para se inteirar dos acontecimentos mas, passadas cerca de duas horas, chegaram sem contactos com o inimigo. 

Soube no dia seguinte, que perto dali tinha passado gente graúda do PAIGC, então enviaram uns poucos para junto da Aldeia dar uns tiros para ocupar a tropa no Quartel, já que era hábito, a Companhia Operacional ir diariamente patrulhar a zona perto da povoação. Nada encontraram de anormal.

Na estrada que ligava Teixeira Pinto (hoje Canchungo) passando pelo Pelundo e Có, até ao cais de João Landim, no Rio Mansoa, muitas emboscadas foram feitas pelo inimigo. Recordo que os primeiros feridos de guerra que vi e tratei, foram paraquedistas emboscados na chamada “curva do Dimple”, como era por mim conhecida nesta estrada. Outras companhias aí sofreram emboscadas. Devo referir aqui que, do meu Batalhão e durante toda a comissão, e desde que eu estive por aquelas bandas, nenhuma escolta nossa foi emboscada. Eu, por diversas vezes, fiz aquele percurso sem que tivesse contactos com o inimigo. Por norma não levava qualquer arma comigo.

Todo este percurso até ao Rio Mansoa era de terra batida na altura que eu fui para o Pelundo. O nosso pelotão de Sapadores, diariamente inspecionava aquela via. Porém, pouco tempo depois, toda ela foi alcatroada e as suas margens com mato cortado até uma distância que dificultasse ao inimigo emboscadas próximas do alcatrão.

Em Bissau e na Direção de Saúde, interrogavam-se admirados por as nossas escoltas não sofrerem emboscadas. Eu meio a sério ou brincando um pouco, dizia-lhes que por certo se devia ao modo como viam os seus familiares serem bem tratados por mim. Certo é que o meu colega de profissão civil e chefe da Granja Agrícola de Teixeira Pinto, familiar ainda de Amílcar Cabral, procurava sempre ir tratar de assuntos a Bissau quando eu também lhe fazia chegar informação do dia que eu pensava ir. Muitas vezes lhe perguntei da razão da sua escolha sendo ele natural da Guiné, trabalhador e chefe duma Granja local e, ainda por demais, familiar do Chefe da Guerrilha. Sempre teve resposta pronta. As balas não escolhem quando são disparadas e sei que a escolta onde tu vais não será atacada. Felizmente assim aconteceu durante todas as viagens que tive que fazer durante a comissão.

(Continua)

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Nota do editor

Poste anterior de 24 DE MAIO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23288: "A Minha Passagem pela Guiné-Bissau em Tempo de Guerra" (António Sebastião Figuinha, ex-Fur Mil Enf) Parte VI

Guiné 61/74 - P23294: Parabéns a você (2068): Jorge Narciso, ex-1.º Cabo Especialista MMA da Força Aérea Portuguesa (BA 12, 1969/70)

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Nota do editor

Último poste da série de 18 DE MAIO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23272: Parabéns a você (2067): Joaquim Fernandes Alves, ex-Fur Mil Art da CART 1659 (Gadamael e Ganturé, 1967/68)

quarta-feira, 25 de maio de 2022

Guiné 61/74 - P23293: Convívios (928): Almoço/Convívio do BCAÇ 3883, dia 4 de Junho de 2022, em Viseu


ALMOÇO/CONVÍVIO DO PESSOAL DO BCAÇ 3883

DIA 4 DE JUNHO DE 2022 EM VISEU

Boa noite.
Divulgação do Almoço/Convívio a realizar dia 04 de Junho de 2022 em Viseu.

Batalhão Caçadores 3883 - Guiné, 72/74

Subscrevo-me com toda a consideração.
Manuela Rodrigues
(filha do camarada Rodrigues)

Cumprimentos,
Rodrigues

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Nota do editor

Último poste da série de 19 DE MAIO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23276: Convívios (927): A Magnífica Tabanca da Linha reabre hoje, em Algés, no Restaurante Caravela de Ouro, ao fim de mais de dois anos de pandemia... Uma luzidia representação do Porto, de "O Bando" (incluindo 3 escritores), vem animar este 48º convívio, já histórico...

Guiné 61/74 - P23292: Blogpoesia (766): Adeus Guiné, vou-te deixar, minha missão está cumprida, por Albino Silva, ex-Soldado Maqueiro da CCS/BCAÇ 2845

1. Mensagem do nosso camarada Albino Silva, ex-Soldado Maqueiro da CCS/BCAÇ 2845 (Teixeira Pinto, 1968/70), com data de 23 de Maio de 2022, com mais um dos seus trabalhos em verso, desta vez dedicado ao sempre sonhado regresso, após sentirmos que a nossa Missão estava Cumprida:

Bom dia Carlos Vinhal, e também, bom fim de semana.
Missão Cumprida é o trabalho que envio e, para saberem que o Albino Silva anda aqui pela Tabanca pensando em todos os Tertulianos e, não esquecendo a Guiné, de vez em quando lá vai escrevendo coisas que a memória guarda.

