Álvaro Andrade de Carvalho (Lourinhã, 14/8/1948 - Lisboa, 4/1/2018). Diretor do Programa Nacional de Saúde Mental, desde 2011.
Foto: cortesia de APDH - Associação Portuguesa paar o Desenvolvimento Hospitalar
Acabas de atravessar o rio Caronte, nessa viagem sem regresso para qualquer mortal. Todos já temíamos o pior, a tua família e os teus amigos do peito, quando em 14 de agosto de 2017 nos juntámos na tua casa da Lourinhã para celebrar a vida, o amor, a amizade e... a esperança. Fazías então 69 anos.
Foi uma luta desigual, mas digna e corajosa, a tua, contra a morte anunciada. Não tenho cabeça, às cinco da manhã do dia seguinte, para te escrever a "oração fúnebre" que te é devida. Outros farão muito melhor do que eu o elogio do homem público, do cidadão, do português e sobretudo do médico, do psiquiatra, do psicanalista, do professor, do chefe de serviço hospitalar, do gestor e reformador da saúde mental. Infelizmente, já não estarás cá, em 2019, quando se comemorar os 40 anos do serviço nacional de saúde, para cuja génese e desenvolvimento também deste a tua quota parte, decisiva. Mas o teu exemplo, em termos de ação e pensamento, continuará a ser inspirador para todos nós,
Deixa-me reproduzir aqui, meu querido Alvarinho, as palavras que eu te disse, no teu dia de anos. É uma pequena, singela, homenagem de um dos teus amigos de infância que ficaram, discretamente, amigos para sempre. Estas palavras, ditas num círculo íntimo em 14/8/2017, passam a ser públicas, se não me levas a mal, do outro lado da margem do rio. E espero que possam ser também um lenitivo para a perda devastadora que é a tua morte, extemporânea, aos 69 anos, para todos nós, a começar pelos teus filhos, Miguel, Joana e Sara, e os teus netos, demais família e amigos, sem esquecer a grande comunidade da saúde mental (e da saúde pública), o teu país, a tua terra. E as mulheres que te amaram. Sim, tu foste feliz entre os homens e as mulheres. Foste feliz no amor e na amizade,
Nota do editor:
Último poste da série > 28 de dezembro de 2017 > Guiné 61/74 - P18149: In Memoriam (309): Alf inf QP Augusto Manuel Casimiro Gamboa, CCAÇ 1586 (Piche, Nova Lamego, Canjadude, Madina do Boé, Béli, Bajocunda, 1966/68), nascido em São Tomé , morto em combate, em 14/12/1967, em Uelingará, entre Canjadude e Nova Lamego (José Martins / Virgílio Teixeira / António J. Pereira da Costa / José Corceiro)
2. Soneto de amizade, dedicado por Luís Graça ao Álvaro de Carvalho no seu 69º aniversário:
Meu caro Álvaro,
meu bom e velho amigo,
querido Alvarinho:
Raramente me esqueço de te dar os parabéns,
no teu dia de anos,
desde há mais de sessenta anos.
A data, de resto, coincide com um dia glorioso da nossa história,
o da batalha de Aljubarrota, em 14 de agosto de 1385.
Se o nosso exército não tem derrotado o dos nossos vizinhos,
hoje estaríamos aqui a “hablar en castellano de la amistad entre nosotros”…
Nasceste num sábado, em 14 de agosto de 1948,
que foi de alegria para os teus pais,
pessoas de quem tive o privilégio de serem minhas amigas.
O dia, em termos metereológicos, não terá sido muito diferente do de hoje,
querido Alvarinho:
Raramente me esqueço de te dar os parabéns,
no teu dia de anos,
desde há mais de sessenta anos.
A data, de resto, coincide com um dia glorioso da nossa história,
o da batalha de Aljubarrota, em 14 de agosto de 1385.
Se o nosso exército não tem derrotado o dos nossos vizinhos,
hoje estaríamos aqui a “hablar en castellano de la amistad entre nosotros”…
Nasceste num sábado, em 14 de agosto de 1948,
que foi de alegria para os teus pais,
pessoas de quem tive o privilégio de serem minhas amigas.
O dia, em termos metereológicos, não terá sido muito diferente do de hoje,
talvez um pouco melhor,
pelo que pude ler na 2ª edição do “Diário de Lisboa”
(, edição de 8 páginas, de que te mando um exemplar em formato digital).
Na costa norte e centro, o céu estava limpo,
pelo que pude ler na 2ª edição do “Diário de Lisboa”
(, edição de 8 páginas, de que te mando um exemplar em formato digital).
Na costa norte e centro, o céu estava limpo,
por vezes com algumas nuvens,
vento norte bonançoso a fresco,
visibilidade boa,
ondulação norte noroeste moderada.
