Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
terça-feira, 20 de dezembro de 2022
Guiné 61/74 - P23898: Boas festas 2022/2023 (6): As Mães e os anos da guerra... Feliz Natal, queridos companheiros (Tony Borié, ex-1.º Cabo Op Cripto)
1. Mensagem do nosso camarada Tony Borié (ex-1.º Cabo Operador Cripto do CMD AGR 16, Mansoa, 1964/66), com data de 30 de Novembro de 2022:
As Mães e os anos de 1964/6!
Já passaram mais de cinco décadas, quase seis, no entanto, nenhum de nós companheiros, pode esquecer a jornada de ter sido combatente na Guerra Colonial Portuguesa em África, na então província colonial da Guiné Portuguesa, cuja guerra, principalmente nesta região, foi denominada "o Vietname de Portugal”. Era uma guerra terreste de guerrilha mortífera.
E agora, quase a chegar à época de Natal, constantemente nos vem ao pensamento os amigos de infância e a família de então, que deixámos na Europa, onde na escola da vila o professor nos repetia constantemente a história dos reis e rainhas e os tais “descobrimentos”, onde o professor se levantava, tal qual um actor representando, fazia desenhos de caravelas no quadro negro, declamando frazes mais ou menos: “Portugal descobriu novos mundos, enfrentando tempestades e fúrias dos dragões de mares distantes, subjugando outros povos e outras civilizações ao Reino de Portugal e dos Algarves”.
E nós ficávamos excitados com estas palavras sem todavia compreender o que eram os “novos mundos”, os “dragões” ou “mares distantes”, e claro, encobrindo sempre tudo o que nos pudesse dar o conhecimento do que existia lá por esses “novos mundos” ou essas tais civilizações que eram subjugadas ao reino de Portugal e dos Algarves.
Em outras palavras, era mais ou menos como “colocar a pele de ovelha ao sistema colonialista em que se vivia, no maldito e feroz lobo que lá morava dentro”. E mais, constantemente nos diziam que a nação era a nossa mãe. Infelizmente, hoje compreendemos que era uma enorme e horrorosa mentira.
A nossa mãe era uma personagem linda, carinhosa e bondosa, (aliás todas as mães para nós filhos, são lindas, carinhosas e bondosas), e a nossa mãe ILDA, era uma sofredora, contando-nos muitas vezes que nunca tinha sido menina, pois nessa idade já era uma mulher de tranças feitas ao domingo de manhã antes da missa, de saia de borel cardado pelas mãos da sua mãe, nossa avó, braços cansados de trabalhar na lavoura e de rodilha na cabeça para aguentar o peso dos molhos de erva que carregava para alimentar o gado, trabalhando de sol a sol e esperando a sorte de alguém a levar para a vila, “servir para casa de gente de posses”, pois seria menos uma malga de caldo para encher e uns tostões que chegavam a casa no final de cada mês, para ajudar no sustento dos seus pais, nossos avós.
E quando mais tarde, já avó, em conversa com os vizinhos, quase chorando dizia:
- “Tive quatro filhos e só um é que foi à guerra, mas felizmente voltou vivo para casa”.
Companheiros, somos sobreviventes de uma guerra horrorosa, que anos depois se verificou que era injusta, que não desejamos, em nenhuma circunstância, se volte a repetir, mas não resistimos em mencionar algumas passagens de relatos de textos anteriores, onde falamos da mulher mãe que nesta época de Natal mais recordamos.
Portanto cá vai:
“Na aldeia havia somente uma mulher, magra, já de uma certa idade, nua da cintura para cima, com algumas argolas em volta do pescoço, servindo de enfeite, talvez. Estava sentada, ao lado de um balaio de arroz com casca, com as mãos ao lado da cara, falando aflita, numa linguagem incompreensível, e de vez em quando, tirava as mãos da cara, fazia gestos para a frente, ao mesmo tempo que balançava o corpo para a frente e para trás. Na sua frente, estavam duas crianças, também magras e nuas. Estas três pessoas, eram no momento, os habitantes da aldeia.
Os soldados africanos, chamados pelo alferes, para traduzirem as palavras da mulher, diziam:
- Ela se lastima, por os militares lhe terem morto os seus dois filhos, e diz para se irem embora, que aqui não há mais ninguém. Também diz que tem quatro filhas, que desapareceram um certo dia pela madrugada, e que as visitam de vez em quando, pois neste momento eram guerrilheiras, transportadoras de material de guerra”.
E agora, outro relato tirado de outro texto:
“Em Portugal visitámos a família deste militar, por diversas vezes. Era de uma aldeia da Serra da Estrela, tinha uma irmã e um irmão, ambos casados. A mãe andava sempre vestida de preto e dizia:
- Ainda não fui, mas não tarda muito tempo. Sou viúva duas vezes, do meu Joaquim, que Deus lhe guarde a alma em descanso, e do meu António, que era a cara do pai, quando nasceu, e que foi dar o corpo às balas, e que morreu na guerra, lá na África. E mostrava sempre o farrapo do camuflado ensanguentado, que o Cifra lhe mandou, e a fotografia do António, que beijava e encostava ao coração”.
Tenham um bom tempo neste mês de Natal, todos vós e vossas famílias, queridos companheiros e, já agora, que o ano que vem nos traga saúde e algum carinho, pelo menos da família.
Tony Borie, Dezembro de 2022.