Para todos um grande abraço, em especial aos chefes de tabanca
Albino Silva
Ex-Soldado Maqueiro da CCS/BCAÇ 2845



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Notas do editor

Último poste da série de 15 DE FEVEREIRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23000: Blogpoesia (765): "Para ti, Ó Mulher Grande", por Albino Silva, ex-Soldado Maqueiro da CCS/BCAÇ 2845

Guiné 61/74 - P23291: Efemérides (368): 25 de maio de 1972, há 50 anos: o duelo fatal na Ponta Varela, Xime, em que o apontador da HK 21, da CCAÇ 12, Braima Sané, matou em combate o Mário Mendes, comandante de bigrupo do PAIGC, pelo que foi louvado pelo CAOP2, ele, a sua equipa e o seu comandante de secção, o fur mil José Domingues, natural de Águeda (António Duarte / Luis Graça)


Excerto da História da Unidade: BART 3873 (Bambadinca, 1971/74)- Louvores: Cap III, pág. 4, jullho de 1972


1.  Mensagem, por email, de Antonio Duarte,

[António Duarte, foto à direita:

 (i) ex-fur mil da CART 3493, a companhia do BART 3873, que esteve em Mansambo, Fá Mandinga, Cobumba e Bissau, 1972-1974; 

(ii) foi transferido para a CCAC 12 (em novembro de 1972, e onde esteve em rendição individual até março de 1974; 

(iii) depois da peluda, formou-se em conomista, e trabalhou na Banca, de que está  reformado:

(iv) formador na área bancária, com larga experiência  em Angola; 

(v) tem 57 referências no nosso blogue;

(vi) é um dos históricos da Tabanca Grande, para a qual entrou em 18/2/2006, por mão do Sousa de Castro, da CART 3494] 


Data - quarta, 19/01/2022, 20:04
Assunto - O 'matador' de Mário Mendes

Boa noite, camaradas.

Propositadamente não falei em nomes, porque o blogue é público, lido na Guiné e poderia haver constrangimentos, embora eu acredite que provavelmente os envolvidos já faleceram.

O apontador da HK 21 era o Braima Sané, louvado pelo CAOP2.

Foram também louvados pelo CAOP2, para além do referido Braima, o Ansumane Baldé e o Indrissa Baldé, todos da equipa da HK21.

O furriel era o José Domingues, também ele louvado.

Estou com estes detalhes, porque consultei o livro do BART 3873, onde na página 4, cap III, figuram os louvores de julho de 72. (O Luís possui a publicação digitalizada que há longo tempo disponibilizei e que com a paciência que ele tem, publicou no nosso blogue).

O fur Domingues foi um dos que rendeu os graduados fundadores da CCAÇ 12. Tive há muitos anos a informação, sem confirmação, de que teria falecido bastante novo.

E é tudo. Deixo ao critério do Luís se o detalhe dos nomes ligados a este acontecimento deverão ser publicados no blogue.

Um abraço a todos
António Duarte

2. Comentário do editor LG:

António, meu "neto" da CCAÇ 12, querido amigo e camarada: o prometido é devido.  Faz hoje 50 anos que ocorreu esse duelo fatal, para o Mário Mendes (1943-1972), na Ponta Varela, subsector do Xime.  Ao fim de 50 anos, não há mais segredos a guardar, nomeadamente nos "arquivos públicos". Daí ter republicado, agora na íntegra, o teu email de há 4 meses atrás (*).

Volto a agradecer-te, António, o teu interesse pela história da "nossa" CCAÇ 12 (1969/74), e sobretudo s tuas preocupações com o direito à privacidade (e ao sigilo) dos nossos camaradas guineenses, incluindo o seu sentido de "honra militar" e de lealdade.

Obrigado, António, pelas informações adicionais que me deste ao telefone... Confirmo as informações, que me deste na altura sob reserva, e nomeadamente a identficação completa dos nossos camaradas que foram louvados pelo CAOP2 (Bafatá), na sequência desta operação sobre  a qual só tenhos informação oral (**). (A morte do Mário Mendes só é referida indiretamente na história do BART 3873, cap. II, 2.º fascículo, maio de 1972, pág. 16 ("de harmonia com a correspondência retirada a Mário Mendes (aniquilado pela CCAÇ 12), o IN planeava nova ação na estrada Xime-Bambadinca...").

Infelizmente, só há uma história da CCAÇ 12, e fui eu que a fiz: vai desde a formação e mobilização da CCAÇ 2590, futura CCAÇ 12, no 1.º trimestre de 1960, até fevereiro de 1971... Como sabes sabes, a CCAÇ 12 foi extinta em agosto de 1974, e nós costumamos distinguir  3 "gerações" de graduados metropolitanos, de rendição indiviual na composição orgânica desta unidade: por exemplo,  eu, da 1.ª geração (1969/71), o Victor Alves, da 2.ª  (1971/72) e tua da 3.ª (1973/74)...

Volto a repetir o que atrás ficou dito;

(...) "Guerra era guerra", diziam-nos os antigos combatentes do PAIGC quando nos encontrámos em Imberém, Gandembel, Guileje e Bissau, por ocasião do Simpósio Internacional de Guileje (1-7 de março de 2008).

É verdade, "guerra é guerra", morremos e matámos, matámo-nos uns aos outros, naquela guerra. O Mário Mendes "matou" o nosso sold cond auto Manuel da Costa Soares (em 13/1/1971, em Nhabijões), que deixou um filho por conhecer, o Rogério Soares... O Mário Mendes foi morto, um ano e quatro meses depois pelo Braima Sané, e também era casado e tinha filhos...

Os filhos têm o direito de saber como é que os pais morreram na guerra. Não para se vingarem, o que hoje já não faz sentido, mas completarem o "luto", fazerem o seu "choro"...


A paz e a reconciliação entre os povos também passa pelo doloroso processo de falarmos dos nossos mortos, e dos mortos dos nossos inimigos de ontem (, de há 50/60 anos). (...)


