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sábado, 8 de novembro de 2025

Guiné 61/74 - P27400: Os nossos seres, saberes e lazeres (708): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (229): Por casualidade, o fotógrafo interessou-se por tal momento, por ele considerado esplendente - 1 (Mário Beja Santos)

Mário Beja Santos, ex-Alf Mil Inf
CMDT Pel Caç Nat 52

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 1 de Outubro de 2025:

Queridos amigos,
Vamos guardando uma imensidão de imagens no nosso telemóvel, há momentos em que apetece recordar o impulso ou o ímpeto com que se captou o nascer ou o fim do dia, aquele edifício de quem guardamos terna memória, aquelas horas de confraternização, o deslumbramento de uma peça de museu como, no caso presente, em que fui visitar o Museu Nacional de Arte Antiga, de que fiz relatório para o blogue, e quis guardar, veja-se só, como um quase relicário a restaurada Custódia de Belém que nunca a vi tão esplendente como agora. Deve ser fruto da idade, não me desembaraço das minhas recordações de ânimo leve, mas não quero ter a memória amordaçada pelo passado, é por isso que guardo imagens que me lançam pisca-pisca para obras de ficção, bem gostaria, antes de partir para as estrelinhas, de escrever dois livros a jeito de romances.

Um abraço do
Mário



Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (229):
Por casualidade, o fotógrafo interessou-se por tal momento, por ele considerado esplendente - 1


Mário Beja Santos

Explicado ou por explicar, há uma circunstância, um ímpeto irresistível, quiçá uma assombração, que nos põe a câmara na mão para captar a irradiação da luz, registar uma caleidoscópica atmosfera, é assim que assumimos que temos o direito a um arquivo pessoal, aquelas imagens vão ficar para todo o sempre, imaginamos nós, para regalo dos olhos. E em dado momento todo aquele fulgor dos registos deixa de ser visto como um cofre-forte de rememorações, como antigamente se faziam álbuns de viagens ou de família. Ora acontece que quem capta essas imagens sente vontade de as repartir, e num blogue, nestas rubricas que destinamos ao aprazimento dos nossos lazeres, tem todo o sentido de as revelar, dando alguma explicação da circunstância em que a imagem foi fixada. É o que se passa a pôr em palavras
Adoro este local onde há alguns anos adquiri dois casebres situados a meia encosta, estamos na freguesia de Reguengo Grande, concelho da Lourinhã, no extremo do distrito de Lisboa, a dois quilómetros está uma placa a dizer “Bem-vindos ao concelho do Bombarral”. Aqui tenho remanso, ponho Bach, Telemann ou Albinoni no leitor CDs, disfruto da vida no vale, oiço vozes nas colinas em frente, gente que visita o miradouro, e espero ansiosamente pelo pôr-do-sol, é como que uma liturgia a favor da vida, a luz vai se apagar, virá pelo amanhecer, como não estamos longe do mar há manhãs de neblina, aí pelo meio-dia o sol irrompe, triunfal.
Há mais de dez anos que colaboro semanalmente no jornal O Templário, de Tomar. Tenho ensaiado passeios pelo rio Nabão, mostrado as fachadas das casas, bisbilhotado pelos museus, documentando-me, acima de tudo, pelo precioso Património da Humanidade, centrado no Castelo e no Convento de Cristo, ali sucedem-se os movimentos artísticos desde o românico, é o caso da Charola, o gótico, marcado pela presença do Infante D. Henrique e dois claustros que mandou fazer, temos depois o tardo-gótico na dimensão do manuelino, segue-se o maneirismo e as manifestações do Renascimento até se chegar ao barroco. Há, neste monumental conjunto, casos intrigantes de monumentos mal conservados ou que possam ameaçar derrocada. É o caso da Casa do Capítulo, um grande edifício que está à frente da Igreja do Convento e da Charola, nunca foi concluído, caiu fragorosamente o primeiro andar, que era destinado aos Cavaleiros da Ordem de Cristo, foi naquele espaço e no terreiro em frente que se celebraram as Cortes de Tomar, em 1581, Filipe II de Espanha passou a ser Filipe I de Portugal. Por aqui andei a preparar reportagens para o dito jornal, e dei com esta escultura, que de algum modo lembra os trabalhos de João Cutileiro, disse-me o técnico do Convento de Cristo que me acompanhava que está destinado a outro local, falta ainda algum acabamento, para o protegerem dos rigores do tempo meteram-no na antecâmera que tinha sido destinada aos clérigos do Convento. Achei o contraste belíssimo, guardei estas duas imagens.
A Santíssima Trindade, autor desconhecido, séculos XV-XVI, pedra calcária policromada, proveniência da Igreja de S. Pedro da Beberriqueira, esta escultura está na atual receção do Convento de Cristo. A imagem não permite ver com facilidade a Pomba do Espírito Santo que se impõe sobre a cabeça de Cristo
Pintor Sam Abercromby, fotografia tirada no decurso da exposição no Convento de Cristo, em Tomar, intitulada "Sebastianismo Revisitado"
Agarrado às engrenagens e maquinaria do seu pequeno esquife, Sebastião lembra-se da vida no palácio, pré-batalha e pré-exílio onde irá aterrar o barco, quem irá encontrar? Quando lhe será permitido regressar?... tudo isto dentre deste momento… enquanto uma gaivota rouba o seu crucifixo. Quando a óleo de Sam Abercromby exposto na referida exposição.
Sebastião com o cão, quadro a óleo do ciclo Memórias e Premonições do Quarto Azul, por Sam Abercromby. Fiz uma reportagem da exposição, cerca de cento e trinta telas enormes dispostas em belos espaços conventuais logo na Nova Sacristia, indo por aí fora até aos espaços onde viveu o Conde de Tomar e onde estudaram os alunos do Colégio dos Missionários. Não me deixa de surpreender a preocupação deste artista que vive há quarenta anos perto de Tomar pelo fenómeno do Sebastianismo, andamos sempre à espera do homem providencial que nos subtraia da pequenez, da modorra, da inveja corporativa, um homem providencial que nos deu sonho e fumos de grandeza
Eduardo Viana, A pequena, 1916. Não sei há quanto tempo fui ver uma exposição no Centro Cultural de Belém que se prendia com o diálogo interatlântico das artes, naquele momento em que em Paris do Impressionismo se partia para uma ebulição de correntes estéticas, entrecruzavam-se o expressionismo, o cubismo, os resquícios do simbolismo, o construtivismo, o modernismo, em suma. Sacralizamos Almada Negreiros e Amadeo Souza-Cardoso, e pomos um tanto à margem o genial Eduardo Viana que pintou corpos femininos voluptuosos na sua carnalidade, mas que tudo experimentou entre as correntes de vanguarda, ele que pôde conviver algum tempo com Robert e Sonia Delaunay, que tanto o marcaram.

