PAIGC > Conselho de Guerra > Reunãio de 11/5/1970 a 13/5/1970. Acta das reuniões. Detalha da Capa.
[Amílcar Cabral: (...) Este acto foi um acto de grande consciência política e um acto de independência. Foi um acto de grande acção e de capacidade dos nossos camaradas do Norte. É a primeira vez que numa luta de libertação nacional se mata assim três majores, três oficiais superiores que, nas condições da nossa luta, equivale à morte de generais. (...)]
Jorge Araújo, ex-fur mil op esp / ranger, CART 3494 / BART 3873 (Xime e Mansambo, 1972/1974); professor de eduxção física, docente do ensino superiro; nosso coeditor, autor da série "(D)o outro kado do combate"; régulo da Tabanca dos Emiratos,
GUINÉ: (D)O OUTRO LADO DO COMBATE:
A MORTE DOS TRÊS MAJORES NO CHÃO MANJACO
EM 20 DE ABRIL DE 1970 E A INTERVENÇÃO DE AMÍLCAR CABRAL NA REUNIÃO DO CONSELHO DE GUERRA TRÊS SEMANAS DEPOIS
1. - INTRODUÇÃO
Saúdo a oportuna e sentida homenagem pública aos "sete militares chacinados pelo PAIGC no Chão Manjaco", feita ontem pelo camarada Manuel Luís Lomba - P20879.
A narrativa lembra a todos os que nele estiveram envolvidos ou dele foram tendo conhecimento ao longo dos últimos cinquenta anos (1970.04.20-2020.04.20), alguns antecedentes históricos e respectivas consequências.
Como fazemos parte do último grupo, os que foram coleccionando informações avulsas, umas vezes da autoria dos que viveram muito de perto este horripilante acontecimento, enquanto informantes e/ou observadores privilegiados, outras, corolário de diferentes análises documentais que, por serem feitas em síntese, ficam amputadas de detalhes que podem influenciar a compreensão da sua totalidade.
Partindo dos diferentes comentários dos camaradas: Luís Lomba, Manuel Carvalho e, particularmente, do Valdemar Queirós, quando coloca no seu texto "também não me lembro da informação do PAIGC sobre o assunto" (e eu também não!), levou-me a indagar junto do Arquivo Amílcar Cabral, existentes na CasaComum, Fundação Mário Soares, algo relacionado com o tema.
Encontrei a "Acta informal das reuniões do Conselho de Guerra", realizada em Conacri, de 11 a 13 de Maio de 1970, três semanas após a consumação do Massacre, sendo este o primeiro (e único) documento «(D)o Outro Lado do Combate» que, no meu entender, faz fé quantos às motivações dos seus "actores" e "autores".
Sugiro, também, a leitura da entrevista dada ao "cmjornal", por Francisco Rodrigues, publicada em 30Mar2008, um dos militares que esteve na recuperação dos corpos dos sete mártires. [in: https://www.cmjornal.pt/mais-cm/domingo/detalhe/vi-os-corpos-mutilados-dos-tres-majores, com devida vénia.
PAIGC > Conselho de Guerra > Reunião de 11/5/1970 a 13/5/1970. Acta das reuniões. Capa
[Página 1]
2. - A ACTA DA REUNIÃO DO CONSELHO DE GUERRA (ALARGADO)
Transcrição da intervenção de Amílcar Cabral (1924-1973), manuscrita por Vasco Cabral (1926-2005), secretário da reunião do Conselho de Guerra realizada em Conacri de 11 a 13 de Maio de 1970
► S.G. [Secretário-geral, Amílcar Cabral] – Saúdo os camaradas. É com o máximo prazer que fiz esta reunião que, desta vez, é em Conacri, para variar.
Desde a última reunião do B.P. [Bureau Político] até esta, a luta já mudou bastante. A Leste é uma mudança constante. Por ex.: fomos capazes de atacar Mansoa e Bissorã, com novas armas. Nesta altura, a posição do inimigo é diferente. O inimigo deve estar a pensar o que deve fazer para evitar os nossos ataques aos centros urbanos. Conseguimos fazer causar ao inimigo, em todas as frentes, um choque psicológico bastante grande. Conseguimos anular a tentativa do inimigo de desorientar as nossas populações.
A situação mudou também por causa da acção levada a cabo no Norte contra alguns oficiais superiores, em consequência da acção combinada das nossas forçadas armadas, da segurança e da Direcção do Partido.
