sábado, 7 de agosto de 2010

Guiné 63/74 - P6832: Convívios (264): Festejar a vida em Santa Luzia, Ourique (Felismina Costa)

1. Mensagem da nossa amiga tertuliana Felismina Costa com data de 4 de Agosto de 2010:

Boa-noite Amigo Carlos Vinhal
Queria partilhar convosco um almoço a que assisti na minha terra no passado dia 25 de Julho.


FESTEJAR A VIDA

A organização presidida por ex-combatentes, promove o encontro de naturais da minha freguesia, nos últimos três anos, dando prioridade aos nascidos em 1943, mas sucessivamente alargados os convites, a familiares e amigos, e, é na qualidade de convidados, que me apresento com meu marido, meu filho mais velho, nora e neto.

Penso que já vos disse, que sou alentejana, natural de uma freguesia do Concelho de Ourique, chamada Santa Luzia. A partir dos anos sessenta, quase todos nós deixamos as nossas terras e fixámo-nos nas periferias das grandes cidades, tentando mudar o rumo da vida, tentando melhorará-la.

O trabalho do campo, mal remunerado, e cada vez mais escasso, mercê das novas tecnologias agrícolas, fazia com que, principalmente os jovens saíssem à procura de dias melhores, e foi assim que a minha aldeia, tal como tantas outras, viu partir os seus filhos: o êxodo dá-se ao mesmo tempo que acontece a guerra do ultramar, e os próprios ex-militares que regressam, depressa saem também, tentando melhores condições de vida. Muitos alentejanos fixaram-se na margem sul, (sempre pensei, que por se sentirem mais próximos do seu torrão Natal). O certo é que as aldeias, foram ficando despovoadas, poucos jovens permanecem, e os menos jovens vão partindo para a viagem final.

Contudo alguns resistem, decidem ficar, e aos poucos os que saíram vão regressando reformados:

O chamamento da terra é algo muito forte!

E ei-los que voltam! E os que voltam querem trazer mais, e querem reunir os que há muito partiram e nunca mais se reuniram, e organizam-se, fazem-se contactos a nível escolar, e são convocadas turmas inteiras da escola Primária, porque era o único estabelecimento de ensino, e a terra enche-se de gente. No café do Zé Capela, um dos organizadores do evento, e no recinto do Clube local, os encontros de quem não se via há 40 anos são verdadeiras demonstrações de alegria e saudade. Quem és tu? E tu quem és? São perguntas constantes, e os sorrisos e as lágrimas, e os beijos e os abraços, e o recordar famílias, e situações divertidas, e dramas, e os rostos que já não vimos nunca mais, e as casas em que vivemos transformadas, modificadas por novos ocupantes, tudo isso gera emoções quase impossíveis de caber no peito. Fiz questão de falar a todos os habitantes que vi, como sempre fiz, percorri a aldeia inteira acompanhada pela meus, para mostrar ao meu neto os lugares onde cresci e onde vivi as histórias que sempre lhe contei, onde feliz e amada por todos, donde trouxe as melhores recordações da minha vida.

O almoço foi espectacular, na maior camaradagem, na maior alegria!

Que alegria me deu a minha gente!

Depois do almoço, cantamos o nosso encantador canto alentejano, havia vozes magnificas, e as menos boas faziam-se ouvir na mesma. Éramos todos um. A mesma alegria e a mesma emoção.

Os meus amigos da organização fizeram questão de me dizer: - Obrigados por teres vindo e teres trazido a tua família, tu és nossa, não queremos que faltes nunca. Vem sempre e trá-los também. Chorei, distribuí beijos e abraços aos meus irmãos e irmãs de infância, que à despedida me diziam: - Não vás, fica cá.

Li alguns poemas meus, um intitulado Santa Luzia, numa homenagem à terra que nos viu nascer e crescer.

Havia convidados ex-combatentes que prestaram serviço em Angola com os nossos conterrâneos e que ficaram amigos para a vida, e um deles me disse que se sente como se fosse um dos nossos.

Gostei de tudo, da alegria, da saudade, da emoção, para a qual tenho pedido ajuda ao Lexotan, e sobretudo de constatar que a minha gente tem os mesmos valores, a mesma maneira de ser e agir, que o berço, mesmo pobre, lhes incutiu.

Porque é grande a minha emoção, quis partilhar convosco, homens da guerra, habituados que estão a estes
encontros e a sentir estas emoções. Eu, também vivo as vossas, como se minhas fossem.

Obrigada
Felismina Costa

Felismina Costa entre dois amigos. De frente, o filho e a nora

Nesta foto: marido, nora, Felismina e o neto
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 16 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6746: Tabanca Grande (230): Felismina Costa, madrinha de guerra de Hélder Martins de Matos, ex-1.º Cabo Escriturário, Bafatá, 1963/64

Vd. último poste da série de 23 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6775: Convívios (178): Encontro do pessoal da CCAÇ 4740 (Armando Faria)

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Guiné 63/74 - P6831: (Ex)citações (88): Futebol e nacionalismo nos anos 50/60 (Nelson Herbert)


Guiné-Bissau > Bissau > s/d (pós-independência > Campo de jogos de Bissau (antigo estádio Sarmento Rodrigues) > Um jogo de futebol, sob a bandeira da nova República, duas equipas locais, com equipamentos de clubes portugueses (Benfica e Sporting). Foto de autor desconhecimento.

Imagem: Gentilmente cedida por Nelson Herbert / Maria da Conceição Silva Évora


1. Comentário, com data 2 do corrente,  do Nelson Herbert,  ao poste P6815 (*):

"Apareceram também clubes de futebol como o Sport Lisboa e Benfica, 'por iniciativa de alguns nomes conhecidos da sociedade portuguesa, Gama das Construções [Gama] Lda, Pimenta do Cadastro, Casqueiro, etc.' e o Sporting Club de Bissau, 'sob a égide de Eugénio Paralta, irmão Zé Paralta, Chico Correia'... A UDIB já existia, diz-nos Cadogo Pai. No entanto, o desemvolvimento do futebol, 'trouxe mais um bafo de rivalidades, olhando a situação dos jogadores caboverdianos , importados pelo Benfica, que, para os atrair, os adeptos bem colocados, tinham que lhes oferecere bons empreegos. Bons rapazes, no fundo, Antero, os sinais [?] Tcheca, Marcelino Ferreira (Tchalino), etc." (1ª Parte, p. 6).

Caro Luis

A origem das equipas de futebol da Guiné é, por sinal,  uma das tematicas que há meses vinha eu já ensaiando propor a "debate" e [pedir] contribuições ao blogue...Sobre esta temática tenho eu recolhido alguns testemunhos, por incentivo do meu próprio progenitor... por sinal da leva dos futebolistas caboverdianos que povoaram o meio desportivo guineense da época. Alias, modalidade-rei, com a qual os caboverdianos estavam em certa medida familiarizados, através dos ingleses, que pelas passagens pelo Porto Grande da Ilha de São Vicente, introduziram o futebol e o "cricket"...Quanto a este último facto curioso, nos demais territorios "ultramarinos" de Portugal, foi o único onde a modalidade pegou e conserva ainda alguns resquícios da sua práctica.

Dessa "hegemonia" de futebolistas caboverdianos - Antero, Marcelino (Gazela),  Armando Lopes (Búfalo Bill , meu pai), Tcheca, Júlio Almeida (referenciado como um dos fundadores do PAIGC), na sua maioria atletas do Sport BISSAU e Benfica e da UDIB (caso do meu pai que,  "importado" de Cabo Verde, inicia a sua carreira na UDIB,transferindo-se anos mais tarde para o Benfica de Bissau), houve na época a necessidade de se contrabalançar...essa então "primazia" de futebolistas das ilhas, pelas razões  já expostas acima... 

E seria pois com base nesse pressuposto que nasceria o Sporting Club de Bissau (clube de que fui futebolista junior, apesar da minha paixão clubística pela UDIB)...outrora Império... e na qual militaram numa primeira fase da sua fundação, e na sua quase totalidade, futebolistas originários da Guiné. 

"Caboverdianos" do Sporting viriam depois... e entre os nomes sonantes dessa época, cito aqui o nome de "Djinha" Almeida...

Por iniciativa dos irmãos Paralta,e de mais um lote de futebolistas, de novo, na sua maioria caboverdianos, que,  na época do defeso do campeonato provincial, praticavam o ténis nos adstritos courts do então estádio Sarmento Rodrigues, nasceria a ideia de fundação estariam envolvidos do Tenis Club de Bissau...

Eis pois aqui uma proposta de "debate" e de recolha de testemunhos de que o Blog...tem sido proficuo...
Por exemplo, que papel teve a "tropa" na sustentabilidade do futebol na Guiné, pelo menos a nivel das equipas do interior do pais, algumas que com inicio da guerra deixaram de ser parte do campeonato provincial da Guiné.

Entretanto, relativamente à participação das equipas do futebol guineense, incluindo a própria selecção provincial, nas competições regionais africanas da época... Bobo Keita, um hist+rico comandante da guerrilha e talentoso futebolista guineense, entretanto ja falecido, recordou em tempos,  em entrevista por mim conduzida, o seu primeiro contacto com a ideia da necessidade da emancipação do homem africano...Aconteceu pois aquando de uma digressão da selecção provincial da Guiné ao Ghana de Kwame Nkrumah...