(continua)

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Nota do editor

Último post da série de 1 de novembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27373: Os nossos seres, saberes e lazeres (707): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (228): Um aspeto da exposição, com uma museografia excecional, mostrando no centro e ao fundo uma imagem de Henry Moore (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P27399: Notas de leitura (1861): "O capelão militar na guerra colonial", de Bártolo Paiva Pereira, capelão, major ref - Parte V: "Tenho um papel na gaveta", disse-lhe o Salazar, na véspera de partir para o CTIG, como capelão-chefe, em fevereiro de 1966... Era o papel que criava a capelania militar, a meio da guerra...



Padre Bártolo Paiva Pereira,
alferes graduado capelão,
Cabinda, 1962

1. Só em 1966, com a criação da Diocese Castrense,passou a existir a figura jurídica do capelão militar (Decreto Lei nº 47 188, de 8 de setembro).


Este diploma que vem promulgar "a estruturação da assistência religiosa nas forças armadas": embora já revogado (em 1991), tem interesse para a história da capelania militar e da guerra colonial. Até então os capelães mobilizados para os 3 teatros de operações eram todos, teoricamente, voluntarios, como foi o caso do padre Bártolo.

No seu artigo 10º (de um total de 23), o Decreto-Lei noº  47 188 determinava a realização de um curso, a ser regulamentado por portaria conjunta do Ministro da Defesa Nacional e dos Ministros e Secretário de Estado de cada um dos departamentos das forças armadas. Diz o nº 1 do art. 10º

(...) "Após a incorporação, os sacerdotes frequentam um curso destinado a ministrar-lhes os necessários conhecimentos de natureza militar e pastoral." (...)

O nosso autor diz que o primeiro curso realizou-se na Academia Militar, em Lisboa, logo em 1967. Foi frequentado por 58 sacerdotes, graduados no posto de aspirante miliciano (pág. 46). Entre eles, o nosso conhecido padre Mário de Oliveira, já falecido, que foi alferes g
aduado capelão, CCS/BCAÇ 1912 (Mansoa, entre novembro de 1967  e em março 1968).

De 1967 a 2017, realizaram-se 43 cursos de capelães militares, frequentados por total de 877 sacerdotes Bártolo Paiva Pereira, op. cit., pág. 47).

O curso e a participação na guerra colonial ajudaram a "arrumar a casa".


 Capa do último livro de Bártolo Paiva Pereira, padre da diocese de Braga, capelão militar, capelão-chefe do CTIG (1965/67); nascido em 1935, em Santo Tirso,  foi ordenado sacerdote em 1959, em Braga; foi capelão militar desde 1961, em Angola, e serviu nas Forças Armadas durante 30 anos (um caso raro de dedicação á Pastoral Castrense; é hoje major do exército na situação de reforma;  também exerceu o seu múnus espiritual no seio da diáspora portuguesa na Suíça; é autor de uma dezena de livros; vive em Vila do Conde, é vizinho e amigo do nosso camarada Virgílio Teixeira.

Esta última obra, que acaba de sair,  é edição de autor (Vila do Conde, 2025, 120 pp.). A capa é de Joaquim António Salgado de Almeida. Depósito legal nº 548769/25. Não tem ISBN. Impressão: Gráfica São João, Fajozes, Vila do Conde. ~(*)


(pág. 48)


O abandono do sacerdócio terá sido mais dramático com a guerra.

 O autor diz que de 1967 a 1971, em nove cursos e num total de 305 capelães, houve um em cada três que pediu a redução ao estado laical. 

 Não se percebe como é que o padre Bártolo calculou a taxa de 10% de abandono para o total dos 877 capelães , formados no período de 1967 a 2017.

Há aqui dois factores a considerar na análise deste fenómeno:

 (i) a realização do Concílio Vaticano II (que se reunuiu em 4 outonos,de 1962 a 1965); e 

(ii)  a experiência da guerra colonial. 

Valeria a pena ir mais longe na especulação sobre as razões (sociológicas, teológicas, éticas, psico9lógicas,  etc.) que levaram à crise náo só do clero como das vocações sacerdotais, em Portugal, nos anos 60/70/80.

 "Se a farda militar ajudou alguns sacerdotes a despirem a batina, (...) foi saudável" (pág. 49).

Por outro lado, há que reconhecer que apenas dois capelães foram "expulsos do Exército", por coincidència dois membros da Tabanca Grande, um deles o já supracitado Mário da Lixa (sic) e o Arsénio Puim. Falaremos destes dois caso em próximo poste.

Mas também morreram dois capelões durante os 13 anos de guerra: um em combate, o padre Lomba, da diocese de Braga, e o padre Manuel Cunha, em acidente de viação (pág. 53).
 

O padre Bártolo, que não nos lê, nem tem acesso à Net, náo deve ter lido a excelente e bem documentada reportagem sobre os capelães militares e a guerra do ultramar / guerra colonial. da autoria do jornalista António Marujo (do jornal digital 7Margens), publicada na revista do semanário Expresso, edição nº 2673, de 12/5/2023,  

O destaque é dado à figura do açoriano  Arsénio Puim  Mas o autor acabou por descobrir "pelo menos outros 11 padres católicos que se opuseram à guerra colonial e não quiseram ser capelães", para além dos dois que foram expulsos do CTIG e exonerados das suas funções de capelania (Mário de Oliveira, em 1968 e Arsénio Puim, em 1971):

  • José Maria Pacheco Gonçalves, 
  • José Alves Rodrigues, 
  • Domingos Castro e Sá, 
  • Serafim Ferreira de Ascensão, 
  • Manuel Joaquim Ribeiro, 
  • António de Sousa Alves, 
  • José Domingos Moreira, 
  • José Lopes Baptista, 
  • Joaquim Sampaio Ribeiro 
  • Carlos Borges de Pinho,
  • José Carlos Pinto Matos.

Eram todos da diocese do Poto, com exceçáo do último que oertencia à diocese de Viseu. "

Destes nomes destaque-se o do Carlos Manuel Valente Borges de Pinho, que foi capelão da CCS / BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, 1973/74), no curto período de 16/3 a 16/9/73. Foi amigo pessoal do nosso tabanqueiro José Teixeira. que deixou de ter notícias dele. hoje leigo (para saber mais ler aqui o poste P19055.).


2. Surpreendente ou talvez não, é a "inconfidència" ou a partilha de um pequeno segredo do padre Bártolo, na véspera de partir para a Guiné, em fevereiro de 1966. Teve ensejo de fazer uma visita inusitada, de conversar durante 20 minutos  e de inclusive tomar chá com o homem mais poderoso do país naquela época

Registe-se a opinião (ou a imoressão ) do autor:  

"Salazar era o único governante que se opunha à oficialização do Serviço de Assistência Religiosa às Forças Armadas. 

"Já a guerra colonial ia a meio, quando foi criada a Diocese Castrense. Saiu o 'papel da gaveta' e o Serviço Religioso das Forças Armadas e de Segurança foi legalmente instituído" (pág. 49). 

Porquê ? O autor não aprofunda as razões da má-vontade, reserva, se não mesmo "antipatia" e até "oposição" de Salazar à ideia da oficialização do serviço de assistência religiosa nas forças armadas, já há, de resto,  muito reclamado pelas chefias militares.