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Nota do editor
Último poste da série de 18 DE DEZEMBRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23889: Boas festas 2022/2023 (5): Mensagens dos nossos camaradas e amigos: José Firmino; Ernestino Caniço; José Carlos Mussá Biai e Luís Fonseca
Guiné 61/74 - P23897: Parabéns a você (2127): José Botelho Colaço, ex-Soldado TRMS da CCAÇ 557 (Cachil e Bafatá, 1963/65) e José Casimiro Carvalho, ex-Fur Mil Op Esp da CCAV 8350/72 e CCAÇ 11 (Guileje, Gadamael e Paunca, 1972/74)
Nota do editor
Último poste da série de 19 de Dezembro de 2022 > Guiné 61/74 - P23893: Parabéns a você (2126): Humberto Reis, ex-Fur Mil Op Esp da CCAÇ 2590/CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71)
segunda-feira, 19 de dezembro de 2022
Guiné 61/74 - P23896: E as nossas palmas vão para... (21): o Humberto Reis, que hoje faz anos e é um dos nossos grandes fotógrafos, para além de colaborador permanente e "cartógrafo-mor" do nosso blogue
Não aparecço na foto mas participei na Op Navalha Polida, em 2 e 3 de janeiro de 1970, integrado desta vez no 4.º Gr Combate. Como me dizia amavelmente o meu capitão Brito - era um gentleman! - , eu era o peão de nicas, o tapa-buracas, o suplente, o que substituía os camaradas furriéis doentes, convalescentes, desenfiados ou em férias... Não sei por que carga de água é que os psicotécnicos me disseram que eu era bom para apontador de armas pesadas de infantaria. Como a CCAÇ 12 era uma companhia de intervenção, não tendo armas pesadas, eu tornei-me um polivalente, um pau para toda a obra ...
Foto da autoria de Humberto Reis (ex-fur mil op esp, CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71). Tem sido imensa e despudoradamente "pirateada" por aí, nas redes sociais, em livros, etc., sem referência ao autor e ao nosso blogue.
Guiné > Zona leste > Rwgião de Bafatá > Setor L1 > Estrada Bambadinca-Xime > Ponte do Rio Udunduma > Destacamento da CCAÇ 12 > 2º Grupo de Combate > 1970 > O fur mil op esp Humberto Reis, à entrada do abrigo (?)...
(...) "Com este destacamento passou-se um episódio que diz bem do carácter que presidia à união de todos os operacionais (operacionais eram aqueles que iam para o mato e as sentiram assobiar e não os que viviam no bem bom dentro dos arames farpados e que nunca sentiram o medo de levar um tiro).
"Um domingo à noite estávamos a jantar na messe [, em Bambadinca], nesse dia calhou-me estar dentro do arame, e de repente começámos a ouvir rebentamentos para os lados da ponte. Pensámos que era o destacamento que estava a embrulhar e automaticamente nos levantámos (eu e mais alguns até estávamos vestidos à civil), fomos a correr aos respectivos quartos buscar as armas e quando chegámos à parada já lá estavam alguns Unimog com os respectivos condutores à espera (ninguém lhes tinha dito nada mas a ideia foi a mesma - é a malta da ponte a embrulhar, temos de os ir socorrer ). Até um dos morteiros 81 levámos e aí vai o fur mil do Pel Mort com uma esquadra, o Lopes que era natural de Angola (tão bem organizada que era a nossa administração militar, que o colocaram na Guiné!).
"Felizmente, quando chegámos à ponte, verificámos que não era aí, mas sim 2 km mais à frente, na tabanca de Amedalai, pelo que seguimos até lá. Escusado será dizer que quando o IN notou que chegaram reforços fechou a mala e foi embora" (...)
Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Setor L1 > CCAÇ 12 (1969/71> c. 1970 > 2º Grupo de Combate > Estrada Bambadinca-Xime > Destacamento da Ponte do Rio UdundumaO Tony (Levezinho) e o Humberto (Reis) sentados na "manjedoura"... Era ali, protegidos da canícula, por uma chapa de zinco, à volta de uma tosca mesa de madeira, entre duas árvores, com vista sobre o espelho de água do rio Udunduma, afluente do Geba..., era ali que tomavámos em conjunto as nossas refeições, escrevíamos as nossas cartas e aerogramas, jogávamos à lerpa, bebíamos um copo, matávamos o tédio e os mosquitos...
Na imagem, o Tony (Levezinho), à esquerda, segurando uma granada de LGFog de 3.7. À direita, o Humberto Reis, o nosso "ranger"... e fotógrafo. O 2º Gr Comb ficou, cedo, entregue aos dois furriéis, Levezinho e Reis... O alf mil António Carlão foi destacado... para a equipa de reordenamento de Nhabijões ( a gigantesca tabanca, ou aglomerado de tabancas, de maioria balanta, onde a rapaziada do PAIGC se dava ao luxo de entrar e sair quando muito bem lhe apetecia...).
Guiné > Zona leste > REgião de Bafatá > Setor L1 (Bambadinca) > CCAÇ 12 (1969/71) > Estrada Xime-Bambadinca > 23 de novembro de 1969 > A famosa autogrua Galion, desembarcada no Xime, em LDG, e fornecida pela Engenharia Militar para operar no porto fluvial de Bambadinca... Atascada, no final da época das chuvas... junto à bolanha de Samba Silate, antes de Nhabijões, dois topónimos de má memória para muitos de nós que andámos por aquelas paragens...
Na foto, temos em grande plano uma das rodas da Galion atascada,,, E, em segundo plano, aparece o Humberto Reis, de cigarro na boca, óculos de sol, lenço ao pescoço, impecavelmente fardado, como mandava... a puta da sapatilha!.
A Galion veio para substituir as pequenas autogruas de marca Fuchs (segundo oportuno comentário do nosso camarada Vasco Ferreira, e que eu creio que eram duas, pintadas de azul), existentes até então no cais de Bambadinca , por ocasião do início do ambicioso projecto de reordenamento de Nhabijões, um dos maiores da Guiné naquele tempo (cerca de 300 casas).
Guiné > Zona Leste > Região Bafatá > Setor L1 (Bambadinca) > CCAÇ 12 (1969/71) > Pessoal do 2º Grupo de Combate, atravessando em coluna apeada a bolanha de Finete na margem direita do Rio Geba, no regulado do Cuor, em frente a Bambadinca (que pertencia ai regulado de Badora). O destacamento que havia mais a norte, era o de Missirá (guarnecido pelo Pel Caç Nat 52, no tempo do alf mil Beja Santos, 1968/70, e depois pelo Pel Caç Nat 63, do alf mil Jorge Cabral).
