1. Transcrição de uma publicação do Blogue Molianos, viajando no tempo, do nosso camarada António Eduardo Ferreira (ex-1.º Cabo Condutor Auto da CART 3493/BART 3873, Mansambo, Fá Mandinga e Bissau, 1972/74).
Quando dois desconhecidos se apaixonam, é uma história de amor, onde a
ficção e a realidade se misturam, terá acontecido na década de sessenta do
século passado, entre uma jovem da Nazaré e um rapaz de Almeirim. Começa hoje a
ser publicada neste blogue, na categoria Tempos Cruzados,
terá continuidade nas semanas seguintes.
Como gosto de dizer, escrevo para estar entretido… a quem tiver paciência
para ler o que vou escrevendo, os meus agradecimentos.
António Eduardo Ferreira
QUANDO DOIS DESCONHECIDOS SE APAIXONAM
1 - Início
Na década de trinta do século passado, chegada a primeira
semana de setembro, ia o António da Palha e a esposa Guilhermina com os três
filhos a caminho da Nazaré, a banhos, como sempre faziam. Por essa altura
ficavam por lá apenas uma semana, o tempo foi passando os filhos atingiram a
idade adulta casaram e os pais passaram a ficar duas semanas.
O primeiro a casar foi o João, depois o Jorge e, por último a Maria do
Carmo. Se os rapazes ficaram na terra, a Carminho casou com um rapaz do
Pombalinho e foi morar para Santarém, a cerca de oito quilómetros da pequena
quinta dos pais que ficava próximo de Almeirim. Distância considerável
atendendo à falta de transportes, ainda que minimizada graças à égua e à velha
carroça do pai, um dos maiores negociantes de gado bovino da região.
Não tardou muito tempo para que o António da Palha e a Guilhermina tivessem
sete netos, se o António era uma pessoa alegre e feliz, em quase todos que o
conheciam tinha amigos, essa felicidade aumentava sempre que nascia mais um
neto, ao todo foram nove.
Sempre que chegava o mês de setembro, agora na companhia dos netos mais
crescidos, lá iam eles a banhos para a praia da Nazaré, viagem que era feita na
empresa de transportes Ribatejana, uma das que fazia carreira para aquela praia,
ao saírem da camioneta um dos primeiros que aparecia a oferecer os seus
préstimos era o moço de fretes, que a troco de uns escudos se prontificava a
transportar toda a bagagem que levavam, que era sempre muita: o saco com
batatas, feijões e alguns melões entre outras coisas indispensáveis para os
dias em que iam estar na praia.
Mas antes de acertar o transporte com o moço era necessário alugar casa, a
oferta era muita, as mulheres da Nazaré estavam sempre com atenção a quem
chegava para oferecer a sua casa. Quando a mesma não era do agrado de quem
acabava de chegar, elas não raramente informavam outras na mesma rua ou nas
imediações.
Para o avô nem sempre era tarefa fácil, tinha que ser no rés-do-chão, ele
não gostava de subir escadas, e tinha de ter casa de banho. Havia muitas que
tinham apenas uma pia de despejo, como as nazarenas lhe chamavam, e o avô não
queria casas assim. Para além das condições da habitação havia que ter em conta
o preço da renda, ou não fosse o avô homem habituado ao negócio.
Alugada a casa era altura de entrar em ação o moço de fretes, que nem sempre
conseguia levar toda a bagagem, mas o avô, a avó e a pequenada todos ajudavam.
Havia anos em que o sítio onde iam morar durante o tempo em que estavam a
banhos era o mesmo de anos anteriores, o que era sempre do agrado da dona da
casa.
Quando chegava o fim da estadia, quase sempre sobravam algumas coisas que
tinham ido para ser consumidas, sobras que lhe eram oferecidas, o que dava
muito jeito pois a seguir ao verão vinha o inverno, e a vida na Nazaré por essa
altura não era fácil para a maioria das pessoas.
Depois de se terem instalado na nova casa havia que comer alguma coisa, a
viagem tinha sido longa, acalmado o estômago o avô apressava-se a ir procurar
alguns amigos que, como ele, era sempre naquela tempo que iam a banhos, alguns
nem chegavam a pisar a areia… tinham lugar por essa altura as festas em honra
de Nossa Senhora da Nazaré, no Sítio, a que eles nunca faltavam, se não os
visse todos nesse dia, certamente no dia seguinte haveria de os encontrar, a
notícia da sua chegada ia sendo divulgada por aqueles com quem já tinha estado
à conversa. Passado pouco tempo todos sabiam que ele estava por ali…
Havia alguns locais que fazia questão de visitar no dia da chegada, eram as
tabernas onde ele e os amigos passavam grande parte do tempo: a casa da
Parreirinha, o José da Reboicha, e o António dos passarinhos, se não fosse
naquele dia, em breve na companhia dos amigos haveriam de ir à taberna do
António Arnaldo tinha sempre vinho daquele que eles gostavam, do bom!
No dia seguinte havia que ir à praça, ritual para cumprir todos os dias que
estivessem na praia, as compras estavam a cargo da avó Guilhermina, só a compra
de carne é que era feita pelo avô, alguns dos talhantes eram seus conhecidos. A
ida à praça servia também para que a rapaziada conhecida se encontrasse e,
muitas vezes, combinar onde naquela tarde iam comer uns carapaus secos, assados
no fogareiro a carvão e beber uns copos, normalmente onde o vinho fosse melhor.
As mulheres e a pequenada passavam a tarde na praia.
(Continua)
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Nota do editor
Último poste da série de 3 de Agosto de 2014 > Guiné 63/74 - P13458: Blogues da nossa blogosfera (67): Jovens da Aldeia de Molianos na Guerra da Guiné, no Blogue Molianos, viajando no tempo (António Eduardo Ferreira)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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