Acrescenta apenas que, apesar de uma pretensa amizade entre ele e o Cardeal Cerejeira,  Salazar sempre terá cultivado,  com a Igreja enquanto instituição,  "uma cautelosa diplomacia" (pág. 50). 

A história do "papel na gaveta" vem a seguir. É uma "petite histoire":


(pp. 50/51)

Quanto ao número de capelães mobilizados terão sido mais de mil pelas contas do autor:
  • c. 500 para Angola;
  • c. 400 para Moçambique;
  • 113 para a Guiné.
(Continua) (**)

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Notas do editor LG:

 (*) Vd. postes anteriores da série:




7 de outubro de 2025 > Guiné 61/74 - P27293: Notas de leitura (1848): "O capelão militar na guerra colonial", de Bártolo Paiva Pereira, capelão, major ref - Parte IV: "Até 1966 eram todos voluntários" (Luís Graça)

sexta-feira, 7 de novembro de 2025

Guiné 61/74 - P27398: 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente (Cabo Verde, Guiné, S. Tomé e Príncipe e Angola, 10 de agosto - 3 de outubro de 1935), de que foi diretor cultural o jovem e brilhante professor Marcello Caetano - Parte V: preços só para meninos ricos ou gente da classe média-alta... Hoje daria para dar a volta ao mundo em 100 dias.





Fotogramas do filme de San Payo (1936), O I Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente.
Os dois primeiros (minuto 35) mostram a praxe na passagem pelo Equador. A "cerimónia" é presidida pelo então popularíssimo ator do teatro de revista, Estêváo Amarante (Lisboa, 1894 - Porto, 1951). No último fotograma mostra-se o grupo musical do Mindelo que animou o baile oferecido aos "excursionistas" no Liceu Infante Dom Henrique.

Cortesia de Cinemateca Digital, documentário "I Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente", realizado em 1936 por San Payo. Disponível aqui (*)

http://www.cinemateca.pt/Cinemateca-Digital/Ficha.aspx?obraid=1378&type=Video



1. Ainda  a propósito do I Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente (de 10 de agosto da 4 de outubro de 1935), e do documentário, de  longa metragem (c. 1 hora e meia), que foi feito por encomenda  do Secretariado Nacional de Propaganda (**)...

Já aqui o dissemos: o navio a vapor "Moçambique", da CNN, levava a bordo uma exposição de produtos de empresas portuguesas. Isso foi uma fonte de receita, adicional, a par de outras formas de publicidade paga. Uma terceira fonte de receita foram as  inscrições dos excursionistas (cerca de 200, dos quais 7 dezenas de estudantesm sendo o resto familiares, professores, funcionários públicos, civis e  militares, etc.)

A viagem contou ainda com um subsídio governamental de 150 contos.

Acrescente-se que o filme (**) acabou por ser uma deceção, não chegando a passar nas salas de cinema: ao que parece, o filme da viagem terá sido projectado apenas uma vez, no S. Luiz, em Lisboa, a 29 de junho de 1936, e apenas para os participantes do cruzeiro. 

A realização foi entregue a um fotógrafo, de talento, mas próximo, política e ideologicamente, do regime do Estado Novo. O San Payo não era propriamente um grande cineasta. Era sobretudo um bom retratista.

De qualquer modo, o leitor hoje tem curiosidade em saber mais alguns pormenores sobre o Cruzeiro, tais como o número e o tipo de passageiros (Quadro I) bem como o preçário, por classes (Quadrto II):

Quadro I— Passageiros oficialmente inscritos  no I Cruzeiro de Férias às Colónias, por categoriaqs  (entrre parènteses o número de mulheres)

  • Estudantes = 69 (6)
  • Professores =  19 (2)
  • Família / Convidados = 93 (31)
          Total = 181

 Fonte: Roteiro do I Cruzeiro de Férias às Colónias de Cabo Verde, Guiné, S. Tomé e Príncipe e Angola, iniciativa do ‘Mundo Português’ , 1935, Biblioteca Fernando Pessoa, pp. 26-31. (cit por Sílvia Espírito-Santo (2019: 109).


As mulheres (tiranda as da classe alta) ainda viajavam pouco em 1935: neste cruzeiro representam apenas 21,5% do total de 181 passageiros. 

 O número total de passageiros rondaria os 200, segundo o filme de San Payo (1936). Mas este número é controverso. Entre eles, incluia-se o popular ator do teatro de revista, Estêváo Amarante (Lisboa, 1894 - Porto, 1951).

Quanto ao preço dos bilhetes... Bom, havia 3 classes, como era normal na época. Os nossos emigrantes viajavam em 3ª classe.

Quadro II— Tabela de Preços para o  I Cruzeiro de Férias às Colónias por  Classes (Alunos e professores;  Família de alunos e de professores)

Classes: Alunos e professores / Valor

  • 1.ª  > 3.000$ 
  • 2.ª > 2.500$
  • 3.ª  > 2.000$ 
Classe: Família de alunos e de professores / Valor

  • 1ª > 3.500$ 
  • 1ª > 3.000$ 
  • 3ª > 2.500$

Fonte: A. Cunha, «Os cruzeiros de Férias às colónias», in Mundo Português, vol.1, 1934, p.  306  (cit por Sílvia Espírito-Santo (2019: 105).

Segundo o organizador,Augusto Cunha, o  preço do bilhete não reflectia os preços de mercado dado que o Cruzeiro beneficiava de facilidades concedidas pela Companhia Nacional de Navegação e pelo Caminho de Ferro de Benguela, além do subsídio estatal.

2. O que se comprava, em Lisboa, em 1935 com 150 mil escudos portugueses (1 milhão de euros a preços de hoje) ? Qual era o salário médio, na função pública ?

Com a ajuda da assistente de IA /ChatGPT, apurámos que era um "pipa de massa"...Se não, vejamos:


(i) O poder de compra de 150 contos em 1935 (1 conto= 1000 escudos)

Com base em estudos do INE, Banco de Portugal e cálculos de historiadores económicos (como Jaime Reis, Pedro Lains, Nuno Valério), 150 mil escudos em 1935 equivaleriam grosso modo a cerca de 1 milhão de euros de 2025 ( um valor coerente com o índice de preços ao consumidor e a evolução dos salários reais)

(ii) O que se podia comprar em 1935 com este dinheiro




Conclusão: om om 150 000 $00, uma família podia: (i) comprar uma casa confortável em Lisboa
e mobilá-la, (ii) comprar um automóvel e (iii) ainda ficar com capital investido,,, Era um valor
de elite, correspondente ao rendimento de um médico abastado, industrial ou proprietário rural.