A tabanca de Finete, em autodefesa, guarnecida pelo Pelotão de Milicia nº 102, é visível ao fundo. No primeiro plano, para além de municiador da Metralhadora Ligeira HK 21, Mamadú Uri Colubali (se não erro), vê-se o fur mil op esp Humberto Reis e o saudoso 1º cabo José Marques Alves, de alcunha "Alfredo" (1947-2013) (natural de Campanhã, Porto, vivia em Fânzeres, Gondomar).
Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Setor L1 > Bambadinca > Tasca do Zé Maria > Um dos nossos poucos luxos no mato... Os famosos lagostins do Rio Geba Estreito... Da direita para a esquerda, três camaradas da CCAÇ 12 (1969/71) os furriéis mil Humberto Reis e Tony Levezinho e alf mil o José António G. Rodrigues (já falecido já muito).. Penso que fui eu quem tirou esta foto com a máquina do Humberto Reis...
Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Sector L1 > 1969 > O sortilégio e a beleza do Rio Geba, entre o Xime e e Bambadinca, o chamado Geba Estreito, numa das fotos aéreas magníficas do Humberto Reis.
Ainda do lado esquerdo, o cais fluvial, uma zona ajardinada, a estátua do governador Oliveira Muzanty (1906-1909)... Ao centro, a rua principal da cidade. Ao fundo, ao alto da avenida principal, já não se chega a ver o troço da estrada que conduzia à saída para Nova Lamego (, que ficava a nordeste de Bafatá); havia um a outra, alcatroada, para Bambadinca, mas também com acesso à estrada (não alcatroada) de Galomaro-Dulombi, povoações do regulado do Cosse, que ficava a sul. À entrada de Bafatá, havia uma rotunda. ao alto. Para quem entrava, o café do Teófilo, o "desterrado", era à esquerda..
Do lado direito pode observar-se as traseiras do mercado. Do lado esquerdo, no início da rua, um belo edifício, de arquitetura tipicamente colonial, pertencente à famosa Casa Gouveia, que representava os interesses da CUF, e que, no nosso tempo, era o principal bazar da cidade, tendo florescido com o patacão (dinheiro) da tropa. Por aqui passaram milhares e milhares de homens ao longo da guerra,. que aqui faziam as suas compras, iam aos restaurantes e se divertiam... com as meninas do Bataclã.
1. O Humberto Reis, engenheiro técnico reformado, meu camarada da CCAÇ 2590 / CCAÇ 12 (Contuboel e Bambadinca, 1969/71), meu companheiro de quarto em Bambadica, meu vizinho de Alfragide, meu velho amigo (de há mais de meio século), faz hoje anos (*) e merece ser aqui recordado sobretudo como grande fotógrafo da nossa companhia e do nosso tempo (ele e o Arlindo T.Roda). As melhores fotos aéreas que temos aqui publicado são dele (Bambadinca, Bafatá, Xime, Mansambo, Xitole, rio Geba, etc.). E são conhecidas dos nossos leitores.
O Reis tinha vários amigos na FAP e, de vez em quando, apanhava uma boleia de helicóptero ou de DO 27. As fotos de Bafatá, pro exemplo, foram tiradas de heli. Ele fazia "diapositivos", revelados na Suécia (se não erro). Ao fim destes anos estão em excelente estado, conforme as imagens que nos mandou em 2006, digitalizadas. E, para mais, tinha uma excelente resolução (mais de 2 MG), perrmitindo o seu recorte em várias imagens parciais.
A fotografia aérea foi da responsabilidade da Aviação Naval. O trabalho de restituição, por seu turno, foi feita pelos Serviços Cartográficos do Exército. As fotolitografias e a impressão foram feitas em várias casas, de Lisboa, Porto, V.N. Gaia: Litografia de Portugal, Papelaria Fernandes, Arnaldo F. Silva... A imagem em geral é de boa qualidade, graças também à fotolitografia de casas como a Papelaria Fernandes e a António F. Silva (em geral, são os melhores trabalhos, os destas casas)… e à posterior digitalização. A edição é da antiga Junta das Missões Geográficas e Investigações do Ultramar, do antigo Ministério do Ultramar.
Convirá recordar que a sua paciente digitalização foi efectuada pelo Humberto Reis na Rank Xerox, em 2006. (Ele não nos disse quanto pagou, mas não deve ter sido barato...). Eu passei cada um destes pesadíssimos ficheiros (10 ou mais Mb) para outros mais leves (da ordem dos 2 Mb), procurando manter a qualidade da imagem (que tem alta resolução).
Fica aqui uma pequena homenagem ao nosso querido Humberto, juntando algumas das suas fotos (**). Para ele os nossos votos de um Bom Natal e de um Melhor Ano Novo de 2023. (LG)
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Notas do editor:
(*) Vd. poste de 19 de dezembro de 2022 > Guiné 61/74 - P23893: Parabéns a você (2126): Humberto Reis, ex-Alf Mil Op Esp da CCAÇ 2590/CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71)
Guiné 61/74 - P23895: Notas de leitura (1534): Guevara versus Amílcar Cabral: Divergências estratégicas na guerrilha (3) (Mário Beja Santos)
1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 30 de Abril de 2020:
Queridos amigos,
Gérard Chaliand, talvez o mais conceituado historiador francófono do movimento revolucionário, teve oportunidade de acompanhar Cabral no interior da Guiné em 1966 e obter os elementos concludentes da estratégia de guerrilha por ele montada, nomeadamente a partir de 1960, depois do insucesso de conversações com o governo português. Ponto curioso é o que ele observa acerca da fase do desenvolvimento da guerrilha em que se encontravam que abria campo para com melhor armamento se fazerem operações de caráter esmagador sobre este ou aquele objetivo, à semelhança do que ocorrera ou estava a ocorrer no Vietname ou na Argélia. Ele não chegou a ver o desenvolvimento dessa fase, foi assassinado em janeiro de 1973, só meses depois ocorreria a Operação Amílcar Cabral com os objetivos bem definidos de Guilege e Guidage. Chaliand também não esconde que não houve teórico revolucionário em África, e porventura no mundo do seu tempo, como Amílcar Cabral.