A liquidação dos 3 majores, 1 alferes e alguns outros elementos (segundo alguns camaradas, um capitão e um chefe da Pide), mostrou que era falsa a propaganda dos tugas de que estavam à vontade na nossa terra. Por outro lado, os tugas estavam convencidos de que conseguiam comprar as nossas gentes.
Toda a política do Spínola [1910-1996], em consequência destas nossas acções está posta em causa para toda a gente, tanto dentro como fora da nossa terra, o nosso prestígio aumentou bastante e até mesmo para o nosso inimigo. Sobretudo esta liquidação dos oficiais superiores contribuiu para isso. O tuga pensava antes que nós todos éramos cachorros. O tuga agora já se convenceu do contrário. Isso aumentou a nossa dignidade, a nossa importância aos olhos do próprio inimigo.
A situação hoje é diferente da altura em que fizemos a reunião em Boké. Os nossos camaradas deram provas de capacidade. Nesta luta, como costumamos dizer, tudo é possível. Conseguimos levar armas pesadas do Sul para o Norte, quase sem perdas: perdemos dois camaradas e três armas. Os nossos camaradas foram capazes de enganar, discutir com eles, convencê-los, apesar da sua imensa experiência e capacidade e liquidá-los.
No intervalo da reunião de Boké para este, um ponto importante do nosso tema que é, o Kebo foi atraído diversas vezes. Isto é também importante. Sobre a passagem de armas do Sul para o Norte.
[Página 2]
Através de certos camaradas que estão em Canchungo [mais conhecido por chão de manjacos], os tugas tentaram combinações com eles com vistas a desmoralizar a nossa gente. Tentaram, servindo-se de elementos da FLING [Frente de Libertação para a Independência da Guiné], portanto a um nível mais baixo, desmobilizar a nossa gente, sem resultados. Por consequência foram à prisão de quatro dirigentes da FLING. Tentaram contactar Albino, Braima Dakar e outros. E na região do Quinara. E também com gente na periferia da nossa luta: Luís Pinto e João Cabral.
Tentaram a ligação com André Gomes e com Quintino [Gomes; 1946-1972]. Eles avisaram a Direcção do Partido, para o interrogar. André Gomes deu mais uma prova de confiança no Partido. Ele mesmo supunha que os tugas queriam desertar. Só depois é que se viu o que queriam era desmobilizar a nossa gente.
O Secretário-geral deu o seu acordo à proposta mas pediu que agíssemos depressa. Luís Correia pôs-se, por sua própria iniciativa, em contacto com os camaradas da Zona, Lúcio Touchô também foi envolvido na combinação. Ele pôs-se em contacto com os tugas, mas quem devia falar era Braima Dakar que jogou um papel de defesa do Partido.
Os tugas escreveram cartas amáveis e respeitosas aos camaradas, um grande namoro. Deram-lhes muitos presentes. Propunham que os guineenses deviam substituir os cabo-verdianos, de quem já tinham feito uma lista negra de trinta e que deviam ceder os seus lugares a guineenses. Deram presentes vários: conhaque, whisky, vários panos para as mulheres, relógios, cigarros bons, etc..
Encontraram-se cinco vezes. Na quarta vez, esteve presente o governador [Spínola] que apertou a mão, tirando a luva, do nosso camarada André Gomes (Amílcar lê uma das cartas de um major, Pereira da Silva, a André Gomes). No dia do encontro, deviam vir os nossos camaradas chefes e estava prevista a vinda do próprio governador [Spínola].
Os camaradas vieram de facto acompanhados das suas armas. Apareceu mesmo o Luís Correia e eles já sabiam da sua presença. Para não desconfiarem disseram-lhe que o Luís Correia estava presente e que era um alto responsável do Partido.
Durante as conversações com os tugas, foi decidido pararem os bombardeamentos aéreos e os combates. Isso aconteceu de facto: os nossos camaradas pararam também certas acções (Amílcar lê uma outra carta do Major [Alferes] Mosca). Braima Dakar aproveitou para fazer certas exigências. Pediu a libertação do seu país, a libertação de dois camaradas (Claude e José Sanhá) e foram mesmo soltos (já cá estão).
Durante a trégua, os camaradas levantaram minas na estrada de Bula-Binar.
Mesmo assim houve uma emboscada, aos tugas, na qual, segundo uma carta apanhada de um dos majores, afirmam que morreram quatro tugas.
