sexta-feira, 24 de fevereiro de 2023

Guiné 61/74 - P24093: In Memoriam (472): José António Paradela (Ílhavo, 1937 - Aveiro, 2023): pequena homenagem póstuma lida ontem, na igreja matriz de Ílhavo (Luís Graça)

O arquiteto José António Paradela (1937-2023), na sua terra natal, Ílhavo, junto ao monumento aos combatentes da Grande Gerra (mortos em França e África). s/d. Cortesia da Câmara Municipal de Ilhavo. Imagem reeditada pelo Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2023), com a devida vénia...



Capa do livro de Ábio de Lápara pseudónimo literário de José António Paradela 1937-2023, "Uma Ilha no Nome: Pequena Crónica dos Dias Líquidos", ed. autor, s/l, 2007, 77 pp. (CDU: 821.134.3-3, BN, por). Prefácio de Luís Graça.

Zé António, meu querido amigo do peito, “meu mano”:

Já passaste por este momento doloroso, a perda de alguém muito querido, um pai, um irmão, um amigo… Ficamos sem palavras, tolhidos pelo choque da notícia. E depois, à medida que os primeiros minutos e as primeiras horas passam, há um turbilhão de emoções, antes de começarmos a fazer o processo do luto…

Agora somos todos nós, a tua Matilde, o teu Marco, o teu Jorge, a tua família mais próxima e os amigos, os muitos amigos que tu tinhas,  a encarar de frente a brutal realidade da tua perda, da tua morte física…

É devastador perder alguém que muito se ama… A nossa primeira reação é de denegação: não é possível que o meu amigo do peito, o meu “mano”, tenha partido da Terra da Alegria (para usar uma metáfora do poeta Ruy Belo) sem se despedir de nós…

Infelizmente, a morte é o maior absurdo da vida, mesmo que seja o corolário da vida, mesmo que a vida contenha as sementes da morte desde o primeiro segundo em que vemos a luz do dia, ao nascer… Diz o provérbio que a vida tem uma porta, e a morte cem…Dificilmente podemos encenar a tragédia da nossa própria morte: não sabemos quando nem como ela há-de chegar…

No teu caso, chegou aos 85 anos, e a maldita porta foi a doença de evolução prolongada, que ainda hoje temos, todos nós, pudor ou dificuldade em nomear.

 Por certo, meu irmão, que morreste em paz (se é que um homem pode morrer em paz depois de uma prolongada luta contra a doença que acaba sempre, mais tarde ou mais cedo, por levar a melhor: afinal, morremos todos os dias um bocadinho).

Sim, não tenho dúvidas que quiseste despedir-te de todos nós. Recordo o que escreveste no teu Facebook, no passado dia 6, às 21:34, partilhando 10 anos de memórias:

“Tempos felizes que cabem por inteiro na minha passada ambição. Deixaram sabores doces e tanto me basta.”

Uma frase lapidar, no duplo sentido da palavra, algo de sublime, que só podia ser escrito por um grande ser humano como tu. É um belíssimo poema de despedida da vida, mesmo que tão curto para uma vida que foi grande...É um adeus lúcido, corajoso, sereno... (Bolas, e a gente sempre a queixar-se do que não fez, não viu, não viajou, não usufruiu, não amou, não gozou, , não comprou, não escreveu...ou simplesmente desperdiçou a começar pelo tempo.)

Eras um homem afável, amigo do seu amigo, que adoravas o convívio e a tertúlia.  Amavas os teus, amavas a vida, adoravas o mar, o sol, o sal, o sul, a ria de Aveiro, o rio Tejo, as Berlengas,   a fotografia, o desenho, as viagens... Amavas as coisas boas da vida, e partilhavas com os teus amigos as tuas múltiplas afinidades, talentos, seres, saberes e sabores, desde a boa comida (o peixe, os mariscos)   à  literatura, à música e  à arquitetura, a tua profissão.

Nesta hora, profundamente triste, somos nós que viemos despedirmo-nos de ti. A morte tem várias dimensões: física, simbólica, cultural, social… Morreste, fisicamente, na batalha da vida, a tal em que todos nós, seres finitos, acabamos derrotados.

Para aqueles que te amavam (e te continuam a amar), tu continuas presente entre nós. Porque há uma coisa que a morte não nos pode roubar: as memórias (e os afetos) que partilhámos em vida, a par das nossas geografias emocionais… Mais do que a tua imensa obra como arquiteto e urbanista (e essa falará por si e por ti!), somos nós que não te esquecemos, enquanto por cá ainda andarmos, e tivermos saúde, força e ânimo …

Como não podemos esquecer os livros que, já em fase mais tardia da tua vida, começaste a escrever… Cito um ou dois que me dizem muito: o teu primeiro,  de 2007, “Uma Ilha no Nome: Pequena Crónica dos Dias Líquidos”, a que me deste a honra de prefaciar.

E o outro, de 2015, a "Rua Suspensa dos Olhos": Ah!, quanto humanidade, ternura, inocência, traquinice, generosidade e poesia havia na tua rua suspensa dos olhos...

Ilhéu, lhavense, filho da terra e do mar,  evocas e descreves com enorme ternura e talento a rua onde nasceste e cresceste. E das figuras humanas   que  marcaram a tua memória e o teu imaginário, não posso deixar de citar o teu pai, marinheiro aos 12 anos, figura de referência na tua vida, sempre ausente e sempre presente, e que gostava de dizer: “O mundo todo não vale o meu lar”…

Tendo tu sido criado no matriarcado, cercado de mulheres e dos seus fantasmas e das suas recordações, fizeste,  no entanto, da figura do teu pai a mais bela evocação na tua narrativa ilhavense:

 “Estávamos todos em casa, isto é, ele não estava no mar, que é como quem diz, sabe-se lá onde”…

E da recolha que fizeste dos palimpsestos dos muros da tua Ílhavo, deixa-me por fim citar duas ou três frases lapidares dos anónimos pichadores e grafiteiros:

- A saudade, mano… a nossa última riqueza! Porque a lembrança é a fonte de onde parte toda a riqueza….

- Nascemos para perder absolutamente tudo, sempre, e nada.

- Não faças sempre a mesma pergunta. Apenas luta por uma resposta diferente.

Estas três frases, pérolas de uma arqueologia dos seres e dos saberes, dizem muito, afinal, a teu respeito. E não foi por acaso que as anotaste e as resgataste, nesse teu livrinho que é um belíssimo e comovente regresso ao passado, à tua infância, à tua ilha, à tua origem ilhavense… 

É também a redescoberta da tua/nossa insularidade fundamental e da situação-limite que é a própria vida, cercada de sinais de fragilidade, de solidão, de doença, de morte e de finitude por todos os lados…

Não se pense, todavia, que é uma narrativa passadista e tu um autor pessimista… No final, o teu “alter ego” (re)descobre    que também faz parte de um vasto arquipélago , e que um ilhéu, mesmo quando deixa a ilha, quando embarca para a Terra Nova, na “Faina Maior" (a pesca do bacalhau), ou vai para Lisboa estudar e trabalhar, nunca destrói as pontes, nunca corta o cordão dunar e umbilical que o liga ao passado e ao futuro…

Zé António, para os amores da tua vida, a tua Matilde, os teus filhos e a tua neta, para os teus amigos, para todos aqueles que te amaram e que tu amaste, serás sempre lembrado não só como o arquiteto, um construtor de cidades, como sobretudo um homem de pontes, de memórias, de afetos: as do amor, da amizade, da beleza, da solidariedade, da liberdade…

Aceita, lá na estrelinha  que te coube em sorte na galáxia celestial dos homens bons e sábios, esta minha pequena homenagem póstuma. Recuso-me a dizer “adeus, até sempre”, porque quero/queremos continuar a poder falar contigo.

Luís Graça + os teus amigos e fãs Alice, Joana e João.