Um abraço do
Mário
Guevara versus Amílcar Cabral: Divergências estratégicas na guerrilha (3)
Mário Beja Santos
Tanto quanto me é dado saber, não existe um documento em que Amílcar Cabral esclareça sobre quais as fontes documentais em que se baseou para arquitetar o seu pensamento e a liderança da luta armada na Guiné. Vários estudiosos procuraram os testemunhos de companheiros de Amílcar Cabral em Lisboa, um deles, Marcelino dos Santos, fez referência às leituras de todos aqueles jovens ardentes nacionalistas, obras de cariz político, de Gorki a Jorge Amado. Mas o que, em concreto, Cabral lera dos grandes clássicos da guerrilha, dos seus contemporâneos do Vietname ou da Argélia, por exemplo, não se conhecem anotações. Basil Davidson mostrou uma grande surpresa quando, em 1960, conheceu em Londres Amílcar Cabral e o ajudou a pôr em inglês aquele documento referente aos factos da Guiné colonial que ele apresentou numa conferência de imprensa, era ainda Abel Djassi. Surpresa pela riqueza das observações do profundo conhecimento do terreno. É um período de sensibilização à escala internacional, os resultados foram bem modestos, mas o documento revelava alguém que até procurava negociar com a potência colonial a independência. Obviamente que Cabral estava informado da evolução da guerra da Argélia, do que se passava da Tunísia a Madagáscar, as insurreições nas colónias britânicas em África, havia o Congo, e fervilhavam as lutas de caráter anticolonial na Rodésia, na Namíbia e na África do Sul. Sonhava-se com federações, houve a tentativa de cessação do Biafra e lutas pela independência no Corno de África.
O que Gérard Chaliand vem dizer na sua obra monumental Estratégias da Guerrilha, Payot, 1994, para a qual concorreram inúmeros especialistas que discursaram sobre as guerrilhas em todo o mundo, é o que ele experimentou diretamente quando acompanhou Cabral no interior da Guiné em 1966 e deu origem a um livro publicado em 1967, intitulado Luta Armada em África. Pôde apreciar como se processava a organização global dessa luta, conversar com vários líderes, reter o pensamento de Cabral nas suas tiradas tribunícias em várias localidades, não escondendo a impressão de que havia algo de diferente na proposta cabralina, um projeto cultural que desse identidade ao país com base naquela luta anticolonial; um elevado sentido de independência e de repúdio de qualquer forma de exploração fosse por brancos, fosse por negros; provocou-lhe assombro aquele discurso de alguém que punha a mulher ao nível do homem, exaltando o trabalho, fazendo a apologia de um desenvolvimento onde não faltariam escolas nem hospitais, havia que aproveitar sem tréguas a experiência da luta armada para encontrar novas fórmulas económicas; a plena convicção de que a luta armada não podia progredir sem o apoio das populações; o PAIGC não era ele, era constituído por todos que estavam conscientes dos objetivos da luta; manifestava o seu profundo apreço pela organização das raparigas, na escola, no trabalho e nas milícias, as comissões de tabanca eram o embrião de uma democracia revolucionária que exigiam um constante trabalho político de debate para dar coesão ao esforço coletivo; era bem claro em todo este discurso do líder do PAIGC que não se deviam criar diferenças entre os combatentes e as populações, a questão central passava pelo repúdio de todos aqueles que se opunham à liberdade do novo país e por isso a formação política precedia sempre a formação militar; não iludia o modo como se deviam superar os problemas étnicos e como, a partir do final de 1964, a relação de forças passava a ter pontos favoráveis para a guerrilha… Gérard Chaliand assistiu a debates em que estavam de um lado Cabral, Chico Mendes e Osvaldo Vieira e as populações do outro, registou perguntas e respostas, interrogou vários dirigentes para se aperceber quanto aos primórdios da sublevação e como gradualmente o PAIGC foi ofuscando grupos competidores, como ia chegando o armamento e materiais indispensáveis a Conacri, como, a partir de 1964, fora criada a estrutura militar, as FARP, as milícias, hospitais, escolas, armazéns. Obviamente que Chaliand apresenta números que correspondiam aos dados da propaganda, alguns deles claramente fantasiados, serviam para embasbacar aqueles que nunca pedem o contraditório, por estarem do lado da revolução, o que se dizia sobre as operações do Como era um puro delírio, uma mentira descarada.
Também em 1966, num artigo publicado na revista Le Nouvel Observateur, pouco depois de vir da Guiné, Gérard Chaliand faz uma síntese da sua viagem, dos bombardeamentos na região do Morés, ele visitou, vindo pela fronteira senegalesa, primeiro a base de Djagali, depois Maké, as suas escolas e o posto médico, ouviu depoimentos, ganhou nitidez o pensamento de Cabral. Contrariamente à teoria do foco, o PAIGC começara um longo trabalho de preparação política, Cabral dera-lhe nota de que não era suficiente assimilar os quadros gerais da teoria revolucionária, impunha-se determinar os traços específicos da realidade guineense, precisava de tempo, de auscultação. Aí Chaliand observa que estes preparativos nada tinham a ver com a teoria do foco, houvera um trabalho de reconhecimento e de agitação, Cabral aproveitara o reconhecimento direto, impusera-se a formação de quadros, o trabalho de agitação no interior e a organização de uma estratégia de guerrilha que contasse com o apoio das populações.