(iii) Salários na função pública (Lisboa, 1935)



Conclusãoo: 150 000 $00 correspondiam a 5 a 10 anos de salário de um diretor-geral,ou 20 a 30 anos de salário de um funcionário médio; 50 anos do "salário mínimo" (figura jurídico-económica que ainda não existia)

(iv) Síntese comparativa (entre 1935 e 2025) (1$00=6,666 euros, em termos de poder de compra)

  • Salário médio anual na função pública > c. 6 contos = c. 40 mil euros | Idêntico ao rendimento de um indivíduo da classe média atual (em Portugal);
  • 150 contos = c. 1 milhão de euros | Fortuna pessoal.
Podemos concluir, sem exagero, que não eram módicos os preços cobrados aos estudantes, professores e famílias...Pelas nossas contas. e considerando que um 1 escudos em 1935 valeria hoje 6,666 euros, esse cruzeiro de menos de dois meses custaria, para um estudante ou um professor, o seguinte, conforme a classe escolhida: 
  • 20 mil euros (1ª classe); 
  • 16,7 mil euros (2ª classe); 
  • 13, mil euros (3ª classe).

Convenhamos, terá sido um cruzeiro só para meninos ricos ou de classe média-alta (como o Ruy Cinatti, por exemplo). Até porque os filhos do povo náo frequentavam, nessa época, o liceu.
________________

Fonte consultada: 

Sílvia Espírito-Santo: O 1.º Cruzeiro de Estudantes às Colónias (1935): 'Uma Excursáo Onde Havia de Tudo'. In: Castro, Maria João, coord. Empire and Tourism: An Anthology of Essays. 1.ª ed., Lisboa, abril 2019. Universidade Nova de Lisboa, pp. 103-112. https://run.unl.pt/bitstream/10362/61873/1/Impe_rio_e_Turismo_MIOLO.pdf

(Pesquisa: LG + Assistente de IA / ChatGPT)
(Revisão / fixação de texto, título, negritos: LG)
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Notas do editor LG:

(*) Vd. poste de 4 de novembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27386: 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente (Cabo Verde, Guiné, S. Tomé e Príncipe e Angola, 10 de agosto - 3 de outubro de 1935), de que foi diretor cultural o jovem e brilhante professor Marcello Caetano - Parte III: um documentário de hora e meia, que diz muito (até pelo que omite) sobre o que era o "ultramar português" há 90 anos

(**) Último poste da série : 6 de novembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27391: 1º Cruzeiro de Férias às Colónias do Ocidente (Cabo Verde, Guiné, S. Tomé e Príncipe e Angola, 10 de agosto - 3 de outubro de 1935), de que foi diretor cultural o jovem e brilhante professor Marcello Caetano - Parte IV: impressões de viagem do Ruy Cinatti: Mindelo e Bolama

Guiné 61/74 - P27397: Notas de leitura (1860): "Ecos Coloniais", coordenação de Ana Guardião, Miguel Bandeira Jerónimo e Paulo Peixoto; edição Tinta-da-China 2022 (5) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 3 de Novembro de 2025:

Queridos amigos,
A itinerância começa na Praça do Império, espaço onde tem havido controvérsia que não se confina só à toponímia, tem a ver com brasões, não foi por puro acaso que aqui incluí uma entrevista a quem sabe da poda, a professora Isabel Castro Henriques, afinal não se pode viver sem passado, aquela Praça foi urbanizada aquando da Exposição do Mundo Português, guarda aqueles cavalos marinhos colossais de uma escultura que fez parte da época, como há um conjunto de bustos desse evento que podem ser vistos no Jardim Botânico Tropical. É de questionar se o dever de memória não deve estar exposto sem retoques ou disfarces, é duvidoso que este espaço público e outros ainda estimulem o sentimento de nostalgia em relação a um passado glorioso. As novas gerações não guardam nenhum travo amargo de um império que se tornou lusofonia. Indo por aí fora fomos até à Rua do Poço dos Negros, tudo indica que aí houve um influente bairro africano, e sob a expressão Poço dos Negros também há debate dos especialistas. É a penúltima viagem, tudo terminará a falar das Ruas Gilberto Freyre e Viriato da Cruz e do acervo monumental que está guardado na Sociedade de Geografia de Lisboa.

Um abraço do
Mário



Império e colonialismo: reverberações na Lisboa atual - 5

Mário Beja Santos

Ecos Coloniais resulta de um exercício coletivo de investigação sobre o património histórico e cultural, aqui se interrogam instituições, entidades, monumentos, obras de arte, palácios onde se interseccionam a história colonial e imperial portuguesa, do passado ao presente, edição ilustrada com fotografias de Pedro Medeiros e o acervo de textos tem a coordenação de Ana Guardião, Miguel Bandeira Jerónimo e Paulo Peixoto, edição Tinta-da-China 2022. Logo na introdução, os organizadores referem que este levantamento é uma obra consciente e que há muito por investigar e por saber, importa evitar generalidades e simplismos mobilizadores para escapar aos engenheiros e empreendedores da “história” e da “memória”.

A Praça do Império, tal como a conhecemos hoje, foi construída em 1940, para a Exposição do Mundo Português. O projeto do jardim na Praça foi desenhado pelos arquitetos Cottinelli Telmo e Vasco Lacerda Marques, bem como as esculturas de cavalos-marinhos. A escolha deste local não foi arbitrária, fazia parte do projeto de simbiose entre a memória do Estado Novo e a memória dos grandes feitos portugueses, estão ali o Mosteiro dos Jerónimos e a Torre de Belém, bem como o Padrão dos Descobrimentos, construído com materiais perecíveis no tempo da Exposição e reconstruído em 1961.

Quando ocorreu a renovação da Praça do Império no âmbito da reurbanização da zona de Belém estalou a controvérsia, houve quem propusesse um restauro arquitetónico para retornar ao projeto original de 1940, o que impunha a retirada dos brasões florais colocados em 1961; houve igualmente quem defendeu a manutenção dos brasões florais, para a continuidade do conhecimento acerca da história do Império Português. Um ponto curioso deste debate é que nenhuma das posições pôs em discussão a denominação da Praça do Império, atualizada em 2021. Não é despiciendo recordar que na Exposição do Mundo Português, a Praça do Império era um centro articulador do evento que tinha nas proximidades “aldeias indígenas”. Ali estavam 138 “indígenas” provenientes do mundo colonial, Fulas e Bijagós da Guiné, Muchopes e Macondes, de Moçambique, havia mesmo uma aldeia de moleques para que as crianças indígenas pudessem brincar.

Passando à atualidade, os brasões florais da Praça do Império contribuíram para a renovação da imagem do Império. A questão está longe de ser pacífica, e deixamos ao leitor o teor de uma entrevista a Isabel Castro Henriques, uma historiadora que conhece bem a presença africana em Lisboa (https://amensagem.pt/2021/08/11/entrevista-isabel-castro-henriques-historia-colonial-roteiro-lisboa-africana-destruicao-simbolos-coloniais-padrao-descobrimentos/).

