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sábado, 22 de setembro de 2018

Guiné 61/74 - P19034: Ser solidário (216): Vim a Bissau ver o meu filho e preciso de cuidados médicos... Quem conhece aqui um bom ortopedista? (Manuel Neves)

1. Mensagem do nosso leitor e camarada Manuel Neves:

Data: quinta, 20/09/2018 à(s) 20:56
Assunto: pedido de ajuda

Boa tarde, Doutor Luís Graça, sou Manuel Neves, estive aqui, na Guine-Bissau, de 1966 a 1968. A  pedido do meu filho,  vim novamente para cá, mas desta vez não pela mesma razão, apenas para  estar junto dele.

Há uns 15 dias comecei a ter uma dor na omoplata e cotovelo, dor tão aguda que tive de recorrer a uma clínica que me enviou ao hospital militar para RX. Voltei à clínica com a rádio, que me enviou ao hospital Simão Mendes.

O ortopedista me pergunta se tinha tido alguma queda, respondi que tinha caído de costas, a resposta foi que felizmente não tinha nada partido, mas sim uma boa carga de artrose e osteoporose. Receitou-me pomada Voltaren e comprimidos igualmente Voltaren, mas continuo com muitas dores.

A ajuda que pretendo: haverá ortopedistas particulares aqui na Guiné? O que me aconselha? Não está nos meus planos ir nesta altura a Portugal, mas também não consigo continuar com tanta dor. Peço desculpa por ser longo no meu comentário. Obrigado.

Manuel Neves


2. Resposta do editor LG:

Manuel, tenho muito pena, lamento o teu estado de saúde... É azar um tipo ir à Guiné-Bissau ver um filho e precisar de um médico, especialista em ortopedia,  e não o haver. Pessoalmente, não tenho aí ninguém conhecido da área da ortopedia... De resto, eu não sou médico. Tive vários alunos, médicos, mas de saúde pública, mas infelizmente nem todos regressam ao seu país. Sugiro-te que procures ajuda e/ou conselho na Embaixada de Portugal. Vai dando notícias. As tuas melhoras: para já, repouso... Mantenhas.
Luís Graça

PS - Pode ser que o nosso grã-tabanqueiro Patrício Ribeiro, "homem grande" de Bissau, "pai dos tugas", tenha alguma informação útil, para ti, sobre ortopedistas... Deve haver alguém competente nessa área. Vou-lhe dar conhecimento deste email.


3. Resposta do Patrício Ribeiro, com data de ontem, 21, às 11h15, de que já foi dado conhecimento ao Manuel Neves: 

Bom dia. Luís e Manuel

Desde as margens do Vouga, para fazer as vindimas...
Não conheço nenhum ortopedista que possa indicar, embora parte dos meus trabalhos em 2017 e 2018, tenham sido nos hospitais regionais.

Penso que os únicos existentes são os médicos cubanos no Hospital Simão Mendes, que têm tratado de alguns portugueses amigos. O Manuel terá que chegar à fala pessoalmente com eles, por vezes particularmente...

Perguntar à dona Lourdes do Restaurante a Padeira, em Bissau.

Abraço
Patrício Ribeiro

IMPAR Lda
Av. Domingos Ramos 43D - C.P. 489 - Bissau , Guiné-Bissau
Tel. 00245 966623168 / 955290250
www.imparbissau.com
impar_bissau@hotmail.com
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Nota do editor:

Último poste da série > 6 de julho de 2018 > Guiné 61/74 - P18815: Ser solidário (215): Sessão cultural: "Diálogos sobre Timor Leste", Sabugal, auditório municipal, 19 de julho próximo, 5ª feira, às 20h30: (i) exposição de fotografia ("Expressões Lorosae", de Victor Cordeiro); (ii) momento musical, seguido da exibição do filme "Rosas de Ermera", de Luís Filipe Rocha; e (iii) conversa com Rui Chamusco e Gaspar Sobral

sexta-feira, 21 de setembro de 2018

Guiné 61/74 - P19033: Notas de leitura (1102): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (52) (Mário Beja Santos)


Fotografia referente às obras do Palácio do Governo, constante da mesma brochura, e que pertence à Biblioteca do Arquivo Histórico do BNU.


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 21 de Fevereiro de 2018:

Queridos amigos,

Na Guiné, vive-se na maior das tensões entre o BNU e a Casa Gouveia, a compra e venda da mancarra estão no olho do furacão. A Casa Gouveia pretendia um privilégio que a lei não lhe concedia, apelou ao Ministro das Colónias, o BNU em Lisboa esclareceu o Governo do que se estava a passar. São peças essenciais para quem pretenda fazer o estudo da economia deste período e ter em conta o peso ascensional que iam adquirindo os interesses que estavam na órbita da CUF, o concorrente na sombra do BNU, que tinha outros interesses a zelar, como os da Sociedade Comercial Ultramarina. É preciso estudar esta documentação para se perceber o profundo choque de interesses que opunham estes dois conglomerados.

Entretanto, vai chegar a guerra, com muita perturbação, a Gâmbia é colónia inglesa e África Ocidental francesa não se identifica com o Governo de Vichy. Em Bissau, é preciso mostrar neutralidade, o sistema económico e financeiro vai passar por um mau bocado, crescerá o contrabando, virá ouro de diferentes proveniências.

Um outro governador, Ricardo Vaz Monteiro, destacar-se-á por trazer um projeto para a administração, vai abrir caminho para os sucessos que Sarmento Rodrigues irá colher.

Um abraço do
Mário



Fotografia de dia de pagamento ao pessoal da SIGUE, empresa sediada nos Bijagós, que andou permanentemente aos altos e baixos e que acabou na água. O seu processo consta do Arquivo Histórico do BNU, é peça de muito interesse. 


Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (52)

Beja Santos

A Casa Gouveia entrara declaradamente em rota de colisão com o BNU em Bissau, o gerente Virgolino Pimenta, como se disse anteriormente, não poupava críticas ao comportamento da empresa, dizendo claramente para Lisboa:

“A Casa Gouveia tem a Guiné por tabanca sua e tem razão para isso porque ninguém – absolutamente ninguém – a impede de fazer o que quer em matéria de transferências, que outra não nos interessa”.

A Casa Gouveia reagia, procurava atrair outros comerciantes para a sua causa, queixara-se mesmo ao Ministro das Colónias. No acervo documental do Arquivo Histórico do BNU guarda-se o documento em que a Casa Gouveia ensaiava uma culpabilização:

“A Crise da Guiné provocada pelo Banco Ultramarino

A firma António Silva Gouveia, Lda., compra, na Guiné, mancarra (mendobi com casca) para fornecer em Lisboa à indústria nacional dos óleos comestíveis.

Desde a sua fundação, persistentemente, e à custa de pesadíssimos sacrifícios, tem a referida firma nacionalizado o comércio naquela província ultramarina, comércio que quase exclusivamente esteve em mãos de franceses o que, dada a posição da Guiné (entre duas colónias francesas) poderia vir a ser perigoso para a Soberania Nacional.

Assim, já a colheita de 1937 foi comprada e exportada para Lisboa na sua quase totalidade pela firma A.S.G. (23.500 toneladas compradas e exportadas para 24.700 de colheita).

Esta mancarra é comprada directamente ao gentio ou ao pequeno comércio e é paga em dinheiro (notas do BNU).

As disponibilidades da firma A.S.G. são obtidas pela venda, na Guiné, de mercadorias europeias e por entregas feitas em Lisboa ao BNU em numerário metropolitano, 50% do valor da exportação da Guiné. O BNU paga à firma A.S.G. na Guiné igual valor em numerário colonial, nos termos da lei (cambiais de exportação).

Como a campanha de compra da mancarra dura cerca de dois meses e a exportação se arrasta quase por um ano, a firma A.S.G. tem entregue numerário antecipadamente ao BNU por conta de futuras exportações.

Este ano, porém, o BNU alegando falta de lucros nas suas agências da Guiné, recusa-se a aceitar a liquidação das exportações da forma como se tem vindo fazendo nestes últimos anos, isto é, antecipadamente, pretendendo forçar a firma A.S.G. a recorrer ao crédito na Guiné, por desconto de letras, onde ele, BNU, leva 10% de juro ao ano!