Chaliand tomou nota que o PAIGC estava numa segunda fase de guerrilha, ainda em desenvolvimento, já tinham sido afastados os guerrilheiros violentos que aterrorizavam populações, caminhava-se para uma simbiose entre o partido e a guerrilha, a partir de Conacri impusera-se uma circulação permanente entre a direção, os quadros, os guerrilheiros e os camponeses, instituíra-se o direito à crítica, a explicação e o diálogo. Cabral teimava que apesar da guerra e da disciplina que ela implicava, o direito à crítica era a fonte mais segura da democracia, e que ela estava a funcionar, apesar das múltiplas dificuldades. Naquele ano de 1966, o PAIGC considerava que as atividades militares portuguesas já estavam altamente condicionadas, havia estradas intransitáveis, já não se fazia a circulação no rio Corubal, no Sul só havia operações das forças especiais, tal o peso e a intimidação da guerrilha. Ainda não se punha, isto dito por Cabral, a articulação da luta nas florestas e formas de luta urbana, mas não tardaria chegar-se a essa fase. Disse a Chaliand que para passar a uma ofensiva mais destrutiva seria necessário atingir uma dimensão de formações capazes de atacar o adversário de forma esmagadora, quartel a quartel, povoação por povoação, mas ele não esquecia o sucesso das guerrilhas chinesa, vietnamita e cubana. É esta a exposição de Cabral no quadro de 1966. Só em 1973 é que houve meios para concretizar tal estratégia de guerrilha, como sabemos.
Materiais utilizados por Amílcar Cabral em Conacri entregues ao Museu Militar da Luta de Libertação Nacional, Bissau, 2018
Notas do editor
Poste anterior de 12 DE DEZEMBRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23871: Notas de leitura (1531): Guevara versus Amílcar Cabral: Divergências estratégicas na guerrilha (2) (Mário Beja Santos)
Último poste da série de16 DE DEZEMBRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23886: Notas de leitura (1533): "O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974 - Volume I: Eclosão e Escalada (1961-1966)", por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2022 (8) (Mário Beja Santos)
Guiné 61/74 - P23894: Memórias cruzadas: relembrando os 24 enfermeiros do exército condecorados com Cruz de Guerra no CTIG (Jorge Araújo) - Parte IX
O nosso coeditor Jorge [Alves] Araújo, ex-Fur Mil Op Esp/Ranger, CART 3494 (Xime e Mansambo, 1972/1974), professor do ensino superior, ainda no ativo. Tem mais de 290 referências no nosso blogue.
MEMÓRIAS CRUZADAS
NAS “MATAS” DA GUINÉ
(1963-1974):
RELEMBRANDO OS QUE, POR
MISSÃO, TINHAM DE CUIDAR DAS FERIDAS CORPOREAS PROVOCADAS PELA METRALHA DA
GUERRA COLONIAL: «OS ENFERMEIROS»
OS CONTEXTOS DOS
“FACTOS E FEITOS” EM CAMPANHA DOS VINTE E QUATRO
CONDECORADOS DO EXÉRCITO COM “CRUZ DE GUERRA”, DA ESPECIALIDADE “ENFERMAGEM”
PARTE IX
► Continuação do P23711 (VIII) (15.10.2022)
1. - INTRODUÇÃO
Com este antepenúltimo fragmento relacionado com o tema em título, continuamos a partilhar no Fórum da Tabanca Grande os resultados obtidos nessa investigação. Com ela, procura-se valorizar, em particular, o importante papel desempenhado pelos nossos camaradas da “saúde militar” (e igualmente no apoio a civis e população local) – médicos e enfermeiros/as – na nobre missão de socorrer todos os que deles necessitassem, quer em situação de combate, quer noutras ocasiões de menor risco de vida, mas sempre a merecerem atenção e cuidados especiais.
Considerando a dimensão global da presente investigação, esta teve de ser dividida em partes, onde se procura descrever cada um dos contextos da “missão”, analisando “factos e feitos” (os encontrados na literatura) dos seus actores directos “especialistas de enfermagem”, que viram ser-lhes atribuída uma condecoração com «Cruz de Guerra», maioritariamente de 3.ª e 4.ª Classe. Para esse efeito, a principal fonte de informação/ consulta utilizada foi a documentação oficial do Estado-Maior do Exército, elaborada pela Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974).
2. - OS “CASOS” DO ESTUDO
De acordo com a coleta de dados da pesquisa, os “casos do estudo” totalizaram vinte e quatro militares condecorados, no CTIG (1963/1974), com uma «Cruz de Guerra» pertencentes aos «Serviços de Saúde Militar», três dos quais a «Título Póstumo», distinção justificada por “actos em combate”, conforme consta no quadro nominal elaborado por ordem cronológica e divulgado no primeiro fragmento – P21404.
Nesta antepenúltima parte - a nona - analisaremos mais dois “casos”, ambos registados durante o ano de 1967, onde se recuperam mais algumas memórias dos seus respectivos contextos.
Aproveitando a elaboração do presente fragmento, voltamos a reproduzir o quadro geral dos “condecorados”, onde o seu universo foi estratificado por posto e ano da condecoração, com a divisão das frequências por triénios.
Quadro 2 – Da análise ao quadro supra, verifica-se que o número total de indivíduos do Exército, com formação específica na área dos «Serviços de Saúde Militar», condecorados com medalha de «Cruz de Guerra» por “actos em combate”, e considerados como fazendo parte da população deste estudo, é de 24 (vinte e quatro), todos eles pertencentes a diferentes Unidades de Quadrícula em missão no TO.
Verifica-se, ainda, que desse universo, 1 era Alferes médico (4.2%), 4 eram Furriéis enfermeiros (16.6%), 15 eram 1.ºs Cabos Enfermeiros (62.5%), 1 era 1.º Cabo maqueiro, 1 era Soldado auxiliar de enfermagem (4.2%) e 2 eram Soldados maqueiros (8.3%).