Mudamos agora de percurso, da Praça Luís de Camões vamos pelo Loreto até ao Calhariz e descemos a Calçada do Combro, lá em baixo está a Rua do Poço dos Negros que cruza com a Travessa do Poço dos Negros. O autor do artigo referente a este lugar dá-nos informação:
“Em finais do século XIX, descrevendo a cidade de Lisboa que debruçava sobre o rio Tejo, Júlio de Castilho publicou uma carta escrita por D. Manuel I ao Senado de Lisboa, em 13 de novembro de 1515, dedicada explicitamente ao problema da sepultura dos escravizados. Quando faleciam eram atirados em lugares próximos do centro da cidade. Eles não eram bem soterrados, os cães podiam comê-los; e que a maior parte destes escravos se lança no alto que está junto da Cruz de Pau, localizada no caminho que vai da porta de Santa Catarina para Santos. E que posto que nisso tenham previsto penas, e promulgado tudo o possível, não se remediou como deve.”

Assim sendo o Rei decidiu que o melhor remédio seria fazer um poço no qual se lançariam os ditos cadáveres; para acelerar o processo da decomposição decretou que se deitasse de quando em quando uma certa quantidade de cal virgem. Júlio de Castilho reconhecia, na descrição topográfica do documento quinhentista, as encostas de Santa Catarina, que atualmente coincidem com o trajeto do Elevador da Bica com o Miradouro do Adamastor e interrogava-se se estaria nisto a origem do Poço dos Negros. Isabel Castro Henriques e José Sarmento de Matos chegaram a duas conclusões divergentes. Ela reforçou a hipótese proposta por Júlio de Castilho. Fora das portas de Santa Catarina, localizadas no atual largo do Chiado, estendia-se o bairro do Mocambo, ocupava uma área que incluía o bairro que atualmente é conhecido por Madragoa. O termo africano mocambo, da língua umbundo e corresponde ao termo quilombo, da língua quimbundo. O facto da Rua e a Travessa do Poço dos Negros se encontrarem nesta superfície contribui para corroborar a hipótese de uma alta concentração de população negra nesta parte da cidade (mocambo ou quilombo significava nas citadas línguas africanas pequena aldeia ou refúgio).

Sarmento de Matos contrariou a hipótese de Júlio de Castilho e a investigação de Isabel Castro Henriques, oferecendo outra explicação ligada à presença, na mesma área, do Mosteiro de S. Bento. Ele fundamenta-se na instalação na cidade dos beneditinos cluniacenses, que se diferenciavam dos beneditinos cistercienses, vestidos de branco, por levarem uma capa de cor negra, razão pela qual seriam chamados Padres Negros. No limite sul da propriedade do Mosteiro encontrava-se um poço de água que os religiosos deixavam a população utilizar. Por isso, em sua opinião os topónimos da Rua e da Travessa subentendem o significado do poço de água dos Padres Negros. Na atualidade, a Rua do Poço dos Negros integra os circuitos do turismo histórico organizado por Associações de afrodescendentes, como um dos marcos da presença africana na cidade de Lisboa.

A dificuldade em assumir radicalmente este passado traumático levou Sarmento de Matos a afirmar que estes escravos, por serem batizados, não havia legitimidade na prática de atirar corpos de cristãos para poços. Porém, o documento de 1515 revela um pormenor muito interessante. Os escravizados que, falecidos, não eram sepultados na maneira devida para evitar pestilências, eram dos tratadores da Guiné. Esses corpos pertenciam, provavelmente, aos escravizados que ainda não tinham sido vendidos ou que tinham falecido no mercado da Casa da Guiné e Mina. Os escravos eram vendidos no mercado próximo da praça do Pelourinho Velho (hoje em frente à Igreja de Santa Madalena, a caminho da Igreja de Santo António e da Sé de Lisboa). Assegurar uma sepultura digna constituía uma das principais finalidades das confrarias de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos. Os escravizados recém-chegados, ainda propriedade dos comerciantes escravistas, não beneficiavam destas formas de proteção, e o abandono dos seus corpos representava, provavelmente, a principal causa da prática que vem no documento de D. Manuel I.

O Poço do Negros de Lisboa inseria-se numa área que se tornou zona habitacional da população africana ou afrodescendente na cidade. O bairro do Mocambo é descrito como o segundo dos seis bairros em que Lisboa estava organizada, e incluía as freguesias de Santos-o-Velho, Santa Catarina, São Paulo, Nossa Senhora do Loreto e Chagas, isto é, a vasta faixa da parte ocidental da cidade que ficava fora das muralhas da época fernandina.

A Rua do Poço dos Negros faz parte do debate público, em que é dado destaque aos descobridores portugueses e à epopeia marítima sem nenhuma denúncia das implicações do tráfego negreiro transatlântico. Observa o autor que são postas placas que assinalam a história dos lugares conexos com a vivências das pessoas negras, crê-se ser inevitável que a Rua do Poço dos Negros seja um desses lugares contemplados.

Deixamos para uma última intervenção as ruas Gilberto Freyre e Viriato da Cruz, detendo-nos com mais detalhe na Sociedade de Geografia de Lisboa, por razões óbvias.
Padrão dos Descobrimentos, escultura de Leopoldo de Almeida
A Cruz de Cristo no jardim em frente aos Jerónimos, a Praça do Império tem recordações coloniais que ainda dão controvérsia
Perto da Praça do Império temos o Jardim Botânico Tropical, ali aparecem esculturas do tempo da Exposição do Mundo Português, 1940
Rua do Poço dos Negros na atualidade

(continua)
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Notas do editor:

Vd. post de 31 de outubro de 2025 > Guiné 61/74 - P27370: Notas de leitura (1857): "Ecos Coloniais", coordenação de Ana Guardião, Miguel Bandeira Jerónimo e Paulo Peixoto; edição Tinta-da-China 2022 (4) (Mário Beja Santos)

Último post da série de 7 de novembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27395: Notas de leitura (1859): "Amok", por Stefan Zweig; Lisboa: Relógio D'Água, 2022 (Jaime Bonifácio da Silva, ex-Alf Mil Paraquedista)

Guiné 61/74 - P27396: Ser solidário (290): Relatório de Atividades, Outono de 2025, da Missão Solidária da ONGD Afectos com Letras à Guiné-Bissau

1. Mensagem da ONGD Afectos com Letras, com data de 6 de Novembro de 2025
afectoscomletras@gmail.com

Assunto: Relatório da Missão Solidária da ONGD Afectos com Letras à Guiné-Bissau


A ONGD Afectos com Letras tem o prazer de partilhar convosco o Relatório da Missão Solidária à Guiné-Bissau, realizada entre os dias 25 de outubro e 1 de novembro de 2025.
Esta missão teve como objetivo reforçar o nosso compromisso com a promoção da educação, da saúde e da solidariedade, através da implementação de iniciativas de apoio às comunidades locais.

O relatório que enviamos em anexo apresenta um resumo das ações desenvolvidas, dos resultados alcançados e das perspetivas de continuidade dos projetos apoiados.

Agradecemos a todos os voluntários, parceiros e entidades que contribuíram para o sucesso desta missão, cuja concretização apenas foi possível graças ao vosso apoio e confiança no trabalho da ONGD Afectos com Letras.