Foi um ano de estiagem, o de 1948…
Foi um ano de estiagem, o de 1948…
Tinha havido, ao menos, umas chuvadas fortes uns dias antes…
E pelo mundo, as notícias eram aparentemente as de rotina:
E pelo mundo, as notícias eram aparentemente as de rotina:
acabavam os jogos olímpicos em Londres,
chovia torrencialmente em Berlim,
afetando a ponte aérea anglo-americana,
estávamos em plena guerra fria
e chegavam também ao fim, depois de 3 anos, os julgamentos de Nuremberg…
Em Portugal, na ponta mais ocidental e acidental da Europa, nada de novo…
Em Portugal, na ponta mais ocidental e acidental da Europa, nada de novo…
Ah!, éramos bicampeões europeu e mundiais de hóquei em patins…
E claro comemorava-se o 14 de agosto, “dia da infantaria”…
Não quero ser maçador, e abusar do meu tempo de antena,
em dia que é teu, da tua família, dos teus filhos e netos,
e todos aqueles que te querem bem
e que fazem votos para ver-te de novo em boa forma,
em dia que é teu, da tua família, dos teus filhos e netos,
e todos aqueles que te querem bem
e que fazem votos para ver-te de novo em boa forma,
ativo, produtivo e saudável…
Estamos aqui para darmos graças à vida
Estamos aqui para darmos graças à vida
e festejar o amor, a amizade…e a esperança!
Mas tenho que te dizer, com ternura, algumas palavras
na tua festinha das 69 primaveras…
Não sei se alguma vez houve um poeta ou uma poetisa
que te tenha escrito um soneto…
Aceita aquele que eu te acabo de escrever,
e que é uma singela declaração de amizade,
em meu nome, e em nome da minha família,
a Alice, a Joana e o João.
Foste importante para mim,
por muitas razões que tu e eu sabemos,
na minha infância, adolescência e juventude,
e já depois de ter vindo da Guiné, ter casado e voltado a estudar…
Mas também foste importante para eles.
Foste, mais do que visita da nossa casa,
também um médico, um conselheiro e um grande amigo.
A Alice e eu estamos-te muito gratos,
a ti e à Ana Jorge,
pelo João que também ajudaste a nascer,
e que hoje é teu colega, psiquiatra.
Músico, seguiu esta manhã para Espanha, para um concerto,
e manda-te um xi-coração de parabéns.
Separados por duas ruas,
vivemos a nossa infância, adolescência e parte da juventude
na mesma terra, Lourinhã.
Estudámos na mesma escolinha do Conde de Ferreira,
brincámos no mesmo largo do coreto,
uma e outro há muito vítimas do camartelo camarário.
Lemos, na tua casa, os mesmos livrinhos aos quadradinhos,
dos cobóis às séries do “Cavaleiro Andante”…
Depois da 4ª classe e do exame de admissão (que fizemos juntos em Lisboa),
seguimos caminhos diferentes,
mas encontrávamo-nos nas férias grandes.
Desde cedo mostraste espírito de líder
(aquele que vai à frente mostrando o caminho),
criando o “Alvorada” juvenil,
e depois colaborando intensamente na redação do jornal.
Foi aqui, no jornal "Alvorada", que eu tive a minha primeira atividade remunerada.
Mas tenho que te dizer, com ternura, algumas palavras
na tua festinha das 69 primaveras…
Não sei se alguma vez houve um poeta ou uma poetisa
que te tenha escrito um soneto…
Aceita aquele que eu te acabo de escrever,
e que é uma singela declaração de amizade,
em meu nome, e em nome da minha família,
a Alice, a Joana e o João.
Foste importante para mim,
por muitas razões que tu e eu sabemos,
na minha infância, adolescência e juventude,
e já depois de ter vindo da Guiné, ter casado e voltado a estudar…
Mas também foste importante para eles.
Foste, mais do que visita da nossa casa,
também um médico, um conselheiro e um grande amigo.
A Alice e eu estamos-te muito gratos,
a ti e à Ana Jorge,
pelo João que também ajudaste a nascer,
e que hoje é teu colega, psiquiatra.
Músico, seguiu esta manhã para Espanha, para um concerto,
e manda-te um xi-coração de parabéns.
Separados por duas ruas,
vivemos a nossa infância, adolescência e parte da juventude
na mesma terra, Lourinhã.
Estudámos na mesma escolinha do Conde de Ferreira,
brincámos no mesmo largo do coreto,
uma e outro há muito vítimas do camartelo camarário.
Lemos, na tua casa, os mesmos livrinhos aos quadradinhos,
dos cobóis às séries do “Cavaleiro Andante”…
Depois da 4ª classe e do exame de admissão (que fizemos juntos em Lisboa),
seguimos caminhos diferentes,
mas encontrávamo-nos nas férias grandes.
