quarta-feira, 22 de abril de 2020

Guiné 61/74 - P20890: (Ex)citações (366): Assim como que ... uma resposta ao Mário Gaspar, que diz que nunca viu no mato, em 23 meses, nenhum fuzileiro, comando ou ranger (Ramiro Jesus, ex-fur mil cmd, 35ª CCmds,Teixeira Pinto, Bula e Bissau, 1971/73)


Guiné > Região de Cacheu > Teixeira Pinto >  35ª CCmds e Pel Rec Daimler 3089 (Teixeira Pinto, 1971/73) > Março de 1972, durante a protecção aos trabalhos de desmatagem das margens, ou da pavimentação, da estrada entre Teixeira Pinto e o Cacheu. Eu, nas costas de uma Daimler, tendo do meu lado esquerdo o então Furriel Comando Paquete e à minha direita o então Alferes Comando Alfredo Campos, comandante do Pelotão da 35ª  CCmds a que ambos pertenciam. (...) "O Furriel Mil Comando Paquete, da 35ª CCCmds, infelizmente já não está entre nós. Segundo informação do Ramiro de Jesus, também ele ex-fur mil comando da 35ª CCmds, natural de Aveiro (e, portanto, meu conterrâneo), o Paquete, depois do regresso à metrópole, morreu atropelado por um comboio em Vila Franca de Xira.

Foto (e legenda): © Francisco Gamelas (2016). Todos os direitos reservados [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem de Ramiro Jesus (ex-Fur Mil Comando da 35.ª CComandos, Teixeira Pinto, Bula e Bissau, 1971/73) , mora em Aveiro e é membro da nossa Tabanca Grande desde 9/12/2012][, foto à esquerda]:

Date: segunda, 20/04/2020 à(s) 12:21

Subject: Assim como que ... uma resposta.

Bom-dia, amigos.

Antes de mais, os votos de que se mantenham "operacionais" e, portanto, isolados do famoso SARS-CoV-2.

Numa das minhas consultas de ontem ao blogue - a do fim da tarde - reparei no relato exaustivo da vida militar (e não só) do camarada Mário Gaspar  (*), em que lamenta as suas passagens por vários "cárceres", embora reconheça, implicitamente, que nalguns casos nem eram muitos rigorosos, já que lhe permitiram (como confessa), algumas liberdades e vários "desenfianços". Este último é que está a custar, quanto mais não seja, porque os outros já passaram há muito.

Mas, como salienta, somos COMBATENTES. Portanto ... venceremos!

Entretanto, porque não compreendi muito bem o que escreveu, copiei e reproduzo a seguir os últimos parágrafos do texto, para ver se é possível ele próprio, e por intermédio do Blogue, esclarecer o que pretendeu dizer.

(...) Curioso que nunca vi no mato – foram praticamente 23 meses – nenhum Fuzileiro, Comando ou Ranger. Aliás, minto. Existia na minha Companhia um Ranger, o Furriel Miliciano José Nicolau Silveira dos Santos – o grande Amigo Açoriano que vive no Canadá.

Somos Combatentes e PRESOS, de Serviço durante 24 horas; não autorizados a licenças de recolher; sem fins-de-semana. Os chamados Tropas Especiais – tenho muitos Amigos Combatentes nessa Tropa – mas viviam em Bissau e eram chamados para Operações. Podiam ir "às meninas", petiscar no Zé da Amura ou andarem aos tiros uns contra os outros após de jogos de futebol entre eles.

Mas este flagelo, ou surto que ataca o Mundo não é – como ouvi e li – uma guerra – nem o exagerado termo, 3.ª Guerra Mundial, embora tenha muitas semelhanças, esta é a minha opinião.

O que será então? É o desafio que deixo ao Blogue. (...)



Porque, afirmar que «é curioso mas nunca vi no mato um fuzileiro, comando ou ranger» pode ter várias interpretações.

Senão vejamos:

- Em primeiro lugar é necessário esclarecer o que entende por mato.

- Depois o que quer dizer este encontrar,

Ora, se, como a generalidade de toda a tropa, considerarmos o tal mato tudo o que não era Bissau, então digo, desde já, ao amigo Mário que não sabe do que fala. Porque nem todos «viviam em Bissau e eram chamados para operações».

No meu caso - 35ª CCmds - cheguei a Bissau no dia 29/11/71, embarquei numa LDG no dia seguinte, para Teixeira Pinto (hoje Canchungo), vim a Bissau (Brá) passado um mês receber o crachá (depois do treino de adaptação e confirmação de habilitação na especialidade) e só voltei à capital em Setembro do ano seguinte, para vir de férias. Regressei em Outubro e só retornei a Bissau em Março/73, para voltar de férias, tendo até nisto tido azar, já que no dia que embarcava (25/03/73), derrubaram o bom "militante" do Blogue, tenente [pilav Miguel] Pessoa, e já não houve avião da TAP.

Voltei em Abril/73 e só saímos dali em Junho, mas para Bula, que estava a ser massacrada. Tivemos de "limpar a zona".

