Capa do livro de memórias de Carlos de Azeredo “Trabalhos e Dias de Um Soldado do Império” (Porto, Civilização Editora, 2004, 496 pp.): Sinopse: "Foi prisioneiro após a invasão do Estado português da Índia, seguir-se-ão três comissões, das duas na Guiné, por onde andou no Olossato, Aldeia Formosa e Bolama, regressará meses depois, a pedido de Spínola, para acompanhar os reordenamentos, envolveu-se no 25 de Abril, foi governante na Madeira, onde recebeu o Presidente da República e Presidente do Conselho depostos; será assessor militar de Sá Carneiro, Comandante da Região Militar Norte e Chefe da Casa Militar de Mário Soares. É intenso livro de memórias, o General Carlos de Azeredo é conhecido pela resposta pronta, pela língua afiada e pelo destemor." (*)
Data - 22 agosto 2021 13:38
Assunto - Carlos de Azeredo
Caro Luís: A notícia da morte do Sr. General Carlos de Azeredo (**), a quem me ligava profunda e respeitosa amizade pessoal, foi para mim um daqueles momentos em que uma catadupa de recordações foram dominantes.
Escrevi algumas “linhas” a título de comentário que se tornaram num texto longo para tal.
Vou enviar-te o texto que talvez tenha neste momento especial algum interesse para os Camaradas.
Um abraço, J.Belo
Carlos de Azeredo um Homem digno, nobre e corajoso (***)
por Joseph Belo
Data - 22 agosto 2021, 14:43
A citação do General Douglas McArthur aquando do seu discurso de despedida ao Congresso Norte Americano em 1951 bem se poderia aplicar à morte do Sr. General Carlos de Azeredo: “Old Soldiers never die;they just fade away” (Os velhos soldados nunca morrem simplesmente desaparecem)
Tendo servido em Aldeia Formosa e Mampata sob as ordens do então Major Carlos de Azeredo, fiquei a ele ligado por forte e respeitosa amizade pessoal.
Tive a honra de dar uma pequeníssima colaboração aquando da preparação do seu livro “Trabalhos e Dias de Um Soldado do Império” (**).
Já há muito a viver na Suécia, fui contactado por um dos seus filhos que então o apoiava na recolha de “histórias” relacionadas com a sua presença no teatro de guerra da Guiné. (Contacto facilitado pelo meu Amigo e Camarada José Teixeira).
Entre outros, os detalhes relacionados com a ataque a partir de Aldeia Formosa a importante base inimiga situada na proximidade, mas bem já dentro da República da Guiné-Conakri.
Os ataques com canhões sem recuo, morteiros 120 e mesmo foguetões 1122, tanto a Aldeia Formosa como aos Destacamentos de Mampatá e Chamarra, assim como as inúmeras emboscadas às colunas de abastecimento Buba-Aldeia Formosa-Gandembel, eram efectuados por forças inimigas desta base.
Num período em que os mesmos se estavam a intensificar, o Major Azeredo ordenou ao Capitão de Artilharia Ricardo Rei, então responsável por uma bateria de obuses 14 sediada em Aldeia Formosa para elaborar um plano de fogos para um ataque a esta base.
O Capitão Rei, que era um operacional bastante agressivo, tinha evidente vontade de cumprir a ordem. Lembrou no entanto ao seu superior que tal ataque viria certamente a causar “turbulências” tanto a nível do Quartel General de Bissau, como no Comando-Chefe e, não menos, entre os políticos em Lisboa pelas previsíveis consequências internacionais.
A resposta do Major Azeredo foi simples: "Precisamente!"
Depois de preparação cuidadosa, as granadas foram durante a mesma noite “enfiadas” na base inimiga, com as inerentes consequências provocadas por uma bateria de obuses 14 quando sob comando competente .
Não muitas horas passadas, Spinola desembarca do seu helicóptero em Aldeia Formosa. Trazia uma expressão facial que nada de bom indicava. Realmente as “turbulências” previstas estavam a surgir.
Depois de vívida troca de opiniões com o Major Azeredo, o Comandante-Chefe aparentou acalmar-se. Talvez (!) o respeito pela coragem da frontalidade de Carlos de Azeredo, então não muito habitual entre alguns dos responsáveis militares.