Insisto;

Já não há, ao fim de meio século (***), razões para não divulgarmos o nome do "matador" do Mário Mendes. O Braima Sané, infelizmente já não deve estar vivo, se é que não foi  fuzilado pelo PAIGC a seguir à independência, como outros soldados e sobretudo graduados da CCAÇ 12 que transitaram para a CCAÇ 21 (, comandada pelo tenente 'comando' graduado Abdulai Jamanca)... 

Se o Braima fosse vivo, teria hoje 80 anos... (Eu já não o conheci, era da "2.ª geração")... O mesmo se passa com restantes elementos da equipa da HK 21 que, segundo ouvi dizer, pertenciam ao 4.º Gr Comb., o Ansumane Baldé e o Indrissa Baldé.  Nessa altura, os alferes eram O Jaime (hoje e gestor, casado com a dra-Odete Cardoso),  o Sobral (hoje médico oftalmologista em Coimbra), bem como o Ferreira e o Florindo, todos de rendiçao individual. 

Quanto ao fur mil José Domingues, natural de Macinhata do Vouga, Águeda, também já terá morrido, infelizmente, segundo informação do seu conterrâneo, Paulo Santiado, que o conheceu em Bambadinca e nunca mais voltou a encontrá-lo (Vd. comentário ao poste P22924).

Façamos um minuto de silêncio à memória de todos estes homens que já nos deixaram, uns de morte natural, outros de morte violenta, e que um dia se cruzaram nas nossas vidas... Também no dia 19 de janeiro de 2022, quando fazia anos o meu filho João, me custou a adormecer com todos estes "filmes" a "rebobinarem" na minha cabeça: também eu poderia ter ficado em Nhabijões, em 13/1/1973, numa das duas minas A/C, mortíferas, que o Mário Mendes nos deixou, à porta do reordenamento... Se assim fosse, o meu filho também não teria nascido... LG
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Notas do editor:

(*) Vd.poste de 20 de janeiro de 2022 > Guiné 61/74 - P22924: (Ex)citações (400): Não, não foi o Cherno Baldé... Divulgação do nome do "matador" do Mário Mendes no dia 25 de maio de 2022, quando passarem os 50 anos do duelo fatal, na Ponta Varela... (António Duarte / Luís Graça)

)**) Vd. poste de 19 de janeiro de 2022 Guiné 61/74 - P22920: (Ex)citações (399): Ética na guerra? O caso do "matador" do comandante de bigrupo Mário Mendes (1943-1972): "Não se mata um homem de costas", disse ao António Duarte, o apontador da HK 21, do 4º Gr Comb da CCAÇ 12... (Seria o Cherno Baldé?)

(***) Último poste da série > 6 de maio de  2022 > Guiné 61/74 - P23237: Efemérides (367): Faz hoje precisamente 55 anos que um estrangeiro, o ten-cor H. Meyer, adjunto do Adido Militar Americano em Lisboa, participava, com as NT (CART 1525, Bissorã, 1966/67) na Op Beluário... Não sabemos em que circunstâncias nem a que título (Virgínio Briote)

Guiné 61/74 - P23290: Historiografia da presença portuguesa em África (318): “Por Terras da Guiné, Notas de um Antigo Missionário, Padre João Esteves Ribeiro” publicado em "Portugal Missionário, reunião havida no Colégio das Missões de Cernache do Bonjardim em 1928"; edição da Tipografia das Missões em Couto de Cucujães em 1929 (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 1 de Junho de 2021:

Queridos amigos,
A remexer papéis que têm a ver com o Conselho Ultramarino, falou-se em missionação na Guiné, assim cheguei a um inventário intitulado Portugal Missionário, uma reunião para a qual convergiram missionários de todo o Império e deu origem a depoimentos do maior interesse, e foi aí que recolhi o testemunho do Padre José Eduardo Ribeiro que nos dá um quadro da vida da Guiné na época nas suas diferentes dimensões. Ainda se vivem grandes sublevações, mas já na ordem decrescente, chegou a pacificação e institui-se a administração. O padre Ribeiro fez amizade com o tenente Graça Falcão que escapou milagrosamente a ter sido massacrado nas sublevações do Oio de 1897, ele aqui descreve ao pormenor a recuperação de Graça Falcão em condições quase milagrosas, levado meio morto para Farim onde recuperou, Graça Falcão faz parte das figuras muito controversas da Guiné, militares de bravura indiscutível que se meteram em negócios que deram para o torto.

Um abraço do
Mário



A Guiné vista por um missionário em 1928

Mário Beja Santos

Bisbilhotava numa publicação os diferentes colégios missionários que existiram em Cernache do Bonjardim, Bombarral e Tomar (hoje em Couto de Cucujães), dei pela existência de um volume intitulado Portugal Missionário, reunião havida no Colégio das Missões de Cernache do Bonjardim em 1928 e que deu edição da Tipografia das Missões em Couto de Cucujães em 1929. Foi aí que encontrei este testemunho intitulado “Por Terras da Guiné, Notas de um Antigo Missionário, Padre João Esteves Ribeiro”. Há fundadas razões para tomar nota, mesmo que abreviadamente, do que ele escreve. Sobre o solo guineense observa: “A pequena, mais riquíssima, colónia da Guiné Portuguesa, parece formada por terrenos de aluvião. Terreno silicoargiloso, havendo húmus em alguns pontos. É desprovido de calcários. Não se conhecem minérios na Guiné" (falso).