Perante a recusa da firma A.S.G. de se submeter aquela pretensão, o BNU propõe manter o regime anterior de liquidação de futuras exportações, desde que a firma A.S.G. lhe pague uma comissão de 2% sobre o montante de cada liquidação, isto é, o BNU podia dispor do montante dos escudos metropolitanos desde a data da entrega pela firma A.S.G. até à data em que, por sua vez, ponha à disposição do Governo da Província aqueles escudos metropolitanos e receba do mesmo Governo, escudos da Guiné, e ainda exigia uma comissão de 2%!!!


Sendo, como é, inaceitável a proposta do BNU, vai dar-se o caso da firma A.S.G. reduzir as suas compras de mancarra ao mínimo, visto só poder dispor do pequeno montante de escudos da Guiné, deixando inteiramente o gentio na mão das casas francesas (além da casa A.S.G. só há poucas casas portuguesas e de pequena importância) que o vai explorar a seu belo talante, comprando por preços irrisórios e desnacionalizando o comércio da Província Portuguesa da Guiné, com a agravante ainda de se os preços forem muito baixos ou se as casas francesas não tiverem capacidade para a compra de toda a colheita, não ter o gentio disponibilidade para pagar o imposto de palhota. E note-se que 25.000 toneladas de mancarra, ao preço médio de $50 por quilo, dão Esc.12.500$00 e o cômputo do imposto de palhota é de cerca de Esc. 12.000$00. Em consequência desta atitude do BNU, a indústria nacional dos óleos comestíveis vai ser obrigada a recorrer a outros mercados, drenando o ouro para fora do país”.

Dirigindo-se ao chefe de gabinete do Ministro das Colónias, em abril de 1938, um administrador do BNU dá outra versão aos acontecimentos:

“Em anos anteriores a firma Silva Gouveia, Lda., entregava na sede do Banco escudos metropolitanos para na Guiné lhe ser entregue igual quantia em notas da emissão daquela colónia. Esta operação era efectuada sem que a firma António Silva Gouveia, Lda., pagasse qualquer comissão. Estas entregas representavam o valor total da mancarra anteriormente exportada da Guiné pela referida firma, e nos termos da lei 50% eram creditados ao Governo da Guiné e os restantes 50% utilizados pelo Banco para as transferências do comércio e dos particulares. As coberturas obtidas não eram suficientes para as transferências e o Banco, com o desejo de não criar embaraços às actividades da colónia, continuou a fazer transferências, encontrando-se hoje com créditos paralisados na colónia que só muito lentamente conseguirá transferir. Aquela modalidade de entregas não convinha à firma António Silva Gouveia, Lda., que entrou a utilizar outro sistema: a entrega de 50% do valor da exportação, ficando em mão com os 50% restantes, que aplica ulteriormente como lhe convém. Sucede, porém, que esta conveniência de a firma é contrária aos interesses legítimos do BNU e dos particulares e comerciantes da Guiné. O Banco, privado dos 50% das coberturas livres, resultante da exportação da mancarra, não pode fazer transferências e os comerciantes e particulares só as conseguem clandestinamente a taxas não inferiores a 10%. Ora o interesse particular não deve sobrepor-se ao interesse geral, antes aquele tem de subordinar-se a este. Assim o entende o BNU, e procura agir em conformidade.

Este último sistema muito útil para a firma António Silva Gouveia, Lda., visto pretender que seja continuado, é prejudicial para o Banco e para o comércio. O Banco recusou-o e indicou três modalidades de entre as quais a interessada podia escolher a que mais lhe conviesse. Consistiam as três modalidades no seguinte:

a) – entrega em Lisboa da totalidade do valor da exportação em escudos metropolitanos, sem o pagamento de comissões;
b) – concessão de crédito na Guiné, com o encargo de juros à taxa em vigor na colónia, liquidável em escudos da emissão do BNU;
c) – entrega de 50% do valor da exportação em Lisboa, em escudos metropolitanos, pagando a firma a taxa de transferência de 2%.

A patriótica atitude da firma António Silva Gouveia, Lda., pretendendo evitar que o pobre indígena seja explorado, merece inteiro aplauso e deve ser louvável. O Governo da Colónia, porém, antecipou-se na defesa do indígena: regulou os preços da campanha, não consentindo que se paguem pela mancarra preços muito baixos. Segundo informações existentes no Banco, o perigo de compra da mancarra pelas casas francesas a ‘preços irrisórios’ não existe, sendo talvez a própria firma António Silva Gouveia, Lda., que teria procurado praticá-los oferecendo ultimamente o preço de 400$00 a tonelada por um lote de cerca de 8000 toneladas de mancarra adquirido aos preços correntes do mercado, ou seja, a cerca de 460$00 a tonelada e que lhe foi oferecido ao preço de Esc. 500$00. A mancarra está já vendida pelo indígena a preços bem superiores aos da paridade da Europa.

Certamente, por lapso, não sugeriu a firma António Silva Gouveia, Lda., para protecção do indígena da Guiné que o Governo da Metrópole estabelecesse uma taxa de importação para a mancarra não originária das nossas colónias. Se essa taxa vier a estabelecer-se, não ficará o pobre indígena sujeito à exploração das casas francesas e das poucas e de pequena importância casas portuguesas.”

Recorde-se que vinha de longa data o compromisso da casa Gouveia realizar todas as suas operações bancárias por intermédio do BNU.

Anteriormente à correspondência trocada entre a sede do BNU e o gabinete do Ministro das Colónias já o gerente de Bissau, em 29 de março, enviara para Lisboa um ponto de situação da praça, nos seguintes termos:

“A Sociedade Comercial Ultramarina não recebeu agora nenhumas ordens para comprar mais mancarra.

Se vierem, são talvez tardias. A mancarra da colónia deve estar toda vendida, à excepção da de Bolama cuja campanha vai começar em breve.

Os negócios da mancarra, este ano, ainda nos parecem mais incertos que de costume, dadas as baixas cotações que se conhecem.

A Comercial, para ganhar algo na muita mancarra que já possui, terá que a vender com muito cuidado a certos intermediários que nos parece ganharem exageradamente.

Já vimos uma carta em que se menciona o preço de £ 0.35 de frete, por tonelada. Ora já vimos que uma casa da praça, sem intermediários nenhuns, obteve o preço de £ 0.25.

Para nós, entendemos que é melhor o Banco fechar as portas à Comercial que estar fazendo negócios de compras e vendas por intermédio de intermediários de cá e de lá, a não ser que estes sejam considerados nos seus benefícios.

Sobre a vinda de notas para a Casa Gouveia, ou se faz o que a lei permite, fazendo-se sentir seriamente à Gouveia que deve respeito às leis do País, ou é melhor não se fazer nada para não cairmos no ridículo.

O governo local nunca tomou as menores providências contra o que faz a Casa Gouveia em matéria de ilegalidade e concorrência ao Banco.

E bem lhe cumpria intervir no assunto, pois as transferências da Gouveia, por milhares de contos, a taxas exageradíssimas, são uma função importantíssima do enorme alteamento de custos da vida na colónia. Excelentíssimo Senhor: ou a moral e força moral para se fazerem cumprir e respeitar as leis e as autoridades atacam a fundo casos de desrespeito com a violência relativa aos mesmos e a arrogância e constância com que esses desrespeitos se praticam, ou regista-se uma cobardia moral que envergonha mas que, nem por isso, assusta os responsáveis por tão vergonhoso estado de coisas.
E, nesta situação, para quê e a quem pedir providências se elas não vêm e ainda sofre o que pediu em emprego da lei que a imoralidade do meio e a incapacidade moral dos governos locais deixou cair em desuso?

Tudo que não seja uma atitude digna e severa do governo local, fará cair no ridículo qualquer pedido de providências sem haver a prévia certeza que aquela atitude é possível.

V. Ex.ª. verá: se vierem notas do Banco de Portugal, virão clandestinamente num barco da Gouveia. Clandestinamente desembarcarão e depois de a praça estar cheia delas será fácil, muito fácil mesmo, não se… saber de onde vierem.

A solução é só esta: uma busca a cada barco da Gouveia ao chegar e a aplicação da lei se forem apreendidas as notas.

Quanto à atmosfera criada contra o Banco, aqui, está perfeitamente anulada, pois não é um gerente grosseiro da casa Gouveia que tem habilidade ou moral para ofender.

Quanto à atmosfera contra o governo da colónia, achamos que este a merece bem, pois a sua atitude de deixar fazer a Gouveia o que tem querido, em matéria de transferências, é tanta que atinge as raias da mais descarada solidariedade inconsciente (?).