É relevante o facto de entre os anos de 1968 e 1971 não ter havido “condecorações” na mesma especialidade do grupo do estudo, assim como no último ano do conflito (1974), uma vez que no 1.º triénio (1963-1965) foram registados 7 casos (29.2%) e no 2.º triénio (1966-1968) os distinguidos foram 15 (62.5%).
É também de relevar o facto de que durante o 1.º sexénio (1963-1968), foram contabilizadas 22 condecorações (92% dos casos), equivalente à soma dos dois primeiros triénios, enquanto no 2.º sexénio (1969-1974) só se verificaram, apenas, duas (8%).
Pergunta-se: O que se terá passado nos anos de 1968 a 1971 para não se terem registado condecorações na área da “Saúde Militar”?
3. - OS CONTEXTOS DOS “FEITOS” EM CAMPANHA DOS
MILITARES DO EXÉRCITO CONDECORADOS COM “CRUZ DE GUERRA”, NO CTIG (1963-1974),
DA ESPECIALIDADE DE “ENFERMAGEM” - (n=24)
3.17 - MANUEL AUGUSTO RODRIGUES MIRANDA, 1.º
CABO AUXILIAR DE ENFERMEIRO, DA CCAÇ 1501, CONDECORADO COM A CRUZ DE GUERRA DE
3.ª CLASSE
A décima sétima ocorrência a merecer a atribuição de uma condecoração a um elemento dos «Serviços de Saúde» do Exército, esta com medalha de «Cruz de Guerra» de 3.ª Classe - a segunda das distinções contabilizadas no decurso do ano de 1967 - teve origem no desempenho tido pelo militar em título ao longo da sua comissão. Merecem, todavia, destaques, os comportamentos tidos nas acções «Operação Mutação», «Operação Assédio» e «Operação Açoite 10».
► Histórico
◙ Fundamentos relevantes
para a atribuição da Condecoração
▬ Portaria de 26 de
Setembro de 1967:
“Manda o Governo da República Portuguesa, pelo Ministro do Exército, condecorar com a Cruz de Guerra de 3.ª Classe, ao abrigo dos artigos 9.º e 10.º do Regulamento da Medalha Militar, de 28 de Maio de 1946, por serviços prestados em acções de combate na Província da Guiné Portuguesa, o 1.º Cabo, n.º 5484365, Manuel Augusto Rodrigues Miranda, da Companhia de Caçadores 1501 [CCAÇ 1501] – Batalhão de Caçadores 1877, Regimento de Infantaria 15.”
● Transcrição do louvor que originou a condecoração:
“Manda o Governo da República Portuguesa, pelo Ministro do Exército, louvar o 1. Cabo n.º 5484365, Manuel Augusto Rodrigues Miranda, da Companhia de Caçadores 1501 – RI 15, pela maneira como se tem comportado em todas as acções em que tem tomado parte, acorrendo prontamente aos locais em que há feridos a assistir, não se poupando ao perigo desde que o exercício da função da sua especialidade assim o exija.
A este escrupuloso cumprimento do dever alia desembaraço, resistência física e grande serenidade debaixo de fogo, qualidades estas que muito têm contribuído para o cumprimento da sua missão.
Durante a «Operação Mutação», demonstrou qualidades de presença de espírito frente ao inimigo, deslocando-se à rectaguarda da coluna para prestar os primeiros socorros a um ferido grave, evitando com a sua intervenção oportuna que o mesmo continuasse a perder sangue, com grave risco de vida. De salientar o facto de ser a primeira operação em que tomou parte.
Na «Operação Assédio», logo que teve conhecimento da existência de feridos, imediatamente se deslocou debaixo de fogo inimigo para o meio da clareira onde as nossas tropas estavam a ser emboscadas. O seu desembaraço, serenidade, dinamismo, total dedicação e excepcional presença de espírito permitiram-lhe assistir sozinho a todos os feridos. No regresso, a sua notável resistência física contribuiu para que prestasse uma assistência permanente, durante várias horas do deslocamento, aos feridos que eram transportados em macas, conseguindo que os mesmos chegassem ao quartel em razoáveis condições de serem evacuados.
Mais uma vez, na «Operação Açoite 10», a sua acção mereceu ser citada no relatório da operação, pela eficiência demonstrada na assistência a um ferido.
Mercê da sua coragem, valentia e solidariedade para com os camaradas, o 1.º Cabo Miranda tornou-se credor de muita estima e admiração de todo o pessoal da sua Companhia, constituindo a sua presença um elemento moralizante.” (CECA; 5.º Vol.; Tomo IV, p 455).
◙►
CONTEXTUALIZAÇÃO DA OCORRÊNCIA
Não tendo sido possível obter quaisquer informações sobre detalhes factuais relacionados com as três operações anteriormente identificadas, tomámos a iniciativa de considerar, para enquadramento particular deste contexto, outros aspectos da actividade operacional em que intervieram forças da CCAÇ 1501.
Está neste caso a sua participação na «Operação Inquietar», realizada entre 9 e 11 de Maio de 1967 (de 3.ª a 5.ª feira), na região de Sare Dicó, que tinha por objectivo executar acções de força sobre o acampamento IN de Canjambari, Sector L2, em coordenação com as forças do Agr 1976 (infogravura abaixo).
No livro da CECA consta que as forças intervenientes nesta «Operação», que contaram com apoio aéreo, foram organizadas em quatro destacamentos: Dest. A = CCaç 1685; 1 GC CArt 1690 (do, então, Alf. A. Marques Lopes) e 1 do PCMil 3; Dest B = CCaç 1689 e 1 Sec/CMil 3; Dest C = CCaç 1501, 1 GC CCaç 1499, 2 Sec/CMil 2 e 1 Sec/CMil 4; Dest D = 1 PRec 1578.