[Será que se referem a: António da Silva Capela e Henrique Ferreira da Anunciação Costa, da CCAV 2487, em 18OUT69; e Joaquim José Ramalho Rei e Manuel Domingos Martins, da CCAV 2525, em 07Dez69]?
Também dão notícia dos ferimentos graves que sofreu um capitão que estivera com eles nessa reunião, ao tentar detectar minas: perdeu um braço e uma das vistas.
[Segundo José Paulo [Abreu Nogueira] Pestana (então capitão da CCAÇ 2466/BCAÇ 2861), "foi ele que mais tarde foi substituir o capitão [José Júlio da Silva de] Santana Pereira [CCAÇ 2367/BCAÇ 2845], ferido com uma mina antipessoal na zona de Có-Pelundo, onde se construía uma estrada entre Bula e Teixeira Pinto. Nunca podíamos descurar as minas colocadas nos trilhos, que já haviam vitimado um alferes (José Manuel Brandão, da CCAÇ 2616/BCAÇ 2892, em 02Mar70) e ferido o capitão". - in https://www.cmjornal.pt/mais-cm/domingo/detalhe/conheci-os-tres-majores-assassinados (04Jan2009)], com a devida vénia.
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► Nino – Salienta a importância dos nossos camaradas terem levado à certa grandes homens dos tugas. Isso foi porque os tugas nos consideram como cachorros. Os tugas sentem hoje qual é a nossa força tanto moral como política.
► Amílcar – Este acto foi um acto de grande consciência política e um acto de independência. Foi um acto de grande acção e de capacidade dos nossos camaradas do Norte. É a primeira vez que numa luta de libertação nacional se mata assim três majores, três oficiais superiores que, nas condições da nossa luta, equivale à morte de generais.
Refere o artigo de [Cor Hélio] Felgas [1920-2008] na Revista Militar [n.º 4 – Abril de 1970] que, no fundo, é um grande elogio ao PAIGC. Diz algumas das suas observações a nosso respeito. Talvez que os tugas vão desenvolver uma acção de grande envergadura e de repressão.
Depois do acontecimento [dos majores], publicaram um pacto, ao qual propunham mais contactos com os nossos militares, mas não onde se realizaram [os anteriores] mais um em Canchungo e um em Pelundo.
Dizem que os nossos militares não cumpriram os preceitos de honra militar. Mas que eles cumprirão no futuro os deveres de honra militar. Eles afirmam que querem o fim da guerra. Também as populações de certas zonas (Mansoa, por exemplo) estão bastante influenciadas pela realidade, pela utilização de novas armas. Dizem por exemplo: "agora, mama acabou" (querendo significar que já não há protecção junto dos tugas nas cidades). Apelo aos camaradas para terem iniciativas, pensarem profundamente nos problemas, criarem, conhecerem bem cada um dos seus homens.
Anuncio os problemas que vão a seguir ser discutidos (ordem de trabalhos).
[…]
Fonte:
Citação:
(1970-1970), "Acta informal das reuniões do Conselho de Guerra em Conakry". CasaComum.org, Disponível http:htrp://hdl.handle.net/11002/fms_dc_34125.
Instituição:
Fundação Mário Soares
Pasta: 07073.129.004
Título: Acta informal das reuniões do Conselho de Guerra em Conakry
Assunto: Acta informal das reuniões do Conselho de Guerra, em 11 e 13 de Maio de 1970, manuscrita por Vasco Cabral.
Membros Presentes: Amílcar Cabral, Aristides Pereira, Luís Cabral, João Bernardo Vieira (Nino), Osvaldo Vieira, Francisco Mendes, Pedro Pires, Paulo Correia, Mamadu N'Djai [Indjai], Osvaldo Silva, Suleimane N'Djai.
Secretário: Vasco Cabral.
Data: Segunda, 11 de Maio de 1970 – Quarta, 13 de Maio de 1970.
Observações: Doc incluído no dossier intitulado Relatórios: 1960-1970.
Fundo: DAC – Documentos Amílcar Cabral.
Tipo Documental: ACTAS
Obrigado pela atenção.
Um forte abraço de amizade (virtual)… e votos de muita saúde em tempo de "clausura"
Jorge Araújo.
21ABR2020.