Com os melhores cumprimentos,
A Direção

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Associação Afectos com Letras - Organização Não Governamental para o Desenvolvimento (ONGD)
Rua Engº Guilherme Santos, 2
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venha estar connosco no www.facebook.com/afectoscomletras

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Nota do editor CV:

Último post da série de 28 de setembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27264: Ser solidário (289): Bilhete-postal que vai dando notícias sobre a "viagem" da campanha de recolha de fundos para construir uma escola na aldeia de Sincha Alfa - Guiné-Bissau (16): Mercatino em Merano (Itália) no dia 04 de outubro de 2025 (Renato Brito)

Guiné 61/74 - P27395: Notas de leitura (1859): "Amok", por Stefan Zweig; Lisboa: Relógio D'Água, 2022 (Jaime Bonifácio da Silva, ex-Alf Mil Paraquedista)



1. Mensagem do nosso camarada Jaime Bonifácio Marques da Silva, ex-Alf Mil Paraquedista da 1.ª CCP/BCP 21 (Angola, 1970/72), com data de 5 de Novembro de 2025:


MEMÓRIAS (À MARGEM) DA GUERRA

Notas de leitura do livro de Zweig, Stefan (2024). AMOK. Lisboa: Relógio d´Água. Esta obra foi publicada pela primeira vez, na Alemanha, em 1922.

Preâmbulo ao uso do termo amok

Na vida, quando olhamos, ao acaso, para os títulos dos livros bem arrumadinhos, algures numa estante, alguns deles, num ápice, espoletam em nós memórias e transportam-nos para locais e vivências, há muito tempo, arrumadas no sótão do esquecimento.
Aconteceu-me isso, recentemente, quando descobri este livro com o título AMOK.

Recordou-me o momento, em que, pela primeira vez, ouvi prenunciar a frase: deu-lhe o amok. Foi em Ninda, leste de Angola – Terras do Cú de Judas. Em fevereiro de 1970, quando fui render o Tenente paraquedista Grão no comando do 3.º Pelotão da 1.ª CCP do BCP 21. A companhia estava em plena fase operacional e, segundo me fui apercebendo, cada um dos 4 pelotões tinham encontrado forte resistência na zona.

Entretanto, nas conversas que ia travando com os meus novos camaradas de armas, ouvia-os pronunciar, regularmente, uma expressão que nunca tinha ouvido e desconhecia: “deu-me o amok, assaltámos a base e demos cabo daquilo tudo” ou, ainda, “cuidado com o gajo porque ele hoje, está com o amok” ou, ainda, “ninguém pode falar contigo, vai-te curar, estás com o amok”.

Com o tempo fui interiorizando o significado desse termo. Fui percebendo que se referia a alguém que se tinha “passado dos carretos”, “não via nada à sua frente” ou que “estava apanhado do clima”!... Foi neste contexto que fui assimilando o sentido do termo, de tal modo que, ao longo da vida, com alguma frequência e, em circunstâncias de menor ânimo, dizia para comigo: “hoje, não estás bem!... Hoje, estás com o amok”!...


1. Sobre o livro AMOK

Porém, ao folhear o livro de Stefan Zweig, vim a descobrir a origem e o significado do conceito de amok.

“ é um termo retirado da cultura Indonésia e significa “lançar-se furiosamente na batalha”. As pessoas afetadas por este estado psíquico têm ataques de fúria cega e procuram aniquilar os que consideram seus inimigos e quem quer que se interponha no seu caminho, sem consideração pelo perigo que correm”. (Zweig, 1992, capa)

Sobre o termo, transcrevo, ainda, o diálogo travado entre duas personagens do livro Amok:
“… O senhor sabe o que é o amok?
- Amok?... A palavra diz-me qualquer coisa… Não é uma espécie de inebriamento entre os malaios?
- É mais do que um inebriamento… é a perfeita loucura, uma espécie de raiva que atinge o ser humano… um ataque de monomania assassina, irracional, sem qualquer termo de comparação com outra forma de intoxicação alcoólica… eu próprio, durante a minha estadia nos trópicos, estudei alguns casos de amok –
“(…) tem, de certa forma, a ver com o clima, com aquela atmosfera abafada e sufocante que se abate, qual trovoada, sobre os nossos nervos até explodir, por fim…” (…) … mas quem está sob o domínio do amok, fica cego e não vê para onde se precipita … (…) não houve nada nem ninguém, não vê nada à sua volta.”
(Ibidem, 39 a 41)

Stefan Zweig na obra AMOK coloca o “narrador a contar a sua viagem de Calcutá para a Europa a bordo do Oceania. Num passeio noturno na coberta do navio, encontra um médico preocupado e assustado e que evita qualquer contato social. Este vai contar-lhe o que o levou a uma relação obsessiva por uma mulher que o colocou em estado de amok” (Ibidem: contra capa).


2. Sobre a biografia do autor

Como se refere na capa do livro, Stefan Zweig nasceu em Viena em 1881. Era filho de um industrial e estudou História, Literatura e filosofia. Aos 17 anos escreve já em revistas modernistas. Praticou os mais diversos géneros literários, do romance ao teatro. Em todos os géneros procurou detetar as forças do irracional no coração da natureza humana.

Com a subida de Hitler ao poder em 1933, vê as suas obras serem destruídas em Munique. É forçado a partir para a Grã-Bretanha, de onde viaja para o Brasil em 1936 e depois para Nova Iorque, tendo visitado Portugal em 1938. 

 A 10 de setembro de 1939 escreve a Romain Rolland (1886-1944): “Não vejo qualquer saída para este terrível lamaçal”. Regressa ao Brasil em 1940 e em 1942 suicida-se com a mulher em Petrópolis.

As suas memórias, O Mundo de Ontem, de 1942, terminam com uma frase: “em última análise, cada sombra é também filha da luz, e só aqueles que experimentaram a luz e as trevas, a guerra e a paz, a ascensão e a queda viveram verdadeiramente.”

Jaime Silva, Lourinhã, 1.11.2025

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Nota do editor

Último post da série de 3 de novembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27382: Notas de leitura (1858): "Atlas Histórico do 25 de Abril", por José Matos; Guerra e Paz, 2025 (1) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P27394: A nossa guerra... a Petromax (2): o destacamento da Ponta do Inglês (jan 65 /out 68), onde a iluminação do perímetro de arame farpado era feita com garrafas de cerveja cheias de querosene (António Vaz, 1936-2015)




Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Xime > Ponta do Inglês > O destacamento da Ponta do Inglês, um dos muitos "bu...rakos" onde viveu gente nossa , entre janeiro de 1965 e outubro de 1968. Teve um gerador que nunca chegiu a funcionar. Nem petromax tinha ! (*)

(...) "As garrafas de cerveja penduradas no arame farpado, cheias de combustível, tinham que ser continuamente acesas nas noites de chuva forte ou de vento. O risco que a malta corria nessas circunstâncias, sendo a única coisa iluminada na escuridão, tornando-se um alvo fácil era enorme, embora, que me lembre, nunca tenha havido flagelações nessas alturas. (...)