E isto que consideramos solidariedade inconsciente (?) teve o ponto de quase provocar um pedido telegráfico contra o Banco por este não dar dinheiro à Gouveia, pedido provocado por trapalhices do gerente da Gouveia e que o gerente desta agência fez anular, falando com respeito mas com firmeza e clareza próprias de quem tem razão.

Se o telegrama seguisse, o Sr. Governador seria um semideus. Não seguiu e ficou o Sr. Governador sujeito ao ataque. Achamos bem, pois é isto a que se sujeita quem anda a jogar em falso para todos os lados, gritando a sua amizade ao Banco, que vive dentro da lei e não lhe pede nada fora dela, mas ajudando aqueles que a desrespeitam e provocam assim prejuízos materiais e morais ao Banco.
Esta é a triste verdade.”

O gerente Virgolino Pimenta manterá sempre uma atitude hipercrítica com Carvalho Viegas, e sempre que pode põe-no a ridículo. Veja-se a carta que envia em 22 de junho de 1939 para Lisboa:

"O Sr. Governador da colónia foi a Cabo Verde cumprimentar Suas Excelências o Presidente da República e o Ministro das Colónias.

Levou consigo uns três funcionários e quis levar um representante das forças vivas da colónia.
Ninguém quis ir.

Depois de várias démarches, lembraram-se de levar o advogado Dr. Alçada Padez, que pareceria ir naquela qualidade.

Este pediu oito contos pelo serviço, fez-se uma subscrição, mas ninguém deu um real.

O Sr. Dr. Padez baixou a sua exigência para quatro contos. Ainda ninguém deu nada.

Para se salvar a situação, o Presidente da União Nacional e a Casa Ed. Guedes, Lda., tomaram a responsabilidade de pagar os quatro contos ao Dr. Padez.

Porém, estas duas entidades pretendem ainda que se faça a tal subscrição e vieram ao Banco pedir dinheiro.

É mais que certo que ninguém dará nada, como até aqui, mas para regularmos o nosso procedimento, agradecemos a fineza de nos dizerem se devemos ou não contribuir, e em caso afirmativo, com que verba”.

O despacho em Lisboa, e que consta do documento existente no Arquivo Histórico do BNU, foi o de não autorizar qualquer subsídio, alegava-se que os estatutos não o permitiam.

E assim chegamos à II Guerra Mundial.

(Continua)


Imagem constante de uma brochura de propaganda intitulada “Guiné, Início de um Governo”, 1954, Mello e Alvim sucedeu a Raimundo Serrão, uma historiografia fantasista atribui-lhe a responsabilidade do regresso compulsivo de Amílcar Cabral e da mulher a Portugal, quando na verdade estes vieram por imperativos de saúde, carregados de malária.


Guarda de honra feita ao Governador pelos polícias guineenses, imagem retirada da brochura que assinala os primeiros meses de governação de Mello e Alvim.
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Notas do editor

Poste anterior de sexta-feira, 14 de setembro de 2018 > Guiné 61/74 - P19014: Notas de leitura (1100): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (51) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 17 de setembro de 2018 > Guiné 61/74 - P19022: Notas de leitura (1101): “Contos de N’Nori”; Edição UNEAS (União Nacional dos Escritores e Artistas de S. Tomé e Príncipe), 2005 (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P19032: Agenda cultural (649): Festival TODOS 2018: Lisboa, São Vicente, de 20 a 23 de setembro


Lisboa > São Vicente > Campo de Santa Clara > Oficinas Gerais de Fardamento do Exército (OGFE) > 20 de setembro de 2018, 19h00 > Início da 10ª edição do Festival Todos > Atuação do grupo de batucadeiras de Cabo-Verde "Ramedi Terra" (, que pertence à Associação de Mulheres Cabo-Verdianas na Diáspora em Portugal). Seguiu-se a abertura da exposição sobre as pessoas e a realidade do bairro de São Vicente, e o lançamento do livro TODOS (sinopse fotográfica das anteriores edições, de 2009 a 2017,), livro de distribuição gratuita. Houve depois um "cocktail de sabores do mundo", da Guiné-Bissau ao Bangladesh... Tudo no edifício da OGFE.

Foto: © Luís Graça (2018). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


1. Festival TODOS 2018: 

"Criado em 2009, o TODOS-Caminhada de Culturas tem afirmado Lisboa como uma cidade empenhada no diálogo entre culturas, entre religiões e entre pessoas de diversas origens e gerações. O TODOS tem contribuído para a destruição de guetos territoriais associados à imigração, abrindo toda a cidade a todas as pessoas interessadas em nela viver e trabalhar."




Recortes com a devida vénia do sítio oficial do TODOS 

Programa de ontem:

  • 19h - 20h30 : Abertura da 10ª Edição do Festival nas Oficinas Gerais de Fardamento e Equipamento (Campo de Santa Clara) com Cocktail de sabores do mundo, inauguração da exposição de fotografia "São Vicente de Fora por dentro", actuação do grupo de batucadeiras de Cabo-Verde "Ramedi Terra" e lançamento do livro “TODOS”.

• 20h30 – "Vala Comum" (Teatro) de Andresa Soares na Escola Básica de Santa Clara - espectáculo pago (3€)

  • 21h00 – "Viagem Sentimental" (Dança Contemporânea) de Francisco Camacho na Casa dos Gessos do Museu Militar - espectáculo pago (3€)

• 22h00 – Orquestra Todos (Música) na Voz do Operário - Entrada livre

• 23h00 – Rita Só (DJ set) no DAMAS - Entrada livre

Fonte: Página do Facebook do TODOS


Nota do editor LG:

São 3 ou 4 dias que não perco, todos os anos, desde 2009. Vale a pena e recomendo este evento (que de  3 em 3 anos muda de cenário dentro da cidade de Lisboa: Martin Moniz / Intendente / Bem Formoso (de 2009 a 2011); Poço dos Negros / São Bento / Santa Catarina (de 2012 a 2014); Colina de Santana / Campo Mártires da Pátria (de 2014 a 2017).

 Para além da descoberta (e aprofundamento do conhecimento) das diferentes culturas e povos que vivem em Lisboa (, nas escolas do ensino básico da Grande Lisboa é possível encontrar hoje dezenas de diferentes etnias, da Guiné-Bissau ao Nepal, da China ao Brasil), o festival TODOS tem sido para mim (e para a Alice Carneiro) uma (re)descoberta da Lisboa, muitas vezes escondida (ou mesmo inacessível) aos olhos dos próprios lisboetas e dos seus visitantes.

Ontem, por exemplo, fomos aos eventos assinalados, acima,  a negrito.  Nunca tínhamos entrado, por exemplo,  na OGFE e muito menos na famosa Sala do Gesso, do Museu Militar... Em anos anteriores, por exemplo, na Colina de Santana, a Academia Militar abriu as suas portas aos participantes do TODOS. Diversos oficiais superiores das OGFE e do Museu Militar participaram, este ano,  na cerimónia de abertura do evento.

O festival proporciona fantásticas visitas guiadas pelos sítios onde decorre: este ano, em São Vicente. Ponto de encontro: jardim Botto Machado, no Campo de Santa Clara, junto à Feira da Ladra.
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Nota do editor:

Último poste da série > 4 de setembro de 2018 > Guiné 61/74 - P18984: Agenda cultural (648): lançamento do livro "Moçambique: guerra e descolonização, 1964-1975", de Manuel Bernardo, na biblioteca municipal de Faro, dia 18 de setembro de 2018, pelas 18h00

Guiné 61/74 - P19031: Parabéns a você (1500): Cor Art Ref Alexandre Coutinho e Lima (Guiné, 1963/65-1968/70 e 1972/73); Maria Teresa Almeida, Amiga Grã-Tabanqueira da LC e Raul Albino, ex-Alf Mil da CCAÇ 2402 (Guiné, 1968/70)



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Nota do editor

Último poste da série de 15 de setembro de 2018 > Guiné 61/74 - P19015: Parabéns a você (1499): Manuel José Ribeiro Agostinho, ex-Soldado Radiotelegrafista - CCS/QG/CTIG (Guiné, 1968/70)

quinta-feira, 20 de setembro de 2018

Guiné 61/74 - P19030: Em busca de... (290): Mais elementos informativos sobre o memorial em Bachile, na região do Cacheu, com os nomes dos fur mil op esp José Duarte Franco Verde, e sold Humberto dos Santos Aires, da CCAÇ 2572, "Os Sem Pavor", mortos por acidente com arma de fogo em 26/11/1969 (António Salvada, CCAÇ 2584 / BCAÇ 2884, Có, 1969/71)


Guiné > Região do Cacheu > Bachile > CCAÇ 16 (1972/74) >  Dois camaradas que passaram por Bachile: os fur mil José Romão (à direita) e Bernardino Parreira (à esquerda), dois algarvios de Vila Real de Santo António e Faro, respetivamente. Ao fundo, no memorial, lê-se: "Para uma Pátria una e indivisível, a Companhia Manjaca [,CCAÇ 16, constituída em 1970] está defendendo o seu chão da cobiça de estranhos, ainda que tenha de derramar o seu sangue". 