Mantenhas
Nelson Herbert
USA 

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(**) 4 de Agosto de 2010 > Guiné 63/74 - P6827: (Ex)citações (70): O direito de um velho colon a ter um ponto de vista um tanto reaccionário (António Rosinha)

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Guiné 63/74 - P6830: Em busca de... (138): Procuro o ex-Fur Mil Carvalho ferido numa emboscada, em meados de 1965 no Gabú (Rogério Cardoso)

1. Mensagem de Rogério Cardoso (ex-Fur Mil, CART 643/BART 645, Bissorã, 1964/66), com data de 3 de Agosto de 2010:

Amigo Carlos Vinhal
Muitos anos se passaram sem poder encontrar um amigo do HMP, ferido na Guiné e companheiro de quarto.
Assim, gostava de ver publicado o seguinte;

Procuro o ex-Furriel Mil. Carvalho, ferido numa emboscada quando uma granada de RPG atingiu o Unimog que transportava a sua Secção.

O local julgo ter sido o Gabu, mais ou menos em meados do ano de 1965.

Segundo ele me contou, toda a Secção foi aniquilada, ao cair da noite. Como se tratava de uma única viatura, ele, o Carvalho, ficou toda a noite gravemente ferido no terreno. O IN, julgando-o morto retirou.
Só de manhã foram socorridos em virtude de não haver efectivos na altura para a ajuda.

Sei que ele era de Lisboa, do Alto do Pina, estava na Enfermaria 2, nas urgências da Infante Santo.
Nunca mais o vi, era um bom amigo, por isso o meu interesse neste pedido.

Um abraço
Rogério Cardoso
rmcardoso1941@gmail.com


2. Comentário de CV:

Pesquisando no Livro I - Guiné, Tomo II - Mortos em Campanha - 8.º Volume da Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974), encontrei 3 mortos em Gabu (Nova Lamego), por ferimentos em combate, no dia 4 de Julho de 1965, pertencentes à CCAÇ 727.

Face a estes dados, há hipótese de o camarada Carvalho ser um dos feridos naquela emboscada do dia 4 de Julho de 1965.

Como é costume, solicita-se a quem conheça o Carvalho ou tenha conhecimento mais preciso do acontecimento, o favor de contactar o nosso camarada e tertuliano Rogério Cardoso.
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(*) Vd. poste de 14 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6731: Notas soltas da CART 643 (Rogério Cardoso) (25): O meu Irmão Álvaro

Vd. último poste da série de 30 de Junho de 2010 > Guiné 63/74 - P6664: Em busca de... (137): Procuro informações sobre Fernando Labaredas Torrão, Alf Mil da CCAÇ 461

Guiné 63/74 - P6829: Efemérides (50): Acontecimentos de 3 de Agosto de 1959 no cais do Pindjiguiti, Bissau (3) (Leopoldo Amado)

III (e última) parte do texto do Leopoldo Amado, historiador guineense e membro da nossa tertúlia (publicado igualmente no blogue Lamparam II, em poste de 21 de Fevereiro de 2006):

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Destaque para o último parágrafo deste importante e oportuno texto, cujo leitura e análise se recomendam aos membros da nossa tertúlia:

" (...) Para lá da obrigação que temos de preservar e partilhar os legados da nossa História comum, é natural e compreensível que subsistam – porventura, subsistirão sempre –, perspectivas interpretativas dissonantes, estas últimas, talvez decorrentes dos novos paradigmas que actualmente consubstanciam o devir das ex-colónias (hoje, países independentes que procuram legitimamente um lugar no contexto africano e no concerto das Nações) e de antiga potência administrante (hoje, um país que se pretende moderno, com uma democracia consolidada e que, legitimamente, aspira a um lugar igualmente digno no contexto europeu e no mundo)".
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Simbologia de Pindjiguiti na óptica libertária da Guiné-Bissau (Leopoldo Amado) - III (e última) Parte (*)

Reportando-nos agora ao Pindjiguiti enquanto tal, acontecimento ocorrido na sequência da greve dos trabalhadores do cais de Bissau (Pindjiguiti), a 3 de Agosto de 1959, não nos parece nem relevante, nem curial e nem sensato, atiçar uma estéril polémica acerca do número de trabalhadores mortos ou feridos.

Infelizmente, certamente porque nunca atribuí importância acrescida a questão do número de mortes, não fotocopiei e nem guardei as referências (cotas) de um ou dois relatórios circunstâncias feito então pela PSP que cheguei de manusear e ler nos Arquivos da PIDE/DGS, na Torre do Tombo. No entanto, da leitura desse relatório, fiquei com uma vaga ideia de que os números de mortos aí descritos roçam a casa dos vinte e poucos, não atingindo assim os 50 que tradicionalmente a historiografia oficial do PAIGC assinala. Porém, não se podendo negar a ninguém o interesse em apurar exactamente o número de mortos e feridos de Pindjiguiti, em que ficamos então? No quantitativo que nos é sugerido pela historiografia oficial do PAIGC, do brilhante depoimento de Mário Dias ou da suposição numérica que eu próprio introduzi?

Nos trilhos da procura da verdade, abstendo-nos sempre de emitir qualquer juízo de valor, convenhamo-nos de que persistem ainda questões pertinentes e legítimas a colocar, as quais, entre inúmeras outras plausíveis, podíamos assim tentar alinhavar:

(i) Mário Dias apenas refere-se ao quantitativo dos mortos contados localmente, não se referindo ou ignorando os que eventualmente vieram a morrer na sequência dos ferimentos registados?

(ii) Mário Dias refere-se aos mortos contabilizados na sua presença ou ao quantitativo aferido pela versão que lhe teria chegado ao conhecimento?

(iii) O quantitativo de mortos que alude a historiografia do PAIGC será um caso típico de propaganda?

(iv) Mesmo supondo que o relatório a que me refiro (a existente nos Arquivos da PIDE/DGS) situa, de facto, a ordem de grandezas na casa do vinte e poucos mortos, será que o(s) quantitativo(s) ali estampado(s) correspondem na realidade à verdade dos factos?

Como quer que seja, para lá da veracidade ou não desses números e sem iludirmos com a possibilidade imediatista de virmos a depararmo-nos de forma mágica com toda a verdade, importa sobretudo tomar as declarações dos contendores com cautelas redobradas, seja pela via da confrontação de entrevistas e depoimentos realizados ou a realizar (inclusive com o máximo de sobreviventes ainda vivos e testemunhos presenciais possíveis), seja pela via da prova de autenticidade heurística aplicada ao fenómeno, através de uma aturada investigação que privilegie a confrontação cruzada do teor da documentação disponível com o das entrevistas ou de testemunhos presenciais.

Acresce ainda, já o referimos, a necessidade de adoptarmos uma postura de humildade perante as naturais dúvidas metódicas que imensos aspectos e episódio relativos à guerra colonial versus guerra colonial suscitam, em virtude de ser um acontecimento recente que se reporta ao campo da chamada História imediata, que, por isso mesmo, ainda não criou, naturalmente, a necessária estandardização historiográfica susceptível de o conferir um maior grau de sistematização e visibilidade, aliás, razão porque nos seus meandros abundam “zonas cinzentas” cujo grau de verosimilhança ou de distorção, têm ou podem ter diversas e prováveis explicações que vão desde a necessidade de incrementar a investigação que melhore o estado actual dos conhecimentos sobre a matéria, simples desconhecimento metódico, motivações de natureza política, segredo e/ou interesse de Estado, razões de índole “propagandística” ou de deliberada falsificação, tout court.

Os poucos exemplos que a seguir daremos, muitos deles conhecidos do grande público, são ilustrativos do quanto se disse. Nos finais de 1970 em que aludia a 2600 baixas nas forças do PAIGC durante os anos de 1969 e 1970, assim repartidas:

1969 (1038)
Mortos......................614
Feridos.....................259
Capturados................165
Total......................1038

1970
Mortos......................895
Feridos.....................449
Capturados..................86
Desertores.................132
Total......................1562

Vê-se claramente que estas estatísticas obedeciam a outros desígnios de propaganda ou da guerra, pois de forma nenhuma podem corresponder a verdade dos factos, na medida em que um exér­cito de guerrilha em que o contingente máximo seria de 5000, tinha perdido, em dois anos de guerra, 2600 combatentes, sem que a luta tivesse diminuído de intensidade, antes pelo contrário. Isto não pre­cisa de comentários.

To­mando em conta os relatórios se­cretos do Estado-Maior português, as forças do PAIGC sofreram entre 1963 e 1966 as seguintes perdas, «entre outras perdas»:

1963
Mortos....................1497
Feridos.....................240
Capturados................287
Total..................... 2006

1964
Mortos.................1589
Feridos..................448
Capturados............1492
Total...................3592

1965
Mortos.................1153
Feridos..................397
Capturados............1761
Total...................3311

1966
Mortos................1125
Feridos.................256
Capturados............700
Total...................2081

Como não possuímos dados re­ferentes a 1967 e 1968, iremos con­siderar, para estes anos, a média dos anos anteriores. Assim, teríamos, para cada um deles:

Mortos ................1336
Feridos .................335
Capturados ...........1010
Total...................2681

O que totalizaria, compreen­dendo as pretensas perdas em 1969 e 1970, um total de 18.889 perdas entre os efectivos do PAIGC no decurso dos 8 anos de luta armada. Se considerarmos as ditas «outras perdas», podemos arredondar este número para 20 000.

