segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Guiné 63/74 - P10859: Blogpoesia (310): Em dezembro (Luís Graça)













Fotos de © Luís Graça: Candoz, 22 de dezembro de2012


em dezembro
não fazia frio
em dezembro
não fazia ainda neve
em dezembro era natal
e comiam-se rabanadas

em janeiro
cantavam-se as janeiras
e bebia-se o vinho novo

em dezembro
ainda não havia neve
pra cozer as pencas pró natal

não havia neve
à porta dos camponeses pobres do norte
nem as peugadas dos pés descalços
das criancinhas do augusto gil

batem leve levemente
como quem chama por mim...
ah onde está o tipicismo da miséria rural
que os escritores burgueses descobriram antes de nós
o camilo o eça o ramalho o aquilino

em dezembro
o pai natal já não descia pelo fumeiro
por entre os salpicões e os presuntos
vinha de peugeot pelas estradas de frança
e trazia tiparrillos pra malta fumar
à lareira

em dezembro
a maria do norte cortava erva pró gado
e cantava a plenos pulmões
uma canção do sul

candoz. natal de 1976


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Nota do editor:

Último poste da série >  15 de dezembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10804: Blogpoesia (309): Vem aí retoma... (Luís Graça)

4 comentários:

Anónimo disse...

Meu Caro Luís

O homem que une uma multidão de corações generosos, inteligentes e sensíveis, também nos oferece poesia, esta noite, embora de 76, mais uma prova de que as palavras são eternas.

Desejo um Natal de 2012, vivido na esperança de dias melhores e de coragem para enfrentar a guerra actual.

Um beijo para a Alice, para o Luís e os "miúdos grandes"

Obrigada pela companhia ao longo do ano e pela vossa amizade.

Felismina.

Anónimo disse...

Olá Camarada

Ah, onde está o tipicismo da miséria rural
que os escritores burgueses descobriram antes de nós?
Não creio que alguma vez tenha existido nem que os escritores o tenham fomentado. Apenas chamaram a atenção para um tipo de vida diferente que os leitores, especialmente das cidades, acharam interessante e curioso. Aliás, há escritores "daqueles tempos" que não enfileiravam por aquele bucolismo que parece existir.
De qualquer modo um obrigado pelo poema de Natal e um
Ab. do
António J. P. Costa

Rui Silva disse...

Caro Luís:
A tua primeira foto está soberba. Parabéns!!
Eu não sou (por acaso) sportinguista, mas... teias de aranha sobre o verde...

Continuação de Boas festas e, claro, também para os camaradas sportinguistas.
Rui Silva

Luís Graça disse...

Camarada Tó Zé:

Foi o meu primeiro natal passado no norte, onde casei em 7 de agosto de 1976... (Diga-se, de passagem, o primeiro casamento civil, para mais na casa do menu sogro!)...

São coisas do "baú"... Lembrei-me de desencantar o texto... Se quiseres, são as primeiras impressões de um "mouro" no berço da nacionalidade... É óbvio que o poema está datado... Era ainda uma época em que ainda se usava (e abusava de) a adjetivação fácil, o chavão (ideológico)... "Escritores burgueses"!... Coitado do Eça, grande mestre, e "nosso vizinho" (a quinta de Tormes fica do outro lado do vale, já em Baião)...

Desde então nunca mais passei o Natal no sul... Aqui há alegria, música, gente boa e solidária, e muita fartura!... (No sul, também há claro... mas não há as "pencas"!)... Deitei-me quase às cinco da manhã, ao som de uma velha/nova tuna rural: acordeão, violas, violino, cavaquinho... Esta ambiência nunca foi a da minha infância... Com a idade, estou a ficar sentimental...

Boa continuação das tuas festas natalícias!... Luis