Quanto à fauna, diz que é variadíssima, refere animais ferozes como a onça, a pantera (?), o leopardo (?), a hiena, o búfalo e o elefante (diz que em vista de desaparecimento). Refere a gazela, a fritambá (antílope de porte pequeno), as cobras, os diferentes tipos de macacos. Há cavalos e burros mais pequenos dos que na Europa, o boi, a cabra, a ovelha (?) e o porco. Nos rios abundam os hipopótamos e os jacarés. É enorme a versatilidade de aves. Sobre os insetos, diz que os maiores inimigos do homem são os mosquitos e as formigas. Passando para a flora, alude a árvores de grande porte e reconhecida utilidade (cibe ou palmeira de leque, pau-ferro, pau-sangue, bissilão – uma espécie de mogno –, o incenso, a cabaceira, o poilão e o pau-carvão. Enumera árvores de fruta: laranjeira, mangueira, goiabeira, limoeiro, tangerineira, coleira…), diz haver pequenas quantidades de café e cacau, quanto às grandes culturas só o amendoim e o arroz, e observa: “A falta de capitais tem impedido o desenvolvimento da agricultura”.

Vê-se que dedicou observação à árvore étnica, fala em Baiotes, Banhuns, Felupes, Fulas, Sossos, Mandingas e Cassangas, Beafadas, Nalus, Bijagós, Balantas, Cobianas, Brames e Mancanhas, Manjacos e Papéis. Alarga-se nas referências aos Grumetes, dizendo que era nome dado aos descendentes do cruzamento dos soldados cabo-verdianos com os Papéis de Bissau e Cacheu e que na atualidade em que escreve este nome era dado a todos os indígenas que falam crioulo e andam vestidos com calças, camisa e casaca, habitando nas povoações europeias ou arredores.

No tocante à região, nada adianta que não se saiba, mas traz informações a ponderar. Os Grumetes de Cacheu são católicos. Os Grumetes de Bissau batizam os filhos e exigem enterro religioso. Os Grumetes são geralmente uns bêbados inveterados, gastam tudo quanto ganham na bebida e tabaco. E daqui passa para uma leitura das igrejas da Guiné: há três com um só padre residindo em Bissau. “O benemérito missionário Padre José Pinheiro, pároco de Bissau, está na Guiné há perto de 20 anos, deve retirar-se brevemente ficando a Guiné sem um único padre. Este estado vergonhoso constitui também um problema político porque os muçulmanos pregarão livremente a sua Guerra Santa, incutindo no espírito de todos os indígenas sentimentos de ódio e rebelião para com as autoridades portuguesas”. E depois dá-nos uma nota sobre a administração civil dizendo que a Guiné que ainda há poucos anos apenas era nossa em Bolama, e dentro das vilas de Bissau e Cacheu, e povoações de Farim, Geba e Buba, está hoje completamente ocupada e pacificada. Refere os dois concelhos e oito circunscrições em que se dividia a administração civil, observa que há em Bolama bons edifícios particulares, sendo o mais aparatoso o do Banco Nacional Ultramarino e diz que Bissau é a principal cidade da Guiné. Dá-nos ainda notas sobre o correio, o comércio, a indústria e a força militar.

O autor agradece a ajuda de informações que lhe deu o seu amigo Jaime Augusto da Graça Falcão, que fora militar brioso, que se envolveu em diferentes e polémicos processos que lhe custaram a carreira militar e contendas com a autoridade. E entende, por gratidão com o amigo Graça Falcão fazer uma memória de uma situação extrema que este militar vivera. Tudo acontecera em 1897, houvera revolta dos povos do Oio, houve necessidade de organizar uma exposição contra os sublevados e foi nomeado comandante dessa força Graça Falcão. Vale a pena extrair alguns parágrafos do testemunho deste padre missionário:
“Além da força de tropas regulares, foram incorporadas na expedição bastantes auxiliares indígenas, de raça diferente, e que ofereciam alguma esperança de fidelidade. Foi uma ilusão que nos custou bem cara. Estes auxiliares, ao primeiro embate com o inimigo, não somente recuaram cobardemente, como fugiram e até se bandearam com os revoltosos”. Seguiu-se o pânico, os que ficaram defenderam-se como leões, resistiram até serem trucidados. A notícia do desastre chegou a Farim, logo seguiu rio acima uma canhoneira, não havia notícias do comandante, passaram-se os dias, perdiam-se as esperanças de que ele tivesse sobrevivido ao combate. Quatro dias depois, porém, chega à feitoria da casa alemã Otto Schacht um mensageiro que em grande segredo mostra ao gerente da casa um papel: “Estou vivo, mandem bote Jafaná. Falcão”. O padre Ribeiro foi chamado, o gerente da feitoria e o missionário partem à procura do amigo. Entram numa região rebelada, meteram-se num pequeno bote tripulado por quatro remadores levando algumas provisões. O rio Farim que tinham de subir até Jafaná era a linha divisória do campo revoltado. Doze horas demorou a viagem até chegar a terra firme e embrenharam-se no mato. Caminharam e assim nasceu o sol. Pelas nove da manhã deram com Graça Falcão, de aspeto cadavérico, foi reanimado com marmelada e um cálice de vinho do Porto. Assim arrastaram o doente para o porto de embarque, tinham-se passado cinco dias após o desastre do Oio. Foi-se sabendo a história: Graça Falcão defendeu-se como um bravo, animando a todos até ao último momento, ferido gravemente, encobriu-se com os arbustos, os inimigos afastaram-se do campo de batalha, Graça Falcão cuidou ele próprio das feridas, arrastou-se pelo mato, fugiu dos povoados e ocultou-se com o capim sempre que pressentia alguém pelos caminhos; três dias errou à fome e a perder sangue; providencialmente as feridas não se infetaram. Uma vez no pequeno bote largaram rio abaixo e com o coração aos saltos chegaram a Farim. Este depoimento do padre missionário irá coincidir com relatos coevos de outros testemunhos.