_______________
Nota do editor:
Último poste da série > 7 de março de 2020 > Guiné 61/74 - P20708: (D)o outro lado do combate (58): memórias do militante do PAIGC , Inácio Soares de Carvalho, cabo-verdiano, funcionário do BNU - Banco Nacional Ultramarino, em Bissau, detido pela PIDE em 1962, em seguida deportado para o Tarrafal, donde regressa em 1965, sendo colocado na Ilha das Galinhas... Liberto em 1967, é de novo preso em 1972 e 1973... Regressa à sua terra natal, em finais de 1970, afastando-se da vida política ativa... Morreu em 1994 - Parte V (Carlos de Carvalho, Praia, Santiago, CV)
Último poste da série > 7 de março de 2020 > Guiné 61/74 - P20708: (D)o outro lado do combate (58): memórias do militante do PAIGC , Inácio Soares de Carvalho, cabo-verdiano, funcionário do BNU - Banco Nacional Ultramarino, em Bissau, detido pela PIDE em 1962, em seguida deportado para o Tarrafal, donde regressa em 1965, sendo colocado na Ilha das Galinhas... Liberto em 1967, é de novo preso em 1972 e 1973... Regressa à sua terra natal, em finais de 1970, afastando-se da vida política ativa... Morreu em 1994 - Parte V (Carlos de Carvalho, Praia, Santiago, CV)
21 comentários:
Jorge Araújo
Agora, com esta 'Acta da Reunião do Conselho de Guerra', já temos informação do PAIGC sobre o massacre dos Oficiais.
A ligeireza como é transcrito em Acta o massacre é um testemunho suficiente para levar aqueles gajos a tribunal internacional por crimes de guerra.
Parece que a maioria dos gajos já 'deixou de fumar'.
Boa saúde por essas bandas, que visto bem as coisas as bajudas por aí já andam de máscara há mais de mil anos.
Valdemar Queiroz
Caro camarada Jorge Araújo
Neste relatório falam do ferimento do Cap. Santana Pereira da 2367 ter sido na estrada Pelundo-Có mas não. Ele foi ferido no dia 19 de Março de 69 na estrada Olossato-Bissorã e o ferimento foi numa mão. Depois no início de Abril a companhia veio para Có fazer a protecção à construção da estrada Pelundo Có e aí foi o Alf. Pires também da 2367 que acionou uma mina anti-pessoal e veio a falecer julgo que já em Lisboa.É só uma pequena correcção sem grande importância e sei disto porque também era deste Batalhão.
Um abraço
Manuel Carvalho
Amílcar – Este acto foi um acto de grande consciência política e um acto de independência. Foi um acto de grande acção e de capacidade dos nossos camaradas do Norte. É a primeira vez que numa luta de libertação nacional se mata assim três majores, três oficiais superiores que, nas condições da nossa luta, equivale à morte de generais.
Muito bem,camarada Amilcar Cabral, grande lider revolucionario africano, tao estimado e respeitado por algumas pessoas neste blogue, sobretudo por uma incansavel pessoa que eu estou proibilido de dizer o nome.
Abraço,
Antonio Graca de Abreu
Olá Camaradas
Este facto deve ser visto com frieza. Guerra é guerra e muito mais esta em que a população era o que se queria (e cria?) conquistar, mas não se conseguia. Ninguém. Nesta altura a separação entre prós e contras estava feita e nada a poderia modificar. O futura provou-o.
O texto da intervenção revela a mentalidade dos lideres africanos - nada boa, como se sabe - do tempo e tresanda a racismo. Não há dúvida de que a o próprio massacre deve ser visto na perspectiva do racismo.
Imaginem que os sete homens, em vez de serem assassinados no local, eram levados - eventualmente com as viaturas - até ao Senegal. Dada a situação táctica criada e o conhecimento do terreno pelo PAIGC, não submetido à pressão das NT, os prisioneiros estariam no Senegal em poucas horas. Seria um êxito político enorme para um movimento guerrilheiro que queria afirmar-se como algo de superior, bem conduzido e até civilizado.
Pelo lado de Portugal o que se pretendia era um rendição de uma boa parte dos guerrilheiros e população por eles controlada. Seria um êxito político a apresentar como uma iniciativa de paz e demonstrativa do cansaço das Pop. relativamente a uma guerra de que não se via o fim, apesar dos êxitos de ambas as partes e isso é sempre desmoralizante.