Ílhavo, igreja matriz, 23 de fevereiro de 2023


2. Nota do editor LG:

Desloquei-me ontem, à tarde ao funeral do meu amigo Zé António Paradela, arquiteto, membro da Tabanca Grande, um "ílhavo", orgulhoso da sua terra natal onde, de resto, deixa obra. Tive oportunidade de conhecer pessoalmenet ou reencontrar, nas cerimónias fúnebres, alguns dos seus amigos e  conterrâneos tais como:

(i) Jorge Picado, ex-cap mil art, Guiné 1970/72, nosso camarada, membro da Tabanca Grande; dei-lhe um grande abraço, falámos uns escassos minutos; e justificou-se por que é que, com a falta de tempo e os netos, já não vem tantas vezes ao blogue;

(ii) Tito Peixe Cerqueira,  vice-almirante na reforma, com um comissão em Moçambique como guarda-marinha, em 1970/72, na Corveta João Coutinho, o primeiro ilhavense ou "ílhavo" a atingir o topo da hierarquia da marinha de guerra numa terra de capitães de marinha mercante e da frota pesqueira, vários deles também presentes no velório do Zé António Paradela (alguns conhecia-os de vista, de nossos convívios anuais):

(iii)  João Vizinho, especialista em medicina do trabalho, meu velho amigo das lides da saúde pública:

(iv) o capitão Valdemar Aveiro, um dos últimos "lobos do mar", e grande escritor das memórias da "Faina Maior" (a pesca do bacalhau): tem cerca de uma dezena de publicações (e outras tantas referências no nosso blogue):

(v) o historiador e editor Senos da Fonseca, cunhado do nosso Jorge Picado, uma  verdadeira autoridade sobre Ílhavo, a Costa Nova,  as suas gentes e falares, as embarcações  da ria de Aveiro, a pesca do bacalhau, etc.

De Lisboa, tive o prazer de reencontrar os arquitetos Ricardo Santos Pereira e Luís Gravata Filipe, que trabalharam ou ainda trabalham na PAL - Planeamento e Arquitetura Lda, a empresa de prestígio que o Zé António fundou e dirigiu durante dezenas de anos. Reencontrei também a secretária Teresa Martins Gil, competente e incansável colaboradora da PAL.

E ainda outros amigos comuns, que vieram de Lisboa,  como o prof João Salis Gomes (CIES-ISCTE) e familia... e o advogado Manuel Queirós (acompanhado do filho), natural do Marco de Canaveses, colaborador da PAL. Pude confirmar mais uma vez quão estimado era, na sua terra, o Zé António. E que nem sempre é verdade o que diz o provérbio "Ninguém é profeta na sua terra"... O Zé António tinha-se reconciliado há anos com a sua terra natal, que ele muito amava. O município, na sua págima oficial,  deixou, com data de ontem, uma nota de pesar pelo seu falecimento:

(...) Natural de Ílhavo, José António Boia Paradela deixa o seu traço no Município de Ílhavo, tendo assinado obras como o edifício dos Paços do Concelho e o Centro Cultural da Gafanha da Nazaré. Mais recentemente, foi responsável pela modernização do Jardim Henriqueta Maia e a reconversão do antigo edifício dos Bombeiros Voluntários de Ílhavo, também da sua autoria, no Centro de Religiosidade Marítima. (...)
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quinta-feira, 23 de fevereiro de 2023

Guiné 61/74 - P24092: Álbum fotográfico de José Carvalho (4): A CCAÇ 2753, ”Os Barões”, em Mansabá (Parte I)

1. Mensagem do nosso camarada José Carvalho, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2753 (Brá, Bironque, Madina Fula, Saliquinhedim e Mansabá, 1970/72), com data de 20 de Fevereiro de 2023:

Caros Editores e Amigos Luís e Carlos,
Desejo que se encontrem bem.
Com o frio e a chuva permaneço mais tempo em casa, menos campo... e lembrei-me de tentar ampliar o meu reduzido e apelidado álbum fotográfico, no nosso blogue.

Selecionei algumas fotos (diapositivos digitalizados) de Mansabá, que pouco ou nada adiantam às fotografias já disponíveis no blogue, sendo somente o autor e a data das mesmas diferentes, mais propriamente obtidas no 2ºT de 1972, no curto período de permanência da CCaç 2753, neste local.
No entanto estas imagens, têm uma numeração que dada a minha pouca amistosa relação com as informáticas, não consigo eliminá-la. Espero que para especialistas não seja obstáculo maior... para o caso de admitirem algum interesse na sua publicação.

Fazendo força para que o objectivo do Luís se concretize e que o nº 900 seja atingido este ano, envio votos de boa saúde.
Abraço amigo do,
José Carvalho


Foto 10 - Placa toponímica de Mansabá, na entrada do lado de Mansoa e creio que a única existente à altura. Parece mais uma placa de final de localidade…
Foto 11 - Pequeno monumento situado logo a seguir à placa toponímica . Ainda uma pequena edificação “fortificada”, cuja utilização na altura não me recordo!
Foto 12 - Vista aérea parcial das instalações militares. Heliporto, quartos dos oficiais, edifício do comando, messe de oficiais e sargentos e enfermaria(?).
Foto 13 - Bomba de gasóleo, que pertencia a José Leal, proprietário da serração e madeireiro, perto de uma das entradas da tabanca. Era igualmente proprietário de uma “tasca” onde servia umas refeições bem apetitosas. Recordo que nesse local se registou um acidente com o rebentamento de uma granada de mão, que provocou alguns feridos.
Foto 13a - Bomba de combustível civil de Mansaba
Foto 14 - Edificações do aquartelamento.
Foto 15 - Abrigo, que dispunha de uma metralhadora pesada.
Foto 15a - Abrigo da pista(?) visto mais próximo
Foto 16 - Foto da antiga serração, situada a cerca de 2 kms de Mansabá, na estrada de Mansoa. Visualizam-se edificações em ruínas, viaturas ligeiras incendiadas, chassis de viaturas pesadas e sucata de maquinaria da serração, abandonada havia algum tempo, depois de atacada e destruída.
Foto 17 – Eu, no meu quarto cinco estrelas, partilhado algumas semanas com o Alf. Mil. Médico Vazão de Almeida e depois esporadicamente com oficiais em trânsito operacional, nomeadamente comandos africanos. As paredes do quarto estavam bem pintadas, com várias imagens do Pato Donald, desconhecendo a identificação do artista…

Fotos e Legendas: © Alf Mil Inf José Carvalho da CCAÇ 2753
Fotos 13a e 15a editadas e legendadas pelo editor

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2. Não é meu hábito comentar directamente nos postes que publico, não sendo de minha autoria, mas abro uma excepção já que me sinto "altamente qualificado" para o fazer.

- Foto 10 - Não sei se esta placa foi inaugurada pela CART 2732 ou se foi restaurada no nosso tempo. Esclareço o José Carvalho que o artista tentou fazer aquela diagonal com as cores verde e rubra da Bandeira da Nação, com as tintas que tinha à mão.

- Foto 11 - A fortificação que se vê à esquerda é o "castelo", um abrigo que tinha instalada uma Breda. Manga de tonco quando havia ataques ao aquartelamento.

- Foto 12 - Referindo-me ao meu tempo, que não diferiu muito do vosso, a Messe de Sargentos era lá muito ao fundo, no enfiamento da porta d'armas. Acho que não é visível. Quanto ao resto, tudo bem.

- Foto 13 - Aquele posto de abastecimento era o último grito em evolução técnica. Lembro-me bem dele.
- Chamar "tasca" à "charmosa sala de jantar" do senhor José Leal e da D. Olinda, é no mínimo falta de consideração. José Carvalho, lembras-te do empregado de mesa, o Agostinho?
- O caso da granada foi um lamentável episódio por se tratar de uma brincadeira estúpida com uma granada de mão ofensiva manipulada pelo homem errado, no local errado,na hora errada e no local errado, Passagem de ano 1971/72, de má memória. O caso passou-se dentro da sala de jantar do senhor José. Os 5 sinistrados foram levados em coluna auto, pelos seus camaradas, ao HM 241.