Sobre a CCAÇ 2572, dos infortunados fur mil op esp João Verde e sold Humberto Aires, que aqui morreram em 26/11/1969, não temos infelizmente qualquer referência.

Foto: © José Romão (2010). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem do nosso leitor e camarada, que esteve na Guiné, António Salvada, com data de hoje, às 11h19

Bom dia,  caros amigos. Estive na Guiné,  de 69/71, na CCAÇ 2584 / BCAÇ 2884. Estive em Có.

Como todos nós, também eu fiquei, de algum modo, ligado àquela terra.

Contacto-vos porque conheci uma rapariga da Guiné que, depois das nossas conversas sobre sua terra, me disse ter conhecimento de uma sepultura de 2 camaradas nossos que lá  ficaram.

Como os nossos amigos têm tentado informar alguém, calhou agora comigo.

Creio que talvez possam ajudar.

Esse monumento ou memorial é no  Bachile, região do Cacheu,  e os nomes que estão gravados são: 

Fur mil José Verde Apelido: VERDE; e o soldado Humberto S.Aires, Os nomes estão juntos, a data não é legível (só se lê 07).

Deu me as referências: Bachile, aldeia Punguran onde mora seu pai, Adriano Pimpão Fernandes (conhece o local do monumento ou memorial).

A miúda chama-se Júlia Fernandes e é funcionária no Hospital dos SMAS.  Tem fotos da sepultura.

Seria bom que todos pudéssemos ajudar.

Obrigado e, se conseguirem algo, digam. Ok!

Um abraço António Salvada.

Enviado a partir do meu smartphone.


2. Comentário do editor LG:

Obrigado, camarada Salvada, por nos fazeres chegar esse pedido da tua amiga guineense. A nossa missão é justamente não deixar "ninguém para trás", física ou simbolicamente falando... Não queremos que nenhum camarada ninguém morra no esquecimento ou esteja sepultado na "vala comum do esquecimento", como acontece, infelizmente, com a a maior parte...

Infelizmente, não temos, no nosso blogue, nenhuma referência à CCAÇ 2572, "Os Sem Pavor" (1969/71)... Os camaradas em causa terão sido os únicos mortos dessa Companhia. E sabemos que morreram em 26/11/1969, por acidente (ao que parece, com arma de fogo).

Fica aqui o apelo aos nossos leitores. Presume-se que o alegado monumento, em Bachile, com os nomes destes dois infortunados camaradas, seja um memorial e não uma sepultura... Nessa altura, os restos mortais dos militares portugueses eram já trasladados para o cemitério da sua terra natal...

Apelido: VERDE
Nome: JOSÉ Duarte Franco
Posto: Furriel
Ramo: Exército
Teatro de operações: Guiné
Data: 26/11/1969
Motivo: Acidente

Apelido: AIRES
Nome: HUMBERTO dos Santos
Posto: Soldado
Ramo: Exército
Teatro de operações: Guiné
Data: 26/11/1969
Motivo: Acidente

Sobre o José Duarte Franco Verde, conseguimos apurar, através de consulta do portal Ultramar Terra Web (o Portal UTW - Dos Veteranos da Guerra do Ultramar, que está "on line" desde 2006),  o seguinte: (i) era natural de Vila Praia de Âncora, concelho de Caminha; (ii) tinha o posto de furriel miliciano de operações especiais; (iii) pertencia à CCAÇ 2572 / BCAÇ 2845; (iv) morreu, de facto, por acidente com arma de fogo, em 26/11/1969; e  (v) está sepultado na sua freguesia natal. (O concelho de Caminha teve 7 mortos na guerra do ultramar.)

Qualquer outra informação dos nossos leitores será bem vinda, e nomeadamente sobre o Humberto dos Santos Aires, cujo concelho de naturalidade desconhecemos.

Quanto ao nosso camarada António Salvada: ficas desde já convidado para integrar a nossa Tabanca Grande, na qual estão estão listados, desde 23/4/2004, os nomes de 777 amigos e camaradas da Guiné, dos quais 66 já falecidos. Só é preciso mandares duas "chapas",  digitalizadas, uma foto atual e outra do "antigamente da guerra"... E duas ou três linhas para complementar a tua apresentação... No caso de teres uma álbum fotográfico da Guiné, com interesse documental, melhor ainda: podes partilhá-lo com todos nós. LG
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Nota do editor:

Último poste da série > 31 de agosto de 2018 > Guiné 61/74 - P18968: Em busca de... (289): Camaradas de armas do ex-Fur Mil João António (1950-2010) do Batalhão do Serviço de Material da Guiné (Brá, 1972/74), de quem vai ser inaugurada uma exposição de pintura na Associação 25 de Abril, em Lisboa (Dulce Afonso/A25A)

Guiné 61/74 - P19029: Estórias do Juvenal Amado (62): O Vilela, num conto com bolinha vermelha

Alcobaça vista do Castelo


1. Em mensagem de 17 de Setembro de 2018, o nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor Auto Rodas da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74), autor do livro "A Tropa Vai Fazer de ti um Homem", enviou-nos mais uma das suas estórias, esta a do Vilela.


ESTÓRIAS DO JUVENAL AMADO

62 - O VILELA - NUM CONTO COM BOLINHA VERMELHA

O Vilela era o rapaz do nosso grupo, amigo das paródias, dos matraquilhos dos bailaricos. Adorava anis escarchado e um dia, pregamos-lhe um piela em minha casa. O problema foi quando o foi preciso leva-lo a casa pois tinhas as pernas que pareciam gelatina e não se punha em pé de maneira nenhuma. Quando finalmente o conseguimos levar, a mãe só faltou bater-nos para além dos nomes que nos chamou.

Aprendiz de alfaiate, viu-se impedido de acompanhar os pais que se mudaram para a América, uma vez que estava na idade militar, e assim despediu-se da mãe chorosa e do pai emocionado, porque os homens que eram homens não choravam, e por cá ficou, não sei se me recordo bem mas tenho ideia de que assentou arraiais em casa de familiar próximo.

A partir daí o herói deu-se a ares de magnata e nunca mais parou de exibir belos fatos com colete a condizer, sobretudos e botas que se usavam naquele tempo, à moda dos Beatles. Quem daquele tempo não se lembra das cobiçadas botas com bocadinho de cano e biqueira muito fina, que ficavam a matar com as calças à boca-de-sino. Era rara a semana que não aparecia com uma “encadernação” nova.

Eu, os Pedrosas, o Rego, o Joaquim e José António, todos os dias tínhamos ponto de encontro no café Portugal, onde ele sobressaía mais parecendo o Al Capone e nós os acólitos, mas ele era cómico e nós riamo-nos com as coisas que fazia e dizia.

Está claro que deixou de trabalhar e o dinheiro era como quem abana a árvore das patacas, não parava de chover, porque aos seus pedidos os pais talvez com peso na consciência por o cá ter deixado, abriam os cordões à bolsa no vão intento de que a sangria parasse, que a tropa o viesse buscar rapidamente e desse um fim ao calvário porque passavam, afastados do seu menino que custava os olhos da cara e muitas horas extraordinárias nos empregos que arranjaram lá nos states.

Por cá o Vilela acabou por se indispor com o familiar onde se hospedara e, como os dólares pingavam sempre, hospedou-se nos Corações Unidos, a melhor pensão de Alcobaça, por onde passava toda a gente que era gente, que visitava a linda vila, desde industriais e artistas, músicos e até engates de caixeiros viajantes.

O Vilela estava na maior. Passava dos pedidos de roupas para um anel visto numa ourivesaria, ou para uns óculos Ray-Ban que lhe trouxeram da base americana das Lajes nos Açores, é que lhe faziam muita falta porque cá havia muito Sol. Pudera era só escrever a pedir à mãe, que lá vinham os benditos dólares que não tardou a queixar-se sem grandes resultados.

