Guiné > Zona leste > Setor L5 > Galomaro > BCAÇ 3872 (1972/74 > A bolanha de Galomaro...
Fotos do álbum do ex-alf mil médico Rui Vieora Coelho, disponíevis na página do grupo (fechado) do Facebook Galomaro, destino e passagem (Criado em 23/3/2011, e editado pelo Rui Vieira Coelho, tem já cerca de 90 membros, pretendendo "convergir pelo trato afectivo todos os ex-militares que permaneceram em Galomaro, na Guiné-Bissau, ou por lá passaram em trânsito").
Fotos (e legenda): © Rui Vieira Coelho (2014). Todos os direitos reservados [Edição de L.G.]
1. Mensagem, enviada por IPad, do nosso camarada Rui Vieira Coelho, médico reformado, ex-alf mil médico BCAÇ 3872 e BCAÇ 4518 (Galomaro, 1973/74) [, foto acima, em 1973, na bolanha de Galomaro]
Data: 12 de Outubro de 2014 às 17:45
Assunto: Água
Caro Luís:
O bem mais precioso para os operacionais da Guiné. Antes de cada operação pedia aos camaradas que iam para o mato, para tomarem umas pastilhas de toni-hidratantes (cloreto de sódio, o vulgar sal das cozinhas) e seguidamente beberem água esterelizada ou umas cervejolas que em princípio toda a malta preferia.
O sal fazia reter a água, diminuindo a sede e portanto o consumo da mesma. Mas se a operação fosse longa, até como muito bem dizes, " até o mijo se bebia". Nunca vi mas em quanto permaneci no CTIG as descrições sucediam-se e não eram poucas. Como tu gostava do meu uísque com água Perrier que vinha do Senegal, ao fim do dia e de manhã eu não passava sem beber o meu Gin com água tónica (tem sempre quinino).
Ás refeições acompanhava sempre com uma cervejola.
Mas tive o privilégio de, como médico do Batalhão, estar quasi permanentemente na CCS ou então nalguma companhia, em Dulombi ou Cancolim, onde as condições, embora não fossem das melhores, nada tinham a ver com o inferno que todos os operacionais passaram não só pela falta de água, mas pelo isolamento, pelos perigos constantes que espreitavam de qualquer lado, pelo clima psicológico e meteriológico que os rodeavam, pelo temor de um ataque de uma emboscada, mas no fundo sempre com a esperança de um bom regresso sem qualquer mazela ou ferimento.
A chegada à base surgiam as graçolas, os risos, as anedotas, uma refeição quente após uma chuveirada para limpar o corpo e a alma das agruras passadas, parecendo já esquecidas.
Nunca me deitei enquanto não chegavam os grupos de combate das missões de patrulhamento a que diariamente estavam sujeitos, inteirando-me de qualquer situação anómala que tivessem tido e se necessitavam da minha intervenção .
O comandante e o major das operações igualmente assim como o capelão (Padre Nuno), o aferes das transmissões (engº Mário Vasconcelos), o alferes tesoureiro (economista Veiga), o capitão da companhia do Dulombi (eng Pires). Todos solidários com quem vinha do mato e que nos guardava as costas e a quem devemos a nossa integridade física.
Obrigado, pois, a todos os Operacionais da Guiné
Rui Vieira Coelho
ex-Alf Mil Médico dos Batalhões 3872 e 4518
Galomaro, Guiné 1973/1974
_________________
Assunto: Água
Caro Luís:
O bem mais precioso para os operacionais da Guiné. Antes de cada operação pedia aos camaradas que iam para o mato, para tomarem umas pastilhas de toni-hidratantes (cloreto de sódio, o vulgar sal das cozinhas) e seguidamente beberem água esterelizada ou umas cervejolas que em princípio toda a malta preferia.
O sal fazia reter a água, diminuindo a sede e portanto o consumo da mesma. Mas se a operação fosse longa, até como muito bem dizes, " até o mijo se bebia". Nunca vi mas em quanto permaneci no CTIG as descrições sucediam-se e não eram poucas. Como tu gostava do meu uísque com água Perrier que vinha do Senegal, ao fim do dia e de manhã eu não passava sem beber o meu Gin com água tónica (tem sempre quinino).
Ás refeições acompanhava sempre com uma cervejola.
Mas tive o privilégio de, como médico do Batalhão, estar quasi permanentemente na CCS ou então nalguma companhia, em Dulombi ou Cancolim, onde as condições, embora não fossem das melhores, nada tinham a ver com o inferno que todos os operacionais passaram não só pela falta de água, mas pelo isolamento, pelos perigos constantes que espreitavam de qualquer lado, pelo clima psicológico e meteriológico que os rodeavam, pelo temor de um ataque de uma emboscada, mas no fundo sempre com a esperança de um bom regresso sem qualquer mazela ou ferimento.
A chegada à base surgiam as graçolas, os risos, as anedotas, uma refeição quente após uma chuveirada para limpar o corpo e a alma das agruras passadas, parecendo já esquecidas.
Nunca me deitei enquanto não chegavam os grupos de combate das missões de patrulhamento a que diariamente estavam sujeitos, inteirando-me de qualquer situação anómala que tivessem tido e se necessitavam da minha intervenção .