- Foto 14 - Mansabá era mesmo uma "nação". O que tinha de pior eram os vizinhos, que eram ns arruaceiros.


- Foto 15 - Se bem me lembro este abrigo estava colocado à esquerda, logo no início da pista. Lá ao fundo, consegue vislumbrar-se o abrigo do Moínho onde o nosso amigo Melim manejava como ninguém outra metralhadora pesada. Que será feito dele?

- Foto 16 - "Serração", a partir da qual já nos sentíamos em casa.

Carlos Vinhal
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Nota do editor

Último poste da série de 30 DE DEZEMBRO DE 2020 > Guiné 61/74 - P21708: Álbum fotográfico de José Carvalho (3): A CCAÇ 2753, ”Os Barões”, e o K3 (II e última Parte)

Guiné 61/74 - P24091: Recordando o Amadu Bailo Djaló (Bafatá, 1940 - Lisboa, 2015), um luso-guineense com duas pátrias amadas, um valoroso combatente, um homem sábio, um bom muçulmano - Parte XX: Bigene, a última saída do Gr Comandos "Os Centuriões" (Op Virgínia, fronteira com o Senegal, 24-25 de abril de 1966) (Op Vamp)


Guiné > Brá > Comandos do CTIG > 20 de junho de 1966 > Encerramento das actividades da Companhia de Comandos do CTIG.


Guiné > Brá > Comandos do CTIG > 20 de junho de 1966 > Comandos com a comissão terminada. Eu sou o penúltimo da direita, ao lado de Adriano Sisseco.  Imagens publicadas no livro, pág. 145. Créditos fotográficos: Virgínio Briote (2010).


1. Continuação da publicação das memórias do Amadu Djaló (1940-2015), a partir do manuscrito do seu livro "Guineense, Comando, Português: I Volume: Comandos Africanos, 1964 - 1974", Lisboa, Associação de Comandos, 2010, 229 pp, + fotos, edição esgotada.  (O seu editor literário, ou "copydesk", Virgínio Briote, facultou-nos uma cópia digital; o Amadu, membro da Tabanca Grande, desde 2010, tem cerca de nove dezenas de referências no nosso blogue.)


Recorde-se aqui o seu passado militar:

(i) começou a recruta, como voluntário, em 4 de janeiro de 1962, no Centro de Instrução Militar (CIM) de Bolama;

(ii) esteve depois no CICA/BAC, em Bissau, onde tirou a especialidade de soldado condutor auto-rodas;

(iii) passou por Bedanda, 4ª CCaç (futura CCAÇ 6), e depois Farim, 1ª CCAÇ (futura CCAÇ 3), como sold cond auto;

(iv) regressou entretanto à CCS/QG, e alistou-se no Gr Cmds "Os Fantasmas", comandado pelo alf mil 'cmd' Maurício Saraiva, de outubro de 1964 a maio de 1965;

(v) em junho de 1965, fez a escola de cabos em Bissau, foi promovido a 1º cabo condutor, em 2 de janeiro de 1966;

(vi) voltou aos Comandos do CTIG, integrando-se desta vez no Gr Cmds "Os Centuriões", do alf mil 'cmd' Luís Rainha e do 1º cabo 'cmd' Júlio Costa Abreu (que vive atualmente em Amesterdão);

(vii) descreve-se a seguir   a última saída do Grupo, Op Virgínia, 24/25 de abril de 1966, na fronteira do Senegal; o Amadu será depois transferido, a seu pedido,  para Bafatá, sua terra natal, para o BCAV 757.


 

Capa do livro


Recordando o Amadu Bailo Djaló (Bafatá, 1940 - Lisboa, 2015), um    luso-guineense com duas pátrias amadas, um valoroso combatente, um homem sábio, um bom muçulmano - Parte XX:   

Bigene, a última saída do Gr Comandos "Os Centuriões"  (Op Virgínia, fronteira com o Senegal, 24-25 de abril de 1966)  
(pp. 143-146)

Na saída que se seguiu, apanhámos um barco até Bigene. Partimos à tarde e chegámos à noite. No dia seguinte, preparámo-nos para efectuar uma missão na fronteira com o Senegal. O objectivo era montar uma emboscada em Samoge. 
[1]

Saímos de Bigene muito cedo, em direcção à zona da fronteira, que atingimos por volta das 11h00. O sol queimava, a água do cantil parecia que tinha água a ferver. Quando nos estávamos a aproximar da estrada para montar a emboscada, pareceu-me ver qualquer coisa ao longe. Tirei os binóculos e passei-os ao Alferes Rainha. O que parecia ter visto, se estava lá, agora não estava. O alferes disse que não era nada, que devia ter visto um tronco de árvore e voltou a passar-me os binóculos. Voltei a pôlos nos olhos e pus-me a observar. Confirmei, aquilo que eu devia ter visto já lá não estava. 

O guia, em dialecto mandinga, apontou em frente e disse: 

– Amadu, ali naquela mata pequena tem fonte com boa água, água fresca. 

O alferes perguntou-me o que é que ele tinha dito. 

– Que naquele grupo de palmeiras ali em baixo tem uma fonte com água fresca. 

Era uma zona que parecia fresca e o calor era muito. Começámos a andar em direcção às palmeiras e na encosta de uma pequena elevação vimos uma picada  que vinha do Senegal. Do outro lado da picada vi uma árvore bem grande, com ramos deitados no chão com erva e debaixo da árvore, uma boa sombra estava mesmo à nossa espera. Era uma árvore tão grande que podia esconder uma companhia. Na Guiné chamamos a estas árvores “Tamba Cumba” e dá frutos que se podem comer. 

Quando nos estávamos a aproximar dela, fomos atacados. Apanharam-nos num terreno que não nos era favorável. A primeira coisa em que pensámos foi abandonar rapidamente o local. Estávamos na pequena encosta e os guerrilheiros estavam na parte de baixo. Era fácil bater-nos. Só que a experiência e o treino que tínhamos levava-nos a acreditar que se os primeiros tiros não nos acertassem enquanto estávamos de pé, depois já era mais difícil. 

Quando ficámos colados ao chão, começámos a fazer uma manobra de envolvimento com o objectivo de retirar do local. Sabíamos que havia um acampamento de barracas atrás de nós, na zona de Samoge e não podíamos dar lhes tempo para impedir a nossa passagem. O sol ainda queimava mas nós acelerámos a marcha até à tabanca abandonada de Samoge. Para nosso contentamento, à entrada da tabanca corria um pequeno curso de água e todo o grupo se refrescou e encheu os cantis. Dirigimo-nos a seguir para uma horta e vimos mangos maduros. Outra sorte para nós. Todo o grupo se meteu dentro da horta a comer mangos, até passar a fome. 

Então o alferes deu ordem para abandonarmos o local e retirámos para Bigene. Eram mais ou menos 19h00, quando entrámos na povoação. Dirigimo-nos para o refeitório e no fim de jantar um prato de sopa tivemos uma surpresa, o alferes disse-nos que íamos passar a noite na mata. Estava um céu muito escuro, mas fomos andando com as precauções habituais até que começou a cair uma chuva forte. Eram as primeiras chuvas de Maio de 1966. Estivemos parados naquele local cerca de uma hora. Depois escolhemos um outro local para passarmos a noite emboscados, junto a um caminho que ligava Bigene à fronteira. Quando regressámos, na manhã seguinte a Bigene, ainda a nossa roupa estava molhada. 

Agora, eu pergunto: por que voltámos para a mata? Se fomos detectados e atacados, se o silêncio tinha sido quebrado, para quê voltar a sair e passar uma noite à chuva, que nem o PAIGC queria apanhar? Continuo na minha, acho que certas missões, como as emboscadas e os golpes de mão quando se quebra a surpresa, ficam desfeitas e não adianta muito passar a noite na mata e ainda por cima com chuva grossa a cair. 