Assim o grupo de amigos acabava por olhar para a situação com algum misto de incredulidade e não foram poucas as vezes que lhe dissemos que talvez devesse parar com aquilo. Nada feito, dos gastos com roupa e sapatos passou ao gosto desenfreado pelos jogos de alcova, tornando-se assíduo em certo estúdio de fotografia, que o dono transformava em bordel algumas noites por semana. Ora o nosso Vilela parecia um catraio numa loja de doces e passou a assediar o proprietário para que arranjasse mais “meninas”. Vivia num frenesim, o seu aspecto cuidado passou a apresentar algum desleixo, bem como um ar cansado e a rarear nos convívios com o grupo.

Uma bela noite o Rego bateu-me à porta com um ar suspeito a pedir-me para ir com ele, pois o Vilela precisava de ajuda. Lá vou eu direito ao estúdio de fotografia, e ao fundo das escadas lá estava o bom do Vilela embrulhado num lençol com um ar meio esgazeado. Assim que vi o que aconteceu, fui buscar um táxi, e ala para o hospital que se faz tarde.

Quando o enfermeiro lhe retirou o lençol mais o papel higiénico do corte que tinha na glande, foi um mar de sangue. Dizia o enfermeiro Torres que nunca tinha visto uma gaita tão escangalhada e perguntava como tinha acontecido aquilo. Ele contou que se tinha cortado a fazer sexo num cabelo, que estava atravessado à entrada e não vale a pena pôr mais na escrita, pois para bom entendedor meia palavra basta.

Está claro que aquilo foi motivo de muito riso e para mais como é que o Vilela ia estar quieto sem pensar em nada que o fizesse arrebitar, quando ele se tinha transformado viciado em sexo.

Entretanto curou-se e voltou ao mesmo, mas afastou-se de nós que não tínhamos capacidade de o acompanhar em tonteira nem financeiramente.

Finalmente foi para a tropa como nós todos e eu terei sido o último. Mobilizados uns para cada lado, eu e os irmãos José e Joaquim António fomos para a Guiné, um dos Pedrosa foi para Timor e o Luís Pedrosa foi Operações Especiais em Moçambique, o Rego ficou cá como amparo de mãe, o nosso Vilela não faço a menor ideia, mas penso que acabado que foi o seu serviço militar, deve ter ido para a América ter com os pais e nunca mais o vi.

No regresso encontrei os irmãos, soube que o Pedrosa se tinha suicidado em Timor, o Luís contraiu um vírus, que se veio a revelar uma poliomielite infantil tardia, ficando coxo até à sua morte.

Felizmente fui ao casamento do Rego e do José António, que continuam de boa saúde pois têm perguntado por mim aos meus irmãos.

O Vilela é uma recordação que me faz recuar aos tempos de alguma irresponsabilidade e loucura, que cá continuam bem num cantinho e que de vez enquanto acordam misturados com a saudade daqueles tempos, agora que vamos adiantados nos “entas”.

O Vilela nunca lerá esta estória mas se ler, lembrar-se-á e deve dar uma gargalhada, embora eu tenha ficcionado o nome, vai-se reconhecer de certo nela.

Uma abraço
Juvenal Amado

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Nota do editor

Último poste da série de 10 de agosto de 2018 > Guiné 61/74 - P18912: Estórias do Juvenal Amado (61): Um pouco de todos nós - "Difícil foi libertar-me do abraço", por Carlos Paz

quarta-feira, 19 de setembro de 2018

Guiné 61/74 - P19028: Historiografia da presença portuguesa em África (131): Relatório do Comando Militar do Oio, nascia o ano de 1915 (3) (Mário Beja Santos)

Habitação em Bolama, com configuração em L, destaca-se pela composição da fachada com grelhas de ventilação para o interior da habitação, fotografia de Francisco Nogueira, retirada do livro “Bijagós Património Arquitetónico”, Edições Tinta-da-China, 2016, com a devida vénia.


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 12 de Abril de 2018:

Queridos amigos,
Reconheça-se a originalidade da iniciativa do Governador Oliveira Duque em querer uma caraterização da colónia, em moldes de uma pacificação que começava a garantir, na Guiné continental, a possibilidade de uma livre circulação e implementação administrativa.
Estabilidade política não era completa, no mesmo ano em que o Tenente Barbosa redige o seu relatório em Mansabá do Oio. Teixeira Pinto e os irregulares de Abdul Injai investem brutalmente contra os Papéis insubmissos, mas com clamoroso resultado.
Vou continuar a pesquisar se existem nos Reservados da Sociedade de Geografia documentos congéneres. Sob forma de livro, o Administrador de Geba, Vasco Calvet de Magalhães, publicou o seu, muitíssimo interessante, por sinal.
Dele falaremos aqui, em breve.

Um abraço do
Mário


Relatório do Comando Militar do Oio, nascia o ano de 1915 (3)

Beja Santos

Na continuação às respostas dadas, de acordo com uma circular difundida pelo Governador Oliveira Duque, em agosto de 1914, o Comandante Militar do Oio, incontestavelmente, esforçou-se por responder cabalmente a todos os requisitos, já falou de religião, de práticas mortuárias, do tratamento da mulher, do respeito pelos velhos, das etnias existentes naquele amplo espaço do Oio, entra agora concretamente nas atividades da pequena indústria, fala em sapateiros, alfaiates, ferreiros, carpinteiros, tecelões de panos de banda, dizendo que tudo é rudimentar. Os sapateiros, para além de fabricarem sandálias e alpercatas, também fabricam bainhas de espadas. O ferreiro faz a cela mandinga, o carpinteiro faz canoas, bancos em forma de ampulheta e algumas camas, tudo, porém, muito tosco. Recorda que o tecelão produz panos de banda que correm no mercado como moeda.

Inflete agora para o tipo de povoamento e habitação. É uma certa organização das moranças que leva à constituição da tabanca, as casas dentro da tabanca estão organizadas por famílias, separam-se por tecido de bambu silvestre. As paredes das casas dos Soninqués são feitas de um tecido construído com fasquias também de bambu silvestre. As casas dos Fulas são de dois tipos: umas iguais às dos Soninqués e outras são feitas de folhas de sibe.

Quanto a desporto, equitação e jogos, é respondido que os Oincas são ótimos cavaleiros, que também praticam às vezes a luta corpo a corpo no fim dos batuques e que a dança é apenas usada no batuque e que o canto é monótono. Usam alguns instrumentos musicais rudimentares, sendo o mais importante e melodioso o cabaço grande, korá em língua mandinga. Estes instrumentos são usados especialmente pelos emigrados do chão francês que se estabeleceram na Guiné Portuguesa.

No que toca à instrução, diz que os Oincas e os Fulas não dão qualquer instrução às crianças. Os mouros têm um ensino doméstico que consiste no ensino do Alcorão.

O relatório irá expender mais largas considerações no que toca à agricultura e alimentação. A alimentação baseia-se no milho e arroz, mas empregam-se também vários legumes tais como o feijão, a abóbora, a mandioca, a batata-doce, a mancarra, e usam-se muitos frutos como a banana e a papaia.

Falando de bebidas, o Tenente Barbosa diz que só o mouro não bebe, bebe-se acima de tudo vinho de palma e quem tem posses e vai ao comércio compra aguardente. O Fula, que noutras regiões não bebe bebidas alcoólicas, abusa aqui extraordinariamente do vinho de palma. E fala das práticas agrícolas dizendo que os homens cultivam o milho, a mancarra e algum algodão, enquanto as mulheres cultivam arroz e tratam dos quintais onde plantam e semeiam mandioca, batata-doce, baguiche, jagatu, canja, tomate, entre outros. Comenta que há na região abundância de borracha e cera e algum marfim proveniente do hipopótamo, chamado cavalo do rio. A extração da borracha é feita praticando vários golpes no caule da planta, sendo o látex regado com água salgada para a sua gelatinização. Passadas algumas horas, é recolhida a borracha e é assim que é vendida ao comércio. Infelizmente, esta produção atualmente quase não tem procura.

A cera é rudimentarmente preparada. Uns apenas extraem o mel dos favos, empastando a cera, que vendem assim (cera bruta), outros fervem-na para a limpar um pouco, empastando-a depois para a vender. Há na região grandes quantidades de palmeiras e portanto bastante caroço que chega por vezes a ter bom preço no comércio. A colheita nada tem de especial. No Oio não há cacau, café nem tabaco, parecendo que estas espécies aqui se poderiam dar bem nalguns pontos da região. Seria da máxima conveniência fazer um ensaio de cultura destas plantas.