● Resultados => As NT destruíram um acampamento com 10 casas de mato, depois de terem passado revista e capturado 1 "longa", roupas e utensílios domésticos. Depois foi detectado outro, que foi assaltado; capturadas 2 "longas", destruídos numerosos artigos, utensílios domésticos, e derrubadas 30 casas de mato (acampamento de Cambajú). As NT destruíram ainda 10 casas de mato, sendo 5 cobertas com zinco, e capturaram, além de material, documentos e munições diversas, o seguinte armamento: - Lgfog "P-27 Pancerovka" 1-MI"M-52" 1 - Esautom"V-52" 1 - Esp "Mauser " 1 - "Longa" 3 - Gmdef "F-1" 6 - Gmdef"RG-34" 3 - Granadas de "lgfog" 3 - Carregadores de esautom "V-52" 7 " da ml "Degtyarev" 2" da mi "M-52" 2 - Gmdef 1 Munições: - Da esautom "M-52" 217 - Da mi "Degtyarev" 92 - Da pmetr "PPSH" 30 - De pistola 23 - Da eautom "Kalashnikov" 18 - Da esp "Mauser" 3 (CECA, 7.º Vol., Tomo II, p 44).
● Porém, durante esta investigação encontrámos informações mais desenvolvidas, ainda que não coincidentes, nomeadamente quanto ao período indicado na fonte oficial, como foi o caso do Poste 94, publicado no Blogue da CART 3494 em 18 de Fevereiro de 2011, cujo conteúdo se transcreve:
◙ «Operação Inquietar I» - de 9 a 15Jun1967 (de 6.ª a 5.ª feira seguinte).
Ø Situação Particular => Há notícias de que o IN tem um acampamento em CANJAMBARI além de outros espalhados pela mata do OIO. O IN tem-se revelado durante operações realizadas e implantado engenhos explosivos nos itinerários.
Ø Missão => Executar uma acção em força sobre o acampamento IN de CANJAMBARI em coordenação com as forças do Agrupamento 1976.
Ø Forças Executantes => As mesmas indicadas no livro da CECA
Ø Desenrolar da Acção =>
● 09Jun1967 (6.ª feira) = Os destacamentos A e B deslocaram-se em meios-auto de FÁ para BANJARA. Devido à falta das viaturas militares para os transportar houve necessidade de recorrer a requisição de viaturas civis, utilizadas apenas no troço FÁ - SARE BANDA. A concentração das forças em BANJARA foi morosa, pois teve que se fazer por escalões. Iniciada pelas 07h00 terminou pelas 16h00.
● 10Jun1967 (sábado) = Pelas 02h00 os destacamentos A e B iniciaram junto o movimento
para CASA NOVA que atingiram pelas 06h00. Pelas 06h50 as NT abriram fogo sobre 2 elementos desarmados tendo abatido um e ferido outro num braço, quando tentavam a fuga. Interrogado este revelou a existência de uma tabanca nas proximidades, localizado depois em BANJARA 2A4. Pelas 13h50 atacaram este objectivo que o IN abandonou precipitadamente. - As NT destruíram 10 casas de mato, depois de terem passado revista e capturado uma longa, roupas e utensílios domésticos. Pelas 12h30 as NT atingiram GENDO, utilizando o prisioneiro como guia [imagem ao lado], onde pararam para comer. Em exploração das declarações prestadas pelo guia os Cmdt’s Dest. A e B que estavam juntos decidiram seguir a corta-mato para SAMBA CULO, durante a noite, se até iniciarem a progressão não fossem detectadas. Pelas 13h00 ouviram um tiro isolado do lado NW, que lhes pareceu de reconhecimento. Pelas 14h40 um Gr IN estimado em 15 a 20 elementos flagelou durante cerca de 20 minutos com armas automáticas: PM, LGF, e Mort. 60, a posição onde as NT se encontravam, mas sem consequências.
- O Comandante do Dest. B decidiu então, como medida de excepção, desviar-se para BANJARA 5A5 e daqui progrediu durante a noite em direcção a SAMBA CULO. Pelas 17h30 as NT já se encontravam em andamento quando ouviram o rebentamento de duas granadas de mort. 60 no local onde estacionaram. Cerca das 18h00 as NT avistaram 2 elementos dos que seguiam em direcção às NT. Ao detectá-los internaram-se no mato. Momentos depois ouviu-se o lançamento de 1 granada de Mort., tendo as NT avançado imediatamente sobre a posição onde se supunha estar instalada a arma. Assaltado o acampamento foram capturadas 2 longas, destruídos numerosos artigos e utensílios domésticos, roupas, alimentos, catanas, bicicletas e destruídas 50 casas de mato, acampamento de CAMBAJÜ situado em BANJARA, 3CL. O Cmdt. Dest. B decidiu então atravessar a bolanha do Rio Cambajú, para passar a noite em BANJARA 3EL e progredir depois sobre SAMBA CULO.
● 12Jun1967 (2.ª feira) - Pelas 08H00, como o PCV não aparecesse e os Dest. A e B não tivessem sido reabastecidos, os Cmdt’s dos Dest’s decidiram progredir para SW, tendo atingido BANJARA pelas 09h00 altura em que surgiu o PCV e lhes comunicou que de BAFATA saíra uma coluna com os reabastecimentos e com as instruções a cumprir durante o dia 12 e na noite de 12/13Jun. O Dest. A recebeu ordem de montar emboscadas sobre o itinerário BANJARA - MANTIDA e o Dest. B recebeu ordem de montar emboscada na região de BANTAJÃ, mas que não resultaram.
● 13Jun1967 (3.ª feira) - Iniciado o regresso, os Dest. A e B chegaram a FÁ pelas 12h50.
Nota:
Sobre esta operação consultar outros textos de A. Marques Lopes em postes P48 e P49,
de 7 de Junho de 2005.
