sábado, 20 de junho de 2020

Guiné 61/74 - P21094: Boas Memórias da Minha Paz (José Ferreira da Silva) (15): Os Carolos



1. Em mensagem do dia 8 de Junho de 2020, o nosso camarada José Ferreira da Silva (ex-Fur Mil Op Esp da CART 1689/BART 1913, , Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69), enviou-nos esta Boa memória da sua paz, desta vez a história dos Carolos, primorosamente narrada.


BOAS MEMÓRIAS DA MINHA PAZ - 14

OS CAROLOS

- Ó primo, senta aí. Hoje vais ficar na Mesa Principal.
- Não. Como assim? Sabes que não sou nada neste mundo da cortiça. - protestei um pouco confuso.

Era o industrial Adérito Carolo, que estava duplamente feliz: com a presença a seu lado do seu filho Aldino, que representava ali o sogro, o grande industrial António Almada e, ainda, com a de outro grande, Álvaro Gato, (que obrigou a mais uma cadeira, por ter chegado mais tarde e porque tínhamos ocupado o seu lugar). Do grupo dos maiores, só faltavam ali o Amorim (que não se fizera notar nessa Gala Anual da Associação) e o Grupo Suber, que presidia à Associação e que, com as entidades oficiais, fazia as honras da casa.

A minha filha Ana havia assumido a maioria das quotas na nossa sociedade, com o objectivo de conseguirmos a aprovação de um projecto apoiado, destinado jovens empresários. (Claro que nunca o conseguimos). Apesar da nossa pequena dimensão, ela veio entusiasmada com o ambiente e a simpatia que lhe dispensaram.
- Ó pai, não percebi bem porque aquele senhor Adérito, te chamou primo.
- Ó rapariga, a história dos Carolos é uma coisa interessante. Vou tentar contar-te.
O Adérito é filho do António Carolo, mais conhecido por Tono Caçador. Gostava muito de cavalos, mas, ultimamente, andava mais de motorizada, na sua actividade de capador.
O Tono Caçador tinha vários filhos (seis), mas eram mais conhecidas as suas três formosas filhas.

Nos anos cinquenta, o negócio da cortiça estava em grande ascensão. Um filho de industrial rico, de Lamas, apaixonou-se por uma delas. Foi um amor bastante badalado. O rapaz ficou conhecido como o “Penico de ouro”, por ter presenteado a namorada com essa peça valiosa.
Casou pomposamente e logo criou uma empresa com o sogro, onde incluiu todos os demais familiares da mulher, como sócios. Com a experiência e o apoio do “Penico de ouro” e o orgulhoso e entusiasmado trabalho de cada sócio, a empresa cresceu exponencialmente. Lembro que o Adérito, mais velho uns dois anos que eu, trabalhou comigo na primeira empresa em que fui trabalhar, aos 10 anos e meio.Os dois irmãos mais novos foram estudar, para o Colégio dos Carvalhos; o Antoninho e o Carlos Alfredo. Não eram muito inteligentes e, como viviam à fartazana, nada ligavam ao estudo.
O Antoninho era muito vaidoso e andava sempre de nariz levantado e cara de importante. O outro, o mais novo, só queria brincadeira. Gozava com tudo e mais ainda com a escola. O Antoninho, logo que pôde, meteu-se no escritório, enquanto o Carlos Alfredo ainda penava, a fazer que estudava e nada aprendia. Andava quase sempre arranhado pelos constantes acidentes de motorizada.

Com 18 anos e comportamento de menino rico, apetrechado com carro e roupas do melhor, o Antoninho procurava namoradas compatíveis com as suas exigências e ambições.
O Antoninho, que era da minha idade, “comprou” a tropa, alegando, em tons de gozo, sofrer do “calcanhar de Aquiles”, justificação que, aliás, apontava para o seu fraco rendimento de jogador de futebol na equipa de Lourosa, que era patrocinada fortemente pela empresa. Casou com a moça mais linda da freguesia vizinha, por sinal, boa rapariga e de gente de bem e… de bens.
O Carlos Alfredo, desistiu de estudar. Tinha vergonha da chacota que os colegas lhe dispensavam. Dentro da fábrica, entusiasmou-se com as várias operações que a confecção das rolhas obrigava, vindo a ser um expert na matéria. O Carlos vivia intensamente. Dentro ou fora da fábrica arrastava energia atrás de si. Aloirado, de olhos claros e sempre sorridente, encantava as miúdas. E, quando aparecia de descapotável junto às praias, elas pareciam moscas à volta dele.