De qualquer modo, ao regressar ao helicóptero disse em voz bem audível: "Continue!"
Talvez (!) tivesse contribuído para a falta de consequências disciplinares, por muitos previstas,
o facto de tanto Spinola como Carlos de Azeredo serem oficiais da Arma da Cavalaria e o Comandante-Chefe sempre que, em conversa, se referia a Carlos de Azeredo, o apodar de um “Puro Sangue”. Talvez. (Spínola, nascido em 1910, era vinte anos mais velho que o Carlos de Azeredo.)
Recomenda-se a leitura do livro “Trabalhos e Dias de Um Soldado do Império” não só pelos acontecimentos relacionados com a Guiné mas, e principalmente, com tudo o relatado por vários testemunhos de outros militares quanto ao procedimento honroso do então Capitão Carlos de Azeredo. (***)
Um abraço do J.Belo
2. Nota do editor:
No CTIG, Carlos de Azeredo foi comandante da CCav 1616 / BCAV 1897 (Mansoa e Olossato, 1966 / 1968), do Comando Operacional do Sector de Aldeia Formosa / COP 1 (1968/69), e do Centro de Instrução Militar de Bolama (1969).
Fichas de unidades:
(i) CCav 1616 (Mansoa e Olossato, 1966 / 1968):
Cmdts: Cap Grad Cav Eduardo Manuel de Oliveira Trigo PerestreJo de Alarcão e Silva | Cap Cav Carlos Manuel de Azeredo Pinto Melo e Leme
Partida: Embarque em 12Nov66, desembarque 18Nov66 | Regresso: Embarque em 02Ago68
Síntese da atividade opercaional
A CCav 1616 seguiu, em 28Nov66, para a região de Mansoa, a fim de efectuar a adaptação operacional sob orientação do BCaç 1857 e seguidamente ficar integrada no dispositivo e manobra do seu Batalhão, instalando a sede em Mansoa.
Actuou em operações nas regiões de Cubonge, Locher, Sarauol e Tambato, entre outras e na protecção a trabalhos de descapinagem da estrada Mansoa-Cutia, até 03Abr67.
Após ter tomado parte na operação "Fabíola", foi colocada, temporariamente, em Cutia, onde substituíu a CCaç 1421, de 26Abr67 a 07Mai67, com vista a assegurar a segurança e protecção dos trabalhos da estrada Mansoa-Mansabá, então realizados na dependência do BCaç 1912.
Deixando ainda um pelotão em Cutia até 29Jun67, foi transferida em 07Mai67 para Mansabá, a fim de assumir a missão de intervenção e reserva do seu batalhão.
Em 02Ju167, rendendo a CArt 1486, assum iu a responsabilidade do subsector de Olossato, com um pelotão em Ponte Maqué, no sector do seu batalhão.
Em 29Ju168, foi rendida no subsector de Olossato pela CCaç 2367, ali colocada do antecedente em reforço da guarnição, até à chegada e final do treino operacional da CCaç 2406, seguindo depois para Bissau, a fim de efectuar o embarque de regresso.
(ii) Comando Operacional do Sector de Aldeia Formosa / Comando Operacional n.º 1
Cmdt: Maj Cav Carlos Manuel de Azeredo Pinto Melo e Leme
Início: 12Jun68
Extinção: 15Jan69
Este comando operacional foi criado com vista a fazer face a um recrudescimento da actividade inimiga na região do Forreá-Contabane, efectuar o reordenamento de populações na área de Aldeia Formosa e facilitar a acção operacional do BArt 1896 - e depois do BCaç 2834 - na região de Buba.
Estabeleceu a sua sede em Aldeia Formosa. Dele fizeram parte a companhia e outros meios de apoio de combate ali sediados e mais duas subunidades de intervenção que lhe foram especificamente atribuídas.
Em 20Ago68, o COSAF passou a designar-se COP 1. Desenvolveu intensa actividade operacional na área, com a realização de patrulhamentos ofensivos, emboscadas e acções sobre as forças inimigas infiltradas na zona.