Quem teve a paciência de ler o meu livro Os Cronistas Desconhecidos do Canal de Geba: O BNU da Guiné, recordará certamente os comentários pouco abonatórios feitos a Graça Falcão, alguém que foi um militar valoroso e de comportamento heroico que caiu nas malhas de negócios menos claros.

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Nota do editor

Último poste da série de 18 DE MAIO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23273: Historiografia da presença portuguesa em África (317): Anais do Conselho Ultramarino: Curiosidades da Guiné (4) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P23289: In Memoriam (437): Belmiro da Silva Pereira (1946-2022), natural de Peniche, morreu aos 75 anos, em 12/2/2022; foi alf mil, CCAÇ 6 (Bedanda, 1969/71); era médico reformado do SNS


Belmiro da Silva Pereira ou só Belmiro Silva Pereira (1946-2022), natural de Peniche,  morreu aos 75 anos, em 12 de fevereiro de 2022. Foi alf mil, CCAÇ 6 (Bedanda, 1969/71). Depois de passar à disponibilidade, completou a licenciatura em medicina, e integrou a carreira de medicina geral e familiar do SNS, tendo chegado a diretor do centro de saúde de Peniche. Foto: Cortesia da Agência Funerária de Peniche, 12/2/2022 (seguramente, do álbum de família).


Peniche > O 1º encontro dos bedandenses, em terras do sul... > 28/9/2013 > A tasca secreta do Belmiro > Um artista português, do tempo dos Beatles... Ao fundo, ao canto esquerdo, um dos bedandendes de 1972/73, o Joaquim Pinto Carvalho, ex-alf mil, hoje advogado, natural do Cadaval, e régulo da Tabanca do Atira-te ao Mar, Porto das Barcas, Lourinhã


Peniche > O 1º encontro dos bedandenses, em terras do sul... > 28/9/2013 > A tasca secreta do Belmiro > O "patrão" da casa, Belmiro da Silva Pereira, dando as boas vindas.


Peniche > O 1º encontro dos bedandenses, em terras do sul... > 28/9/2013 > A tasca secreta do Belmiro > Algures no promontório do Carvoeiro, onde atacámos a sardinhada... Da esquerda para a direita, o Hugo Moura Ferreira, e o Belmiro da Silva Pereira (ex-alf mil, CCAÇ 6, Bedanda, 1969/71), médico, e a alma daquele encontro na sua adorada terra, Peniche). Com o Belmiro, está o seu filho. Foi o 4º encontro dos bedandenses.


Fotos (e legendas): © Luís Graça (2013). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Lu
ís Graça & Camaradas da Guiné.]

1. Mensagem do José Carvalho, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2753 (BráBironque, Madina Fula, Saliquinhedim e Mansabá, 1970/72), nosso vizinho, amigo e camarada, médico veterinário, e agricultor, residente no Bombarral:


Data - 23/5/2022, 16h30
Assunto - Belmiro Silva Pereira

Caro Amigo Luís,

Desejo que te encontres bem.

Tomei hoje conhecimento, por informação de um familiar que reside perto de Peniche, que o Belmiro faleceu recentemente. (*)

Fui seu colega no Liceu de Leiria e, depois ao longo das nossa vidas encontrámo-nos várias vezes em Peniche, a sua terra natal, onde era adorado pela sua simpatia, popularidade e também pela competência na actividade de Médico.

Recordo o Belmiro, como um amigo irradiando alegria e boa disposição.

Embora me pareça que não fazia parte da nossa tertúlia, lembrava-me de um encontro de bedandenses, que ele organizou em sua casa (P12102) (**) e assim aqui vai mais uma triste notícia.

Um grande abraço do José Carvalho

 

2. Resposta do editor LG:

Obrigado, José, pela partilha desta dolorosa notícia de mais um camarada da Guiné que se despede da Terra da Aegria.

Conheci o Belmiro Pereira da Silva nessa altura, no convívio dos bedandenses, de 28/9/2013 ... Estou desolado.

Temos dois postes referentes a esse convívio (P12102 e P12109) (**), com fotos minhas e do Hugo Moura Ferreira. São, de resto, as únicas referências que temos no blogue ao seu nome, Não temos nenhuma foto dele em Bedanda. Gostava que ele entrasse a título póstumo para a Tabanca Grande, se a família (esposa e filho) não se opuser. Seria uma justa homenagem.

Foi um belo convívio, esse, do final do verão de 2013, de que ainda hoje guardo gratas memórias...

Bom, esse 4.º encontro do pessoal que passou por Bedanda, realizou-se Peniche, o 1.º em terras do sul,  sob organização hopsitaleira e calorosa do Belimiro da Silva Pereira, que só então vim a saber que tinha sido alf mil da CCAÇ 6, em 1969/71. 

Esse convívio, num sítio secreto, junto ao Cabo Carvoeiro, juntou três dezenas e meia de bedandenses, familiares e amigos.