Mesmo o observador mais distraí­do ou o menos favorável à causa da libertação por que o PAIGC dizia bater-se, con­cluirá que estes números são a melhor propaganda. Na realidade, numa guerra como que decorreu na Guiné entre 1963 e 1974, e nas con­dições concretas da Guiné, um movimento de libertação que tenha sofrido 20 000 perdas e que conti­nuava com sucesso o combate contra forças numérica e materialmente bem superiores, realizaria um feito singular, senão um milagre.

Na altura da publicação desses números de nada serviu uma entrevista do Governador Militar de Bissau à Televisão portuguesa, na qual afirmou: “No caso particular da Guiné, dos seus 550 mil habitantes, um número que não atinge os 80 000 abandonou o ter­ritório nacional ou encontra-se re­fugiado no mato».

Ora, sabe-se que, segundo os números apre­sentados pela ONU na altura, cerca de 60 mil habitantes da Guiné estavam refugiados, só no Senegal. E como 80 000 menos 60 000 é igual a 20 000, devemos concluir que, segundo os números oficiais dos balanços portugueses, secretos ou tornados públicos, eles teriam já matado, ferido ou capturado todas as pessoas que, na Guiné, esta­riam refugiadas na floresta.

Um outro exemplo que ilustra o quanto se disse, prende-se com a espectaculosidade com que os serviços de informação e propaganda do PAIGC (sem dúvida, de longe o melhor e com maior audiência africana e internacional de todos movimentos de libertação das ex-colónias portuguesas) reivindicou em Julho de 1970 o derrube de um helicóptero que transportava uma importante delegação parlamentar portuguesa na Guiné, quando, na verdade, o aparelho não teria resistido a um forte tornado que acabou por vitimar todos os seus ocupantes.

Aliás, bastaria uma varredura comparativa dos Comunicados de Guerra do PAIGC ou os relatórios escuta das emissões radiofundidas do PAIGC (existentes no Arquivo da PIDE/DGS) com os informes militares do Exército Português na Guiné (Intrep’s, Sitrep, Supintrep’s, etc.,) para darmos conta que a propaganda entre os contendores desencadeava frequentemente uma verdadeira atmosfera guerra de comunicados e que tanto de um lado como doutro, porque compreendiam justamente que a propaganda era uma importantíssima dimensão da guerra, faziam tudo para que os mesmos obedecessem a estratégias militares, mas igualmente a desígnios político-diplomáticos, para além da acção psicossocial.

De resto, esses comunicados tinham também um denominador comum: não raras vezes, eram elaborados com base numa torrente de factos cuja verosimilhança mantinha uma relação de base com o real acontecido, mas apenas como ponto de partida para a partir daí ampliar-se ou amputar-se de forma mitigada os desenvolvimentos ipso factu provenientes do teatro das operações, obviamente, com artifícios e/ou subterfúgios que reforçam a propensão de confundir desde o mais neutral, céptico ou atento observador.

Com efeito, à montante do ciclo fechado da guerra colonial versus guerra de libertação, não é mais possível obliterar-se o direito que assiste a todos de qualificar este ou aquele episódio como um embuste político ou militar ou uma monstruosa mentira, apesar de termos de reconhecer que, do ponto de vista estritamente da investigação histórica, ganhar-se-ia qualitativamente muito mais em procurar indagar as fontes disponíveis e tentar compreender e se possível interpretar as pretensas ou as aludidas distorções, oficiais ou oficiosas que sejam, ao invés de sobre elas se tecer juízos de valor que só aparentemente se nos apresentam como axiomas, quando frequentemente ressentem-se de uma assaz descontextualização factual, nas sua imbricadas conexões e bifurcações.

À distância dos anos da guerra, confidenciou-me um ex-elemento dos Serviços de Informação e Propaganda do PAIGC das circunstâncias em que foi mais ou menos redigido o Comunicado de Guerra que reivindicou para o PAIGC o derrube do helicóptero que então vitimou os deputados portugueses que nele viajavam. Com efeito, disse-me ele que quando abordou Amílcar Cabral, indagando-o se apenas devia no Comunicado noticiar a morte na Guiné de uma importante delegação parlamentar portuguesa, este respondeu-o: “Olha, a verdade é que, de facto, nada tivemos que ver com o sucedido, mas estamos em guerra. E em guerra, acontecimentos desses não caem do céu sem que dele tiremos os dividendos possíveis”.

Assim, pois, o PAIGC elaborou o Comunicado a que se deu a maior difusão internacional. Quanto a real dimensão do sucedido, não obstante os desmentidos vários das autoridades militares portuguesas, os mesmo não colheram provimento nos areópagos internacionais da altura, tanto mais que o PAIGC já tinha granjeado enorme prestígio em matéria de organização político-militar e contava já, no seu palmarés, inclusivamente, com o derrube confirmado de algumas importantes aeronaves da FAP (Força Aérea Portuguesa).

Mas voltemos ao Pindjiguiti, afinal, objecto principal do comentário que nos propusemos escrever, e que já vai longe, a propósito do texto de Mário Dias. Em primeiro lugar, ocorre-nos rebater a ideia redutora de que Pindjiguiti teria apenas sido uma mera reivindicação laboral cujos contornos escapou ao controle das autoridades que, em consequência, viram-se na obrigação e na contingência de usar da força. Se por um lado demostramos já que à jusante do processo libertário guineense Pindjiguiti circunscreve-se como um elo importante na cadeia de acontecimentos directa ou indirectamente a ele relacionados, pelo que não é e nem pode ser tomado como um acontecimento isolado, pontual ou circunstancial, por outro, ocorre questionar, como normalmente se faz em situações de tumultos, se na decorrência de Pindjiguiti teria havido, de facto, real necessidade de uso da força das armas por parte das autoridades coloniais? Por outras palavras, será que a resposta das autoridades coloniais teria sido proporcional à gravidade e a suposta violência gerada pelos grevistas?

Porém, se relativamente ao enquadramento histórico de Pindjiguiti nos posicionamos inequivocamente do lado da tese que aponta para a necessidade de sua contextualização histórica, já em relação as circunstâncias guindaram esta mera ou complexa contenda laboral que, estranhamente, apenas se saldou em mortos num dos lados da contenda, em lugar de aqui e acolá conjecturar com base em juízos de valor, preferimos por agora manter uma postura de dúvida metódica e aguardar serenamente que se faça mais luz sobre o estado actual dos conhecimentos sobre a problemática, se assim o podemos chamar, na media em que, muito para além das prováveis ou reais lacunas existentes na historiografia de um e outro lado, é iniludível do nosso lado a convicção segundo a qual Pindjiguiti representou e representa (com paralelismo português talvez similar ao alcance simbólico que engendrou o sequestro do “Santa Maria” por Henrique Galvão), com a toda a sua carga simbólica, um importante factor de consciencialização e um ponto de viragem decisivo no processo libertário da Guiné-Bissau.

Esta interpretação e esta percepção, independentemente da forma como foi depois objecto de tratamento por parte da historiografia oficial do PAIGC, teve-a avant la lettre Amílcar Cabral, com a clarividência e a capacidade peculiares de antever as situações que sempre o caracterizaram.

Quando a XVª Assembleia Geral das Nações Unidas, na sua reunião plenária de 14 de Dezembro de 1960, aprovou a resolução 1514, mediante a qual estabelecia os princípios para a concessão da independência aos territórios sob domínio colonial e proclamava solenemente “a necessidade de eliminar, rápida e incondicionalmente, o colonia­lismo em todas as suas formas e manifestações”, Amílcar Cabral e os nacionalistas das ex-colónias reunidos à sua volta (primeiro na CEI (Casa dos Estudantes do Império) e depois no Centro de Estudos Africanos e no MAC, convieram em 192 da necessidade de uma acção espectacular com vista a chamar à atenção da comunidade internacional sobre a situação das colónias portuguesas, particularmente os de África.

Nesse sentido, Amílcar Cabral e Mário de Andrade deslocaram-se várias vezes a Londres entre 1959 e 1960, pelo que datam dessa época as primeiras denúncias internacionais do colonialismo português, os quais foram sobretudo feitas pelo escritor e africanista britânico Basil Davidson, secundados também com conferências de imprensa que aqui e acolá Abel Djassi (pseudónimo de Amílcar Cabral) e Mário de Andrade foram dando em Londres e que acabaram por servir de antecâmara a grande conferência de imprensa que os nacionalistas das colónias portuguesas realizaram depois em Dezembro de 1960.

Assim, escolhida a cidade de Londres, por razões óbvias, obtido o apoio de certos círculos hostis ao colonialismo português e redigido em língua inglesa uma brochura que Amílcar Cabral intitulou Facts About Portugal's African Colonies, o caso que agora nos interessa, realizou-se uma concorrida conferência de imprensa apresentada por parte de cada um dos representantes das colónias portuguesas, versando todos eles sobre a situação das mesmas, dando ênfase ao massacres, (pelo PAI: Amílcar Cabral e Aristides Pereira, pelo MPLA: Mário de Andrade, Viriato da Cruz e Américo Boa Vida e pela Goa League: João Cabral) (29).

É nessa brochura da autoria Amílcar Cabral faz no plano internacional a primeira denúncia de Pindjiguiti, de resto, texto esse que apresentou como o primeiro relatório perante o Conselho especial da ONU em Junho de 1962 e a 12 de Dezembro de 1962, desta feita, quando prestou declarações perante a 4.ª Comissão da ONU.