Esta foi a última saída do grupo “Centuriões”, que terminou com mangos e muita chuva. O nosso grupo estava cada vez mais reduzido, com uma parte do pessoal com as comissões terminadas ou quase no fim. E o que acontecia nos “Centuriões”,  acontecia também nos outros grupos. Tínhamos sido informados que a Companhia de Comandos do CTIG ia acabar. E que os elementos que ainda tinham algum tempo de comissão a cumprir iam ficar num grupo só. 

Terminado o grupo, meti um pedido de transferência para Bafatá, para tomar conta da minha mãe e dos meus irmãos mais novos, porque entretanto o meu pai tinha falecido. Enquanto permaneci em Bissau, aproveitei para tirar a carta militar conhecida por “lista branca”.

Num dia tive um feliz encontro, vi o tenente-coronel Moura Cardoso, comandante do Batalhão de Cavalaria 757, conhecido pelo “sete de espadas”, porque traziam um emblema no ombro com uma carta de jogar. Fiz-lhe a continência e disse-lhe que tinha pedido transferência para o batalhão dele, mas que a resposta nunca mais chegava. Pegou-me no braço e levou-me à 4ª Rep. Aqui, depois de conversar com um major, descobriram que havia uma vaga de cabo condutor para a companhia de Contuboel. E ficou decidido que eu iria ficar adido no batalhão.

(Continuação)

[Seleção / Revisão e fixação de texto / Negritos / Subtítulo: LG]
________

Nota do editor literário VB:

[1] - Nota do editor: operação “Virgínia”, Canja-Sinchã Mamadu, 24/25 Abril 1966, com o reforço de alguns elementos do Grupo Comandos “Vampiros”.
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Nota do editor LG:

Último poste da série > 9 de fevereiro de  2023 > Guiné 61/74 - P24049: Recordando o Amadu Bailo Djaló (Bafatá, 1940 - Lisboa, 2015), um luso-guineense com duas pátrias amadas, um valoroso combatente, um homem sábio, um bom muçulmano - Parte XIX: Mais uma operação helitransportada no corredor de Sitató, junto à fronteira com o Senegal, em março de 1966 (Op Vamp)

Guiné 61/74 - P24090: Parabéns a você (2147): José Ferreira da Silva, ex-Fur Mil Op Esp da CART 1689/BART 1913 (Fá, Catió, Cabedú, Gandembel e Canquelifá, 1967/69)

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Nota do editor

Último poste da série de 17 DE FEVEREIRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24073: Parabéns a você (2146): António Carvalho, ex-Fur Mil Enfermeiro da CART 6250/72 (Mampatá, 1972/74) e Fernando Chapouto, ex-Fur Mil Op Esp da CCAÇ 1426 (Geba, Camamudo e Cantacunda, 1965/67)

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2023

Guiné 61/74 - P24089: Historiografia da presença portuguesa em África (356): Actas do Conselho do Governo da Colónia/Província da Guiné: Uma fonte documental que não se deve ignorar (10) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 9 de Maio de 2022:

Queridos amigos,
Cedo se informou que os dois volumes existentes na biblioteca da Sociedade de Geografia encerram um conjunto lacunar de atas do Conselho Consultivo e depois Legislativo da Guiné, tudo começa em 1917, há diferentes hiatos, faltas que não permitem tentar sequer uma leitura diacrónica do ideário da governação desde a I República até 1971, assomam iniciativas generosas, defesa de interesses económicos, avultam as preocupações com a exequibilidade orçamental, em dados momentos homenageiam-se líderes do Estado Novo, e é percetível o que diferencia Schulz e Spínola, o primeiro no uso da prudência, não querendo asfixiar as finanças da Guiné, exigindo um Plano de Fomento auto-sustentado, o segundo referindo que recebeu meios avultados para pôr em prática a sua Guiné Melhor, e daí a disparidade dos orçamentos destes dois governadores. Para quem pretende estudar a História da Guiné, é compreensível que se sugira a análise desta fonte documental, a despeito de tanta lacuna.

Um abraço do
Mário



Atas de Conselho do Governo da Colónia/Província da Guiné:
Uma fonte documental que não se deve ignorar (10)


Mário Beja Santos

Pode julgar-se à partida que estas reuniões em que se discutiam requerimentos, taxas e emolumentos, em que funcionários da administração se pronunciavam sobre salários e infraestruturas, num órgão consultivo em que compareciam chefes de serviços, comerciantes, profissionais liberais, em reuniões presididas pelo Governador, ou pelo Governador Interino, ou pelo Encarregado do Governo, eram suficientemente enfadonhas para não acicatar quem anda à procura de outros ângulos do prisma que nos ajudam a formar uma visão mais abrangente da História da Guiné. Muitas vezes sem interesse para o historiador/investigador, atrevo-me a dizer, mas há ali casos de tomadas de posição ou declarações que nos ajudam a melhor entender a mentalidade, as iniciativas seguramente generosas que ali se formularam e que não tiveram seguimento, ou mesmo o aproveitamento daquele palco para que um Governador tecesse, em forma de sumário, o que se procurava fazer durante o seu mandato.

Os tempos mudaram, já se fez referência que as sessões do Conselho Legislativo têm participação pública, é ótimo para a conversação mediática que Spínola quer manter com os guinéus, começou logo em 1968, e será uma constante do seu mandato. Já se fez referência à sessão de 10 de dezembro, nas vésperas do fim de ano o Conselho reúne-se e aprova o orçamento da Província para 1969, mas é a 14 de abril que o Conselho tem direito a aparecer nos televisores: comparecem Marcello Caetano e Spínola, vão falar para a Guiné, mandam recado para o Império.

Com pompa e circunstância tem a palavra o vogal Joaquim Baticâ Ferreira: “Nasci e vivo na Guiné, onde sou chefe da comunidade Manjaca, mas todas as raças desta Província estão unidas pela sagrada bandeira de Portugal. É por isso que falo em nome da população nativa da Guiné, para dizer a Vossa Excelência que a nossa firme determinação é a de continuar a ser portuguesas.” E apoia o projeta da Guiné Melhor: com boas estradas alcatroadas e portos fluviais; com mais escolas primárias e estabelecimentos de ensino; com mais hospitais, maternidades e postos sanitários.

Tomou seguidamente a palavra António de Spínola: “A Província encontra-se em guerra, aqui luta-se e morre-se pela causa sublime da paz. Vastos e complexos sãos os seus problemas de guerra e de paz, uns já em fase de resolução, outros equacionados, outros ainda apenas esboçados. A Província caminha na senda do seu desenvolvimento económico-social no quadro das estruturas de uma Guiné Melhor.”

Por último, discursou Marcello Caetano: “Os governantes e as autoridades têm procurado incessantemente combater a doença, a miséria, a opressão, como neste momento lutam lado a lado com as populações nativas e as Forças Armadas contra os perturbadores da Paz. O desenvolvimento do território não se obtém na confusão e no tumulto. É obra de amor. É fruto do trabalho. É resultado do emprego intensivo, adequado e oportuno das técnicas que o nosso tempo coloca à disposição do Homem. Portugal está aberto a todos os seus filhos. Mesmo aqueles que algum dia hajam hesitado no caminho e duvidado de que a bandeira verde-rubra fosse o estandarte da liberdade e do progresso, mesmo esses serão bem recebidos se reconhecendo o seu erro. Foi para proteger a admirável fidelidade da gente da terra que da Metrópole e de outras províncias alguns milhares de portugueses dos exércitos da terra, do mar e do ar, vieram reforçar as forças de segurança da Guiné. Unidos nas mesmas dificuldades, nos mesmos riscos e nos mesmos perigos. E no decorrer das ações em que tiveram de enfrentar armas estrangeiras, brandidas pelos agentes da subversão, caíram lado a lado soldados da Guiné e de outras terras portuguesas, misturando o seu sangue generoso na defesa da causa comum. A terra adubada pelo sangue há de florescer. Da nossa vontade, da vontade de nós todos, portugueses de todas as etnias para quem a Guiné constitui parcela da Pátria, depende que o milagre se produza.”