Vim a saber, em conversa com ele, que já estava no 2.º ano de medicina, creio que em Coimbra, quando foi chamado para a tropa. Na altura não deu as habilitações académicas corretas, pelo que foi parar ao contingente geral. Mas alguém (se não erro, o capitão) descobriu a marosca e o nosso Belmiro lá foi, contrariado, para a EPI, para o COM, em Mafra. 

Quis o azar que, depois, fosse parar com os quatro costados ao então tão temido TO da Guiné. De rendição individual, como os demais graduados e especialistas metropolitanos das companhias africanas, lá foi fazer a guerra em Bedanda, na CCAÇ 6.

Quem foi do seu tempo, ou que ainda o apanhou em Bedanda foi o nosso grã-tabanqueiro João Martins, ex-alf mil art, comandante de um Pel Art. Dos bedandenses do blogue, ou meus conhecidos, estiveram presentes, o Hugo Moura Ferreira, o Rui Santos e João Martins, eu, a Alice, o Joaquim Pinto Carvalho  mais a esposa, Maria do Céu, e ainda o Belarmino Sardinha e a esposa.

O grande ausente, por razões de saúde, foi o nosso querido (e já saudoso) Tony Teixeira, de Espinho.  

Eu já conhecia o Belmiro de Peniche, meu vizinho portanto. Tínhamos amigos comuns na Lourinhã (a quem dei explicações quando putos ...),  e sei que estudara em Leiria com amigos meus do tempo da escola primária. Estava longe de o imaginar na Guiné na mesma altura que eu, em 1969/71, e também numa companhia africana: ele na CCAÇ 6, eu na CCAÇ 12, ele bedandense, eu bambadinquense... Mas uma vez concluí, nesse já longínquo dia 28 de setembro de 2013,  que o Mundo era Pequeno e que a Nossa Tabanca era... Grande.

O Belmiro, como diz o José Carvalho,  o nosso "barão do K3", era de facto uma figura muito popular em Peniche, como homem e depois como médico, mas confesso que não era pessoa das minhas relações pessoais. Creio que estivemos juntos em encontros (profissionais) dos médicos de clínica geral e familiar, nos anos 80/90. Ele foi diretor do centro de saúde de Peniche. Mas não voltámos mais a encontrarmo-nos depois de 2013. Sei que o pai era também uma figura popular na sua terra, conhecido como o Chico Futuro, dono de um traineira que andava na pesca da sardinha, segundo imformação do nosso camarada Joaquim Jorge, de Ferrel.

É mais que justo este IN Memoriam no nosso blogue (*). Descobri entretanto, uma notícia da agência funerária local, no Facebook, das poucas referências que encontrei: afinal, o nosso camarada Belmiro da Silva Pereira já fora a enterrar há 3 meses, em 14 de fevereiro de 2022. 

Segundo a sua página no Facebook, nasceu em 22 de setembro de 1946.

Já dei conhecimento à malta de Bedanda e a outros que o conheceram, da Lourinhã e de Peniche. E pedi ao Joaquim Pinto Carvalho, ao Rui Santos e ao Hugo Moura Ferreira para darem a triste notícia aos demais bedandenses, de quem não temos o endereço de email. As nossas condolências, embora tardias, à esposa, ao filho e demais amigos e camaradas que lhe eram mais próximos. LG


Guiné > Região de Tombali > Bedanda > 1969 > Álbum fotográfico do João Martins > Foto nº 125/199 > Casa do chefe de posto


Foto (e legenda): © João José Alves Martins (2012)  Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

terça-feira, 24 de maio de 2022

Guiné 61/74 - P23288: "A Minha Passagem pela Guiné-Bissau em Tempo de Guerra" (António Sebastião Figuinha, ex-Fur Mil Enf) Parte VI

1. Continuação da publicação do texto de memórias "A Minha Passagem pela Guiné-Bissau em Tempo de Guerra", de António Figuinha, ex-Fur Mil Enfermeiro da CCS/BCAÇ 2884 (BissauBuba e Pelundo, 1969/71)


A MINHA PASSAGEM PELA GUINÉ-BISSAU EM TEMPO DE GUERRA

António Sebastião Figuinha
Ex-Furriel Miliciano Enfermeiro
CCS/BCAÇ 2884
1969/1970/1971
Parte VI

Vinte anos depois do meu regresso, aquando do primeiro encontro do Batalhão para um almoço de convívio na cidade de Évora, ao chegarmos ao restaurante (eu e minha mulher e o meu amigo Tunes), mal nos tínhamos sentado, quando para espanto meu, apareceu o Major e o Tenente Coronel, os quais se foram sentar mesmo ao meu lado direito. 

Senti que o ambiente iria a ficar pesado já que, sentado na mesma mesa e, à minha frente, encontrava-se o Alferes Tunes que o Major tinha enviado para prisão durante dez dias. Derivado a este castigo, o Tunes ficou na Guiné mais tempo.

Se por um lado se ouviu um coro de parte dos companheiros militares que com alguma ironia diziam, “como eles eram amigos!”, eu e o Alferes perdemos parte do apetite para o almoço. Mais, a certo momento, o Major virou-se para a minha mulher,  dizendo-lhe que eu tinha as mulheres que queria no Pelundo. Continuou dizendo que, no caso dele, se deslocava a Bissau quando necessitasse. Como eu previamente tive o cuidado de prevenir a minha mulher para possíveis provocações do Major, ela respondeu-lhe:
- Ainda bem que fico a saber que o meu marido era assim tão querido pelas mulheres da aldeia onde tinha estado! 

Calou-se, não fazendo mais provocações. Pelo meu lado, não lhe alimentei conversas. Este Oficial tentou desde o primeiro dia que nos conhecemos fazer-me a vida negra.