Tratava-se, claro está, de conquistar a adesão, desavisada ou não, dos círculos londrinos e da comunidade internacional, pelo que não se difícil aferir-se ou excluir a hipótese de que a descrição desses massacres teriam sido ou não alvos de excessivo empolamento, tanto mais que no intróito do Facts About Portugal's African Colonies Amílcar Cabral foi incisivo ao espelhar os objectivos subjacentes: “ (...) é preciso conhecer e dar a conhecer os objectivos do inimigo para melhor o combater – tarefa que urge realizar não só junto dos militantes directamente engajados, como junto da opinião africana e internacional, ainda mal informada e muitas vezes iludida pela ideologia colonial portuguesa (...)”.

Porém, é importante referir-se que as denúncias internacionais de Pindjiguiti e que – catalisaram em medida considerável a sua interiorização e longevidade no imaginário colectivo guineense – foram posteriores ao “Memorandum” e “Nota ao Governo Português” endereçados por Amílcar Cabral ao Governo português, o que demonstra que desde cedo o PAI optou sempre por enquadrar e mesmo legitimar o seu substracto ideológico, pelo menos em termos de enunciado, identificando-a com os princípios da legalidade internacional, mormente com o postulado das Nações Unidas e dos Direitos Humanos.

No fundo, o objectivo que Amílcar Cabral perseguia perante o silêncio das autoridades coloniais portuguesas era a obtenção da legalidade e atmosfera internacionais propícias ao desencadeamento da guerra, segundo o postulado que ele próprio definiu como “supremo recurso”, e que acabou de certa maneira por se incorporar no Direito Internacional, ou seja, o direito de recurso a todos os meios possíveis, inclusivamente os violentos, para erradicar o colonialismo. Aliás, não foi por acaso que no dia 25 de Junho de 1962, foi atacado a vila de Catió (destruição da jangada de Bedanda e cortes de fios telefónicos e estradas com abatises), marcando-se do lado do PAIGC à passagem a acção armada, pois a luta armada em só começaria no ano seguinte como ataque ao quartel de Tite, a 23 de Janeiro de 1963.

Daí que, para além das denúncias de caracter económico, político ou humanitário, Amílcar Cabral tivesse também apelado no Facts About Portugal's African Colonies “(...)para todas as forças democráticas e progressistas do mundo, para os povos e para os Governos anti-colonialistas, para as organizações sindicais, da juventude, das mulheres e dos estudantes, para as organizações jurídicas internacionais e, em particular, para os Governos dos países africanos e asiáticos, para que um auxílio concreto e imediato seja concedido ao nosso povo em todos os planos, com vista à libertação dos patriotas presos e ao desenvolvimento da nossa luta de libertação nacional. (...)”. Em particular, renovava “ (...) o seu veemente apelo às Nações Unidas para que, em defesa do seu próprio prestígio aos olhos do mundo, se decidam a tomar, sem demora, medidas eficazes para acabar com os crimes dos colonialistas portugueses no nosso país e obrigar o Governo de Salazar a respeitar o direito do nosso povo à autodeterminação e à independência nacional. (...)”.

Ora, para lá do provável ou mesmo real empolamento de Pindjiguiti ou da justeza ou não das formas e conceitos, sempre discutíveis, sobre a forma como Pindjiguiti foi etiquetado (contenda laboral, massacre ou carnificina) ou ainda do quantitativo de mortes que se saldou na decorrência do acontecimento enquanto tal, temos para nós que o que se afigura importante é o reconhecimento da importância e o alcance históricos que o mesmo teve, à jusante e à montante da guerra colonial/guerra de libertação, no contexto do processo libertário do povo guineense.

Aliás, não foi por acaso que depois de Pindjiguiti o PAIGC logrou atingir uma assinalável mobilização que permitiu o desencadeamento da luta armada de libertação. Também, não foi por acaso que no decorrer da guerra colonial/ guerra de libertação, invariavelmente, o PAIGC normalmente assinalava a efeméride com ataques simultâneos a várias localidades, inclusivamente os centros urbanos, sobretudo a partir de 1968.

Não foi igualmente por acaso que em 1962, os vários partidos e movimentos de libertação que pululavam em Dakar e Conakry (mais contra o PAIGC do que contra o colonialismo português) decidiram criar a 3 de Agosto desse mesmo uma frente de luta, a FLING. Por fim, não também por acaso que Spínola, por ironia do destino, mas com objectivos claramente à vista, procedeu, no âmbito da sua política da “Guiné Melhor”, a 3 de Agosto de 1969, a uma espectacular libertação de cerca de uma centena de prisioneiros políticos, dos quais Rafael Barbosa, Ex-Presidente do PAIGC, bem como todos os que se encontravam na colónia penal de Tarrafal em Cabo Verde, e no Forte de Roçadas, em Angola, em pleno deserto de Moçamedes.

Para fechar este texto – que inicialmente apenas tinha o propósito de tecer um comentário em torno do texto de Mário Dias ­ –, mas que acabou por se alongar demasiadamente, pois comporta(va) a preocupação de subsidiariamente ir dando vazão ao repto lançado por Luís Graça no sentido de trazer à colação elementos disponíveis dos Arquivos. Como dizia, para fechar este texto, direi apenas que, mesmo não subscrevendo algumas ideias expressas por Mário Dias, as quais não obstante procurei rebater com a devida lisura e respectiva contra-argumentação de que me fui valendo, tanto na minha tese de doutoramento como em outras investigações, afirmo e reitero a importância de que se reveste o texto de Mário Dias, de resto, uma contribuição extraordinária para o actual estado do conhecimento sobre a matéria, na justa medida em que, muito para além da importância narrativa e historiográfica que encerra, voluntária ou involuntariamente, quebra o tabú de abordagem sobre um passado recente (a guerra colonial/guerra de libertação) com o qual, talvez por razões compreensíveis e atinentes a uma lenta e demorada catarse ainda não reconciliou com o mesmo os actores passivos dessa mesma guerra, mas também por se afigurar como mais um testemunho presencial, privilegiado, é certo, a juntar-se a muito poucos existentes (30).

Pese embora as normais diferenças de leitura do événementiel, fundado este último em distintas interpretações que se nos opõe relativamente a interpretação do mesmo sujeito histórico (o que é salutar), e ainda as naturais reservas que me suscitaram o importante testemunho presencial de Mário Dias (tanto mais que parte do mesmo reporta-se a uma situação de retransmissão do que lhe foi transmitido (a chamada e imprescindível Oral History tem dessas armadilhas) e porque também, estranhamente, não se referiu a presença no cais de Pindjiguiti, de soldados africanos Domingos Ramos (seu conhecido) e outros como o Constantino Teixeira, vulgo Tchutchú Axon – futuros comandantes da guerrilha do PAIGC (31), do meu lado não restam dúvidas relativamente a preocupações ou motivações que a ambos move – e nisso estamos conversados! –: alertar para a necessidade de uma cada vez maior necessidade de desmistificação e clarificação das naturais “zonas cinzentas” (as “meias-verdades ou mesmo “inverdades”, certamente existentes) que ainda conspurcam a novíssima abordagem histórica da guerra colonial/guerra de libertação, em ordem à reposição, tanto quanto possível, da(s) verdade(s) histórica(s) a que legitimamente todos aspiram e, a não menos importante constatação, no sentido em que ninguém é detentor de toda a verdade histórica sobre a guerra colonial/guerra de libertação e qualquer que ela(s) seja(m), não pode(m), pelo menos por agora, não pode pretender ser única e nem axiomática, tanto mais que, para lá da obrigação que temos de preservar e partilhar os legados da nossa História comum, é natural e compreensível que subsistam – porventura, subsistirão sempre, perspectivas interpretativas dissonantes, estas últimas, talvez decorrentes dos novos paradigmas que actualmente consubstanciam o devir das ex-colónias (hoje, países independentes que procuram legitimamente um lugar no contexto africano e no concerto das Nações) e de antiga potência administrante (hoje, um país que se pretende moderno, com uma democracia consolidada e que, legitimamente, aspira a um lugar igualmente digno no contexto europeu e no mundo).

Leopoldo Amado
Fevereiro de 2005
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Notas do autor:

(29) Marcelino dos Santos estava no grupo mas não participou

(30) Ocorrem-me presentemente apenas os testemunhos presenciais de Upadai Gomes, ex-marinheiro sobrevivente de Pindjiguiti, entretanto já falecido, e de Carlos Correia, ex-Primeiro-Ministro da Guiné-Bissau, que presenciou os acontecimentos a partir das imediações e cercanias do cais de Pindjiguiti) os quais, salvo o erro, foram publicados, há pelo menos dez ou mais anos, no Jornal “Nô Pintcha”, em jeito de evocação histórica da efeméride (3 de Agosto é feriado nacional na Guiné-Bissau

(31) Entrevista de Rafael Barbosa a Leopoldo Amado.
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Notas de CV:

(*) Vd. postes de:

3 de Agosto de 2010 > Guiné 63/74 - P6821: Efemérides (46): Acontecimentos de 3 de Agosto de 1959 no cais do Pindjiguiti, Bissau (1) (Leopoldo Amado)
e
4 de Agosto de 2010 > Guiné 63/74 - P6826: Efemérides (47): Acontecimentos de 3 de Agosto de 1959 no cais do Pindjiguiti, Bissau (2) (Leopoldo Amado)

E ainda postes de:

15 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXXXV: Pidjiguiti, 3 de Agosto de 1959: eu estive lá (Mário Dias)

18 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DLVII: Antologia (36): o massacre do Pidjiguiti (Luís Cabral)

21 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DLXXIII: Pidjiguiti: comentando a versão do Luís Cabral (Mário Dias)

26 de Fevereiro de 2006 >Guiné 63/74 - DLXXXIX: Pidjiguiti: resposta do Mário Dias ao Leopoldo Amado

2 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4452: Controvérsias (15): O 'massacre do Pidjiguiti', em 3 de Agosto de 1959: o testemunho de Mário Dias

27 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6793: Notas de leitura (136): Invenção e Construção da Guiné-Bissau, de António Duarte Silva (2) (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P6828: Memórias de um Combatente da Liberdade da Pátria, Carlos Domingos Gomes, Cadogo Pai (3): Estabelecido por conta própria em 1955



Continuação da publicação das memórias de Cadogo Pai (*)... O documento, de 26 páginas, tem por título: Memória de Carlos Domingos Gomes, Combatente da Liberdade da Pátria: Registos da História da Mobilização e Luta da Libertação Nacional. Recordar Guiledje, Simposium Internacional, Bissau, 1 a 7 de Março de 2008.