Quanto às ferramentas e utensílios, destaca as enxadas, os sachos e os machados. Discreteando sobre as épocas das diferentes fases das culturas, informa que as sementeiras, em geral, são feitas após as primeiras chuvas (junho e julho). O milho grosso é o que se produz em menos tempo, colhendo-se por isso, em média, no mês de setembro. O milho meio grosso colhe-se em princípios de outubro e o milho mendo no fim do mesmo mês. A mancarra é colhida no mês de novembro e princípio de dezembro. O arroz é transplantado quando as chuvas têm inundado o terreno a ele destinado (mês de agosto) e é colhido em outubro e novembro. A mandioca, batata-doce e outras culturas de quintal têm quase todas a mesma época de cultura.

Referindo-se aos utensílios de uso doméstico, observa que há potes e panelas de barro, que são raras as panelas de ferro, como são raras as chaleiras de ferro esmaltado, há muitas cabaças de diversos tamanhos, cestos diversos, camas rudimentares de madeira.

Quanto a matérias empregadas e ao trabalho dos artífices, adianta que a argila é utilizada para o fabrico de potes e panelas; as camas são feitas com madeira toscamente preparada e “tara” que é uma espécie de palmeira. A oficina do ferreiro consta de bigorna, martelo, tenaz e fola. O ferreiro também faz objetos de prata e ouro, caso de manilhas, anéis e brincos, o ferreiro tem muitas vezes esta dimensão de ourives. O carpinteiro tem como ferramenta apenas uma espécie de enxó.

Referindo-se à caça e principais espécies, elenca o búfalo, a onça, a hiena, a corça, a gazela, a cabra-de-mato, o porco-espinho e a lebre. Na descrição das aves inclui a galinha-do-mato, a choca, o pato-bravo, o maçarico e as rolas. No tocante ao gado, diz que predomina o gado bovino, havendo também abundância de gado caprino, lanígero, cavalar e algum suíno. Deixa uma advertência sobre a água:  
“Sendo a região sensivelmente plana, a água para consumo é toda de poços, não sendo relativamente má; a sua exploração é que é feita em péssimas condições e sem cuidados. Os poços e locais onde a água é tomada não têm resguardos e são muito abertos, entrando toda a qualidade de impurezas e na época de chuvas servindo de depósito às matérias arrastadas, o que tornam estas águas impróprias para organismos delicados”.

Aqui se põe termo ao relatório do Tenente Comandante Militar do Oio, todo ele manuscrito numa caligrafia fina, muito harmoniosa, o Governador Oliveira Duque escreve que o leu, curiosamente põe a data de 1916, aqui e acolá aparece sublinhado, nalgumas páginas há dedadas de tinta preta, o Tenente deverá ter escrito à pena, num caderno de amplas folhas de cor creme. E quem tudo isto lê obrigatoriamente se questiona se houve uma compilação final de toda esta documentação, sabe-se lá se provinda de todos os comandos militares e administradores de circunscrição. O mérito a Oliveira Duque ninguém lho tira, cerca de 30 anos depois, sabe-se de fonte certa, recomeçam os inquéritos, pedem-se monografias, relatórios, etc. Mas é outro tempo, é uma nova atitude do pensamento científico, Teixeira da Mota está ao leme da iniciativa.

Administradores de circunscrição houve que entenderam mandar imprimir os seus documentos, é o caso de Vasco Calvet de Magalhães, Administrador da Circunscrição de Geba, de quem em breve iremos falar do seu detalhado relatório, imprimido em 1916.

Bambadinca, cortejo musical dos Fulas, imagem inserida no livro “Guiné, Início de um Governo”, 1954, obra hagiográfica dedicada ao governador Mello e Alvim.
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Nota do editor

Último poste da série de 12 de setembro de 2018 > Guiné 61/74 - P19007: Historiografia da presença portuguesa em África (129): Relatório do Comando Militar do Oio, nascia o ano de 1915 (2) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P19027: In Memoriam (323): Carlos Cordeiro (1946-2018), ex-Fur Mil Inf do Centro de Instrução de Comandos (Angola, 1969/71), Professor Aposentado da Universidade dos Açores

IN MEMORIAM


Carlos Cordeiro

Acabamos de receber a triste notícia através do Manuel Resende, que por sua vez a viu na página do facebook dos Antigos Combatentes Açorianos

Sabíamos que o nosso amigo e camarada Carlos Cordeiro não estava a passar bem, há já algum tempo que se encontrava na cidade do Porto em tratamento por sofrer de uma doença grave.

Ainda no passado dia 15 o Carlos mandava esta mensagem ao editor C.V.:

Boa tarde querido amigo Carlos. 
Comecei ontem nova terapia, trata-se de um método novo que parece tem dado bons resultados. Havemos ainda de nos encontrar.
Único grande abraço amigo.


Carlos Cordeiro> Angola > Leste > Mucussuege > Setembro de 1969. 

O Carlos Cordeiro, apesar de ter sido Furriel Miliciano em Angola, teve uma activa colaboração no nosso Blogue, onde podemos encontrar 64 entradas.

A sua carreira profissional como Professor na Universidade dos Açores granjeou-lhe um grande respeito e admiração. Aqui fica o seu CV:

Professor Auxiliar com Agregação da Universidade dos Açores, onde concluiu o doutoramento e prestou provas de agregação. 

É autor dos livros "Insularidade e Continentalidade: os Açores e as contradições da Regeneração" (1992), "Na Senda da Identidade Açoriana (Antologia de Textos do Correio dos Açores)" (1995), "Nacionalismo, Regionalismo e Autoritarismo nos Açores durante a I República" (1999), (coord.) "Autoritarismos, Totalitarismos e Repostas Democráticas" (2011) e de diversos artigos em revistas nacionais e internacionais. 

Coordenou diversos colóquios e o projeto “História da Imprensa nos Açores (Séculos XIX e XX)”. 

É investigador integrado do Centro de Estudos Interdisciplinares do Século XX da Universidade de Coimbra e diretor do Centro de Estudos de Relações Internacionais e Estratégia da Universidade dos Açores. 

É coordenador do Mestrado em Relações Internacionais da Universidade dos Açores. 

Integrou a Comissão Científica do Dicionário da República e o Comité Organizador do Congresso Histórico Internacional “I República e Republicanismo”. 

Foi homenageado em 13/2/2016, pelos docentes da Área de História do Departamento de História, Filosofia e Ciências Sociais da Universidade dos Açores, quando,  após 27 anos de carreira, passou à aposentação.
(Foto de Carlos Cordeiro: Com a devida vénia a www.iac-azores.org)

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Não sabemos quando será o regresso definitivo do Carlos Cordeiro aos Açores (S. Miguel?) onde certamente terá a sua morada eterna.

À sua esposa, filhas, netos e demais familiares, apresentamos o nosso pesar e a nossa tristeza por esta perda irreparável. Nós, combatentes, perdemos mais um camarada e um amigo.

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Uma nota pessoal

Porque uma filha do Carlos  vive no Porto, tive o grato prazer de me encontrar com ele diversas vezes. No dia 10 de Junho de 2017, aproveitando uma das suas estadias na Invicta, e porque as comemorações oficiais do Dia de Portugal decorreriam na Foz do Douro, fez questão de desfilar, a meu lado, integrando a formatura da Liga dos Combatentes. Sei que sentiu muito orgulho por ter desfilado perante a tribuna de honra onde se encontrava, presidindo às Cerimónias, o Presidente da República de Portugal.


Porto, 10 de Junho de 2017 - Enquanto aguardávamos o momento do desfile

- Como dizias, Carlos, no último SMS que me mandaste:  Havemos ainda de nos encontrar.
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Nota do editor

Último poste da série de 19 de setembro de 2018 > Guiné 61/74 - P19026: In Memoriam (322): Manuel Maria Veira Carneiro (27 jan 1952 - 11 set 2018), natural do Marco de Canaveses, ex-sold paraquedista, CCP 121 /BCP 12 (Bissalanca, 1972/74)... Nosso grã-tabanqueiro, a título póstumo, nº 777

Guiné 61/74 - P19026: In Memoriam (322): Manuel Maria Veira Carneiro (27 jan 1952 - 11 set 2018), natural do Marco de Canaveses, ex-sold paraquedista, CCP 121 /BCP 12 (Bissalanca, 1972/74)... Nosso grã-tabanqueiro, a título póstumo, nº 777.