Quanto ao Comandante do Batalhão 2884, Romão Loureiro, posso começar por o descrever como uma personagem austera com os mais fracos, mas demasiado medroso para com os seus superiores e, neste caso, com o Comandante-Chefe General António Spínola.

Com a maior das facilidades levantava a mão para os soldados e não só! Era conhecido entre nós pelo nome de “Cavalo Branco”. Tudo fez durante a comissão para cair nas boas graças do General.

Como fui mobilizado apenas dez dias antes do embarque para a Guiné e como fiquei em Bissau de Maio até fins de Setembro de 1969, interrompido este tempo com as minhas férias no Continente em Outubro do mesmo ano e intercalando também o tempo que estive em Buba, só já no Pelundo tive a oportunidade de o começar a conhecer.

Como a minha missão estava destinada à ação psicológica com a população, cedo comecei a conviver com a mesma.

Esta minha atitude nunca foi do agrado dele e piorou com as minhas saídas noturnas, primeiro para conviver com pequenos grupos na palhota e mais tarde nos bailaricos quase diários numa espécie de discoteca. 

Nos convívios de grupo, quase maioritário de jovens raparigas, encontrava-se sempre aquela que desde o primeiro dia tomou conta da minha roupa. Pretendi deste modo começar a captar o modo de vida deles, captar pequenas frases linguísticas e, principalmente, ganhar a sua confiança. Não me foi fácil estar só muitas vezes até à meia-noite, hora a que regressava ao Quartel para admiração do soldado que se encontrava à porta de armas. 

Quanto aos bailaricos, foram um meio de convívio dos militares mais os jovens da aldeia durante toda a comissão sem que alguma vez desse origem a confusões. Combati deste modo algum stresse que o ambiente de guerra nos colocava na mente.

Cedo começaram as ameaças do Comandante sobre a minha forma de lidar com os militares e com a população. Num desses dias, estando eu numa cavaqueira com um filho do Régulo Vicente, que por sinal fazia parte do grupo de Milícias que colaboravam com as nossas tropas, durante a nossa conversa coloquei a certa altura uma das minhas mãos no ombro deste. 

Como o local onde isto se passou ficava em frente da Messe de Oficiais e, nesse mesmo momento, o Comandante lá se encontrava a ler o jornal, reparou no meu gesto de colocar a minha mão no ombro daquele nativo. Logo que este Milícia se ausentou, o Comandante chamou-me dizendo-me ao mesmo tempo que na próxima me castigaria com trinta dias de prisão acaso me visse repetir aquele meu gesto. Prontamente lhe respondi que eu também participaria do Comandante junto do General Spínola, já que, estando eu incumbido de executar a ação psicológica junto das populações, o meu Comandante estava a contrariar as ordens do General. Calou-se de imediato.

Poucos dias depois deste acontecimento, durante uma manhã, um irmãozito da jovem Judite foi ter comigo ao Quartel levando-me uma bela manga. Para azar meu, dirigi-me à entrada da Messe de Oficiais onde o Cabo responsável por esta encontrava-se em conversa com o Comandante. Depois de acabar o diálogo entre ambos, solicitei ao Cabo que por favor colocasse no frigorífico a manga para eu comer ao almoço. 

Espantado fiquei ao ver a rapidez com que o Comandante se levantou pedindo ao Cabo Cozinheiro que lhe desse a manga e trouxesse para a mesa dois pratos e respetivos talheres para que ele e eu a saboreássemos naquele momento. Mantive-me sereno em frente dele, mas à porta da Messe ordenei ao cabo Cozinheiro que não queria talheres nem prato para mim porque não me iria sentar para comer a manga. 

Mal o Cozinheiro virou costas, perguntei ao Comandante se não gostando de negros, ia comer fruta dada por eles! Continuei dizendo-lhe que lhe fizesse bom proveito porque de onde tinha vindo aquela manga voltariam a trazer-me mais. Reação do Comandante: 
- Assim já não me vai saber tão bem! 

Virei costas sem lhe alimentar mais diálogo.

Durante a ano de 1970 (não me recordo já em que mês), foram colocadas tarjas por cima e na parte frontal da parede das messes de Sargentos e Oficiais com referências aos anos que se tinham passado desde que os Portugueses haviam chegado à Guiné, e ao desenvolvimento desde então daquela Província Ultramarina.

Ao passar junto das mesmas não aguentei o meu desacordo e, bem alto, disse sobre os anos de atraso mental daquela gente da Província. O Comandante, que naquele momento se encontrava sentado na messe de Oficiais e bem perto da porta de entrada desta, ao ouvir o que eu acabava de dizer, chamou-me aos gritos dizendo que me iria dar trinta dias de prisão. Prontamente preguntei-lhe que desenvolvimento tinha sido feito, já que era eu a ter que aprender o idioma deles para os compreender sempre que, e principalmente os mais velhos, se dirigiam ao Posto Médico? Calou-se engolindo em seco e a custo. Porém, foi-me dizendo que não perderia pela próxima já que não me perdoaria.

Certa manhã chamou-me ao seu gabinete juntamente com outro Furriel Miliciano natural dos Açores, recentemente chegado ao Pelundo em rendição individual. Deu-nos um grande raspanete, principalmente a mim, dizendo-me que estava a desencaminhar o Periquito (nome dado aos militares recém chegados à Guiné) pois, mal ele tinha acabado de chegar, já eu o estava a desencaminhar levando-o aos bailes na Aldeia durante a noite e após o jantar e, ao mesmo tempo, levantou a sua mão, desferiu uma chapada na cara do açoriano. Encaminhou-se de seguida para mim a fim de me fazer o mesmo. Levantei a minha voz dizendo-lhe que pensasse bem no que ia a fazer. Recolheu a mão e, mais uma vez, lançou-me ameaças. 