Excertos da 1ª Parte, Pág. 7-9 


"17. Foi a fase em que surgiu Amílcar Cabral, [em 1952, o qual ] jogou um papel importante, inteligente, em que organizou a sociedade, fazendo serenar os ânimos [exaltados devidos às ] rivalidades, e levando os adeptos a uma camaradagem que se impunha, e a um convívio em paz. E unidos, no sentido de organizar o combate ao único inimigo da Pátria, o nefasto colonialismo.

“Amílcar organizou os contactos, restritos. Para defesa da confidencialidade necessária”: Elisée Turpin, Inácio Semedo, Fernando Fortes, Luís Cabral, Aristides Pereira, Epifânio Soto Amado, Júlio Almeida, guarda-redes da UDIB, etc.

"18. Os colonialistas, em vez de corrigirem, incentivaram mais os motivos das rivalidades e dos reparos dos guineenses: Liceus em Cabo-Verde, bons empregos, salários desiguais, etc.

"19. Vinha de Bolama, as reuniões eram no quarto de Elisée Turpin, [,em Bissau,] que ficava situado atrás do salão onde se pratica hoje o judo. Vinham conhecidos dele do Senegal e os encontros eram ali e também na messe do B.N. U. [, Banco Nacional Ultramarino,] com os cabo-verdianos, empregados do B.N.U. que passaram a dar uma contribuição válida, Lima Barber, Júlio Simas, Eanes, Cézar, Lomba Nascimento, etc., sendo os últimos de S. Tomé.

“Após as reuniões, o camarada Luís Cabral, invariavelmente, mantinha-s eno passeio do B.N.U,, a passear. Ao chegarmos à esquina da empresa francesa NOSOCO (hoje Henrique Rosa), o Elisée dizia-nos:
- Um momento, para eu dar uma fala ao Luís Cabral.  

"Mas nunca dizia o que ia tratar com ele"... 









Cópia da 1ª Parte, pág. 8 (em cima)... Transcrição da página 9 (a seguir):

"razão do meu constrangimento e propôs-me uma transferência para Paris, dada a confiança que ganhei em toda a organização, a exemplo de muitos colegas que foram transferidos na altura para Ziguincgor, Dakar, etc. 

"Avisou-me que o vento da Independência iniciada nos países vizinhos (Conakry, Senegal, etc.) chegaria à Guiné-Bissau e aconselhou-me que, se ficasse na Guiné, iria passar mal, como passei.

"Após esta reunião, decidi adiar a minha decisão, era altura da campanha, mas com o constrangimento a que éramos obrigados nas compras dos produtos, voltei à carga com a decisão. Foi assim que me estabeleci por conta própria a 5 de Setembro de 1955.

"Fim da 1ª Parte".

[ Revisão / fixação  de texto/ excertos / digitalizações / título: L.G.]

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Nota de L.G.:

 (*) Vd. postes anteriores da série:


2 de Agosto de 2010 > 
Guiné 63/74 - P6815: Memórias de um Combatente da Liberdade da Pátria, Carlos Domingos Gomes, Cadogo Pai (2): A elite guineense nos anos 50


quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Guiné 63/74 - P6827: (Ex)citações (87): O direito de um velho colon a ter um ponto de vista um tanto reaccionário (António Rosinha)

1. Comentário de 29 de Julho último, assinado por António Rosinha [, foto à esquerda,  em Pombal, 2007, de L.G.], ao poste P6802:

 Beja Santos, esta tua capacidade e força para publicares e analisares tudo o que se escreve sobre a Guiné, enriquece imenso este blogue. Com a vantagem de deixar campo para cada leitor fazer a própria análise.

E, no caso deste livro, que não dá muitas novidades mais que outras leituras, é aquela dúvida se seria exactamente o PAIGC de Amílcar e Luís Cabral, que os guineenses queriam.

Atenção,  que eu assisti ao 14 de Novembro de 1980, em que Vasco Cabral (não era da família),também foi baleado à porta de casa por «uma bala perdida».

E o facto de alguns guineenses ficarem satisfeitos com a nova constituição, o povo em geral também não teve opinião. Porque aquilo não foi mais do que um tiro no próprio pé do PAIGC.

Será que a grande preocupação do povo seria mesmo uma nova "constituição"? É que aqueles que se diziam membros do PAIGC apregoavam que o golpe nos «bormelhos» foi justo, porque tanto a distribuição dos lugares bons, assim como a distribuição dos automóveis, tinha ido parar às «mãos erradas».

Era um bom motivo para um golpe de estado, visto do PAIGC;  do PAICV, nunca li grandes comentários.

Mário e Luís, o facto de eu ser um velho «colon»,  também tenho direito a analisar de um ponto de vista um tanto reaccionário.

Faço votos que a democracia imposta pelos FMI, ONU, Banco Mundial, e Igreja, e umas tantas ONG, substitua um dia a droga e a corrupção, e fixe os guineenses mais preparados na sua terra. Caso contrário, com o tempo desaparece a nossa velha Guiné.

2. Outro comentário (ao poste P6807) do camarada do nosso querido amigo António Rosinha, a quem desejamos saúde  e longa vida:

Luís Graça, deve ser interessantíssimo publicar na íntegra as memórias do Cadogo Pai, que provavelmente vai permitir, simultaneamente,  ficarmos com uma ideia sobre Cadogo Filho, 1º ministro e talvez o maior empresário guineense pós-independência.

Se o pai não seria histórico do PAIGC?

Podia não ser, mas Luís, nos anos 50,  todos os guineenses letrados, chamemos-lhe assim, (não indígenas), tipo Luís Cabral, da Casa Gouveia, dos Correios,  tipo Aristides, ou o Cadogo, de uma casa comercial, todos eram nacionalistas.

Tanto do PAIGC em Bissau, como do MPLA e outros de Angola, todos eram nacionalistas.  Antes de Março de 1961, não se preocupavam muito em esconder o que pensavam e até o manifestavam entre amigos e colegas metropolitanos.

O que confundia muitos, era essa ligação política ao comunismo, e veio a ver-se,  depois de Março de 1961, as ligações aos americanos através das missões evangelistas em Angola.

Daí haver milhares que, sendo nacionalistas, nunca aderirem aos movimentos. Daí  também se contarem pelos dedos os pouquíssimos dirigentes (letrados) do MPLA e do PAIGC.

É que,  quando lemos tudo o que há escrito sobre os movimentos, principalmente do PAIGC, que secou os outros em volta, são sempre um pequeno grupo.

No entanto todos eram nacionalistas, desde os que foram Cabos, Furriéis e Alferes do nosso exército,  lado a lado connosco, como os que foram colegas de trabalho.

O Cadogo, incompreensivelmente aos olhos de um tuga, tinha sucesso como empresário, em plena implantação do comunismo mais ortodoxo em Bissau de Luis Cabral.

Cumprimentos.
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Nota de L.G.:

Guiné 63/74 - P6826: Efemérides (49): Acontecimentos de 3 de Agosto de 1959 no cais do Pindjiguiti, Bissau (2) (Leopoldo Amado)

Os graves acontecimentos do Pindjiguiti em 3 de Agosto de 1959 

II parte do texto do Leopoldo Amado, historiador guineense e membro da nossa tertúlia (publicado igualmente no blogue Lamparam II, em post de 21 de Fevereiro de 2006):

Simbologia de Pindjiguiti na óptica libertária da Guiné-Bissau (Leopoldo Amado) - II Parte (*)

A independência do Gana (1957) e as perspectivas da independência da Guiné Conakry e do Senegal (1958 e 1959) rapidamente transformaram a predisposição latente de luta pela independência dos guineenses num entusiasmo difuso, alimentado pela expectativa imediatista duma iminente libertação pacífica da Guiné, à semelhança do que ocorrera com os territórios africanos vizinhos.

Coincidentemente, e sob o impulso de elementos directamente doutrinados por Amílcar Cabral, registou-se em 1957 uma primeira grande greve dos trabalhadores no cais de Pindjiguiti em Bissau (12), apesar de que é a independência da República da Guiné que iria doravante funcionar como o ponto de partida e o leitmotiv para um amplo movimento para a independência.

Chega-se assim aos inícios da década de 50 do século XX com um nacionalismo guineense já mais amadurecido, pois, nesse período, para além de toda a carga histórica e cultural que comportou a resistência à ocupação colonial, este nacionalismo começou a ser directa ou indirectamente influenciada pela evolução política no Senegal e na Guiné Conakry, apesar de que as organizações surgidas na altura terem um carácter incipiente, reflectindo todos eles um certo idealismo.