Em 1967, a Guerra do Ultramar estava numa fase difícil e o Carlos não conseguiu livrar-se, à primeira, de ser apurado para o serviço militar. Mexeram os cordelinhos bem untados, mas só ao fim de uns 10 meses de tropa, conseguiu baixar de vez ao Hospital Militar, vindo a livrar-se. Foram 10 meses em beleza, vividos à grande na cidade de Lisboa. Levou um bom carro e, com o “forte carinho” dos familiares, embrenhou-se em ambientes de aparente Jet Set. Nas divagações da noite, conheceu uma lustrosa moça da zona de Cascais, que o fez sentir-se galã e responsável por uma relação …séria. Após mais umas tantas viagens forçadas e umas promessas de amor eterno, casaram. Viviam muito bem numa bela mansão que ele mandara construir, perto de Espinho e do Porto, por forma a usufruir um bom nível de vida familiar.
Foram anos faustosos para toda a família. Com os casamentos consagrados por maior ou menor interesse, mais forte ou menos fraco “amor eterno”, nunca se assistiu à exuberância de tanta felicidade. Ainda hoje se podem ver, reluzentes, algumas das suas moradias similares, alinhadas, à face da rua principal da vila.

O Adérito que fora, dos três mais novos, o primeiro a casar, andou lá por Fiães, junto à igreja e à JOC, até conquistar a mulher dos seus sonhos. Sempre moderado e simpático, transmitia optimismo e confiança. Todos gostavam dele. Por sinal, não foi só ele que vi fazer-se, pontualmente, um religioso fervoroso. Uns 15 anos mais tarde, o Adérito, apercebendo-se da “enorme nau” em que a empresa se transformara, numa de humildade, chegou a acordo com os irmãos, que lhe compraram a quota. Depois montou uma pequena fábrica, onde eu tive a oportunidade de o contactar. Vivia feliz com o “pouco” que dizia ter. O filho fora estudar gestão e vivia ansioso por se desenvolver no ramo da cortiça. E assim aconteceu. Só que o rapaz veio a casar com a filha de um dos maiores industriais da cortiça, o António Almada. E era na qualidade de representante do sogro que estava ali, orgulhosamente, na mesa, ao lado do pai. Eles, que me acompanhavam naquela “coisa” da canoagem, por isso se fartaram de te fazer perguntas sobre esse tema, em que tu, uma Campeã, também tinhas muito que contar.

Entretanto, a Anabela, uma filha do Antoninho, que era uma fotocópia melhorada da imagem da mãe, incitada pelos pais, começou a namorar com o filho do “Rei do Ferro”, um homem que se enchera com os seus negócios escuros conseguidos sub-repticiamente na altura do “controlo operário” da Siderurgia Nacional. Dada a empatia criada entre estas duas famílias, o casamento dos jovens seria a chamada “cereja no topo do bolo”.
Marcaram o casamento e foram efectuados os numerosos convites a tudo que era socialmente destacável naquela região de Santa Maria da Feira, Espinho e arredores. E, nesses “honrosos” convites, pedia-se vestimenta a rigor, incluindo o “charmoso” chapéu de coco.

Os modelos em voga

Só que, enquanto se encenava o mais formal dos desfechos de uma relação pró conjugal, aconteciam outros relacionamentos de proximidade pouco oportunos. É que a bela rapariga nunca eliminara de todo a sua paixoneta por um rapaz, o Luís, meio perdido pela droga, que conhecera, ainda adolescente, na Escola de Fiães.

As modelos em voga

Nunca se vira casamento igual. Carros topo de gama, farpela à maneira e vestidos do último grito. Não sei se Hollywood poderia competir com coisa assim.

Os carros em moda na alta roda

A cerimónia estava marcada para as 11H00 e era já quase meio dia sem a noiva aparecer. Não era normal tanto atraso, mas como se tratava de um casamento de outra dimensão, parecia que o atraso fazia parte dessa excepcional grandeza. Telefonemas para um lado e murmúrios para o outro, mas, quanto à verdade, nada se sabia. Até que o Senhor Antonino avisa que não há casamento, porque a noiva… desaparecera. Foi uma bomba!

E agora, que fazer aos chapéus?

