“Pedimos desculpa, mas hoje
não há notícias”
por Luís Graça
Um dia gostarias de poder acordar sem notícias,
pois aí tens.
Sem notícias,
sem televisão.
sem jornais,
sem internet,
sem emails,
sem o facebook,
sem o twitter,
sem o blogue,
sem o teu blogue,
sem o ruído das ondas hertzianas,
sem radiações não-ionisantes,
sem mensagens,
sem mensageiros.
Nem sequer as duas últimas palavras
do locutor de serviço,
a pedir desculpa
por não haver notícias,
e a pensar que, muito provavelmente,
irá a seguir para o desemprego.
do locutor de serviço,
a pedir desculpa
por não haver notícias,
e a pensar que, muito provavelmente,
irá a seguir para o desemprego.
Um dia gostarias de poder acordar
com a notícia do fim da notícia,
ou nem sequer isso,
com a notícia do fim do circo mediático,
ou nem sequer isso.
Um dia gostarias de poder acordar
sem o teu robô,
sem o teu andróide,
a despertar-te,
e, logo de manhãzinha,
a despertar-te,
e, logo de manhãzinha,
a comandar o ritmo
e o sentido da tua vida.
e o sentido da tua vida.
Um dia gostarias de poder acordar
só com o buraco negro do ecrã,
à tua frente.
Um dia gostarias de poder acordar
no mais absoluto silêncio,
não ouvir sequer o ruído
do vaivém das ondas do mar,
ou nem sequer isso.
Só com o buraco negro do universo
em frente à tua janela.
Só com o buraco negro do universo
em frente à tua janela.
Um dia não gostarias sequer
de poder acordar.______________
Nota do editor:
Último poste da série > 19 de março de 2016 > Guiné 63/74 - P15876: Manuscrito(s) (Luís Graça) (78): Os homens medem-se pelas palavras...
3 comentários:
De uma poetisa que acabo de descubrir de seu Marta Luis
SALITRE
um dia,
visto-me de cal
E deixou-me secar
Desfarelarei...
O meu salitre
não é ferida
que sare
tapada
um dia
respirar vai ser
menos doloroso
do que andar assim,
revestida
de carpas
despida de mim
Marta Luís
POESIA FORA DE MÃO
Poetas da minha terra, da nossa tabanca, onde estais ?
Obrigado, Juvenal!... A poesia não enche a barriga, mas enche a alma... LG
Estive este fim de semana no Miradouro Sophia de Mello Breyner Andresen, no largo da Graça, em Lisboa... Obrigatório para quem visita Lisboa... Esta é uma das mais belas vistas desta cidade surpreendente, mal amada, mal conhecida dos próprios lisboetas... Quem nunca aqui veio, não conhece Lisboa, não ama Lisboa...
Não vou discutir se esta vista é suplantada ou não pela do miradouro da Senhora do Monte, que fica logo ali a 100 metros, mais acima... Todos os miradouros de Lisboa são fabulosos. Este fim de semana também fui ao Martim Moniz e subi ao último andar, o 6º, do centro comercial Martim Moniz (que faz parte da "Little China in Lisbon")... Tem um bar no topo, com um visão panorâmica, mais de 180 graus, da Graça à Mouraria e ao Tejo, em concha... Fabuloso, aconselha-se ir o fim da tarde, levar uma máquina fotográfica e saborear uma imperial (2,5 €)...
Mas o miradouro Sophia de Mello Breyner Andresen, mais conhecido pelo seu antigo nome, Miradouro da Graça, tem para mim múltiplos encantos... Um deles a homenagem (o busto e um poema em mural, Lisboa) a uma das minhas musas preferidas...Aqui fica a trancrição do poema, no dia mundial da poesia:
Lisboa
Digo:
«Lisboa»
Quando atravesso — vinda do sul — o rio
E a cidade a que chego abre-se como se do seu nome nascesse
Abre-se e ergue-se em sua extensão nocturna
Em seu longo luzir de azul e rio
Em seu corpo amontoado de colinas —
Vejo-a melhor porque a digo
Tudo se mostra melhor porque digo
Tudo mostra melhor o seu estar e a sua carência
Porque digo
Lisboa com seu nome de ser e de não-ser
Com seus meandros de espanto insónia e lata
E seu secreto rebrilhar de coisa de teatro
Seu conivente sorrir de intriga e máscara
Enquanto o largo mar a Ocidente se dilata
Lisboa oscilando como uma grande barca
Lisboa cruelmente construída ao longo da sua própria ausência
Digo o nome da cidade
— Digo para ver
1977
In Navegações, 1983
Cortesia de:
http://purl.pt/19841/1/1950/galeria/f27/foto1.html
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