Por esta altura eu já tinha o Comandante por cima dos meus cabelos até porque numa das tarde passadas anteriormente havia simulado abrir uma das cartas enviadas pela minha namorada.

Sempre que havia falta de algum medicamento específico para tratar uma doença, tanto o Médico como eu enviávamos para os Serviços de Saúde de Bissau uma requisição individual daquele medicamento num pequeno pedaço de papel, o qual teria que ser assinado pelo Médico ou por mim, levando por último a assinatura do Comandante.

Aconteceu que no dia seguinte em que o Comandante Romão Loureiro tinha tentado dar-me uma chapada na cara, tive necessidade de voltar ao seu gabinete levando uma requisição de medicamentos para assinar. Ainda revoltado comigo sobre os acontecimentos do dia anterior, disse-me de pronto que não assinava nada já que eu não incluía na requisição um medicamento que ele habitualmente tomava. 

Respondi-lhe dizendo que não me tinha feito qualquer pedido e, como tal, eu não o tinha incluído na lista. Disse-lhe ainda que, como Comandante do Batalhão, recebia um bom ordenado para poder comprar aquele medicamente numa Farmácia em Teixeira Pinto e disse-lhe ainda que, recusando-se a assinar a requisição que tinha à sua frente, a mesma seguiria para Bissau apenas com a minha assinatura, acompanhada de uma justificação minha acerca dos motivos da falta da assinatura do Comandante. Se estava irritado comigo ainda mais ficou e, bruscamente, pediu-me a merda do papel (palavras textuais dele) para assinar.

Por momentos perdi a cabeça e, com o meu sistema nervoso excessivamente alterado perguntei-lhe se sabia qual a arma que eu possuía para minha segurança. Respondeu-me que deveria ter uma G3 ou uma pistola qualquer. Disse-lhe então que apenas tinha uma granada defensiva que por vezes levava comigo escondida quando ia para o bailarico à noite e, de seguida, fui-lhe dizendo que não quisesse que a mesma fosse utilizada naquele gabinete, pendurando-lhe os tomates ao teto. Rapidamente saí daquele espaço não esperando por qualquer reação dele.

Passei de seguida o resto do dia praticamente fora do Quartel. Chegou a noite e, ao passar em frente da Messe de Oficiais, dirigindo-me à minha para jantar, senti a voz do Comandante chamar-me. Temi o que dali poderia vir. Encontrava-se a mesa já repleta de Oficiais esperando pelo jantar. O Comandante pediu-me para me aproximar dele e ao centro da mesa. Então, começou por me fazer várias perguntas: ”Se eu me alimentava bem, se dormia bem, já que eu não poderia ficar doente pois que iria fazer muita falta aos militares ali estacionados e à população”. 
– Já prensaste bem se tu ficares doente o que nos pode acontecer? – Alertou-me ele, e ao mesmo tempo fez-me baixar o tronco e, passando-me a sua mão no meu rosto, foi dizendo que eu estava muito magro e que tinha de alimentar-me melhor. Agradeci-lhe os cuidados que tinha para comigo e saí dirigindo-me à Messe de Sargentos para jantar.

Mal acabei de jantar fui para o Posto Médico. Estava eu meditando no que tinha acontecido naquele dia quando apareceu o Alferes Francisco da Companhia 86, natural do Algarve, que, eufórico, quis saber o que se teria passado entre mim e o Comandante para ele ter tido toda aquela conversa pública comigo e ter-me passado a mão pelo meu rosto. De seguida, com um ar de malandro que tinha, foi-me perguntando se o Coronel tinha dado em “Paneleiro”.

Respondi-lhe que não era o momento certo para lhe contar qualquer acontecimento, mas que talvez um dia mais tarde eu lhe poderia contar. Até hoje não o voltei a encontrar, mas este caso, já o desabafei numa página sobre os antigos Combatentes da Guiné. Emagreci uns bons quilos naquele dia. Fiquei com o meu sistema nervoso tremendamente alterado. Não sei se foi por vingança, mas passados uns tempos enviou-me para uma nossa Companhia operacional que se encontrava na povoação de Có.

O meu dia-a-dia continuou com as preocupações na saúde não só dos militares como da população e, sobre esta, aumentando o meu convívio diário ao ponto de uma das muitas mães da Aldeia que me foram conhecendo e gostavam da maneira como eu as tratava e aos seus familiares, pediu-me encarecidamente que quando eu regressasse ao Continente entregar-me-ia uma das suas pequenitas para que eu lhe pudesse dar uma educação que ela mãe não tinha capacidade para lhe dar. 

Era uma família Fula de sentimentos muito afetivos para todos nós. Respondi-lhe que com muita mágoa minha não poderia satisfazer o seu desejo porque, sendo oriundo de uma família muito pobre, não possuía recursos financeiros para satisfazer os seus desejos, além de ser para mim uma grande responsabilidade. Tenho comigo ainda hoje uma fotografia onde aquela pequenita se encontra pendurada ao meu pescoço. Mal me via, corria logo para os meus braços.

Alguns casos mais marcantes da minha estadia irei relatar, resumidamente, de seguida.

(Continua)

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Nota do editor

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