3.17.1
- SUBSÍDIO HISTÓRICO DA COMPANHIA DE CAÇADORES 1501
= BULA - BISSAU - MANSOA - TEIXEIRA
PINTO - INGORÉ - PELUNDO - FAJONQUITO
3.17.2 - SÍNTESE DA ACTIVIDADE OPERACIONAL DA
CCAÇ 1501
3.18 - JOSÉ LUÍS VALENTE TEIXEIRA DA ROCHA, 1.º
CABO AUXILIAR DE ENFERMEIRO, DA CCAÇ 1416, CONDECORADO COM A CRUZ DE GUERRA DE
4.ª CLASSE
◙ Fundamentos relevantes
para a atribuição da Condecoração
▬ O.S. n.º 16, de 06 de
Abril de 1967, do QG/CTIG:
●
Transcrição do louvor que originou a condecoração:
◙► CONTEXTUALIZAÇÃO DA OCORRÊNCIA
Na busca de outros elementos factuais ocorridos durante a «Operação Milhafre», tendentes a uma melhor contextualização dos mesmos, já que se tratou “(…) de auxílio debaixo de intenso fogo In, numa violenta emboscada que colheu quase por inteiro toda a coluna e provocou numerosas baixas entre as nossas forças”, situação que acabaria por fundamentar a condecoração acima, as fontes bibliográficas consultadas não nos permitem acrescentar algo mais.
No entanto, partindo do facto da mesma ter “provocado numerosas baixas entre as nossas forças”, a questão de partida era tentar saber se as houve, quantas e como ocorreram as baixas da CCAÇ 1416.
Assim, durante o ano de 1966, esta Unidade contabilizou quatro mortes, a saber:
▼ 1. - Filipe Salvador Amaral, Soldado, natural do Fundão.
● Em 24 e 25.Fev.1966, durante a «Operação Cabuca»: Em exploração de uma notícia que referia que um numeroso grupo In ia atacar Cabuca. Forças da CCaç 1416 seguiram para aquela localidade. O In, instalado junto ao rio Cumbera (afluente do Corubal) e protegido pelas rochas, fez fogo sobre as NT. Estas reagiram desalojando o In, que retirou para a República da Guiné, sofrendo 15 mortos, 5 dos quais ficaram abandonados no local. As NT sofreram 1 morto (Filipe Salvador Amaral, 1 ferido grave e vários ligeiros. (CECA, p 392).
● As restantes três baixas ocorreram em 22.Jul.1966, durante um ataque ao Aquartelamento de Medida do Boé, conforme consta no P21547 - (D)o Outro lado do Combate…
▼ 2. – Augusto Reis Ferreira, Soldado, natural de Montargil (Ponte de Sôr).
▼ 3. – Carlos Manuel Santos Martins, Soldado, natural da Cova da Piedade (Almada).
▼ 4. – Rogério Lopes, 1.º Cabo, natural de Chão de Couce (Ancião).
Eis, em síntese, o que foi apurado sobre as questões em aberto.
Foto 2 – Região do Boé > Madina do Boé > CCAÇ 1589 / BCAÇ 1894 > Aquartelamento > Memorial da CCAÇ 1416 “Aos nossos mortos” … “E aqueles que por obras valorosas se vão da lei da morte libertando”. Fonte: foto do álbum de Manuel Caldeira Coelho – P18867, com a devida vénia.
3.18.1 - SUBSÍDIO HISTÓRICO DA COMPANHIA DE CAÇADORES 1416
= NOVA LAMEGO - MADINA DO BOÉ - BÉLI - CHÉ-CHÉ
Mobilizada pelo Regimento de Infantaria 1 [RI 1], da Amadora, para cumprir a sua missão ultramarina no CTIG, a Companhia de Caçadores 1416 [CCAÇ 1416], a primeira Unidade de Quadrícula do Batalhão de Caçadores 1856 [BCAÇ 1856; do TCor Inf António da Anunciação Marques Lopes] embarcou no Cais da Rocha, em Lisboa, em 31 de Julho de 1965, sábado, sob o comando do Cap Mil Inf Jorge Monteiro, tendo chegado a Bissau a 6 de Agosto, 6.ª Feira.
3.17.2 - SÍNTESE DA ACTIVIDADE
OPERACIONAL DA CCAÇ 1416
Ø – «OPERAÇÃO LUMIAR» -
Adenda
Continua…
► Fontes consultadas:
Ø Estado-Maior do Exército; Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974). Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África; 5.º Volume; Condecorações Militares Atribuídas; Tomo II; Cruz de Guerra, 1962-1965; Lisboa (1991).
Ø Estado-Maior do Exército; Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974). Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África; 7.º Volume; Fichas das Unidades; Tomo II; Guiné; 1.ª edição, Lisboa (2002).
Ø Estado-Maior do Exército; Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974). Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África; 8.º Volume; Mortos em Campanha; Tomo II; Guiné; Livro 1; 1.ª edição, Lisboa (2001).
Ø Outras: as referidas em cada caso.
Termino, agradecendo a atenção dispensada.
Com um forte abraço de amizade e votos de muita saúde.
Jorge Araújo.
EAU; 06NOV2022
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Nota do editor:
Último poste da séroe > 15 de outubro de 2022 > Guiné 61/74 - P23711: Memórias cruzadas: relembrando os 24 enfermeiros do exército condecorados com Cruz de Guerra no CTIG (Jorge Araújo) - Parte VIII
Guiné 61/74 - P23893: Parabéns a você (2126): Humberto Reis, ex-Fur Mil Op Esp da CCAÇ 2590/CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71)
Nota do editor
Último poste da série de 15 de Dezembro de 2022 > Guiné 61/74 - P23882: Parabéns a você (2125): Sousa de Castro, ex-1.º Cabo Radiotelegrafista da CART 3494/BART 3873 (Xime e Mansambo, 1971/74)