O seu parceiro, preocupado, pergunta-lhe:
- E agora, está aqui a malta toda emproada, feitos pavões e de chapéu à maneira, que vamos fazer?
- Que se fodam lá os chapéus! Olha, vamos mas é todos comer e beber à puta d’alma, porque a despesa já está feita e este mundo são dois dias.

Não havia nada a fazer, o rapaz de “mau porte”, passara lá de madrugada e levou a noiva numa motorizada, não se sabia para onde.
Grande nau, grande tormenta. A Empresa Corticeira fartou-se de dar dinheiro. Mas quando se verificou que as despesas (e os desvios) aumentavam e as receitas nem por isso e que os encargos se avolumaram em toda a linha, teve início a uma crise, também agravada pelo menor fulgor neste sector industrial. Em pouco tempo tudo se comprometeu e todos tentaram safar-se. Porém, os que mais se assumiram (os quatro que compraram as quotas) ficaram hipotecados à banca, que lhes foi comendo os valores.
Foi tudo à falência. Valeu ao Antoninho, os valores da mulher que não estavam sob hipoteca. O “Penico de ouro” também estava salvaguardado parcialmente, pela empresa do pai. O Senhor António Caçador até perdeu a casa, porque tinha apostado tudo naquele projecto. O Carlos Alfredo ficou também sem casa e sem nada. A mulher, que tanto gastara e tanto gozara, fugiu para Lisboa, deixando os dois filhos já moços, às custas do pai. Os filhos mimados e o pai meio aburguesado, não viam maneira de se defenderem. Foram anos de desespero para eles. Valeu ao Carlos Alfredo a sua capacidade técnica nos mais variados serviços. Sem instalações e sem máquinas minimamente adequadas, ele inventava esquemas incríveis para se desenrascar nesses chamados “serviços especiais”.

Apareci por essa altura e até fiquei prejudicado, devido às habilidades de um dos filhos. Dormia no Pavilhão de trabalho e mandou os filhos para a casa do avô, enquanto não entregou a casa. Mais tarde, ele, já sem os filhos, e com outras capacidades, pediu-me que voltasse a dar-lhe serviços. Efectivamente, não lhe faltavam máquinas nem espaço para trabalhar. Tinha mais serviço. Conseguira entrar como fornecedor no Grupo Amorim, mas receava ficar preso ao alegado comportamento monopolista desse grupo.
Tivemos um bom relacionamento nestes últimos anos. Ele recuperou a estabilidade e voltou a exibir o seu largo sorriso. Estava escaldado de todo o tipo de relacionamento e muito cru em desenvolver novas amizades. Nesta fase, já ele andava com um moderno Mercedes, comia e bebia do melhor, tal como já o fizera noutros tempos. Bebia já de manhã. Por vezes tomávamos o primeiro cafezinho juntos e ele nunca dispensava um bom whisky. E lá recordava ele, bem-disposto, em jeito de intimidade:
- As nossas avós deviam ser umas putas de primeira. Coitadas, vieram lá de “casa do caralho mais velho”, nos tempos de fome e guerra e andaram por aí à balda.
E eu, acrescentava:
- E ninguém diz que teriam sido casadas. O que eu sei é que a minha avó teve três filhos de pais diferentes.
Voltava ele:
- A minha teve dois e também não teve marido.

Lembro que quando a minha Mãe Bia faleceu eu era, ainda, criança. Sei que ela trabalhava para o Azeiteiro da Feira dos Dez, onde nasceu o meu pai. Era magra, morena e muito reservada. O que mais me chamava a atenção era vê-la sentada em pose, muito calma, a beber café/cevada (que me oferecia sempre) e a… fumar. Coisa raríssima naquele tempo: mulher pobre a fumar.
Um dia, vejo o Carlos Alfredo menos receptivo e a dar sinal à “empregada” para me atender. Era a Lina, uma senhora bem vistosa, de uns 50 anos, que me segredou:
- A cabra da mulher, voltou e ele anda desanimado.

