1. No dia 30 de Novembro de 2011 chegou ao nosso Blogue este primeiro contacto do nosso novo tertuliano Adriano Neto:
Caro Luis,
Desde 2009 que sou um visitante assíduo do blogue criado e editado pela tua pessoa.
Também como combatente, de 29/12/1971 a 22/01/1974, vivi nessas terras da Guiné, minutos, horas e dias que pareciam não mais ter fim.
Chegou o dia de também querer fazer parte dessa Tabanca Grande, para tal gostava de saber; como e o que devo fazer para me registar no blogue.
Aguardo com expectativa a tua resposta.
Um abraço
Adriano Neto
Ex-Furriel Miliciano
2. No dia 4 de Dezembro foi enviada resposta ao nosso novo camarada:
Caro camarada Neto
Muito obrigado pelo teu contacto e por seres nosso atento visitador.
Chegou a hora de te juntares a nós e de contares à tertúlia as tuas memórias e mostrares as tuas fotos.
Que precisamos?
Manda uma foto tua do teu tempo de Guiné e outra actual, de preferência tipo passe, para encimarem os teus postes.
Diz-nos o teu antigo posto, especialidade, Companhia e Batalhão se for o caso, datas de ida e volta, os chãos que palmilhaste e outros pormenores que julgues que possamos saber de ti.
Escreve para já uma pequena história de apresentação sobre ti ou sobre a tua unidade, junta alguma foto se tiveres. Não esqueças que as fotos devem trazer sempre a respectiva legenda para sabermos quem está nela, local, situação, etc.
A tua correspondência dever ser sempre enviada para
luisgracaecamaradasdaguine@gmail.com e para um dos editores, a saber:
Carlos Vinhal -
carlos.vinhal@gmail.com
Eduardo Magalhães -
magalhaesribeiro04@gmail.com
Vamos então ficar à espera do teu novo contacto.
Recebe desde já um abraço em nome dos editores.
O teu camarada e novo amigo
Carlos Vinhal
3. No dia 12 de Dezembro recebemos este mail do nosso camarada Adriano Lopes dos Santos Neto, ex-Fur Mil da CART 3521 (Piche) e CCAÇ 11 (Paunca), 1971/74:
Camarada Luis,
Obrigado pela rápida resposta.
Passo à apresentação:
Adriano Lopes dos Santos Neto
Posto - Ex-Furriel Miliciano
Especialidade - Atirador de Artilharia
Companhia - CART 3521 e CCAÇ 11
Depois de ter terminado a 26 de Junho de 1971 o 2.º ciclo de Sargentos Milicianos de Artilharia (Atirador de Artilharia) na EPA Vendas Novas, fui colocado no GACA 2 Torres Novas. Foi nesta Unidade que me chegou a informação do destino africano que me foi atribuído.
Em Agosto/Setembro foi-me passada a guia de marcha para o RAP 2, Serra do Pilar, Vila Nova de Gaia, cujo objectivo seria a formação da CART 3521 e a preparação para o melhor desempenho nas bolanhas da Guiné. Tudo isto se passou até 21/12/1971.
No dia 22/12/1971, depois de cumpridas todas as formalidade que eram obrigatórias, eu bem como todo o pessoal da CART 3521 e do BART 3873, fomos metidos no navio NIASSA rumo à Guiné, onde chegámos no dia 29/12/1971.
A CART 3521 não fazia parte do BART 3873, pois foi formada e mobilizada como uma Companhia Independente, contudo, se a memória não me falha, logo que chegámos a Bissau o destino foi o mesmo, apanhar uma LDG direitinhos a Bolama onde durante um mês fizémos o IAO.
Findo o IAO e de novo de LDG, à data o melhor meio de transporte, rumámos até ao Xime. Daqui o BART
3873 seguiu para Bambadinca e a CART 3521 para Piche, onde passa a fazer o seu Quartel General.
Como já disse, a CART 3521 foi mobilizada como uma Companhia Independente (intervenção), deste modo estava à disposição do Batalhão de Piche e Nova Lamego, sendo o Leste toda a nossa zona de acção, melhor dizendo, estaríamos onde fosse preciso.
Foi assim que de Piche efectuámos colunas, operações, patrulhas nas zonas de Buruntuma, Canquelifá, Nova Lamego, Bafatá, etc, etc., não esquecendo a segurança diária à Tecnil (empresa que construía a estrada para ligar Piche a Buruntuma). Foi esta a actividade da Companhia até ao dia em que recebi a informação que iria ser destacado para a CCAÇ 11, Paunca.
Nestes meses árduos e brutalmente desgastantes já a Companhia tinha duas baixas. A primeira por acidente com arma de fogo, a segunda vítima de ataque de abelhas na
Operação Topázio Maior, (já identificados pelo camarada Henrique Castro também da Companhia).