Desde cedo mostraste espírito de líder
(aquele que vai à frente mostrando o caminho),
criando o “Alvorada” juvenil,
e depois colaborando intensamente na redação do jornal.
Foi aqui, no jornal "Alvorada", que eu tive a minha primeira atividade remunerada.
Foi aqui também nosso colega de escola, amigo e teu primo,
o saudoso Rui Tovar de Carvalho (Lourinhã, 1948-Lisboa, 2014),
começou a dar os primeiros passos na sua carreira de jornalista desportivo.
À criação de uma secção, ou de uma página,
À criação de uma secção, ou de uma página,
a que chamámos "Alvorada Juvenil",
seguiram-se outras:
abrimos espaço ao correio dos soldados do ultramar,
e demos voz aos nossos emigrantes.
No "Alvorada Juvenil", abrimos um inquérito aos jovens lourinhanenses
e alimentámos o "cantinho dos poetas"...
Tu e eu, assinámos em conjunto diversas reportagens,
Tu e eu, assinámos em conjunto diversas reportagens,
para além de artigos de opinião que subscrevemos individualmente.
Havia alguma irreverência e inquietação,
próprias da idade e da época que vivíamos.
Acabei por exercer as funções de redator chefe deste jornal, quinzenário regionalista,
Acabei por exercer as funções de redator chefe deste jornal, quinzenário regionalista,
que ainda hoje se publica.
Foi fundado ao em 1960, como sabes,
pelo padre António Pereira Escudeiro (Tomar, 1917-Lisboa, 1994),
um homem a quem a Lourinhã muito deve
e que fez uma aposta forte na formação das elites, ou seja, na educação.
Foi igualmente fundador do jornal "Redes e Moinhos" (1954-1960).
Antes de vir para a Lourinhã como pároco, em 1953,
esteve em Alcanena onde fundou o jornal quinzenário "O Alviela",
entretanto suspenso pela censura por ousar publicar um artigo
sob o título "A fome em Alcanena"...
Estava-se em plena campanha do general Norton de Matos.
Retomou a publicação depois de ser autorizado a versar também "assuntos sociais"...
À frente do "Alvorado", como redator-coordenador, de 1964 a 1966,
À frente do "Alvorado", como redator-coordenador, de 1964 a 1966,
"fiz-me esquecido"
e deixei de mandar o jornal à censura...
A entrada de jovens fora uma pedrada do charco da pasmaceira e do conformismo
em que se vivia nesta terra do oeste-estremenho.
Estava-se em plena guerra colonial
mas já na fase de fim de ciclo...
"Cadáver adiado", o regime do Estado Novo ainda estrebuchava
e metia medo a muitos.
Não admira que o diretor do jornal tenha recebido
um intimidatório ofício da direção geral de censura
a perguntar porque é que se permitia o luxo de ultrapassar a lei...
Metade do ofício, que era apenas de duas linhas,
correspondia a uma assinatura em letra garrafal,
símbolo máximo da arrogância de quem se sentia dono e senhor deste país...
Tudo "a bem da Nação", pois claro.
O pobre do padre vigário, já com ficha na PIDE (por causa do "Alviela"),
O pobre do padre vigário, já com ficha na PIDE (por causa do "Alviela"),
lá teve que arranjar uma desculpa esfarrapada aos senhores coronéis da censura
e, a mim, puxou-me as orelhas...
Doravante, tínhamos que mandar os artigos em duplicado para a tipografia
que por sua vez submetia uma cópia à censura...
E no entanto nunca nenhum de nós escreveu o que quer que fosse
que pudesse pôr a causa a sacrossanta trilogia Deus, Pátria e Família...
Eu acho que os censores embirravam sobretudo com os nossos jovens poetas.
Eu acho que os censores embirravam sobretudo com os nossos jovens poetas.
Não entendiam nada da poesia moderna
e receavam à brava que os jovens lourinhanenses e outros,
que colaboravam connosco,
escrevessem também nas "entrelinhas"...
Nunca se sabe o que se passa na cabeça irrequieta dos poetas
nem muito menos na mente perversa dos censores...
Um dia vais gostar de rever este período das nossas vidas,
Um dia vais gostar de rever este período das nossas vidas,
em que fomos jornalistas amadores
e ganhámos o gosto pela escrita, pela ação cívica e pela animação cultural….
Prometo fazer-te uma seleção dos teus e dos nossos escritos de adolescência…
Está na hora, por fim, de te ler o poema que te fiz esta noite.
Está na hora, por fim, de te ler o poema que te fiz esta noite.
E que te dedico com todo o meu apreço, gratidão, amizade e fraternidade.
É o meu pequeno contributo para a tua festa.