Quase a chorar, a Lina queria desabafar e lamentar mais uma vez a sua triste sina. Disse-lhe para ter calma e deixei-lhe a orientação do serviço que desejava e afastei-me.
A Lina era uma linda loira de sorriso reservado, de olhar calmo e comportamento introvertido. Aos 16 anos sentia uma certa atracção por um rapaz da JOC que era mais velho uns 4 anos. O Arlindo, o tal rapaz, também de Sanguedo, foi mobilizado para a Guiné. A Lina sentiu que teria que se aproximar mais dele e, num Domingo, à saída da missa das 11H00, abeirou-se dele, a desejar-lhe boa sorte e deixou-lhe o recado:
- Olha, se precisares de Madrinha de Guerra…

Não levou um mês para que a Lina recebesse uma carta agradável do Arlindo. Ela entendeu esse contacto como uma importante decisão nas suas relações. Esse relacionamento aproximou-os mais. Quando, um ano depois, ele veio gozar férias e teve alguns encontros com ela, eles culminaram com alguns abraços e beijos mais avançados. Ela sentiu-se “comprometida” e interiorizou a condição de fiel namorada. Escreveram mais vezes e em modos mais apaixonados.
O Arlindo regressou da Guiné logo em Maio, após o 25 de Abril. Vinha eufórico. Feliz por ter terminado a comissão de serviço na guerra, feliz por a guerra ter terminado e muito feliz pela sua situação amorosa.
A oferta feminina era grande e a Lina, afinal, não era a única madrinha nem a única namorada. O Arlindo, perante a situação de engatatão, teve que tomar opções sérias. E como a Lina, parecia a mais apagada das suas conquistas, ele deixou-se embalar por outros sonhos. Se a Lina era reservada e introvertida, a partir dali, ainda mais ficou. Sofreu muito com essa desilusão e “escondeu-se” na igreja, chegando a parecer mais devota que a Stª. Teresinha do Menino Jesus. …

Tinha ido trabalhar para a Empresa Corticeira, onde acompanhou de perto a sua maior ascensão e a sua queda. E quando o Carlos Alfredo lutava para sobreviver e tinha sido abandonado pela mulher, sentiu-se na obrigação moral de o ajudar. Chegou a sacrificar o seu salário, para o auxiliar em situações aflitivas.
Um dia, ela disse que tinha que ir a Fátima a pé, para cumprir uma secreta promessa, tal como nos outros anos. Só que ele estava apertado com o serviço e precisava dela. A Lina, ciente da situação, lembrou-se de ir falar ao Padre Abílio e expor-lhe o assunto.
Ele, condescendente, disse-lhe:
- Ó rapariga, andaste a cumprir a promessa pela salvação do Arlindo na guerra, mas ele casou com outra. Já há uns anitos. Isso demonstra bem que és uma fiel criatura de Deus e que mereces ser mais feliz. Olha, não deixes de ir a Fátima, mas não precisas de ir a pé. Vai à minha responsabilidade.

No dia seguinte, a Lina confessou ao Alfredo que o padre lhe dissera que poderia cumprir a sua promessa indo de viatura.
- Ó Lina, se eu te levasse a Fátima e te trouxesse de seguida, tu aceitavas?
Ela pensou e respondeu-lhe:
- Vamos, mas eu vou ver se arranjo alguém para ir comigo, percebes? Podemos ir a tempo da Procissão das Velas e virmos embora.

Partiram já da parte de tarde daquele dia 12 de Maio. Como ela não levou companhia, ele perguntou-lhe porquê.
Ela respondeu-lhe:
- Afinal, já não tenho nada a perder, uma vez que nunca cheguei a ganhar nada. Já perdi o melhor tempo da minha vida. Resta-me continuar a viver de bem com Deus.

Seguiram o programa dela. Por ele, viria embora logo após a Procissão das Velas. Porém, ela sugeriu:
- Podíamos ficar para amanhã e assistir ao “Adeus à Virgem”, até porque a esta hora, iríamos perder quase a noite toda na viagem. Que achas?
Arranjaram uma pensão nos arredores de Fátima, no único quarto que havia de vago. Mesmo assim, ele pensou em dormir no chão, para dar a cama à Lina.

A Lina cumpria promessas em benefício alheio.

Foi uma noite de muita conversa e muita aproximação. Finalmente, ela falou abertamente. E confessou que já há muito tempo que sentia essa aproximação por ele. E que sentira sempre revolta por ver a sua mulher a tratá-lo tão mal. Não se aproximara mais dele porque, com a desilusão que sentira com o Combatente Arlindo, a levara a prometer nunca mais querer saber de homem algum. Além disso, o Carlos continuava casado. Desde então, viveram de forma diferente. Ele mantinha as aparências de um viver discreto, mas que acabou por aumentar a sua assiduidade nas pernoitas em casa da Lina.”