Marco de Canaveses > Paredes de Viadores > Festa de Nossa Senhora do Socorro >  27 de julho de 2008 >    Manuel Carneiro, membro da Tabanca de Candoz e,  agora, a título póstumo, da Tabanca Grande, com o nº 777.





Tancos > Regimento de Caçadores Paraquedistas > BCP 12 > CCP 121 > 1971 > O Manuel Carneiro é o terceiro a contar da esquerda para a direita. Nascido em 1952, ainda não tinha 20 anos nesta data... Foto do Para Dias  Dias (o quarto), com a devida vénia).  [Edição e legendagem: Bogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Soube, através da Alice Carneiro, que morreu no passado dia 11 o nosso camarada Manuel Maria Vieira Carneiro, que pertencia à Tabanca de Candoz... Fiquei triste. Falei com ele uma meia dúzia de vezes,  se tanto. E tem duas ou três referências no nosso blogue (*). Era amigo e camarada do Victor Tavares, de Águeda, nosso grã-tabanqueiro da primeira hora.

O funeral foi a 12 do corrente, às 18h30, na igreja de Nª Senhora do Socorro, Paredes de Viadores, Marco de Canaveses- Os seus restos mortais repousam agora no cemitério local, a última (e eterna) morada também dos meus sogros, José Carneiro e Maria Ferreira, fundadores da nossa Quinta de Candoz, pais da Alice Carneiro.

À esposa do nosso já saudoso camarada Manuel Carneiro, às suas filhas e aos seus netos, aos seus amigos e aos seus/nossos camaradas da CCP 121 / BCP 12, os editores deste blogue e os demais membros da Tabanca Grande manifestam a sua solidariedade na dor por esta perda precoce, aos 68 anos,  de mais um dos bravos da Guiné.



2. "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande": foi a expressão que  usei quando encontrei e conheci, pela primeira vez,  o Manuel Carneiro, ex-paraquedista da CCP 121/BCP 12, que esteve na Guiné entre 1972 e 1974.

Quem, primeiro, me tinha falado dele  fora o Victor Tavares, à mesa do Restaurante Vidal, em Aguada de Cima, Águeda, em 2 de março de 2007, tendo a nosso lado o Paulo Santiago, os dois membros, da primeira hora, da nossa Tabanca Grande.

Como então tive ocasião de escrever, o Victor Tavares é "um digno representante dessa escola de virtudes humanas e militares que foram (e são) os paraquedistas".

Valoroso elemento da CCP 121 /BCP 12, na Guiné, entre 1972 e 1974, 1º cabo, famoso apomtador da MG42, sofreu nove baixas mortais: seis na Operação Pato Azul (Gampará, Março de 1972) e três na heroica 5ª coluna que, entre 23 e 29 de maio de 1973, rompeu o cerco a Guidaje. Estes episódios já aqui foram evocados pelo Victor, com dramatismo, autenticidade e rigor (*).

À mesa, na conversa que tive com o Victor, ao almoço, à volta de um delicioso leitão,  deu também para perceber que ele é também um grande homem, um grande português e um grande camarada, que foi um notável operacional mas que não se envaidecia pelo seu brilhante currículo como combatente e pelo facto de ainda hoje privar com os seus antigos oficiais, incluindo aquele que foi seu comandante e que atingiu o posto de tenente-general (Manuel Bação da Costa Lemos, hoje na reforma, condecorado com a Medalha de Valor Militar, grau Prata com Palma), posto esse que é dificilmente alcançável entre as tropas paraquedistas...

O Victor, que tem conhecido as agruras da doença, foi e continua a ser muito respeitado pela família paraquedista, camaradas e superiores hierárquicos... Por isso, a  sua presença, na nossa Tabanca Grande, desde longa data,  só nos pode honrar, sobretudo pela sua grande experiência, camaradagem e lealdade. Não sei se ele já foi, entretanto, informado do camarada Manuel Carneiro.

3. Foi também nessa ocasião, em março de 2007, que eu vim a saber que um grande camarada e amigo do Victor era um tal Manuel Carneiro, conterrâneo e vizinho da minha mulher, Maria Alice Ferreira Carneiro, natural de Paredes de Viadores, concelho do Marco de Canaveses… Não têm, porém,  qualquer parentesco, conhecido,  entre si, apesar do apelido Carneiro…

No dia 2 de Setembro de 2007, seis meses depois, acabei por conhecer, em carne e osso, o Manuel Carneiro. Estava eu a acabar as minhas férias de Verão, passando os últimos dias na pacatez e frescura da nossa Quinta de Candoz, com vista para a albufeira da barragem do Carrapatelo… No dia 2 era a festa do São Romão, orago da freguesia, Paredes de Viadores. Por volta das 16h, decidimos ir dar uma volta até ao sítio onde se realizava a festa do São Romão que não se compara, nem de longe nem de perto, com a grande festa anual da freguesia e do concelho, que é a Senhora do Socorro, na última semana do mês de Junho de cada ano…

São Romão resume-se, em boa verdade, a um pequena procissão e pouco mais. Mas nesse dia actuava o Rancho Folclórico da Associação Juvenil de Paredes de Viadores… Assisti à (e filmei a) segunda parte deste simpático e jovem rancho, fundado em 1997. No final, entendi dever dar uma palavrinha reconhecimento e de estímulo ao respectivo director, que eu não sabia quem era…

Levaram-me até ele e, qual não é a minha surpresa, quando, lá chegado, ele dispara, rápido, a seguinte exclamação:
- Mas... é o Dr. Luís Graça!
- Já nos conhecemos de algum lado?
- Do blogue, pois, claro! Do blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné! Sou camarada do Victor Tavares, paraquedista da 121…
- Podes então dispensar o doutor!… Dá-me cá um abraço, que os camaradas da Guiné tratam-se todos por tu!

Fiquei então a saber que o Manuel Carneiro, na altura com 55 anos, pai de três filhas, era nosso vizinho, conhecia muito bem a família da minha mulher, os Carneiro de Candoz, que era reformado da CP- Camainhos de Ferro, que residia no Juncal, mesmo junto à estação do Juncal (Linha do Douro, entre Marco de Canaveses e Mosteiró) e que assumira há pouco tempo funções de director do Rancho Folclórico da Associação Juvenil de Paredes de Viadores

A conversa inevitavelmente foi parar ao blogue, à Guiné e aos paraquedistas. O Manuel Carneiro estava amiudadas vezes com o Victor, nos convívios periódicos da Companhia (CCP 121) e do Batalhão (BCP 12), nomeadamente em Tancos.

Prometi-lhe, logo ali,  apadrinhar a sua entrada na nossa Tabanca Grande. Disse-me que ainda não tinha endereço de email mas que ia com frequência visitar o nosso blogue, a partir do computador da filha mais nova.

Prometi-lhe também divulgar o rancho (por quem ele mostrava muito amor e carinho e a que dedicava um boa parte do seu tempo), tanto no nosso blogue como no blogue da Tabanca de Candoz, a Nossa Quinta de Candoz…

Um mês depois, hoje, cumpri uma parte do prometido…Carreguei, no You Toube, o vídeo que tinha gravado na festa de São. Romão  [Vd. A Nossa Quinta de Candoz, poste de 7 de outubro de 2007]... é A voz que, entretanto, se ouve no vídeo é a do Manuel Carneiro a quem eu saudei logo, na altura, como "novo membro da nossa tertúlia".

Na realidade, o Manuel Carneiro nunca chegou a ingressar, formalmente, na nossa Tabanca Grande, por falta de endereço de email e da foto da praxe, do tempo da CCP 121 / BCP 12 e da Guiné (1972/74), mais a história que faz parte da "joia de entrada"...

Infelizmente, esse lapso não foi corrigido "em vida"... Ao longo destes anos, fui vendo.o, mas com irregularidade, "lá na terra", na festa de Nª Sra. do Socorro ou no dia de finados...

Onze anos depois, e a agora que ele "da lei da morte já se libertou", o Manuel Carneiro entra diretamente para a nossa Tabanca Grande. É a nossa pequena homenagem a este homem,  bom e simples, amigo do seu amigo, camarada do seu camarada. (**)

 O Manuel Carneiro, cuja campa irei visitar na  próxima oportunidade,  não ficará, assim, na "vala comum do esquecimento". (***)
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Notas do editor:

(*) Vd. postes de:

6 de novembro de 2017 > Guiné 61/74 - P17939: Manuscrito(s) (Luís Graça) (127): O Dia de Fiéis Defuntos na Tabanca de Candoz: aqui a tradição ainda é o que era..