O primeiro das organizações políticas a aparecer foi o MING (Movimento Nacional para a Independência da Guiné). Todavia, António E. Duarte Silva (13) atribui a paternidade da fundação do MING, em 1955, a José Francisco Gomes ("Maneta") e Luís da Silva ("Tchalumbé"), não obstante saber-se que o MING tinha por detrás a mão de Amílcar Cabral, não teve propriamente acções conhecidas e nem grande projecção.

Segui-se-lhe o PAI (Partido Africano para a Independência, fundado em 1956 por Amílcar Cabral (e que só se transformaria em 1962 em PAIGC), apesar deste Partido ter sido forçado a experimentar um período de profunda hibernação (1956-1959), dado que o Governador Peixoto Correia, depois de devidamente informado sobre as actividades de Amílcar Cabral, proibiu-o de estabelecer residência na Guiné, transferindo-o compulsivamente para Angola.

Portanto, é nesse hiato em que as actividades do PAI quase desaparecem, que é fundado o MLG (Movimento para Independência da Guiné), um movimento que integra sobretudo os guineenses, nomeadamente os dignatários com que Cabral havia começado a trabalhar desde 1952 e que, entretanto, assumem a liderança desse movimento.

João Rosa, um dos líderes históricos do MLG lembra (segundo o seu auto de interrogatório na PIDE datado de 1962) de ter integrado este movimento a convite de José Francisco Gomes e de ter participado na primeira reunião do MLG em princípios de 1958, na qual estiveram igualmente César Fernandes, Ladislau Lopes, este último mobilizado por Rafael Barbosa, elemento que viria a revelar a grande veia mobilizadora, chegando mesmo a protagonizar em entre 1959 e 1959 uma rotura que praticamente definhou a estrutura residual do MLG em Bissau, apesar de que em jeito de révanche e antecipação ao PAI, sempre ia desenvolvendo uma ou outra acção clandestina com o objectivo de demarcar-se publicamente do PAI, à semelhança do correio que enviou a todas as repartições públicas no dia 8 de Fevereiro de 1960, de um “Comunicado do Movimento de Libertação”, de resto, em tudo semelhante a “Representação” que o Lacerda produziu a pedido de César Mário Fernandes e José Francisco Gomes (assinada por várias pessoas) ao Presidente da República de Portugal em 1955, aquando da visita deste à Guiné.

Eram ainda da nata fundadora do MLG indivíduos tais como Tomás Cabral de Almada, Paulo Lomba Aquino Pereira e José Ferreira de Lacerda, o patriarca do MLG e líder consensual deste movimento, tido desde 1948 como o líder do Partido Socialista (14), que só não participou no acto da fundação do MLG porque à data da sua consumação encontrava-se em Lisboa, no gozo da licença graciosa na qualidade de funcionário administrativo, tanto mais que segundo palavras de Elisée Turpin, "(...) logo após a Segunda Guerra Mundial, uma organização que tinha como cérebro principal o guineense José Ferreira de Lacerda, funcionário público em Bolama, o qual liderava um movimento que de alguma forma tinha influência no Conselho do Governo colonial, chegando quase a ganhar uma eleição para o provimento desse órgão, quando foi abafado e reprimido pelas autoridades coloniais (...)(15)”.

Outra peça documental imprescindível para se compreender e enquadrar as acções do MLG, pelo menos do período que se estende de 1958 ao Pindjiguiti, são os clarividentes autos de interrogatório (16) da PIDE a Isidoro Ramos (ainda vivo). Aí ele é taxativo ao lembrar-se de, em princípios de 1958, ter visto um grupo de indivíduos em frente a Farmácia Lisboa que o abordarem sobre questões relativas a independência, aliás, reunião essa em que também se encontravam Ladislau Justado Lopes (enfermeiro), Epifânio Souto Amado (empregado de farmácia), César Mário Fernandes (empregado do trafego do cais de Pindjiguiti), Rafael Barbosa ( “ O Coxo”, ou “Patrício”, oleiro da construção civil), José de Barros (guarda-fios dos CTT).

Nos autos de interrogatório de Isidoro Ramos, este lembra de, uns dias mais tarde, ter sido abordado por Ladislau Justado Lopes que o informou de que iriam formar um Movimento de Libertação e que estavam a ver que pessoas é que podiam ser admitidas, pelo que imediatamente anuiu ao convite no sentido de integrar o Movimento de Libertação, após ter sido informado pelo seu interlocutor de que Fernando Fortes (funcionário da estação postal dos CTT) e Aristides Pereira (telegrafista dos CTT) também faziam parte desse grupo.

Aliás, salvo raras excepções, de 1958 a 1961, numa amálgama inextricável, alguns destacados dirigentes do MLG e do PAI, indistintamente, partilharam, voluntária ou involuntariamente o mesmo espaço político (17) coincidindo essa fase com o período em que ainda se acreditava ser possível, a breve trecho, sobretudo da parte do MLG, o início do processo que havia de conduzir a Guiné "dita portuguesa" à independência.

Na verdade, a criação em Bissau, em 1958, do MLG (Movimento de Libertação da Guiné), a par das perseguições das autoridades coloniais, constituiu-se no mais sério problema para os propósitos unitários que Amílcar Cabral postulava na luta contra o colonialismo português na Guiné. O MLG, que desenvolvia acções numa perspectiva política pouco elaborada, cedo hostilizou Amílcar Cabral, a quem alcunhou pejorativamente de "caboverdiano".

Este movimento acusava os caboverdianos de terem ajudado os portugueses na dominação colonial da Guiné e, perante a iminência de independência, pretenderem substituir os colonialistas. A miragem de uma independência prestes a concretizar-se, à semelhança do que ocorreu nas colónias francesas da Guiné "dita francesa" e do Senegal, precipitou nas hostes do MLG a tendência para a organização de um movimento que procurasse congregar no seu seio alguns poucos guineenses ilustres, dando assim primazia a necessidade de sublimação das inquietações mais personalizadas que colectivas, relegando para um plano secundário a preparação para a luta armada e a estruturação do movimento em termos populares.

O ambiente de luta pela independência, levou a que os nacionalistas guineenses e caboverdianos de Bissau se posicionassem a favor do candidato da oposição, Humberto Delgado, nas eleições presidenciais de 1958 que opuserem este a Américo Tomás. Conta Aristides Pereira que “(...)eu, o Fortes e outros patriotas organizámos as coisas de maneira a dominar a situação e fizemos um trabalho subterrâneo de forma a que chegasse às pessoas o que quiséssemos, por exemplo, as listas de voto de Humberto Delgado. Foi assim que a administração ficou perplexa quando apareceram em todos os círculos votos a favor do mesmo. Mas apesar de haver muito boa vontade da nossa parte, havia também muita falta de experiência. Porém, as nossas acções só começaram a ter alguma expressão prática depois da passagem do Amílcar na Guiné. Antes eram apenas ideias (18)".

Como quer que seja, é dado adquirido que o PAI, enquanto tal, até pelo hiato referido que caracterizou a sua quase inacção entre 1956 e 1959, não teve, pelo menos directamente, uma acção ou influência decisivas nas acções que viriam a desembocar em Pindjiguiti. Diferentemente do PAI, a mesma asserção já não pode aferir-se relativamente ao MLG que teve, de facto, uma assinalável e directa participação directa nos acontecimentos. Efectivamente, activistas do MLG tais como César Mário Fernandes (empregado do tráfego do cais de Pindjiguiti), Paulo Gomes Fernandes e José Francisco Gomes tinham-se há muito empenhado em acções de discreta mobilização e consciencialização política dos trabalhadores portuários em geral e dos marinheiros e estivadores do cais de Pindjiguiti em particular (19).

Com feito, Amílcar Cabral só regressaria a Guiné em Setembro de 1959 (14 a 21 de Setembro), isto é, um mês após Pindjiguiti, mas não antes sem ter feito um verdadeiro périplo aos países africanos recém independentes (Congo Kinshasa, Gana, Libéria, etc.) junto dos quais começou discretamente a procurar apoio político e material para a luta de libertação nacional. Assim, a reivindicação a posteriori da paternidade de Pindjiguiti por parte do PAI(GC) só se pode compreender na medida em que o MLG como o PAIGC partilhavam indistintamente o mesmo espaço político, a mesma clientela, chegando mesmo muitos membros do PAI a serem concomitantemente do PAI e vice-versa, de resto, tendência essa que em certa medida se acentua mesmo depois de consumada a rotura, sobretudo a partir do momento em que, a partir de Conakry e Dakar, Amílcar Cabral passou a produzir e a expedir para Bissau inúmeros panfletos que, à cautela, omitiam de propósito quer a sigla do PAI como a do MLG, para apenas se referir ao Movimento de Libertação da Guiné e Cabo-Verde, os quais, de resto, eram clandestinamente distribuídos em Bissau por elementos de filiação dupla (20), particularmente os que, não renegando o MLG, de alguma maneira permaneceram no PAI sob a influência de Rafael Barbosa, mesmo após a cisão.

Curiosamente, a PIDE conseguiu tardiamente reconstituir, através da sua rede informadores em África, todos os passos de Amílcar Cabral neste périplo (itinerário, autoridades contactadas, assuntos versados, etc.), na medida em que tal reconstituição só se concluiu quando Amílcar Cabral tinha já tinha saído de Bissau, onde, numa estada de cerca de uma semana (14 a 21 de Setembro de 1959), informou os correligionários que iria instalar a Sede do exterior do PAI em Conakry, a qual, doravante, se articularia com a Sede do PAI do interior, que acabou clandestinamente por ser instalada pouco depois numa palhota em Bissalanca (21).