Finais de Junho meados de Julho de 1972, (não tenho a data registada), deixo a CART 3521 e rumo para os chãos de Paunca, passando a integrar a Companhia de Africanos CCAÇ 11, onde permaneci até ao fim da comissão. Na CCAÇ 11, bem como em todas as Compahias Africanas, todo o pessoal à excepção dos graduados e especialistas, eram de origem Guineense. Com este pessoal contruí uma camaradagem sã, tenho saudades de alguns momentos, pese embora também tenha tido alguns conflitos que pontualmente foram resolvidos. Após a Independência não sei o que lhes aconteceu, mas lamento que possam ter sido abandonados.
Nos meses em que estive na CCAÇ 11 a Companhia sofreu três mortos, 01/02/1973 Mamadu Embaló, acidente com viatura NT, que ia socorrer o grupo de combate que tinha sido flagelado, 15/06/1973 Boido Baldé e Saliu Baldé rebentamento de minas anti-carro quando faziam a picagem do trilho.
Em Dezembro de 1973 deixei as terras de Paunca e regressei a Bissau, sem mais voltar à CART 3521, Companhia a que pertencia. Para trás ficavam os
chãos onde vivi noites e dias de boas memórias, mas também episódios que jamais esquecerei. Apenas vou referir um; não tenho o dia registado, mas de manhã cedo saímos em coluna militar e civíl de Paunca para Bafatá, via Nova Lamego, na ida tudo bem, no regresso e já bem perto de Paunca 2 a 3Km, uma viatura Berliet, penultíma da coluna, bem carregada de sacos de areia, que era comum, e de arroz que tinhamos recolhido em Bafatá, rebenta uma mina anti-carro de uma potência brutal. Eu e os camaradas que seguíamos na viatura saímos ilesos de quaisquer ferimentos,
milagre, pois a viatura ficou com o rodado esquerdo literalmente destruído.
Em Bissau aguardei ansiosamente pelo regresso, prometido para o dia 19/01/1974, em vôo da FAP.
No dia 19/01/1974 de manhã cêdo eu e outros camaradas fomos direitinhos a Bissalanca, cêdo porque se podia fazer tarde, para apanhar um Noratlas que iria chegar de Lisboa. Iria chegar mas não chegou! Depois de 2 horas de espera fomos informados que por motivos técnicos não levantou de Lisboa e não se sabia o dia em voltaria a fazer a viagem.
Desespero total, mais tempo na Guiné não, apanhei um táxi popular que só parou em frente aos escritórios da TAP, onde fiz a reserva para o 1.º voo que saísse de Bissau.
Foi assim, pagando a minha viagem, que no dia 22/01/1974 deixei as terras da Guiné com destino a Lisboa, com um desvio e aterragem em Faro por não haver condições na Portela.
Termino com um abraço do tamanho da Guiné,
para todos os ex-combatentes da Guiné e um do tamanho do Mundo para a Tabanca Grande.
Ex-Furriel Neto
CART 3521 > Desfile em Bolama no fim do IAO
Tabanca nos arredores de Piche > Trabalho de Psico
Em Piche, sensação de proteção. Estas Chaimites eram temidas pelo IN
Aquartelamento de Canquelifá. Eu do lado direito, Furriel Ribeiro e pretinho que ficou orfão de pais num ataque ao quartel
Burumtuma eu e o Furriel Ribeiro. São visíveis os estragos provocados pelo ataque do IN uns dias antes da nossa chegada. Daí a necessidade do nosso apoio na zona
Capelinha em Buruntuma. Eu depois de um agradecimento à Virgem Maria
Já estou em terras de Paunca, mas não sei o que estou a fazer. Será que vimos da caça!
Em Paunca Natal de 1972. A refeição não é de bacalhau, mas sim leitão preparado pelo pessoal
Paunca > Alguns furriéis da CCAÇ 11. O único que é da Guiné (cabo-verdiano) é o Reis Pires primeiro lado direito
4. Comentário de CV:
Caro Neto, só duas palavras para te dar as boas vindas ao Blogue, a esta Tabanca, ou Caserna virtual, onde o que nos une é muito, porque todos pisámos aquela terra vermelha, atravessámos bolanhas, suamos debaixo do mesmo sol escaldante, sofremos privações semelhantes e deixámos por lá o nosso suor e alguns até o sangue.
Aqui não conta a idade, o sexo, as habilitações literárias ou posição social/profissional. Tratamo-nos todos por tu, porque a amizade e camaradagem assim o impõem. Não impede isto, o respeito e a aceitação da diferença de opinião. Discutir sempre que se julgue oportuno e necessário, evitando o confronto directo e de tom agressivo e provocatório.
Esperamos a tua regular colaboração de acordo com a tua disponibilidade.
Em nome da tertúlia e dos editores, deixo-te um abraço de boas vindas.
Carlos Vinhal
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 13 de Dezembro de 2011 >
Guiné 63/74 - P9194: Tabanca Grande (310): Luís Gonçalves Vaz, professor, filho do Cor CEM Henrique Vaz (1922-2001)