sábado, 23 de junho de 2018

Guiné 61/74 - P18770: Os nossos seres, saberes e lazeres (273): De Aix-en-Provence até Marselha (5) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) com data de 18 de Abril de 2018:

Queridos amigos,
Muito havia a ver em Arles, a UNESCO consagra a arte romana e o românico provençal, mas há a modernidade que aqui se entrelaça, a memória de Van Gogh que por aqui andou, de Picasso que ofereceu uma soberba coleção e há a fotografia, o acervo do Museu Réattu é impressionante.
O viandante aqui acampou alguns dias, Avignon era perto, foi-se de comboio de manhã e regressou-se à noite, às vezes sente-se um amargor de tudo aquilo que não se vê porque o tempo não é elástico, nem se pôs os pés na Camarga, havia uma vontade imensa de visitar o teatro antigo de Orange e apanhar um banho de Picasso em Les Baux-de-Provence, fica para a próxima, é para isso que servem as viagens, para deixar saudades e apetite desbragado para regressar, tal a imensidão de belezas que não se podem abraçar em tão poucos dias.

Um abraço do
Mário


De Aix-en-Provence até Marselha (5)

Beja Santos

O viandante entrou lampeiro neste reduto da Roma das Gálias, Arles, outrora uma encruzilhada comercial da maior importância, o Ródano passa na sua berma, bem caudaloso. Dos tempos medievos pouco resta, há esta porta fortificada, suficientemente impressionante para não se ficar aqui especado, sem se saber muito bem o que o miolo da cidade nos reserva, mesmo sabendo que os testemunhos do período romano são de um valor enorme, bem como o românico provençal.


O viandante já entrou na capital romana e refúgio de Van Gogh, pertenceu ao Condado da Provença-Barcelona, veio depois a Casa Anjou, a partir do século XIII a cidade entrou numa doce obscuridade, mas há marcas de valor estético, na arquitetura e na decoração, o turismo foi imperativo para a manutenção de um casco histórico de incontestável interesse, acresce que Arles se orgulha de ter um poderosíssimo centro internacional de fotografia e um museu romano em instalações modernas que é de uma enorme beleza. O viandante vai por ali fora, em demanda do monumento romano número 1, o anfiteatro.


O anfiteatro foi e é o símbolo da cidade. É semelhante ao anfiteatro de Nîmes, tanto nas suas dimensões (eixo longitudinal 136 metros, eixo transversal 108), como no que se refere à parede exterior. Tem duas ordens de arcadas e 60 eixos, que emolduram o exterior do edifício de forma oval. O anfiteatro continha 34 filas de assentos distribuídos por 4 ordens que permitiam a ocupação de mais de 20 mil lugares.


Esta construção foi provavelmente edificada durante as duas últimas décadas do século I, é uma construção idêntica não só à de Nîmes como ao Coliseu de Roma. O anfiteatro foi alterado na Idade Média para defesa da cidade. Três torres são disso testemunho. Entre as casas de habitação existentes no seu interior podiam ver-se, até ao século XIX, duas igrejas.


Quando as escavações puseram a descoberto as arenas, restabeleceu-se uma ligação à antiga tradição das lutas de gladiadores com as famosas corridas de toiros de Arles. O viandante está esmagado pelas possantes galerias, sente-se minorca diante desta grandeza do tempo dos imperadores flávios, e mais, vai encontrando indícios da continuidade da arquitetura antiga, a cultura grega na época helenística marca aqui presença.


Antes de partir para as Termas de Constantino, o viandante sentiu-se atraído por este caudaloso Ródano que vem lá dos confins da Suíça e vai todo buliçoso espraiar-se perto de Marselha, les Bouches du Rhône, um nome que aparece associado a uma importante região vinícola, ali produz-se bom vinho, exportado para todo o mundo.


O viandante sabia de antemão a fartura de sítios e monumentos que o esperavam em Arles, já se falou do anfiteatro, do teatro antigo, dos criptopórticos, da Igreja de S. Trófimo e do seu esplendoroso claustro, deu-se uma olhadela pela necrópole antiga e medieval, a peregrinação prossegue pelas termas de Constantino. As termas eram um ponto marcante da vida urbana na época romana, eram um marco de civilização para a fruição da higiene e um ponto de encontro. As termas de Constantino datam do século IV. O que aqui se vê dá a dimensão do que foi este edifício, os visitantes podem percorrer os locais do banho quente, tépido e frio, balneário e tudo mais.


O viandante não resistiu a ver esta parede adossada a construção mais moderna, é prática comum o aproveitamento do antigo, aqui resulta muito bem, impressiona o casamento entre Roma e a Idade Média, até chegar às beneficiações que a contemporaneidade permite. É bom de ver!


As termas romanas tinham características comuns. Os salões dos banhos, abobadados e fechados, alternavam com dependências abertas para o exterior. Os banhos eram aquecidos através de ar quente que circulava sob o pavimento apoiado em pilares.


A digressão termina na Fundação Vincent Van Gogh em Arles, veja-se a beleza da fachada, é uma casa de agenda carregada, desde exposições a programas de educação artística, há conferências, acolhimento de artistas, faz-se intercâmbio de obras de Van Gogh, vêm da Fundação em Amesterdão, à data, a obra de referência era L’entrée dans une carrière, datada de 1889.




Amanhã o viandante parte para Avignon, mas regressará a Arles, há museus a visitar, o Museu Réattu, um primor de pintura e fotografia e o museu de arte antiga, um reservatório colossal de arte romana. O palácio dos Papas, acreditem, é de uma monumentalidade esmagadora.

(Continua)
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 Nota do editor

Último poste da série de 16 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18745: Os nossos seres, saberes e lazeres (272): De Aix-en-Provence até Marselha (4) (Mário Beja Santos)

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