O comandante e o major das operações igualmente assim como o capelão (Padre Nuno), o aferes das transmissões (engº Mário Vasconcelos), o alferes tesoureiro (economista Veiga), o capitão da companhia do Dulombi (eng Pires). Todos solidários com quem vinha do mato e que nos guardava as costas e a quem devemos a nossa integridade física.
Obrigado, pois, a todos os Operacionais da Guiné
Rui Vieira Coelho
ex-Alf Mil Médico dos Batalhões 3872 e 4518
Galomaro, Guiné 1973/1974
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Nota do editor:
Úlçtimo poste da série > 14 de outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13732: Os nossos médicos (78): Memórias do Dr. Rui Vieira Coelho, ex-Alf Mil Médico dos BCAÇ 3872 e 4518 (10): As recordações surgem e as saudades de todos os lugares e gentes também
Úlçtimo poste da série > 14 de outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13732: Os nossos médicos (78): Memórias do Dr. Rui Vieira Coelho, ex-Alf Mil Médico dos BCAÇ 3872 e 4518 (10): As recordações surgem e as saudades de todos os lugares e gentes também
4 comentários:
Meu caro Rui:
Belas fotas, belas bajudas... Temos que continuar a publicar o teu álbum. Presumo que sejam imagens digitalizadas de "slides", como estavam então na moda...Um pequeno luxo que não era para todas as bolsas...
Têm uma ótima qualidade as imagens... Não levas a mal tê-las editado... Nalguns casos, ampliei-as, recortei-as, dei-lhes mais contraste... Acho que ficaram melhores...
Já tens destino a dar às tuas caixas de "slides" ? Um dia batemos a bota e os filhos e netos mandam a tralha todo do defunto para o contentor do lixo...
Quanto às tuas preocupações de médico com o risco de desidratação do pessoal em operações no mato... Em Bambadinca nas messes de oficiais e sargentos, a distribuição dos pacotinhos de sal e da pastilha de quinino estava assegurada pelo pessoal de serviço que punha mesa... Mas as praças, será que não se esqueciam frequentemente de tomar as "pastilhas" ? Os nossos soldados tinham mesmo que se desenrascar...
Já não me recordo com que frequência se tomava o medicamento para a prolilaxia do paludismo... Já não me recordo do nome... Já quanto ao "comer sal" todos os dias ao almoço, tornou-se um hábito saudável... Hoje é um das coisas que evito, o sal, o acúcar e a gordura...
Em todo o caso, a nossa alimentação era desiquilibrada... À boa maneira portuguesa, procurávamos fazer uma boa refeição ao almoço... E o resto era petisqueira, para quem podia... O pior era quando andavámos no mato: aí rapava-se fome, mas a tensão era grande, e a preocupação com o regressar são e salvo ao quartel amigo mais próximo inibia-nos de sentir fome... Um homem pode passar vários dias sem comer, mas não sem beber... Gerir 2 cantis de água para um operação de 2 dias era dramático... Por isso fazíamos a guerra de noite e de madrugada...
A desidratação e a perda de peso eram dois grandes problemas com se defrontavam os operacionais como eu... Cheguei a perder 4 a 5 kg. numa só operação... Port sistema, não levava ração de combate, mas apenas fruta e às vezes um frasquinho de uísque...
Gosto de gin tónico mas na Guiné preferi a água (filtrada) com uísque ou o u+isque com ´água de Perrier. Pequenos luxos que n os ajudaram a sobreviver. Mais difícil era o "desmame", depois de passarmos à peluda... Hoje não bebo (ou só raramente bebo) um uísque. Na Guiné tinha outro sabor, outro encanto...
A ignorância é a mãe de todas as mazelas.
Essas pastilhas vinham já nas respectivas rações de combate e na verdade, entre a tropa ninguém sabia ao certo para que serviam. Assim eram muitas vezes trocadas por galinhas e mangas na população como "mezinha" para a dor de cabeça, dor numa perna, ou mesmo para a falta capacidade sexual dos velhos homens grandes. Eles acreditavam e a gente ria-se, no fundo hoje não sei se nos riamos deles, quando afinal nos devíamos rir de nós.
Parafraseando o tenente Raposo ex guarda fiscal e já com idade para ser nosso pai, dizia "raios parta isto, se eu soubesse nunca me tinha metido com esta canalha"
Comandei a CCS/BCAÇ 2851 de JAN a MAI70
em Galomaro e estas fotos lembram-me as Duas Fontes onde víamos as bajudas a lavar roupa, a lavar-se e a tomar banho.Eram o encanto da rapaziada. No entanto julgo que estas fotos não serão daí. O comprimido profilático contra o paludismo era o Daraprim e era tomado ás 5as feiras. Já agora informo que o médico do Batalhão, que tinha entre os colegas o alcunha de Espanhol, fez a comissão integralmente no mato (não aceitou o convite para, a certa altura, ir para Bissau) e era um exímio caçador(com pressão de ar) de pombos verdes que abundavam em Galomaro. Um abraço a todos
Hilário Peixeiro
Na minha companhia um dos enfermeiros distribuía, uma vez por semana, 1 comprimido de pirimetamina e 1 drageia de complexo B.
Apenas uma vez um camarada se recusou a toma-los e o manifestou publicamente, o comandante da Companhia veio ao refeitório e o caso resolveu-se.
Este soldado foi o primeiro a ter paludismo penso que serviu de exemplo pois tal caso nunca mais se repetiu.
Delfim Rodrigues
suzana e Varela 1971/73
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