Pelo lado do PAIGC, era necessário fazer propaganda "para dentro" e nada melhor de que um acto brutal como aquele. O Amílcar conhecia bem o "seu povo" e como conduzi-lo. Os "camaradas" dariam uma lição de militância, maturidade política e confiança no partido (que remédio tinham eles?), como então se usava e se usa ainda nas "democracias orientais". E o texto assim o enuncia. Está escrito num português esteriotipado e repetitivo, como era característico das intervenções do Amílcar. No fundo, uma sucessão de lugares comuns de quem vê os objectivos da "sua" luta de libertação.
Um coisa é certa: a tentativa de desequilíbrio psicológico do inimigo é uma característica de todas as guerras e a repressão brutal sobre os capturados também.
Chamo a atenção para a imprecisão da narrativa dos factos relativos às minas. Neste âmbito, como sabemos a nossa documentação é muito mais fiável, quer pelos procedimentos habituais em vigor, quer pelo conhecimento que ainda hoje temos do que sucedeu em cada unidade. Não tivemos medo fazer publicações de referência, fundamentadas nos documentos existentes. Estas publicações não foram, até ao momento, alvo de contestação, mais do que pontual.
O que não sucede com o PAIGC, como também sabemos.
Nada melhor do que criar uma aura e uma "verdade" oficial que glorifique a acção do "nosso glorioso partido". Limpeza da História que funciona melhor em regiões de memória fraca e onde a História se faz e refaz como é necessário e conveniente...
Um Ab. e um Feliz Confinamento
António J. P. Costa
Caros Camaradas,
Bom dia.
Na sequência da publicação (e do contexto) que deu origem a esta minha narrativa, onde recuperei o conteúdo da “Acta informal das reuniões do Conselho de Guerra” (PAIGC), realizada em Comacri, de 11 a 13 de Maio de 1970, três semanas após a consumação do Massacre «dos três Majores», cumpre, em defesa da verdade, dar conta do seguinte:
1.– De facto, como só agora tive a oportunidade de confirmar, a primeira referência a este documento já havia sido feita pelo camarada Jorge Picado (Cap Mil da CCAÇ 2589/BCAÇ 2885, Mansoa; CART 2732, Mansabá e CAOP 1, Teixeira Pinto, 1970/72), no P12704, de 10Fev2014, a quem peço as minhas desculpas por este lapso.
2.– Este mesmo documento foi, também, analisado pelo meu Cmdt, camarada Pereira da Costa (Cap Art da CART 3494/BART 3873, Xime, e CART 3567, Mansabá, 1972/74), no P12732, de 17Fev2014.
3.– Em ambos os postes, foram produzidos diversos comentários que completam o quadro global de avaliação sobre esta ocorrência. Sugiro a sua leitura.
Um abraço,
Jorge Araújo.
Caro Camarada Manuel Carvalho,
Obrigado pelo teu comentário.
Três pequenas notas sobre o que referes:
1.– O “relatório do C.G” não faz referência ao Capitão Santana Pereira mas sim “dos ferimentos graves que sofreu um capitão [?] que estivera com eles (Majores) nessa reunião, ao tentar detectar minas (…)”.
2.– Quem menciona o nome do Cmdt da CCAÇ 2367, foi o seu substituto – Cap José Paulo Pestana, em entrevista dada ao “cmjornal”, em 04Jan2009, conforme se dá conta no texto.
3.– Quanto à mina antipessoal accionada pelo Alf Mil Inf Pires (Manuel Maria Pires, natural de Salvador, Município de Mirandela), da CCAÇ 2367, ela ocorreu em 13Abr69, domingo, na estrada Pelundo-Có.
Evacuado para o HMP, em Lisboa, aí viria a falecer cinco dias depois, a 18Abr69, 6.ª feira (fonte: Ceca).
Um abraço.
Jorge Araújo
Ainda a propósito de “efemérides”:
Passaram, ontem (22Abr1972), quarenta e oito anos que vi a “passadeira rolante” chegar ao fim da pista. Impunha, desde logo, seguir em frente, em nome da vida.
Estou a referir-me ao meu “baptismo de fogo”, e dos camaradas do meu Gr Comb, o 4.º da CART 3494.
Recupero o que escrevi no P9698, datado de 03Abr2012, com o título «Era uma vez uma estrada, palco de jogos de sobrevivência».