A biblioteca da Sociedade de Geografia inclui atas até 1971, vale a pena mencionar alguns títulos. Em 30 de outubro, Spínola retoma as linhas do seu plano para a ativação do progresso económico-social da Guiné (aumento de salários, subsídio do custo de vida, vencimento para as autoridades tradicionais, apoio pecuniário para um novo gerador destinado a Bissau, reapetrechamento da Imprensa Nacional, melhoramentos em várias localidades, aquisição para os TAGP de 3 aviões, asfaltagem de estradas, saneamento, etc., etc.). Na circunstância o diretor da Fazendo comentou: “Continua a Província a dispor de uma balança de pagamentos com saldos positivos confortáveis e que neste momento se cifra em cem mil contos”.

Em 29 de dezembro ainda desse ano de 1969, a sessão abre com uma exposição de Spínola pondo ênfase na execução de uma política de valorização e dignificação humanas, foi dentro dessa perspetiva que se elaborou o Plano de Ação para 1970 e revelou com alguma minucia as linhas gerais quanto a: comunicações, agricultora e pecuária, assistência médico-sanitária, educação e cultura, melhoramentos rurais, trabalho, economia, justiça, setor administrativo. Em 30 de outubro do ano seguinte, Spínola procede a um balanço da execução do Plano de Ação, e em dada altura observou: “O progresso da Guiné, como parcela de uma nação caracterizadamente africana e multirracial, terá de aferir-se pelo número dos lugares públicos ocupados no futuro proporcionalmente a cada uma das etnias, pois temos de ter bem presente que não se pode construir uma sociedade em bases sólidas e duradouras sem a elevação cultural das massas portuguesas africanas.”.

Era um novo acento tónico da política da Guiné Melhor, declaradamente o conceito da Guiné para os guinéus, os lugares cimeiros ocupados pelos cabo-verdianos passariam a ser ocupados por guineenses. Em 18 de dezembro desse ano é apresentado o diploma legislativo destinado a aprovar o Regulamento do Ensino Primário Elementar da Província da Guiné. Em 30 de dezembro, dando continuação às grandes metas do Plano de Ação para 1970, é apresentado e aprovado o Plano de Ação para 1971. Em 29 de outubro de 1971, Spínola refere-se à participação das populações na defesa da Província: “Criou-se o Comando-Geral da Milícia, estruturou-se em novos moldes o Corpo da Milícia e regulamentaram-se as suas atividades; igualmente foi regulamentada a atividade do Corpo dos Voluntários; formaram-se no corrente ano 720 milícias e estavam em formação mais 800; aumentou-se o efetivo da Força Armada Africana com um destacamento de Fuzileiros e uma Companhia de Comandos; organizaram-se em autodefesa mais 2360 elementos da população a quem foi destinado armamento. E em 22 de dezembro desse ano foram aprovados diferentes regulamentos, entre eles o da Organização Provincial de Voluntários e Defesa Civil da Guiné e o regulamento do Corpo de Milícias.”

Findam aqui as atas do Conselho Legislativo da Guiné, resta saber se nalgum arquivo ou biblioteca será possível encontrar um acervo mais completo do que este.

Receção a Marcello Caetano em Bissau, 14 de abril de 1969
António de Spínola, 1968, atrás James Pinto Bull
Postal de Bissau, vista da Avenida Marginal, 1960
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Nota do editor:

Postes anteriores de:

14 DE DEZEMBRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23880: Historiografia da presença portuguesa em África (347): Actas do Conselho do Governo da Colónia/Província da Guiné: Uma fonte documental que não se deve ignorar (1) (Mário Beja Santos)

21 DE DEZEMBRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23902: Historiografia da presença portuguesa em África (348): Actas do Conselho do Governo da Colónia/Província da Guiné: Uma fonte documental que não se deve ignorar (2) (Mário Beja Santos)

28 DE DEZEMBRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23925: Historiografia da presença portuguesa em África (349): Actas do Conselho do Governo da Colónia/Província da Guiné: Uma fonte documental que não se deve ignorar (3) (Mário Beja Santos)

4 DE JANEIRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P23948: Historiografia da presença portuguesa em África (350): Actas do Conselho do Governo da Colónia/Província da Guiné: Uma fonte documental que não se deve ignorar (4), veja-se hoje como Sarmento Rodrigues pretendeu instituir mudanças no sistema de saúde, incluindo as farmácias e os medicamentos (Mário Beja Santos)

11 DE JANEIRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P23972: Historiografia da presença portuguesa em África (351): Actas do Conselho do Governo da Colónia/Província da Guiné: Uma fonte documental que não se deve ignorar (5) (Mário Beja Santos)

25 DE JANEIRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24010: Historiografia da presença portuguesa em África (352): Actas do Conselho do Governo da Colónia/Província da Guiné: Uma fonte documental que não se deve ignorar (6) (Mário Beja Santos)

1 DE FEVEREIRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24028: Historiografia da presença portuguesa em África (353): Actas do Conselho do Governo da Colónia/Província da Guiné: Uma fonte documental que não se deve ignorar (7) (Mário Beja Santos)

8 DE FEVEREIRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24048: Historiografia da presença portuguesa em África (354): Actas do Conselho do Governo da Colónia/Província da Guiné: Uma fonte documental que não se deve ignorar (8) (Mário Beja Santos)

15 DE FEVEREIRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24068: Historiografia da presença portuguesa em África (355): Actas do Conselho do Governo da Colónia/Província da Guiné: Uma fonte documental que não se deve ignorar (9) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P24088: Memórias de Luís Cabral (Bissau, 1931 - Torres Vedras, 2009): Factos & mitos - Parte III: A fuga para Dacar, nos princípios de 1960, com a ajuda do madeireiro e antigo deportado político Fausto da Silva Teixeira


Guiné > Bissau > s/d > Associação Comercial, Industrial e Agrícola de Bissau. Bilhete Postal, Colecção "Guiné Portuguesa, 144". (Edição Foto Serra, C.P. 239 Bissau. Impresso em Portugal). A Associação (também comhecida por Câmara do   Comércio de Bissau) ficava junto ao palácio do governador... O projeto é de um jovem arquitecto de Lisboa, Jorge Chaves (1920-1981), e a remonta  à segunda  metade da década de 50. Depois da saída dos portugueses em setembro de 1974, a sede da Associação Comercial  passará a ser, muito naturalmente, a sede do PAIGC, ou seja dos novos senhores da guerra, com Luís Cabral, irmão de Amílcar Cabral (1923-1973), como primeiro presidente da jovem república da Guiné-Bissau.

Na opinião de outros arquitectos de renome que trabalharam para África, o edifício desenhado por Jorge Chaves (com murais de José Escada), pelo arrojo das suas linhas, conforto, mordernidade e até riqueza, não ficava atrás da arquitectura de Brasília, por exemplo, e era unanimemente considerado como o melhor edifício que Portugal  deixou  em Bissau, do ponto de vista arquitectónico.

Nascido em Santo Antão, Cabo Verde, J
orge Chaves não pertencia ao Gabinete de Urbanização Colonial (ou do Ultramar, como passou a ser chamado, a partir de 1951), e daí talvez a razão do projeto ter uma modernidade que não seria possível dentro do paradigma da arquitectura colonial de então, marcado pelos constrangimentos da funcionalidade, adaptação ao clima, resistência e uso de materiais de baixo custo de manutenção.

