domingo, 6 de setembro de 2020

Guiné 61/74 - P21329: Blogpoesia (695): "O agitar das águas", "Senhora Marquinhas da venda" e "Apenas agricultor", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728

1. A habitual colaboração semanal do nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66) com estes belíssimos poemas, enviados, entre outros, ao nosso blogue durante esta semana:


O agitar das águas

Águas paradas estagnam. Vêm os insectos e as algas, turvam a superfície.
O sol não inunda o seio e a vida definha nelas.
Como um charco. Imundo e fétido.
É a morte.
O que lhe sustenta a vida é o vento em brisa ou na agitação agreste.
Assim se passa no mundo das ideias. A letargia desertifica a
mente.
Tal como a ociosidade como hábito.
A vontade é o motor do corpo.
Se ele pára, a alma desiste e o corpo caminha para a extinção.
Uma amizade se não se demonstra com a presença, a entreajuda e o sacrifício, enfraquece e, depressa, morre.
Porque secaram as flores do belo jardim?
Seu dono deixou de o regar...
A lareira apagou? Se acabaram os cavacos!...

Berlim, 2 de Setembro de 2020
14h39m
Jlmg

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Senhora Marquinhas da venda

Havia na Forca uma tasca. Vinho da pipa e petiscos frescos eram sua bandeira.
Por trás do balcão de madeira,
Andava a senhora Marquinhas, a mãe,
E sua filha também.
Se cuidavam as duas.
Acudiam fregueses, sobretudo, homens.
Ali passavam a tarde.
Cavaqueando de tudo.
Jogavam à sueca e bisca lambida.
Bebiam canecas de tinto, em porcelana.
Umas atrás das outras.
Quando chegava a tardinha,
Recolhiam a casa para o caldo.
Tresandavam a vinho.
Um santuário de paz no seio da Forca.
Não era por ali que o mal vinha ao mundo...

Berlim, 4 de Setembro de 2020
9h41m
Jlmg

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Apenas agricultor

De sacho e enxada nas mãos, sou apenas o agricultor.
Revolvo a terra. Exponho-a ao sol o seu interior.
Tiro as ervas daninhas.
Os vermes a limpam gratuitamente.
A vida dá-a ele.
Me deleita ver crescer a vida verde.
Contemplar suas flores.
Ver seus frutos a amarelecer.
Depois, é um regalo colher tudo e encher de pão o celeiro enxuto.
É o ritmo vital da natureza.
Tudo é gratuito.
A chuva, o sol e a terra.
Uma condição:
Só damos o engenho e a força das nossas mãos.
Que riqueza!...

Berlim, 5 de Setembro de 2020
10h44m
Jlmg
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Nota do editor

Último poste da série de 4 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21324: Blogpoesia (694): poemas para dizer em voz alta, em casa, na varanda, na rua, ou à beira-mar, em tempos de pandemia: António Gedeão, Li Bai, David Mourão Ferreira e Viriato da Cruz (seleção de Mário Gaspar, António Graça de Abreu, Mário Beja Santos e Luís Graça respetivamente)

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