O dia 22 de Abril de 1972, sábado, será sempre um dia para recordar, particularmente por todos os ex-militares que constituíram a CART 3494, em especial por aqueles que viveram, conviveram e sobreviveram ao jogo do «gato e do rato» ou às «escondidas», como é comum definir-se o conceito de “GUERRILHA”, no léxico militar, como foi o caso dos elementos do 4.º Gr Comb. (...)
Nesse dia 22 de Abril de 1972, tudo passou, num ápice, do «faz de conta» a uma SITUAÇÃO REAL, em que a regra do “JOGO” era, então, a eliminação física do opositor ou dos opositores, por antecipação e perícia, num cenário que incluía, ainda, a variável designada, teoricamente, por «Sorte».
É que «sorte» não se pode prever... ACONTECE!
Na sequência do confronto (em que por três vezes foi tentado o assalto), o balanço da primeira grande batalha (emboscada) travada na Ponta Coli (Xime) pela CART 3494 foi de um morto, o camarada furriel Manuel Rocha Bento [a única baixa em combate ao longo dos mais de vinte e sete meses de comissão, a quem prestamos a nossa sentida homenagem], dezassete feridos entre graves e menos graves e, por exclusão de partes, cinco dos militares saíram ilesos, sendo eu um deles. As viaturas, onde nos fazíamos transportar, não sofreram quaisquer danos significativos.
A funcionar como tampão de segurança ao tráfego rodoviário que circulava no troço «Xime-Bambadinca-Xime» e ao marítimo [Rio Geba] «Xime-Bissau-Xime», as várias gerações de ex-combatentes que cumpriram a sua missão ultramarina neste Aquartelamento sabem bem das dificuldades por que tiveram de passar. Algumas delas transformando-se em calvário permanente, pelas adversidades e desgostos produzidos, outras deixando marcas físicas e psicológicas insupríveis para o resto das suas vidas.
Fiquem bem... em “confinamento”... e em paz.
Um abraço,
Jorge Araújo.
Quem escreveu a Acta, que Jorge Araujo nos traz, foi Vasco Cabral, num português escorreito e cheio de (boas) intenções.
Como conheci pessoalmente em Bissau, Vasco Cabral, quando apanhou um cagaço com um tiro no 14 de Novembro de 80, e como é a esta gente, (antigos estudantes do império, portugas de apenas 500 anos, menos 400 do que o resto de nós outros)) que eu pessoalmente atribuo a victória sobre o colnialismo português, tanto na Guiné como em todas as outras colónias, assim como a victória sobre os outros movimentos tribais, queria mostrar o que diz a wikipédia sobre ele:
"Vasco Cabral (Farim, 1926 — Bissau, 2005) foi um escritor e político de Guiné-Bissau.[1] Foi ministro da Economia e das Finanças, ministro da Justiça e vice-presidente da Guiné-Bissau. presidente da Guiné-Bissau.
Estudou na Universidade Técnica de Lisboa e foi um dos apoiantes da campanha de Norton de Matos.[2] Foi preso em 1953 por sua atuação contra o regime de António de Oliveira Salazar. Foi um dos fundadores do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC).[3]
Estes neo-portugas "sabiam-na toda", conheciam os nossos pontos fracos, fintavam a pide, a psp e qualquer outra autoridade, camuflados com pele de camaleão.
Muitos estiveram do nosso lado, porque sabiam que aquela política não servia a ninguém.
Nem brancos, nem pretos nem mulatos, ele mesmo, não lerpou por pouco, mas ficou mais ou menos a "um canto".
Teve mais sorte que o Amilcar e o Luis Cabral.
... Rosinha, esquesceste de mencionar outra faceta do Vasco Cabral (que não tinha qualquer laço de parentesco com o Amílcar Cabral): também foi poeta...
Não será, na minha opinião, um poeta de primeira grandeza, mas tem lugar (e estátua) no Parque dos Poetas, em Oeiras...
Creio que muitos dos nossos camaradas não conhecem o "Parque dos Poetas", com os seus 22,5 hectares, e onde estão representados 60 poetas – 50 portugueses e 10 de países ou territórios de expressão portuguesa, como por exemplo a Alda Lara (Angola) ou o José Craveirinha (Moçambique).
http://parquedospoetas.cm-oeiras.pt/?page_id=1226
Concordo contigo, era tão português como tu e eu...