As garrafas também funcionavam como sistema de deteção e alerta: a aproximação de elementos IN do arame farpado, fazia-as tilintar... O sistema acabava por ser pouco fiável devido ao vento, à chuva e... aos macacos-cães.

Ilustração de Vera Vaz, filha do nosso camarasa António Vaz  (2012). 



António Vaz (1936-2015)
1.  Nunca será demais lembrar os "bu...rakos" onde vivemos, como toupeiras.

Um dos mais famigerados foi o da Ponta do Inglês, no subsetor do Xime (sector L1). O topónimo tem já perto de meia centena de referências no nosso blogue. Mesmo depois da retirada das NT, a Ponta do Inglês continuou a ser um nossos "ossos duros de roer". Havia sempre contacto com o IN, quando as NT progrediam na antiga estrada Xime-Ponta do Inglês, há muito invadida pelo mato e interdita. No dia 26 de novembro, vai fazer 55 anos que a CART 2715 (Xime, 1970/72) e a CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71) sofreram uma brutakl emboscada com 6 mortos e 9 feridos graves (Op Abencerragem Cadente) (mais um revés nas NT que não vem referido no livro da CECA, correspondente à atividade operacional de 1970/74)


Excerto de um poste nosso saudoso camarada 
António Vaz (1936-2015),ex-cap mil, CART 1746
 (Bissorã e Xime, jul 1967/jun 69) (fot0 de 2012,
à direita).
 



O destacamento da Ponta do Inglês
onde nem petromax havia

por António Vaz (1936-2015)


A Cart 1746 saiu de Bissorã a 7 de Janeiro de 1968,  seguindo de Bissau para o Xime via Bambadinca,  a bordo da barcaça Bor. 

Um Grupo de combate seguiu diretamente para a Ponta do Inglês onde rendeu o pessoal da CCAÇ 1550.

Este Pelotão da Cart 1746 era comandado pelo alf mil Gilberto Madail (hoje uma figura pública) que lá permaneceu cerca de 4 meses,  sendo substituído por outro,  comandado pelo alf mil João Guerra da Mata que lá esteve até 8 de otubro, data em que este destacamento foi abandonado (por ordem do comando-chefe).


Francisco Pinheiro
Torres de Meireles (1936-1965).
Era natural de Paredes. Tem nome de rua
no Porto.

A Ponta do Inglês foi ocupada e os abrigos construídos em dezembro de 1964 na Op Farol pela CCAÇ 508,  comandada pelo malogrado cap inf Pinheiro Torres de Meireles (1936-1965), morto em combate na Ponta Varela (**).


Este destacamento teve sempre uma triste sina porque não tinha meios senão para..
 estar. 

A dispersão de meios que encontrámos no sector L1 a isso conduzia. Nunca serviu de nada a não ser castigar, sem culpa formada, as guarnições que para lá eram enviadas.

Não controlavam nada na foz do Corubal e nada podiam fazer em conjunto com o pessoal do Xime para manter aberto o itinerário Ponta do Inglês / Xime porque a companhia do Xime ocupava também Samba Silate, Taibatá, Demba Taco 
e Galomaro. Assim o seu isolamento era, foi, 
praticamente total.

Os géneros só a Marinha os podia levar e o mesmo se pode dizer das munições, correio, tabaco, combustível, etc.

A chegada dos abastecimentos era motivo de alegria geral como se pode ver nas imagens que junto.

Por muito que o pessoal controlasse os gastos, a falta de quase tudo fazia-se sentir. Bem podia o comando da companhia pedir insistentemente pela vias normais a satisfação dos pedidos que não conseguíamos nada. 

Cheguei a tentar meter uma cunha directamente na Marinha, mas as prioridades eram outras. Como alguns géneros recebidos da companhia que lá tínhamos rendido,  estavam deteriorados, a situação ainda foi pior. Esta situação originou, a pedido do alf Madail, o Fado da Fome,  que o Manuel Moreira ilustrou nas quadras populares da sua autoria.

O destacamento da Ponta do Inglês era a pequena distância da margem (direita) do Rio Corubal e tinha a forma quadrangular. A guarnição era formada por 1 GComb  / CA RT 1746 + 1 Esq/Pel Mort 1192 + Pel Mil 105.

O destacamento era formado por 4 abrigos principais nos vértices para o pessoal, para a mecânica e rádio. O combustível e as munições ficavam na parte mais perto do Corubal; na parte central sob uma árvore frondosa (poilão ?) um abrigo mais pequeno onde ficava o alferes, o enfermeiro e logo ao lado o forno do pão e uma cozinha, tudo muito rudimentar. 

Tinha o espaldão do morteiro 81 na parte central. Não tinha, ao contrário do Xime, paliçada e apenas duas fiadas de arame farpado.

Os abrigos eram de troncos de palmeira com as indispensáveis chapas de bidão, terra e não eram enterrados. Uma saída na direcção do rio e outra no lado oposto para as idas à água e à lenha. No destacamento havia um Unimog para estas tarefas.


Manuel Vieira Moreira
(1945-2024)
ex-1º cabo mec auto
A água era tirada a balde de um poço existente a cerca de 700 metros do arame farpado que também era utilizado pela população, totalmente controlada pelo IN, e pelo próprio IN, sem nunca este ter aproveitado as nossas idas à água e à lenha para nos incomodar e vice-versa


Escreveu  o Manuel Moreira (1945-2014)

O poço era um só,
Estava longe do abrigo,
Dava a água para nós
E também p’ro Inimigo.

Nunca percebi por que razão se fez o Destacamento, afastado do único poço com água potável... Uma proposta de sã convivência? O caso é que resultou.

O que se passou nos tempos infindáveis em que o gerador esteve avariado, assunto já abordado neste blogue, por quem o foi substituir, depois de aturados 
pedidos a Bissau sem que se resolvesse em tempo útil,   é inenarrável. (***)

As garrafas de cerveja penduradas no arame farpado, cheias de combustível,  tinham que ser continuamente acesas nas noites de chuva forte ou de vento. O risco que a “malta” corria nessas circunstâncias, sendo a única coisa iluminada na escuridão, tornando-se um alvo fácil era enorme, embora, que me lembre,  nunca tenha havido flagelações nessas alturas.

Flagelações houve muito poucas (seis),  sem grandes consequências, a água do poço nunca foi envenenada e mesmo sabendo que a resistência oferecida pelas NT, aquando dos ataques, fosse de nutrido fogo mantendo o IN em respeito, penso que este nunca empenhou efectivos suficientes e capazes para provocar danos consideráveis. 

No fundo o IN sabia que,  enquanto aquele pessoal ali estivesse enquistado, a tropa do Xime, com a dispersão acima referida, estaria muito menos apta a fazer operações complicadas.