************

Quando voltei à fábrica do Carlos, para receber a mercadoria, apercebi-me de uma senhora, de cabelos engalanados, presos por um lenço, para se proteger da finíssima camada do pó das rolhas.
- Que se passa, Carlos, quem é essa senhora?
Ele respondeu prontamente:
- É a filha da puta da mãe dos meus filhos, que veio cá acima ver se colhia mais alguma coisa. Olha que ela deu-se ao desplante de querer trabalhar, para mostrar a sua “humildade”, agora tantos anos depois. Nem se lembra que ainda estou fodidinho, controlado por Finanças, Bancos e Tribunais, devido à falência da Empresa Corticeira.
E continuou:
- O que vale é que ela já disse para lhe arranjar algum dinheiro, para voltar para Lisboa. Vou ver se a despacho ainda amanhã, porque no Sábado quero ir para a beira-mar, para Paramos e almoçar uma “parrilhada de peixe” no amigo Orlando com a minha Lina. Essa sim, é uma mulher de cinco estrelas! Coitada, tem sofrido tanto que nunca será recompensada como merece!

A Parrilhada do “Camarada” Orlando é um espectáculo!

Passei a vê-los habitualmente felizes, especialmente da parte de tarde, depois de ele ter complementado bem o almoço com o indispensável digestivo. No ano passado, ele teve uma recaída da sua doença pulmonar e deixou de trabalhar. Lá me desenrasquei com uma alternativa. Porém, umas semanas mais tarde, telefonei, a saber se já havia recuperado. Atendeu a Lina, a chorar:
- Ó Senhor José, o meu Carlos já morreu. Nem lhe disse nada, para não o entristecer. Estou para aqui desolada, a sofrer este desgosto. Éramos tão felizes!


Uns 15 dias depois, telefonámos-lhe a convidá-la e passámos por sua casa. Fomos almoçar ao Casarão de Paramos. O patrão esmerou-se em elogios ao casal que costumava ocupar aquela mesa do lado do mar.
A Lina chorou mais uma vez. Porém, senti que lhe havíamos dado uma alegria que, por certo, iria suavizar a sua dor. No final, ela pegou na rosa vermelha que ornamentava a mesa e disse:
- Ó Senhor Orlando, vou levar a rosa que o meu Carlos costumava oferecer-me.

E mais à saída, virando-se para mim, murmurou em tom saudoso:
- Sabe, Senhor José? Ele ficava tão amoroso depois de beber um copito.

Notas:
1 – A Anabela e o Luís, que fugiram na motorizada no dia da grande boda, fizeram uma família muito feliz. Possuem uma cadeia de lojas de Moda.
2 – O Antonino continua a aparentar muita importância. Anda sempre de Mercedes, pasta preta e óculos escuros. Interpelado, em casa, pelos agentes de execução, respondia jocosamente: - Estou para aqui desterrado nesta quinta, onde vivo da caridade da minha filha. Não tenho nada em meu nome. Roubaram-me tudo.
3 – Há dias vi a Lina a sorrir, numa foto do facebook, com uma criança ao colo e os dois filhos do Carlos ao seu lado, com as respectivas mulheres. Afinal, esta é que é a verdadeira mãe que sempre tiveram.
# - Esta história é fictícia. Porém, como assenta em factos reais, pode descrever algumas coincidências.

José Ferreira
(Silva da Cart 1689)
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Nota do editor

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3 comentários:

Zé Manel Cancela disse...

For-mi-davel,esta "istoria".De melhor em melhor.
Não pares,e manda cá para fora o quarto livro.
Um grande abraço,e muitos parabens.....

Anónimo disse...

Uma bela história carregada de crítica social. Já a conhecia, por dela me ter falado o autor, numa versão resumida. É primorosa a forma como o Zé Ferreira põe a nu as vaidades balofas, o novo-riquismo e a hipocrisia das gentes sem coluna vertebral. Para mim mais um belo retrato do passado, mas muito presente ainda na sociedade actual.

Um abraço.

Carvalho de Mampatá

Ricardo Figueiredo disse...

Os enredos,as aparências,os amores e os desamores,os que trabalham e os que fazem de conta,todos tão bem retratados por ti,Zé Ferreira.
Gostei.
Um abraço