Algunns poemas dele estão aqui disponíveis:
https://www.triplov.com/guinea_bissau/vasco_cabral/poemas/index.htm
O Vasco Cabral era um peão no tabuleiro, o escriba do lado que rejubilava com um assassinio cobarde,sanguinário, indigno de gente civilizada, mesmo numa guerra. Os majores mais o Mosca e os intérpretes, do meu CAOP 1, foram desarmados para negociações com guerrilheiros. Foram barbaramente mortos e retalhados.
Agora vem o Rosinha e o Luis Graça (esqueçam a outra sumidade,lá mais para trás no blogue, a falar do grande lider africano Amilcar Cabral), a dizer que o escriba Vasco Cabral "era tão português como tu e eu."
Que tristeza!
Abraço,
Antonio Graça de Abreu
Graça de Abreu, tens de concordar que há e sempre houve portugueses e portugueses fdp. Também concordo contigo, discordando da portugalidade do Vasco Cabral, Amílcar Cabral e outros fulanos que tais. O Amílcar Cabral tinha aquela máxima de que não fazia a guerra contra o povo português mas contra o colonialismo, leia-se colonialistas. O certo é que o Alferes José Armando Santos do Couto e os Soldados José Espírito Santo Barbosa e Manuel Vieira da CART 2732, faziam parte do povo português e não eram colonialistas, mas perderam a vida na Guiné.
Aquele grupo de militares desarmados e indefesos foram barbaramente assassinados. Aquilo não foi um acto de guerra, foi barbárie, tipo de acções que infelizmente ainda aconteceram há poucos anos na Guiné-Bissau, e que esperamos nunca mais se repitam.
Carlos Vinhal
Jorge Araújo
Haveria todo o interesse, para se apurar a cronologia deste trágico acontecimento, a publicação do Relatório/Informação desta Operação por parte do Comando das Forças Armadas da Guiné.
Se conseguires saber do Relatório seria interessante a publicação no blogue.
Ab.
Valdemar Queiroz
Vasco Cabral, e muitos milhares de portugueses do ultramar, iguais a ele, eram, e muitos milhares continuam a ser, muitos apenas de Bilhete de Identidade, porque no seu interior devem andar meio perdidos, mas muitos há que eram "fanaticamente" portugueses.
Havia uma realidade, é que os caboverdeanos, especialmente, a maioria sonhava com uma situação semelhante à Madeira e Açores e mais nada.
Este próprio Vasco Cabral, segundo a vikipedia, apoiava como estudante em Portugal, a campanha de Norton de Matos, ora sendo este um colonialista mais genuino que o nosso velho Salazar, era ou não era um português (ultramarino)de alma e coração?
António Graça Abreu, durante 500 anos havia duas realidades de portugueses, os ultramarinos e os Minho aos Açores.
E foram meia dúzia de portugueses ultramarinos, que nos ensinaram a jogar à bola e nos enrolaram.
E continua!
Bom dia Camaradas
Ai tadinhos dos Vascos Cabrais e quejandos, "e muitos milhares de portugueses do ultramar, iguais a ele, que eram, e muitos milhares continuam a ser, muitos apenas de Bilhete de Identidade, porque no seu interior devem andar meio perdidos, mas muitos há que eram "fanaticamente" portugueses".
Que peninha que eu tenho deles!
E nós demos-lhe lugar no Parque dos Poetas? Somos mesmo muinta burros! Gostava de saber onde é Parque dos Poetas nos TO das antigas PU, com estátuas de poetas "tugas"...
Quem muito se abaixa...
Aquela coisa dos 500 anos é uma chatice. Nunca mais nos vemos livres daquele paleio balofo! Azar o nosso! Andámos nós p'ráli a civilizar aquilo para nada.
Percebo pouco de futebol. Por isso nem quero ver a miséria que seria se não "foram (a tal) meia dúzia de portugueses ultramarinos, que nos ensinaram a jogar à bola e nos enrolaram (na manta?). Se calhar jogávamos à bola com caixotes de sabão e descalços. Talvez com fardos de palha. Sempre faz menos doer a marcar o penalty... digo eu, que não entendo nada disto.
E continua?
Se calhar até continua...
Mas isto já não tem que ver com a barbaridade cometida pelo PAIGC, para exemplo dos colonialistas e lacaios do imperialismo e dos guineenses que davam o litro diariamente e hoje... é o que é.
Mas isso, já são outros "Caminhos da História".
Um Ab. e bom FdS em confinamento
António J. P. Costa
Caros amigos,
A quem se deve imputar a responsabilidade da morte dos 3 Majores ???