Foto: © Agostinho Gaspar (2010). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem:  Blogue Luís Graça & Camaradas da Guine]


Anúncio comercal, publicado em Turismo - Revista de Arte, Paisagem e Costumes Portugueses, jan/fev 1956, ano XVIII, 2ª série, nº 2.  Digitalização: © Mário Vasconcelos (2015). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné LG. O Mário Vasconcelos faleceu, infelizmente, em 2017.]

1. O madeireiro Fausto da Silva Teixeira podia ser considerado "simpatisante" da causa nacionalista (leia-se: do PAIGC). Mas nunca foi "militante"... Tinha serrações modernas, mecânicas, em Bafatá, Fá Mandinga e Banjara, antes da guerra.   A sua firma foi fundada logo em 1928. Sabemos que em 1947 já estava plenamente integrado na sociedade guineense, sendo um empresário respeitável... Como o próprio Amílcar  Cabral (AC), conceituado engenheiro agrónomo até 1960...

No nosso blogue temos uma dúzia de referências ao Fausto Teixeira. Num dos postes que já publicámos (*), reproduzimos um documento, de setembro de 1966, dactilografado, de 16 páginas (capa incluída), que tem a chancela do PAIGC, e  que se destinava a dar a conhecer (e a combater) "os interesses capitalistas estrangeiros (portugueses e não portugueses) na Guiné e Cabo Verde" (sic) (*). Estranhamente (ou nem por isso),  não vem o nome da firma Fausto da Silva Teixeira.

De facto, no ponto XII, há referências aos "madeireiros", mas as empresas citadas são apenas três, e nenhuma delas nossa conhecida... A omissão do nome do Fausto da Silva Teixeira, é capaz de fazer sentido.

Na altura dissemos que, em relação à fonte da informação documental, no essencial, e tendo em conta o detalhe dos dados, parecia-nos ser de origem portuguesa, fornecida pelos meios oposicionistas que então combatiam o regime de Salazar. (talvez a partir de Argel).

O nome de Fausto Teixeira  também  não aparece na lista das 600 personalidades que constam, como tal, no respetivo blogue e na respetiva página do Facebook ("notas biográficas de cidadãs e cidadãos que lutaram contra o fascismo e o colonialismo"). 

Mas o mesmo acontece com outros dos seus companheiros de desventura: de facto, também não contam dessa lista os nomes de Gabriel Pedro (1898-1972) (igualmente desterrado para a Guiné e depois para o Tarrafal, tal como o seu filho Edmundo Pedro) e de Manuel Viegas Carrascalão (1901-1977) (operário gráfico, anarcossindicalista, preso sob a acusação de bombismo e de pertencer, tal como Fausto Teixeira e Gabriel Pedro, à "Legião Vermelha", acabando por ser desterrado para Timor em abril de 1927, no navio "Pêro de Alenquer", numa viagem que vai demorar 5 meses, com passagem por Cabo Verde, Guiné, onde desembarcam alguns deles e entram outros, e Moçambique onde é rendido o comandante do navio.).

No caso do Fausto Teixeira, a omissão do seu nome,  talvez possa ser devida ao facto de lhe terem perdido o rasto, desde que, com vinte e poucos anos, foi desterrado para a Guiné, em 1925, não pelo "fascismo" da Ditadura Militar / Estado Novo,  mas ainda pela I República em fim de vida.

De qualquer modo, Guiné e Timor eram dois dos piores sítios do nosso glorioso Império para onde o Estado mandava os desgraçados dos "desterrados políticos", sendo ali entregues à sua sorte. Para este inferno, que eram estas duas colónias, iam em geral os indivíduos de profissões manuais ou, no caso de militares, os soldados e os marinheiros. Enfim, até no exílio e deportação, todos eram iguais mas uns eram mais iguais do que outros.

Em todo o caso sabe-se, desde pelo menos a publicação, em Portugal, em 1984, das memórias do Luís Cabral ("Crónica da Libertação", Lisboa, O Jornal, 464 pp., uma edição miserável, o livro, brochado, em que as folhas nems equer são cosidas, apenas coladas, desconjuntando-se todo...), que a fuga deste para Dacar, capital do  Senegal, em princípios de 1960, só terá sido possível com a cumplicidade  e ajuda de dois portugueses, deportados políticos, e oposicionistas ao Estado Novo:

(i)  Maria Sofia Carrajola Pomba [Amaral da Guerra, por casamento], farmacêutica, dona da Farmácia Lisboa, em Bissau (alguns dos seus ajudantes ou empregados destacar-se-iam depois como militantes  do PAIGC, o Epifânio  Souto Amado e o Osvaldo Vieira); apesar de ter ficha na PIDE, vai para a Guiné, nos princípios dos anos 50, com o marido:

(...) "o seu apoio, ao embrionário nacionalismo independentista, é reconhecido pelos históricos dirigentes do PAIGC  que não poupam elogios ao seu papel na luta anticolonialista, nomeadamente no auxílio à organização clandestina de reuniões, na prestação de informações relevantes sobre prisões iminentes, como a de Carlos Correia, e na preparação de fugas, como a de Luís Cabral (auxiliado também por Fausto Teixeira)" (**)

(ii)  Fausto Teixeira (há dúvidas sobre a sua idade: um seu neto diz que nasceu em 1900 e morreu em 1981, mas sabe-se que desembarcou na Guiné em 1925).

2. Vamos ver, na "Crónica da Libertação",  algumas passagens sobre a fuga do Luís Cabral (LC)

O LC era "guarda-livros" (noutras passagens intitula-se contabilista...)  na Casa Gouveia, que pertencia ao Grupo CUF. Mas o seu trabalho político clandestino, no seio do PAI (ainda não se usava a sigla PAIGC) começou a levantar suspeitas da polícia política, mais organizada e ativa depois dos "acontecimentos" de 3 de agosto de 1959 (greve dos marinheiros e trabalhadores das docas do Pijiguiti). 

Na altura o PAI ainda estava confinado a Bissau e era formado por pouca gente,  sobretudo de origem cabo-verdiana, pequeno funcionalismo de 3 ou 4 empresas: além da Casa Gouveia, a NOSOCO, o BNU, os CTT... E a versão sobre o Pijiguiti, onde a Casa Gouveia e o seu subgerente, António Carreira, tiveram muitas culpas no desfecho trágico da greve (pp. 65-70) está muito mal contada por  LC: o PAI quis chamar a si, indevidamente, os louros...

Em contrapartida, "na Casa Gouveia, o meu trabalho profissionalmente sério continuava dando os seus frutos, num momento em que os homens do grupo CUF (Companhia União Fabrl) começavam a aceitar a necessidade de alguma africanização dos quadros superiores da empresa" (pág. 81).

Com uma boa opinião dos patrões, gabinete novo, casa própria, um bom salário, a mulher também tinha um bom emprego, um casal com respeitabilidade e  prestígio na comunidade, etc., o LC tinha tudo para fazer uma boa carreira na empresa. Mas a sua opção foi outra: seguir o irmão, AC, na luta pela independência da Guiné e Cabo Verde. 

Estamos na véspera na inauguraçao da Associação Comercial, Agrícola e Industrial da Guiné, um edifício moderno, de arquitetura arrojada para a época, pago pelo Governo central.

Aristisdes Pereira,  que era chefe da Estação Telegráfica dos CTT (e o Fernando Fortes era  o chefe da Estação Postal, na prática os "donos" dos CTT) , em Bissau, consegue interceptar um telegrama em que o administrador da Gouveia (que tinha vindo  de propósito de Lisboa para assistiir às "festividades" em Bissau)  telefonou para a sede a pedir um novo guarda-livros para a empresa, já que o LC ia ser preso... Mas só "depois de encerradas as contas  do ano comercial findo",  a pedido da própria empresa...  (pág. 83), o que dá uma ideia da promiscuidade entre a PIDE e alguns meios empresariais...

A notícia, confirmada pela dra. Sofia Pomba Guerra (que tinha bons contactos com, pelo menos,  um oficial do exército), pôs em marcha o dispositivo para a fuga: "um antifascista português estava pronto a encarregar-se de me fazer sair, a todo o momento, do país" (pág. 83).