Em 15Jan69, foi extinto, passando a responsabilidade da área a ser assumida pelo BCaç 2834.
(iii) Centro de Instrução Militar
Identificação CIM
Cap Inf José Manuel Severiano Teixeira
Cap Inf António Lopes de Figueiredo
Cap Inf António Ferreira Rodrigues Areia
Cap Inf Laurénio Felipe de Sousa Alves
Cap Inf António Feliciano Mota da Câmara Soares Tavares
Cap Inf João José Louro Rodrigues de Passos
Cap Inf Alcino Fernando Veiga dos Santos
Cap Inf António de Matos
Cap Art Samuel Matias do Amaral
Cap Inf Carlos Alberto Antunes Ferreira da Silva
Maj Cav Carlos Manuel de Azeredo Pinto Melo e Leme
Maj Inf Carlos Alberto Idães Soares Fabião
Maj Inf Fernando Jorge Belém Santana Guapo
Maj Cav José Luís Jordão de Ornelas Monteiro
TCor Inf Octávio Hugo de Almeida e Vasconcelos Pimentel
TCor Cav Raúl Augusto Paixão Ribeiro
Cor Inf Carlos Emiliano Fernandes
Divisa:
Início: Anterior a OIJan61 | Extinção: 14Set74
Era uma unidade da guarnição normal, tendo sido criada inicialmente em Bissau no aquartelamento de Santa Luzia, a partir de 17Mar59, com a finalidade de ministrar instrução militar ao pessoal residente na Guiné e já recenseado
e com documentos de identificação nacionais.
Inicialmente, com a designação Centro de Instrução de Civilizados, passou, a partir de 24Nov59, a ter a designação de Centro de Instrução Militar, ministrando também instrução a praças I.
Em 20Mai61, foi transferido para Bolama, tendo assumido a responsabilidade do subsector respectivo, o qual englobava ainda as ilhas de Bijagós.
Para além da instrução básica e especial ministrada aos militares do recenseamento local para formação de diversas especialidades, efectuou ainda a IAO de unidades e subunidades metropolitanas, esta instrução especialmente a partir de meados de 1970, e estágios de Oficiais e Sargentos para enquadramento de unidades africanas da guarnição normal.
Efectuou também acções de patrulhamento e de contacto com as populações, garantindo ainda a segurança, protecção e controlo dos itinerários, dos aldeamentos e das populações, contribuindo para o seu desenvolvimento social, económico e cultural e superintendendo
no funcionamento do Centro de Licenças de Bolama.
Em 14Set74, na sequência do plano de retracção do dispositivo e após entrega do aquartelamento de Bolama ao PAIGC, o Centro foi desactivado e extinto.
Observações - Tem História da Unidade, referente a OlJan72 a 30Jun74 (Caixa n.º 117 - 2ª
Div/4ª Sec, do AHM).
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Notas do editor:
(*) Vd. postes de:
1 de fevereiro de 2016 > Guiné 63/74 - P15693: Notas de leitura (804): “Trabalhos e Dias de Um Soldado do Império”, por Carlos de Azeredo, Livraria Civilização, 2004 (1) (Mário Beja Santos)
5 de fevereiro de 2016 > Guiné 63/74 - P15708: Notas de leitura (805): “Trabalhos e Dias de Um Soldado do Império”, por Carlos de Azeredo, Livraria Civilização, 2004 (2) (Mário Beja Santos)
(**) Vd. poste de 21 de agosto de 2021 > Guiné 61/74 - P22474: In Memoriam (404): Gen Cav Carlos Manuel de Azeredo Pinto Melo e Leme (1930-2021), falecido na cidade do Porto no passado dia 19 de Agosto de 2021... Entra para a Tabanca Grande, a título póstumo, sob o lugar nº 848
(***) Último poste da série > 15 de junho de 2021 > Guiné 61/74 - P22283: (De)Caras (138): Pepito, o amigo sportinguista (Carlos Fortunato, ex-fur mil trms CCAÇ 13, "Os Leões Negros", Bissorã, 1969/71, e presidente da direção da ONGD Ajuda Amiga)