21 de novembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10702: Tabanca de Candoz: Há a bazuca e a... mazurca; ou aqui não há festa sem música, sem dança no terreiro, sem contradança, valsa, fado, baile mandado..., ou seja, sem as velhas, novas, tunas rurais de Entre Douro e Minho...

(**) Último poste da série de 4 de setembro de 2018 > Guiné 61/74 - P18982: In Memoriam (321): Joaquim Carlos Rocha Peixoto (Penafiel, 1949 - Porto, 2018): dois poemas, um de Josema (José Manuel Lopes) e outro, de Luís Graça

(***)  Último poste da série > 2 de agosto de 2018 > Guiné 61/74 - P18891: Tabanca Grande (466): Manuel Gonçalves, ex-alf mil manutenção, CCS / BCAÇ 3852, Aldeia Formosa, 1971/73; ex-aluno dos Pupilos do Exército, transmontano, vive em Carcavelos, Cascais. Senta-se à sombra do nosso poilão, no lugar nº 776.

terça-feira, 18 de setembro de 2018

Guiné 61/74 - P19025: Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) - Parte XLIV: Bajudas de São Domingos, 1968: felupes, balantas, manjacas, caboianas, papéis,


Foto nº 1 > Felupe


Foto nº 7 > Felupe


Foto nº 8 > Felupe


Foto nº 6 > Papel



Foto nº 3 > Manjaca



Fotp nº 2 > Balanta


Foto nº 4 > Manjaca



Foto nº 5 > Caboiana


Guiné > Região do Cacheu > São Domingos > CCS / BCAÇ 1933 (1967/69) > 1968 >   Bajudas de São Domingos, "chão felupe"

Fotos (e legendas): © Virgílio Teixeira (2018). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]  



1. Mensagem do Virgílio Teixeira, com data de 17 do corrente:


Caro amigo e camarada Luís Graça,

Estas fotos já foram enviadas em Janeiro deste ano, juntamente com aquelas outras das Felupes da Ilha Maldita. Mas muitas outras, das quais retirei agora estas 8 fotos, nunca foram editadas. Vai agora este pequeno lote, mas tenho para mais 2 ou 3 lotes delas.

Estas fotos foram captadas por mim, com autorização delas [, as bajudas,], depois ofereci uma cópia a cada uma, quando vieram reveladas. Era assim que eu mantinha um bom relacionamento com estas jovens, e com quem convivia no dia a dia.

Com estas apenas pretendo mostrar os vários tipo  de mulher guineense, sem qualquer outro propósito.

Obrigado pela compreensão, e ficam à espera de haver lugar na fila das edições.

Um abraço

Em, 19-02-2018, Virgilio

Revisto hoje, dia 17 de Setembro de 2018


2. Continuação da publicação do álbum fotográfico do Virgílio Teixeira (*), ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, set 1967/ ago 69); natural do Porto, vive em Vila do Conde, sendo economista, reformado; tem já cerca de 90 referências no nosso blogue.

Guiné 1967/69 - Álbum de Temas:

T300 – Postais de Nus Etnográficos: Mulheres e Etnias na Guiné – Bajudas de São Domingos

I - Anotações e Introdução ao tema:

Estas fotos foram captadas exclusivamente para mostrar a grande variedade de modelos e formas dos rostos e troncos nus das Bajudas, as raparigas, solteiras, das diferentes etnias que eu conheci na Guiné, entre 1967 e 1969. São também uma homenagem à beleza da mulher africana.

Este tema já foi parcialmente publicado noutras datas anteriores, ficaram outras fotos, por esquecimento. O texto que vou inserir nesta fase e em outras fases é o mesmo, adaptando-se a cada tipo de fotografias e mulheres.

A primeira parte da minha colecção de fotos, aqui representadas, refere-se a mulheres bajudas de diferentes etnias, habitantes no chão de São Domingos, do Norte da Guiné.

Capturadas predominantemente em São Domingos, Susana e Varela, na zona Norte, redgião do Cacheu, onde passei a maior parte do meu tempo – 18 meses, e na zona Leste, em Nova Lamego, nos primeiros 5 meses da comissão.

Em São Domingos existiam vários tipos de etnias: felupes, fulas, balantas, caboianas, manjacos, banhuns, mancanhas, cassangas, mandingas, e outras.

Em Nova Lamego predominavam de longe os fulas, seguidos, em menor núnero, dos mandingas e pajadincas, E entre os fulas havia castas, tais como futa fulas, futa fula preto, fula forro, fula preto.

As felupes já andavam avançadas 50 anos em relação ao Ocidente, pois usavam apenas tanga e fio dental, como se pode ver. Já utilizavam muitas pulseiras e colares por todo o corpo, era ume espécie de selecção entre elas.

As fotografias a preto e branco foram capturadas entre setembro 67 e fevereiro de 68 em Nova Lamego e depois desta data algumas em Bissau em Março 68, finalmente em São Domingos a partir de abril de 68.

As fotografias – slides – a cores só começam em finais do 1º semestre de 68, embora também tenha a preto e branco depois dessa data, pois que, ora fazia fotos a preto e branco, ora a cores, conforme a câamara e os rolos que havia disponíveis.

Era mais fácil tirar fotos às bajudas, aparigas solteiras e ainda muito jovens. As mulheres grandes só deixavam tirar fotos se o régulo ou o marido autorizassem, e depois dava-lhes uma foto para elas, em troca do favor.

Não afirmo que todas as raças estejam certas, era o que escrevia nas fotos, mas a maioria só escrevia passado algum tempo, e depois nos slides não dava para escrever, é apenas por intuição e lembrança das mesmas.

As felupes são fáceis de identificar, pela sua nudez, tanga e fio dental, pelos roncos usados como pulseiras nos braços, no tronco, colares ao pescoço, cabelos trabalhados e por tudo aquilo que desse mais nas vistas aos rapazes guineenses, era isso a que normalmente se dizia de ‘fazer ronco’.

Espero que quem as visualizar, goste, é esse o meu propósito, sem qualquer interesse que não seja mostrar as gerações vindouras, como era a diversidade cultural no continente africano e em particular no nosso território da Guiné, na época em que lá fiz a minha comissão de serviço militar.


II – As Legendas das fotos:


F01 – Bajuda Felupe, São Domingos, 1968.

F02 – Bajuda Balanta, São Domingos, 1968.

F03 – Bajuda Manjaca, São Domingos, 1968.

F04 – Bajuda Manjaca, São Domingos, 1968.

F05 – Bajuda Caboiana, São Domingos, 1968.

F06 – Bajuda Papel, São Domingos, 1968.

F07 – Bajuda Felupe, São Domingos, 1968.

F08 – Bajuda Felupe, São Domingos, 1968.


«Propriedade, Autoria, Reserva e Direitos, de Virgílio Teixeira, Ex-alferes Miliciano do SAM – Chefe do Conselho Administrativo do BATCAÇ1933/RI15/Tomar, Guiné 67/69, Nova Lamego, Bissau e São Domingos, de 21SET67 a 04AGO69».

Virgílio Teixeira

Em 17-09-2018

 NOTA FINAL DO AUTOR:

As legendas das fotos em cada um dos Temas dos meus álbuns, não são factos cientificamente históricos, por isso podem conter inexactidões, omissões e erros, até grosseiros. Podem ocorrer datas não coincidentes com cada foto, motivos descritos não exactos, locais indicados diferentes do real, acontecimentos e factos não totalmente certos, e outros lapsos não premeditados. 

Os relatos estão a ser feitos, 50 anos depois dos acontecimentos, com material esquecido no baú das memórias passadas, e o autor baseia-se essencialmente na sua ainda razoável capacidade de memória, em especial a memória visual, mas também com recurso a outras ajudas como a História da Unidade do seu Batalhão, e demais documentos escritos em seu poder. 

Estas fotos são legendadas de acordo com aquilo que sei, ou julgo que sei, daquilo que presenciei com os meus olhos, e as minhas opiniões, longe de serem ‘juízos de valor’ são o meu olhar sobre os acontecimentos, e a forma peculiar de me exprimir. 

Em, 2018-09-17

Virgílio Teixeira

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Nota do editor:

Último poste da série > 15 de setembro de 2018 > Guiné 61/74 - P19017: Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) - Parte XLIII: O alf mil capelão Carlos Augusto Leal Moita