Fausto Teixeira é descrito como um "deportado político e muito conhecido pelas suas opiniões contra o governo fascista".

Pormenores da fuga, relativamente segura e discreta,  podem ser lidos nas páginas 83-87.

(i)  na véspera de partir o LC não escapou aos rituais da superstição que os seus "camaradas de Partido" lhe impuseram: ao sair de casa tinha que deixar cair um ovo no chão; se ele não se partisse,  devia desistir da viagem (!) (pág.  84);

(ii) o automóvel do Fausto era um Peugeot 203, pintado de cor azul forte ("se a memória não me falha") (pág .85);

(iii) o LC entrou no carro do Fausto, ja era noite, frente ao cinema UDIB, um dos sítios mais iluminados da Av. da República,  deitou-se no chão,  enquanto o carro  seguia lentamente pela Av. da República acima:

(iv) O condutor, por sua vez, "ia tranquilamente saudando as pessoas pelo caminho e  até parou  escassos segundos para dizer  algumas palavras ao inspector da PIDE que estava sentado na esplanada na Pastelaria Império " (pág. 85);

(v) a PIDE nunca suspeitou do plano: esperava que o LC caísse na armadilha de levar o seu próprio carro, daí ter posto guardas na ponte de Ensalma e à entrada de Mansoa: Fausto usou um dos seus camiões para ludibriar a vigilância dos guardas...

(vi) conhecido dos guardas, o Fausto não teve necessidade de parar: o LC atravessou a ponte escondido no  camião: já na estrada de Nhacra,  saiu do camião e voltou a entrar no automóvel e tudo correu bem até ao fim da viagem, perto da fronteira com o Senegal:

(vii) (...) "foi uma viagem agradável. O meu companheiro falou muito da sua vida política em Portugal, da sua prisão e do seu envio para a Guiné. Aqui o Governador deportou-o para a ilha de Bubaque, donde não podia sair.  Pouco a pouco a pressão  foi no entanto diminuindo, até ele poder viver como toda a gente" (pág. 85).

(viii) o LC acrescenta mais, para justificar o gesto altruísta do madeireiro:

 "Queria ajudar a luta de libertação da Guiné. (...) Considerava-se devedor dessa contribuição. Para já, estava em condições de tirar do pais qualquer militante que tivesse que sair. (...) Tinha pintado uma tira branca numa grande árvore, mesmo à entrada do entroncamento  que conduzia à serração, partindo da estrada de Mansabá a Bafatá" (pp. 86/87).

(viii) E conclui:

(...) "Entrámos na serração e logo a seguir continuámos em direção à fronteira, perto da localidade de Fajonquito. A  estrada tinha sido aberta pela Missão Geo-Hidrográfica e nunca era utilizada. A mata era tão cerrada que muitas vezes o caminho parece de longe não poder dar passagem a um carro. (....) Pouco depois, passávamos ao lado da tabanca de Fajonquito e  em seguida o meu companheiro parava o carro e mostrava-me  a tabanca senegalesa de Salekenié. (...) Devia ser por volta das três horas da madrugada quando nos separámos. (pág. 87).

Admitindo que o Fausto e o LC tenham partido às 20h00 de Bissau e chegado às 3h00 da manhã, à fronteira, logo a seguir a Canhanima (com Fajonquito à esquerda) e Cambaju (o "chão" do nosso Cherno Baldé) terão percorrido pouco mais de 200 km em 6/7 horas... Na época, e em plena estação seca (estávamos em janeiro), e ainda não havendo guerra (minas, emboscados, abatises...) até foi uma boa média... (No tempo das chuvas, e em plena guerra, eu cheguei a fazer um quilómetro por hora, na estrada Bambadinca-Mansambo-Xitole-Saltinho...)

Como não conhecemos outras versões deste episódio, não podemos confirmar ou infirmar a veracidade dos factos. Mas tudo indica que se terá passado mais ou menos assim como o LC descreve. (****)

PS - A grafia correta da aldeia fronteiriça senegalesa, em frente  a Cambaju,  deve ser Selikenié, segundo o mapa da Google,  e não Salekenié, como escreve o LC. (Mas aqui o Cherno Baldé deu-nos uma ajuda: a grafia portuguesa é Saliquinhé; não confundir com  Saliquinhedim, a sul de Farim, que os militares portugueses conheciam melhor por K3; os topónimos guineenses são tramados.)




Guiné > Carta da província (1961) > Escala 1/500 mil  > Provável percurso do Luís Cabral e do Fausto Teixeira, numa noite de janeiro de 1960, de Bissau até à fronteira do Senegal (Selikinié / Saliquinhé), passando por Mansoa. Mansabá, Banjara, Camamudo, Contuboel e Cambaju... Segundo o Cherno Baldé, os nossos homens teriam evitado Bafatá e seguido de Banjara para Camamudo, e depois apanhando a estrada Bafatá-Contuboel-Senegal... Fajonquito fica ao lado de Canhámina(estamos em pleno coração do "chão" do nosso amigo Cherno Baldé).

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2023)

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(***) Vd.postes de:


18 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17482: (De) Caras (84): Fausto Teixeira, deportado político em 1925, empresário em Bafatá, de quem o 2º tenente Teixeira da Mota, ajudante de campo do governador Sarmento Rodrigues dizia, em 1947, ser um "incansável pioneiro da exploração de madeiras da Guiné"... Mais três contributos para o conhecimento desta figura singular (José Manuel Cancela / Jorge Cabral / Armando Tavares da Silva)

16 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17477: (De) Caras (83): Ainda o madeireiro Fausto da Silva Teixeira, com residência familiar em Palmela, amigo do "tarrafalista" Edmundo Pedro... Apesar da "amizade" com Amílcar Cabral e Luís Cabral, teve um barco, carregado de madeiras, atacado e incendiado no Geba, a caminho de Bissau...

8 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17447: (De) Caras (75): Fausto Teixeira ou Fausto da Silva Teixeira, um dos primeiros militantes comunistas a ser deportado para a Guiné, em 1925, dono de modernas serrações mecânicas (Fá Mandinga, Banjara...) a partir de 1928, exportador de madeiras tropicais, colono próspero e respeitável em 1947, um dos primeiros a ter telefone em Bafatá, amigo de Amílcar Cabral, tendo inclusive ajudado o Luís Cabral a fugir para o Senegal, em 1960..."Quem foi, afinal, o meu avô?", pergunta o neto Fausto Luís Teixeira (nascido em Ponte Nova, Bafatá, onde viveu até aos três anos)..

(****)  Vd. postes anteriores da série:

2 de fevereiro de 2023 > Guiné 61/74 - P24031: Memórias de Luís Cabral (Bissau, 1931 - Torres Vedras, 2009): Factos & mitos- Parte I: Ainda não foi desta que o autor nos contou toda a verdade...

terça-feira, 21 de fevereiro de 2023

Guiné 61/74 - P24087: Convívios (951): 35.º Encontro do pessoal da 35.ª CComandos, dia 30 de Abril de 2023, no Luso - Mealhada (Ramiro Jesus)

1. Mensagem do nosso camarada Ramiro Jesus (ex-Fur Mil Comando da 35.ª CComandos, Teixeira Pinto, Bula e Bissau, 1971/73), com data de 20 de Fevereiro de 2023:

Bom-dia, companheiros/camaradas d'armas.
Se houver espaço disponível num destes dias, agradecia a publicação do mapa/programa do convívio da minha 35.ª CComandos, a realizar no próximo dia 30/04/23, no LUSO, para o qual estão abertas as inscrições.
Espero que a pandemia não nos volte a impedir.