As relações entre o pessoal podem considerar-se muito boas,  não havendo atitudes condenáveis, que até seriam possíveis num ambiente concentracionário como aquele. 

A convivência com a milícia logo de início se mostrou muito favorável porque, abastecendo-se de géneros junto das NT, passaram a pagar muito menos do que anteriormente,  porque os preços eram os mesmos que nos eram debitados sem alcavalas de qualquer espécie. 

Não me recordo da existência de familiares a viverem com o pessoal africano, mas segundo o testemunho do tabanqueiro Manuel Moreira, uma mulher deu à luz na época em que lá esteve e foi o 1.º cabo aux enf Cordeiro Rodrigues, o " Palmela", ajudado por ele que assistiram ao parto.

Com a falta de géneros tudo se aproveitava incluindo a caça, que se resumia a tiro de rajada para bandos de aves grandes, pernaltas (não sabemos quais) e se caiam nas redondezas eram o pitéu desse dia. 

As noites eram passadas como se calcula, com as sentinelas nos quatro cantos do quadrado e a malta a ver e a ouvir os rebentamentos que vinham da direcção de Jabadá, de Tite, Porto Gole e do Xime, claro. Pode ser sinistro mas não é difícil pensar que muitos diriam: 

− Antes eles do que nós!...

Como de costume, depois das tarefas de rotina, quando o calor era menos intenso, seguia-se o eterno futebol com bolas dadas pelo Movimento Nacional Feminino (MNF), de péssima qualidade, substituídas pelas tradicionais trapeiras. 


João Guerra da Mata

Num dos reabastecimentos que se fizeram conseguimos levar, para além de gado mais miúdo, algumas vacas que, como sabemos, na Guiné são de pequeno porte. 

Como o futebol também farta,  houve alguém que sugeriu tourear uma das vacas que ainda estava viva para tardios bifes.

Foi uma festa com as peripécias inerentes à Festa Brava e todos os dias “a las cinco en punto de la tarde” soltava-se a vaca e era um corrupio de faenas com cornadas… incompetentes. O tempo foi passando e já só restava um dos pobres animais para animar os fins da tarde. 

Como o reabastecimento nunca mais chegava e o atum com arroz já não se podia ver, e muito menos comer, o alf Mata teve de decidir entre o partido pró-tourada e o partido pró-bife. 

Não foi fácil, mas acabou por vencer este último. Convocou-se o soldado condutor J. Viveiro Cabeceiras que também era padeiro, magarefe e pau para toda a obra, que procedeu à matança. Começando a esquartejar a rês,  vai ter com o Alferes e informa-o que a vaca estava tísica, pulmões quase desfeitos. 

 
− Come-se a vaca ou não se come a vaca? 

Nova discussão e resolveu-se não aproveitar as vísceras e apenas o músculo. Assim se comeu carne assada sem problema de maior. Quando esta acabou voltou-se ao atum aos enlatados,  tudo coisas que já escasseavam mas o pessoal andava triste com a falta dos fins de tarde taurinos. Então o Cabeceiras foi ter com o alferes Mata e disse-lhe:

- Meu alferes, a malta anda tão triste que se quiser e autorizar eu faço de vaca pois guardei os... cornos.

E assim de conseguiram mais uns fins de tarde…

Felizmente com a redistribuição das Forças no terreno, iniciada pelo brig Spínola, foi a Ponta do Inglês evacuada sem problemas em 7 e 8 de Outubro de 1968, pondo-se fim ao disparate da sua existência. 

Há uma enorme falta de informação (para mim) sobre a evacuação da Ponta do Inglês; nem na história do BART 1904, nem na da CART 1746, apenas é mencionada a data em que se efectuou. 

Tenho ideia que,  para além do pelotão da CART  1746,  da secção  de Morteiros e do pelotáo de milícia,  estiveram na Ponta do Inglês pessoal de outras unidades a montar segurança (mas quais?) enquanto o pessoal carregava a barcaça Bor de todo o material e bagagem da rapaziada. Estivemos nas imediações da Ponta Varela a assegurar a passagem da Bor a caminho de Bambadinca. Foi uma operação, para mim sem nome, que envolveu mais meios que não recordo.

Segundo informação de oficiais do BART 1904, o brig Spínola com o respectivo séquito aterrou na Ponta do Inglês, já ia adiantado o carregamento da Bor, mandando evacuar a segurança, depois de se ter armadilhado o que estava determinado... Só depois reparou que já não havia segurança nenhuma e que ele e os outros oficiais que o acompanhavam tinham ficado, como hei-de dizer, abandonados na margem do Corubal com o pessoal do ou dos helis a chamá-los quando se aperceberam da situação.

O pelotão da Cart 1746 chegou ao Xime sem problemas e todos tivemos uma enorme alegria por voltarmos a estar juntos. ....E na verdade o que vos doi... É que não queremos ser heróis (Fausto).

António Vaz (2012) (****)

(Revisão / fixação de texto, título: LG)

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Notas do editor LG:

(*) Vd poste de 4 de novembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27384: A nossa guerra... a petromax (1): Quem é que ainda se lembra dos candeiros a petróleo ? Em 1964, em Guileje, Gadamael, Ganturé, Sangonhá, Cacoca, Cameconde... Em 1967/68, em Ponate, Banjara, Cantacunda, Sare Banda, Ponta do Inglês...

(**) O que diz a CECA (2015):

(...) Em 19 e 20Jan65, realizou-se a operação "Farol",para ocupação e instalação dum aquartelamento na Ponta do Inglês. 

O ln emboscou as NT, sofreu baixas não estimadas e foram capturadas granadas de mão e de lança-granadas foguete. 

Em 20Jan, forças da CCaç 526 e CCav 678, durante um reconhecimento na área Ponta do Inglês - Buruntoni, destruíram um acampamento com 15 casas a cerca de 600 metros a sul da antiga tabanca da Ponta do Inglês, tendo capturado diversas munições; encontraram alguns abrigos no lado sul da Ponta do Inglês-Xime, no local da emboscada feita às NT em 19 e destruíram 2 casas a leste de Ponta do Inglês. (...)

Fonte: Excerto de: Estado-Maior do Exército; Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974). Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África; 6.º Volume; Aspectos da Actividade Operacional; Tomo II; Guiné; Livro I; 1.ª Edição; Lisboa (2014), pág  311.


Em comentário ao poste P7590 (****), o José Nunes, ex-1º cabo mec eletricidade, BENG 447, 1968/70; escreveu:

(...) "O aquartelamento da Ponta do Inglês estava operacional em abril de 1968, quando aí nos deslocámos pra montar o grupo gerador, ficava junto ao rio e não havia cais, o Unimogue avançou rio dentro até da LDP [Lancha de Desembarque Pequena] de onde se descarregou o gerados a pulso. 

A iluminação era feita [, até então,] com garrafas de cerveja com uma mecha, cheias de combustível, e as havia a servir de alarme, havia muitos macacos na zona que causavam problemas, ao agarrar o arame farpado da zona de protecção. Foi uma permanência de horas por causa das marés." (...)