Tenho, como testemunhas, mais dois bons "militantes" do Blogue, os ex-alf [Francisco] Gamelas (que nos levava ao Bachile ou mais à frente) e [António Graça de].Abreu (o "navegador" que ainda hoje deu notícias), ambos adstritos ao CAOP1

E a companhia que rendemos - a 26ª CCmds. - terminou a comissão onde a encontrámos, lá em Teixeira Pinto. Praticamente todos os dias tínhamos gente no mato, mas este o mato mesmo, para além «da paliçada e do arame farpado» - Caboiana, Churo, Balenguerês, Punta Costa, etc - Em Bissau estavam só os Comandos Africanos, no Batalhão.

Depois, como queria o amigo Gaspar encontrar as «tropas especiais»? Só carregando o Obus (suponho que fosse a sua arma) naquelas longas caminhadas, que muitas vezes começaram à meia noite, o que não seria muito prático.

Mas podia ter encontrado mais que um ranger, pois, como devia saber, não havia companhias de rangers, uma vez que só tinham esta especialidade oficiais e sargentos, que enquadravam a tropa normal e, portanto, estavam espalhados por todo o território.

Bom, mas, para terminar tão longa dissertação resta-me recomendar ao camarada M. Gaspar que tenha mais um pouco de paciência para vencer mais esta "guerra" que, como ele, também acho que não é guerra e que não enverede por caminhos tão trilhados por tão boa gente, que, para enaltecer o que é ou o que fez, tende a desmerecer o que outros são ou fizeram.

Um abraço para todos, em especial para aqueles que citei no texto.
Ramiro Jesus
____________

Nota do editor:

(*) Vd. último poste da série >  19 de abril de 2020 > Guiné 61/74 - P20875: (Ex)citações (365): Os ex-combatentes, agora confinados por causa da pandemia de COVID-19... Hoje, como ontem, "presos"! (Mário Gaspar, ex-fur mil at inf, MA, CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68)

3 comentários:

Jorge Araujo disse...

Caro Camarada Ramiro Jesus,

Boa noite, desde as «Arábias».

Em primeiro lugar, quero dizer-te que fiquei muito sensibilizado com esta tua iniciativa.

Depois, aproveitando esta oportunidade, gostaria de saber se tens algum contacto com o Américo (?) Costa, furriel da 35.ª, ferido em combate numa das primeiras operações realizadas pela tua CCmds, e natural/residente em Lisboa.

Finalmente, é muito provável que nos tenhamos cruzado no triângulo: Serra das Meadas, Lamego e Penude, por onde "circulei" nos meses de Setembro a Dezembro/71. Ou, quem sabe, na Guiné.

Um abraço (virtual) e tudo de bom para ti.
Jorge Araújo.

António J. P. Costa disse...

Olá Camaradas

Não faz sentido que discutamos se vimos ou não um fuzileiro, um para-quedista ou um comando durante a guerra. Por mim vi e operei com a 3.ª e a 5.ª de Cmds a partir de Cacine (1968).
Mais tarde recolhi no Xime uma CCaç. Pq. que vinha a retirar de um golpe de mão a partir do Sul do meu sector (Ponta do Inglês(?). Depois, os fuzileiros realizaram no sector da CArt 3494 e apenas com apoio naval...
Em Mansabá vi treinar uma CCmds Africana para recompletamento do BCmds. A partir de Mansabá foram lançadas duas ou três operações do BatCmds e a CArt 3567 participou no cerco ao Morés e no lançamento e recuperação dos Cmds. Vi de todos e não há dúvida de que "lá" estiveram, embora não tivessem podido ir "a todas".

Um Ab.
António J. P. Costa

Carlos Vinhal disse...

O nosso camarada Mário Vitorino Gaspar gosta muito de escrever. Aos seus textos, sobre a sua passagem pela Guiné, imprime tal dramatismo que nos dá a entender que foi o maior sofredor, o único que sentiu a adrenalina ao enfrentar uma mina/armadilha, que foi o único a sentir a pressão psicológica do arame farpado, das operações de que não sabíamos se voltávamos vivos e inteiros. Ele sabe bem que as tropas especiais como Fuzos, Comandos, Páras e Força Aérea, estavam sediadas em Bissau, em prontidão para o que desse e viesse. Nos 22 meses em que estive confinado no arame farpado de Mansabá, tivemos durante longos períodos de tempo a presença de tropa especial como a 27.ª CComandos e Companhias de Caçadores Paraquedistas. É injusto dizer-se que a tropa especial estava no bem-bom de Bissau como é injusto dizer-se que a tropa de quadrícula não saía para o mato. Se o amigo Mário tivesse estado nos verdadeiros infernos de Guileje, Gadamael e Guidaje (1973), rezaria a todos os santinhos para que as tropas especiais chegassem rápido em seu socorro. Para isso, a dita tropa especial teria que estar em Bissau em prontidão.
Carlos Vinhal