Na sua meteórica passagem por Bissau, Amílcar Cabral acordou com os seus principais colaboradores, na altura Aristides Pereira, Luís Cabral, Fernando Fortes, Rafael Barbosa (22) e João da Silva Rosa em como largaria tudo e seguiria para a República da Guiné (Conakry) de onde enviaria directrizes. Efectivamente, a decisão de Amílcar Cabral de escolher um poiso de apoio na Guiné-Conakry foi devidamente sustentada com o exemplo de Pindjiguiti, pois que para ele era a prova iniludível da natureza permanentemente violenta do sistema colonial que, sintomaticamente, tinha maior força nos centros urbanos, donde a razão porque era preciso proceder a uma extensa e meticulosa preparação para a guerra de libertação e a mobilização dos camponeses para responder com violência à violência colonial.

É essa linha de raciocínio esse que presidiu ao envio, a 15 de Novembro de 1960, de um Memorandum a que Salazar nem sequer se dignou responder e que propunha uma série de medidas, “para a liquidação pacifica da dominação colonial "(23), secundando-o também, na mesma lógica, a “Nota Aberta ao Governo Português”, na qual, em jeito de “’ultima tentativa “para a liquidação pacifica da dominação colonial" (24), reitera o teor do Memorandum de Novembro de 1960.

No entanto, em Bissau, consumada que foi a rotura entre o PAI e o MLG, este último Movimento de Libertação quase que desapareceu, vindo todavia a ressurgir-se das cinzas no além fronteiras, a saber, em Dakar, Ziguinchor e Conakry, sobretudo a partir do momento em que um número relativamente considerável de nacionalistas guineenses tiveram que acorrer a essas países recém independentes, seja na qualidade de emigrantes económicos, seja para darem continuidade as acções políticas, ou motivados conjuntamente pelos dois factores, sobretudo após Pindjiguiti e a subsequente grande vaga de repressão que em Abril de 1961 foram efectuadas pela PIDE, seguindo-se-lhe uma outra, igualmente da responsabilidade da PIDE, ocorrida em Fevereiro de 1962 (25). Nestas correntes de emigração, divisam-se motivações que se reportavam a certo sentimento de concorrência em relação ao PAI, mas também era possível descortinar nelas um certo frenesim alimentado pela ideia imediatista da independência.

Foi o caso, por exemplo, dos enfermeiros que fugiram para a Guiné Conakry desde 1959 e que todos a trabalhavam todos no Hospital “Ballay” como, Paulo Dias (que veio posteriormente a ascender ao cargo de Presidente da FLING-COMBATENTE, uma das facções dissidentes da FLING (Frente de Libertação para independência Nacional da Guiné, surgida em Dakar a 3 de Agosto de 1962), João Fernandes (26) e Inácio Silva (27), Fernando Laudelino Gomes (28), sendo este último o locutor principal de um programa emitido semanalmente a partir da rádio Conakry, o qual era basicamente alimentado pelas notícias que basicamente denunciavam as reais ou pretensas atrocidades do colonialismo e que eram alimentadas sobretudo pelas notícias que César Mário Fernandes e Rafael Barbosa enviavam clandestinamente para Laudelino Gomes.

No Senegal, o MLG enraizou-se sobretudo entre os inúmeros refugiados guineenses ali instalados, calculados em cerca de 60.000 pessoas. Dakar acolheu ainda outras organizações tal como a UPG (União Popular para a Libertação da Guiné), a UPCG (União Popular para a Libertação da Guiné) o Rassemblement Democratique Africain de La Guiné (RDAG) que desde 1956 fez propaganda no sul da Guiné, em especial na área de Cacine e a UNGP (União dos Naturais da Guiné-Portuguesa), enquanto que em Conakry o médico e nacionalista angolano-santomense, Hugo Azancot de Menezes, propositadamente expedido para Conakry no quadro do Centro de Estudos Africanos (uma dissidência protagonizada no seio da Casa dos Estudantes do Império essencialmente por Amílcar Cabral, guineense-caboverdiano, Mário de Andrade, angolano e Francisco José Tenreiro, santomense) e do MAC (Movimento Anti-Colonial), passou a enquadrar embrionariamente os guineenses nacionalistas ali emigrados através do Mouvement pour l’indépendance des Territoires sous la domination portugaise.

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Notas do autor:

(12) Os registos desta greve cuja cópia não possuo ou não encontro de momento, mas que cheguei de manusear e ler, encontram-se nos arquivos da PIDE/DGS, na Torre do Tombo. O mesmo se dirá dos registos da PIDE sobre Pindjiguiti.

(13) Duarte, António E., A independência da Guiné-Bissau a descolonização portuguesa, Edições afrontamento, 1977, p. 32

(14) Entrevista de Rafael Barbosa a Leopoldo Amado.

(15) Entrevista de Elisée Turpin a Leopoldo Amado em Bissau.

(16) no seu auto de interrogatório do dia 10.3.1961

(17) Cf. Cabral, Amílcar, Evolução e Perspectivas da Luta, p. 12. Igualmente, nos processos da extinta PIDE, agora abertos à investigação do grande público em Portugal, é possível deduzir a asserção referida.

(18) Entrevista de Aristides Pereira, ex-Secretário-Geral do PAIGC a Leopoldo Amado.

(19) Entrevista de Paulo Gomes Fernandes a Leopoldo Amado.

(20) Eram, por exemplo, os casos de Alfredo Menezes D’ Alva, Epifânio Souto Amado ou um Fernando Fortes, entre tantos outros.

(21) O estabelecimento da sede do PAI em Bissalanca data de 1959, tendo funcionado até Fevereiro de 1962, altura em que foi detectada e tomada de assalto pela PIDE com a ajuda de elementos do Exército português, tendo aí sido presos Rafael Barbosa, Momo Turé, Paulo Pereira de Jesus e outros elementos proeminentes do PAI surpreendidos em pleno sono. Com a sede do PAIGC tomada de assalto pela PIDE e preso Rafael Barbosa, seu principal animador, foi desmantelada a rede clandestina do PAIGC em Bissau. A alguns nacionalistas foram fixadas residência em Chão Bom, Tarrafal, excepto Rafael Barbosa que a troco de "colaboração", foi-lhe fixada a obrigatoriedade de se apresentar todos os dias na sede da PIDE em Bissau. Foi apreendido na sede do PAIGC imenso material de propaganda que incluía inúmeros panfletos, correspondências de Amílcar Cabral, para além de armas.

(22) Rafael Barbosa foi acusado em reunião do MLG de ter escondido Cabral aquando da passagem deste último em Bissau, pois tinha anunciado numa reunião anterior deste Movimento a intenção de Amílcar Cabral em reunir com os dirigentes do MLG. Como à cautela Amílcar Cabral rodeou-se de todos os cuidados e apenas se encontrou com Luís Cabral Rafael Barbosa e Fernando Fortes, o facto reforçou as desconfianças nas hostes do MLG sobre as reais intenções de Amílcar Cabral e do PAI.

(23) Andrade, Mário, Obras Escolhidas de Amílcar Cabral – A prática revolucionária (Unidade e luta II), Vol. II, Comité Executivo de Luta do PAIGC, Seara Nova, 1977, pp. 27 à 31.

(24) Ibidem, p. 33-34.

(25) Em Maio de 1962, o PAIGC difundiu largamente um comunicado em que reclamava a libertação dos presos em Bissau, Cadique, Bedanda, Cafal, Cufar, Cantone, Catió, Cotumba, Cafine, Cassumba, Fulacunda, Empada, Tite e nas Ilhas de Bubaque, Canhabaque, Sogá, Caravela e Formosa. Era o período em que quer a mobilização do PAIGC como a consequente repressão dos agentes de mobilização (que apareciam armados de pistolas em diversas tabancas) ia no auge.

(26) Estudou com uma bolsa do Mouvement pour l’ independece des Territoires sous la domination portugaise. Regressou da URSS em 1967 e esteve em Dakar cerca de dois meses antes de partir para Bamako (Mali), onde foi assinalado pela PIDE, em 1970, quando ali exercia como médico cirurgião Bamako, Mali.

(27) Em 1970, encontrava-se em Dakar, segundo uma nota da PIDE.

(28) Em 1964, encontrava-se com problemas psíquicos em Dakar, pelo que a sua mãe foi buscá-lo a Dakar e levou-o a Bissau. Já em Bissau, foi preso pela PIDE em 1966 e acusado de ser o locutor principal que emitia notícias de incitação à revolta a partir da rádio Conakry.
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Nota de CV:

Vd. poste de 3 de Agosto de 2010 > Guiné 63/74 - P6821: Efemérides (46): Acontecimentos de 3 de Agosto de 1959 no cais do Pindjiguiti, Bissau (1) (Leopoldo Amado)

Guiné 63/74 - P6825: Controvérsias (101): Puros e Espúrios 2 (Mário Gualter Rodrigues Pinto)


1. O nosso Camarada Mário Gualter Rodrigues Pinto, ex-Fur Mil At Art da CART 2519 - "Os Morcegos de Mampatá" (Buba, Aldeia Formosa e Mampatá - 1969/71), enviou-nos a seguinte mensagem, em 3 de Agosto de 2010:

Camaradas,

Hoje continuo a abordar uma matéria sensível que, como disse no poste anterior - P6728 -, é a velha polémica entre Oficiais do QP, que não queriam ser confundidos com os Oficiais do QC (Milicianos), tendo mesmo sido publicado um decreto-lei que deu origem aos:

PUROS E ESPÚRIOS 2
Como é do conhecimento dos camaradas do blogue e de quem nos lê, camaradas ou não, surgiu uma controversa sobre quem comandou as Unidades de Combate, nos últimos e mais gravosos anos da Guerra de África,
Oficiais do QP/Milicianos.