Na minha opiniao, o primeiro responsavel foi o Gen. Spinola, por nao ter tido em devida conta os riscos do acto que estava(m) a praticar. Como é sabido, o Spinola e seu commando nao desconheciam a hierarquia do PAIGC e, tivessem boas intençoes, sabiam com quem negociar e nao embarcar numa aventura perigosa (de lado a lado) de negociar (ou aliciar?) directamente com/os comandantes militares de determinadas regioes. Pois tenho a impressao que o André Gomes estava metido numa situaçao muito complicada.
Da primeira vez que ouvi falar deste acontecimento, levaram-me a pensar que teria sido uma operaçao falhada e que, posteriormente, teria chegado através dos eguranças, aos ouvidos da Direcçao do partido que, por sua vez, teria dado a ordem fatal da eliminaçao para testar a fidelidade do comandante da zona (André Gomes) que nao teve alternativa, porque a guerrilha nao perdoava aos "traidores da causa". Com este massacre infame e injustificado, o destino do André Gomes ficou traçado para sempre e, mais tarde, morreria numa cela de prisao em condiçoes obscuras, sem honra nem Gloria. Se isto é verdade ou nao, nao posso confirmer, mas a acta da reuniao do conselho da Guerra aqui apresentada nao me convenceu que tenha sido uma operaçao planeada desde o inicio e conduzida pela direcçao superior do partido.
Voltando a questao que coloco no inicio, o mesmo Spinola voltaria a repetir o mesmo erro poucos meses antes de deixar o commando do territorio, por intermedio de um alto oficial (Coronel Antunes?), desta vez na fronteira Norte (Cuntima) e de um civil com nome de codigo (Padre?), conforme consta, o encontro tinha sido marcado na linha da fronteira, quase dentro do territorio do Senegal (este assunto foi abordado num recente post da TG).
E por fim, queria também aqui relembrar que, por ironia de destino e por motivos diferentes, nesta mesma zona, teria acontecido um nao menos hediondo e infame massacre de civis da parte do exercito portugues de que ja muito se falou neste Blogue, apos um ataque de guerrilheiros nao identificados perto da localidade de Jolmete. Como disse alguém, a Guerra é Guerra e quando acontece, inevitavelmente, cada um chora os seus mortos.
Com um abraço amigo,
Cherno Baldé
PS:
O Post a que fiz alusao é o P20793 de 30/03/2020, e o Coronel envolvido por Spinola na operaçao foi o Antonio Vaz Antunes.
Cmpts,
Cherno Baldé
PS:
O Post a que fiz alusao é o P20793 de 30/03/2020, e o Coronel envolvido por Spinola na operaçao foi o Antonio Vaz Antunes.
Cmpts,
Cherno Baldé
Há um ditado cruel, um provérbio popular português, que tem muito de sabedoria: "Quem foi ferro mata, com ferro morre"... Amílcar Cabral foi abatido, como um cão... Os bons irãs do seu poilão não o protegeram, nesse dia trágico... de ajustes de contas "internas"...
Quando disse, em tom irónico, que o Vasco Cabral, que fez a ata da condenção à morte (e a certidão de morte) dos 3 majores e seus acompanhantes, era tão português como nós, estou a reconhecer apenas factos biográficos: teve uma educação portuguesa, lutou em Portugal contra o regime salazarista, estive preso vários anos, fugiu de Portugal com outras "nacionalistas", antigos estudantes da Casa do Império, escreveu em português (nunca em crioulo),,, e até um estátua no Parque dos Poetas do Isaltino...
Era tão português como por exemplo o bárbaro assassino do general Humberto Delgado, o Casimiro Monteiro (1920-1993), filho de um português europeu e de uma goesa...
Já vi que temos que pegar com pinças neste dossiê. LG
"Com este massacre infame e injustificado."
São palavras do Cherno Baldé.
Por favor, pelo respeito que os nossos mortos,companheiros de guerra nos merecem, não nos venham mais com o elogio dos cobardes assassinos da nossa gente que caminhou ao encontro dos guerrilheiros ingenuamente desarmada.
Abraço,
Antonio Graça de Abreu
Poste, P20793, citado pelo Cherno Baldé:
30 DE MARÇO DE 2020
61/74 - P20793: Notas de leitura (1277): O Coronel Vaz Antunes e as conversações com o PAIGC em Junho de 1973: muitas questões em aberto (Mário Beja Santos)
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