Obrigado e, para todos,
UM ABRAÇO.
Ramiro Jesus



35.ª COMPANHIA DE COMANDOS

35.º CONVÍVIO - RESTAURANTE "O CESTEIRO"

30 DE ABRIL DE 2023 - LUSO (MEALHADA)

EMENTA

- ENTRADAS: Camarão, Salalada de orelheira, Polvo c/molho vinagrete, Queijo fatiado, Rissóis de camarão, Croquetes de carne, Bolinhos de bacalhau, Presunto fatiado, Enchidos assados, Joaquinzinhos e Petingas fritos e Moelas.

- REFEIÇÃO: Bacalhau à Cesteiro (=Minhota) e Leitão à Bairrada.

BEBIDAS: Vinhos tinto e branco da Região; Sumos, água ou cerveja.

- SOBREMESAS: Bolo Comemorativo c/champanhe da Bairrada, Mesa de Doces e Fruta, Café e digestivos.

PREÇO P/Pessoa - 27,50€ (crianças até 5 anos é gratuito e até aos 12 pagam metade)

- INSCRIÇÕES:
R. JESUS - ramiro.sj@hotmail.com ou 926 599 327
FERNANDES - 936 078 948

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Nota do editor

Último poste da série de 16 DE JANEIRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P23986: Convívios (950): 50º almoço-convívio da Magnífica Tabanca da Linha, Algés, Oeiras, 5ª feira, 19/1/2023, a partir das 12:30: ainda se aceitam inscrições (Manuel Resende)

Guiné 61/74 - P24086: In Memoriam (471): José António Paradela (1937-2023), ilhavense, arquiteto, escritor, meu amigo do peito, meu mano: andou na pesca do bacalhau aos 16 anos, e fez o serviço militar na Marinha (Luís Graça)


José António Paradela
Costa Nova, agosto de 2007
Foto: LG
1. Morreu, hoje, no hospital, em Aveiro, de doença de evolução prolongada,  o meu amigo do peito e "mano", o arquiteto José António Paradela. Tinha 85 anos.

O velório e o funeral serão na 5ª feira, dia 23, na sua terra natal, Ílhavo, da parte da tarde.

Estive com ele, pela última vez, na sua casa na Costa Nova, em 11 de janeiro último. Tinha regressado do hospital, mas vinha muito debilitado. Manteve uma conversa curta mas perfeitamemte inteligível e lúcida connosco, eu e a Alice. Já não saía da cama. Ainda lhe telefonámos há uma semana e tal, íamos a caminho do Norte, perto de Aveiro. Tinha regressado ao hospital,desta vez para morrer.

Pela primeira vez, nesse dia, 11 de janeiro,  não veio almoçar connosco,  num dos seus restaurantes 
favoritos (ora na praia da Vagueira, ora na Costa Nova, junto à ria).

Era um homem afável, amigo do seu amigo. Amava os seus, amava a vida, adorava o mar, a ria de Aveiro, o rio Tejo, as Berlenga se,   a fotografia, as viagens... Amava as coisas boas da vida. Tínhamos várias afinidades, desde a boa comida (os mariscos)   à    literatura, à música e  à arquitetura.

Passávamos sempre um dia com ele e a Matilde, no verão, na Costa Nova, antes de rumarmos à Madalena ou a Candoz, mais a norte.  Conhecíamo-lo há mais de 40 anos. Ele e a Matilde, e depois os seus filhos, Marco e Jorge, faziam parte do nosso círculo mais próximo de amigos. 

Era membro da nossa Tabanca Grande, desde 2008, e tem mais de duas dezenas de referências no nosso blogue.

O Zé António, como bom ilhavense, era também ele, filho e neto de gente do mar, tendo passado, aos 16 anos, pela pesca do bacalhau, na Terra Nova... Foi verdadeiramente a sua tropa, a sua guerra da Guiné... Uma experiência, duríssima, de seis meses, que o marcou para sempre... Fez depois o serviço militar obrigatório ma Marinha na 2ª metade da década de 1950.  

Formou-se, a seguir,   em arquitetura, na Escola Superior de Belas Artes de Lisboa (para onde entrou no ano letivo de 1960/61). Chegou a ter o maior gabinete de arquitetura e planeamento de Lisboa, com mais de 6 dezenas de colaboradores, a empresa PAL - Planeamento e Arquitetura, Lda

Fez os planos urbanísticos de muitas autarquias, em especial na região Autónoma da Madeira. Deixa inúmera obra edificada (hoteis, equipamentos desportivos, etc.) não só na região (ilhas da Madeira e Porto Santo) como por todo o país. Trabalhou no SAAL (1974-76), nomeadamente no Bairro da Curraleira-Embrechados – Arquitectos responsáveis: José António Paradela e Gravata Filipe, experiência de que falava com grande paixão.

Homem de múltiplos talentos e saberes, também desenhava e escrevia em prosa e em verso. Publicou uns cinco ou seis livros, em edição de autor, sempre a pensar nos amigos. A um deles deu o belíssimo título Uma Ilha no Nome: Crónica dos Dias Líquidos, que eu tive a honra e o prazer de prefaciar (**). Usava como pseudónimo literário Ábio de  Lápara.

Também fiz três notas de leitura sobre o seu livro "A Rua Suspensa dos Olhos" (20156) (***).

Deixa viúva a Matilde Henriques, que foi técnica superior do Ministério da Agricultura e Pescas. O casal tem dois filhos, Marco (oficial da marinha mercante) e Jorge (que trabalhava com o pai). E uma neta de tenra idade. O Tibério Paradela (1940-2021), um "lobo mar", natural de Ílhavo, capitão da marinha mercante reformado, e seu irmão mais novo, também era membro da nossa Tabanca Grande. 

Dos nossos amigos comuns, na Costa Nova, ainda há destacar: (i)  o Jorge Picado, também nosso grã-tabanqueiro (**); (ii)  o Valdemar Aveiro, um dos últimos capitães da Faina Maior. e ainda (iii) o dr. João Vizinho, outro ilhavense ilustre com casa na Costa Nova, médico do trabalho, meu velho amigo e companheiro das lutas da saúde ocupacional

À família enlutada, em particular à Matilde, o Marco e o Jorge, deixo pessoalmente um muito carinhoso abraço na dor e na saudade. Os pêsames também da Tabanca Grande.

2. Ábio De Lápara (José Paradela) partihou uma memória dos seus últimos 10 anos, escrevendo, pela última vez, na página do seu Facebook o seguinte:
6 de Fevereiro às 21:34 ·


Tempos felizes que cabem por inteiro na minha passada ambição. Deixaram sabores doces e tanto me basta.



O Zé  António  quando jovem marinheiro ("moço")  a bordo do "Lousado", em 1955


Uma das últimas fotos do nosso amigo, aqui com a sua neta de 3 meses, filha do Marco Henriques.


Foto de cronologia no Facebook... Há uma hora, podia ler-se esta derradeira mensagem na sua págima do Facebook:

(...) Querido Facebook, o destino levou-me para um local etéreo, onde descanso agora. Como última paragem despeço-me de todos os meus amigos dia 23 na Igreja Matriz de Ílhavo, por onde andei em seu redor descalço durante a minha meninice. Agora, o início de algo que desconheço. Parti em Paz junto dos que me amam. Cuida da minha conta, meu Querido, um até já.. (...)
___________


(**) Vd. poste de 30 de outubro de 2012 > Guiné 63/74 - P10596: Memória dos lugares (194): Ilhavo, Costa Nova... a terra do meu amigo e irmão mais velho e, porque não ?, meu camarada, o arquitecto Zé António Paradela, que hoje celebra 3/4 de século de existência, antigo marinheiro da pesca do bacalhau, último representante de um povo que tem o mar no ADN!... (Luís Graça)

(***)  Vd. postes de:


29 de dezembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15551: Notas de leitura (791): "A Rua Suspensa dos Olhos", de Ábio de Lápara (pseudónimo literário de José A. Paradela): reprodução do capítulo 7 com a descrição da viagem de seis meses, aos 17 anos, em 1955, aos bancos de pesca do bacalhau: II parte