O assunto pode nem ser relevante, do ponto de vista militar, mas, será seguramente importante para nos avaliarmos enquanto povo, que já deu e quer dar, ao mundo, lições de bom comportamento moral e social.

Para uma apreciação fidedigna, sigamos uma metodologia adequada, ou seja:

1.º - Dados

No passado dia 13 de Julho de 2010, publicou o nosso blogue um trabalho meu.

Este trabalho consistia na publicação de uma “Exposição sobre o D. L. n.º 353/73 assinada por vários Capitães e datada de Bissau, 28 de Agosto de 1973”.

2.º Análise

Para se analisar, com objectividade a questão QP/Milicianos, há que saber que Unidades Operacionais Comandavam, todos e cada um destes Capitães (que assinaram a exposição), e qual era o Aquartelamento onde estava situada a sede dessa mesma Unidade.

É evidente que esta resposta deve ser dada pelo Oficial que contesta as conclusões da Tese de Doutoramento do Camarada Manuel Rebocho e, obviamente, publicada no nosso blogue.

Naturalmente, e como se sabe e observa, não nos importa saber “mobilizações; colocações; acções; posições e todos os ões que se entendam ou possam entender: o que está em causa são os Comandos Operacionais que exerciam, naquele dia, e não noutro.

Compreende-se, com naturalidade, que uma análise requer um acto; um espaço; um tempo; não uma miscelânea de conveniência. Assim:
O acto -------------------- É o comando que exerciam;
O Espaço ---------------- É a Guiné;
O tempo ----------------- É o dia 28 de Agosto de 1973.

Tudo o que sejam respostas para entreter, seguem directamente para o seu arquivo lógico: o caixote dos papéis.

Nesta pergunta não se enquadram os Capitães Pára-Quedistas, pois esses eram efectivamente operacionais, como o afirma e reconhece o Camarada Rebocho, na sua Tese. Logo, se está esclarecido, mais nada pode esclarecer. Desde logo, qualquer comentário que envolva estes Oficiais, tem o seu arquivo definido...

3.º Análise

A análise, como se compreende, só poderá ser efectuada depois da resposta à questão ora colocada.

Um abraço,
Mário Pinto
Fur Mil At Art da CART 2519

Emblema de colecção: © Carlos Coutinho (2009). Direitos reservados.
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Nota de M.R.:

Vd. também sobre esta matéria, do mesmo autor, o poste de:

13 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6728: Controvérsias (94): Puros e Espúrios (Mário Gualter Rodrigues Pinto)

Vd. último poste desta série em:

30 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6809: Controvérsias (100): O que é que o País pode dar aos ex-combatentes? (José Brás)

Guiné 63/74 - P6824: Memórias boas da minha guerra (José Ferreira da Silva) (5): Morteiradas em Canquelifá

1. Mensagem do nosso camarada José Ferreira da Silva (ex-Fur Mil Op Esp da CART 1689/BART 1913, , Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69), com data de 25 de Julho de 2010:

Olá Camaradas
Aí vai mais uma história verídica, tal como as anteriores, sobre as "Memórias boas da minha guerra".

Junto foto de mais uma brincadeira do nosso grupo.
A continuação de Boas Férias para todos

Com um abraço do
Silva da Cart 1689



Todos os dias 26 de cada mês havia festa. Era uma forma de se assinalar mais um mês de degredo. Desta vez, em Canquelifá, junto à messe, festejava-se o 17.º com um "Casamento". E para a nossa história lá vão os nomes: da esquerda para a direita: engravatado, de bigode, Miranda (o padrinho), Valente (o irmão da noiva), Berguinhas (a noiva), Matos (o noivo), Vagomestre (a madrinha), Machado (o padre), Borges (o sacristão), Fachina Guisande (o moço da agua-benta), Fachina Canedo (o curioso, em tronco nu) e Escriturário Cunha (o curioso, também em tronco nú. Em baixo, pela mesma ordem: - Bonifácio (o convidado), Massamá (o menino das alianças) e Cepa (o reporter).



Memórias boas da minha guerra (5)

“Morteiradas” em Canquelifá


- Moniz, levanta-te que já é tarde. – dizia-lhe eu, enquanto me penteava frente a um minúsculo espelho pendurado ao lado de uma pequena janela do nosso quarto.

Dali se via o largo da parada bem como a esplanada da “messe”, que era um prolongamento aberto do bar e da cozinha. Por detrás, era o quarto do 1.º Sargento e, ao lado, havia mais dois quartos, perfazendo no total seis divisórias.

- Olha que a nossa malta já está à espera. – insistia eu, enquanto olhava o 1.º Sargento, que estava sozinho, a tomar, calmamente, o seu pequeno almoço. Tinha dois soldados a servi-lho principescamente, como se tratasse de um General ou de um Don Corleone. E como estava a ser observado pelos soldados, parecia querer exibir, orgulhosamente, a sua importância, aliás, bem vincada através da sua “tromba” de enfadado, que apresentava e, também, nas suas ordens mesquinhas e na exuberância dos seus gestos e palavras. – Ó faxina! Traz-me um pacote novo de manteiga porque este já não está bom. E voltava a ordenar – Ó faxina! Arranja-me pão torrado, que este já está frio. Ó faxina! Este leite está quente de mais. Ó faxina! Este café está uma porcaria. Etc., etc., etc..

O Moniz tinha aquele defeito de não querer sair da cama, próprio de quem nunca tem pressa para se deitar. Era muito educado, muito certinho e incapaz de provocar quem quer que fosse. Perante a minha nova insistência, o Moniz mexeu-se, esticou-se e fez o habitual acto matinal: soltou o seu enorme e único peido diário, acumulado (cuidadosamente) durante 24 horas. Ora, como nem os quartos nem a messe tinham tecto, aquilo repercutiu-se altamente em todas as direcções.

Quisera o acaso que isso acontecesse precisamente quando o Sargento levantava, delicadamente, a sua chávena de leite com café, em direcção à boca. Ele, que até esticava o dedo mindinho para fora, para dar um toque mais aristocrático aos seus movimentos, estremeceu e quase não controlava a queda da chávena. Gritou:

- Lá estão eles a bater com as patas no estábulo. Vocês não ouviram? – perguntou aos humildes faxinas, que já lutavam para aguentar o riso.

Mas ele lá procurou explorar a situação a seu favor e foi barafustar e manifestar a sua indignação a caminho da Secretaria.

Ainda não eram dez horas da manhã já o Cabo Escriturário andava a convocar os furriéis para uma reunião ao fim da tarde, por ordem do nosso Capitão.

Todos perceberam que estávamos perante mais uma denúncia do Sargento e que o tema seria, seguramente, o peido incógnito e descontrolado, oriundo de um dos quartos dos furriéis.

A reacção não se fez esperar: O Furriel Vagomestre, que nutria uma antipatia extrema pelo referido sargento, preparou uma feijoada e forneceu cebola crua para a sobremesa. Ainda estou a ver a malta a trincar cebola como se fossem maçãs, enquanto jogávamos o Ramy (desporto favorito, ao principio da tarde). E para atenuar o sabor, bebia-se muita Coca-Cola, com algum Whisky.

A reunião decorreu numa pequena sala anexa à Secretaria, que o Capitão usava como gabinete. Muito educadamente, o Capitão dissertou acerca da problemática da engrenagem da grande máquina a que todos pertencem. E vincou bem que todos são peças importantes dessa máquina, por muito pequenas que sejam. E dizia:

- Qualquer grãozinho de areia colocado numa das rodas, pode implicar a sua paralisação… bla, bla, bla... E por fim chegou lá. – Vem isto a propósito de uns ruídos estranhos que estão a aparecer, inconvenientemente, na zona de repouso dos furriéis... bla, bla, bla…

Como é evidente, havia já um aroma insuportável. O Capitão fez um apelo apressado para que todos se entendessem harmoniosamente e que os exageros não comprometessem a grande máquina.

Logo que saímos do gabinete foi um alívio, ainda que bastante silencioso. Mas, à medida que nos afastávamos do gabinete, iam aumentando os decibéis de uma orquestra indesejada.

Claro que foi uma noite inesquecível. Foram mais de 4 horas de fogo constante. Não havia ninguém que não sentisse necessidade e vontade de expressar as suas razões, ainda que pelas vias menos honrosas. Desde o Moniz, que queria corresponder minimamente à solidariedade da malta, até ao esforço do Dias que se colocou sobre a cama na posição germânica a fazer de morteiro (e a beneficiar da força da gravidade, para atingir um ritmo quase de rajada). Foram todos uns “heróis”.

E quando se notava um certo desperdício de “morteiradas”, apontadas todas para o quarto do Sargento, lá estava alguém a dar as coordenadas: - MAIS CURTO E MAIS PARA A DIREITA. E, do outro extremo do edifício, também corrigiam: - MAIS COMPRIDO E MAIS PARA A ESQUERDA.

(Silva da Cart 1689)
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 27 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6795: Memórias boas da minha guerra (José Ferreira da Silva) (4): A cabra do Berguinhas