Soneto de amizade
por Luís Graça
Soneto de amizade
por Luís Graça
Alvarinho, deixa-me te dizer,
Hoje, este soneto de amizade:
Amigo é um irmão, podes crer,
Para lá do sangue e da idade.
Nada tem de declaração senil:
Amigos para sempre, desde a infância,
A escola e o “Alvorada” juvenil,
Somos irmãos em última instância.
Amigo é partilhar dor e alegria,
Nos bons e maus momentos da vida,
É cumplicidade, é empatia.
E que mais, meu irmão e meu amigo ?
É saber dar-te a valia devida,
É ter tempo, afinal, para estar contigo!
Lourinhã, 14 de agosto de 2017.
PS – Parabéns, muita saúde e longa vida,
Porque tu mereces tudo!
_______________
Hoje, este soneto de amizade:
Amigo é um irmão, podes crer,
Para lá do sangue e da idade.
Nada tem de declaração senil:
Amigos para sempre, desde a infância,
A escola e o “Alvorada” juvenil,
Somos irmãos em última instância.
Amigo é partilhar dor e alegria,
Nos bons e maus momentos da vida,
É cumplicidade, é empatia.
E que mais, meu irmão e meu amigo ?
É saber dar-te a valia devida,
É ter tempo, afinal, para estar contigo!
Lourinhã, 14 de agosto de 2017.
PS – Parabéns, muita saúde e longa vida,
Porque tu mereces tudo!
_______________
Nota do editor:
Último poste da série > 28 de dezembro de 2017 > Guiné 61/74 - P18149: In Memoriam (309): Alf inf QP Augusto Manuel Casimiro Gamboa, CCAÇ 1586 (Piche, Nova Lamego, Canjadude, Madina do Boé, Béli, Bajocunda, 1966/68), nascido em São Tomé , morto em combate, em 14/12/1967, em Uelingará, entre Canjadude e Nova Lamego (José Martins / Virgílio Teixeira / António J. Pereira da Costa / José Corceiro)
12 comentários:
Que o teu grande amigo de longa data descanse em paz.
Para ti Luís um grande abraço de solidariedade.
Adriano Moreira
Prezado Luís Graça
Não há como segurar a emoção ao ler suas linhas dedicadas a seu querido amigo de infância que se vai mas que estava ainda presente para ouvi-lo na data de aniversário. Fique com meus abraços solidários e que vosso amigo siga em paz na travessia do rio Caronte.
José Luiz Telles
«E quando alguém do nosso grupo cai,
ainda é pior, ainda sofremos mais.
Faz-nos sentir,faz-nos pensar.
Talvez da próxima vez,seja eu,quem vá tombar.»
Estou solidário contigo Luís
Apesar da minha formação profissional (inicial) ter sido em Coimbra, tive alguns episódios em Lisboa. Lá conheci o Álvaro numa dessas formações na área da saúde mental.
Retive a ideia de um ótimo profissional, um bom homem, calmo, afável e empático.
Que descanse em paz.
Ernestino Caniço
Excerto de notícia da TV Europa, 5/1/2018, 17h28:
https://www.tveuropa.pt/noticias/morreu-alvaro-carvalho-diretor-do-programa-nacional-para-a-saude-mental/
O psiquiatra Álvaro Andrade de Carvalho morreu aos 69 anos. O Ministro da Saúde e a
Diretora-Geral da Saúde lamentaram “a perda de uma personalidade de referência no panorama da Psiquiatria e Saúde Mental a nível nacional e internacional.”
Álvaro Andrade de Carvalho dirigia, até à data, o Programa Nacional para a Saúde Mental da Direção-Geral da Saúde, uma personalidade que em que à “excelência das competências profissionais” sempre “se associaram a qualidade das características humanas.”
O psiquiatra foi “um dos construtores do Serviço Nacional de Saúde, tendo sido no seu mandato como diretor de Serviços de Psiquiatria e Saúde Mental da Direção-Geral da Saúde, entre fevereiro de 1996 e outubro de 2000, que foi aprovada a Lei de Saúde Mental, legislação de referência para o setor.”
Velório na Igreja São João de Deus, na Praça de Londres, em Lisboa, a partir das 17h:00 do dia 5, sexta.feira.
Hoje, sábado, o corpo seguirá para a Lourinhã às 10h:00 para a Igreja do Castelo onde estará até 14h, hora em que irá para o cemitério local.
Alice Carneiro
Não conheci o nosso camarada Álvaro Carvalho. Mas como pisou aquela terra vermelha ocre da Guiné, só por isso já é um motivo para me tornar amigo dele, agora que nos deixou. As minhas sinceras condolências à família enlutada.
Presumo que todos que estamos nesta caminhada dos 70/80, não vão faltar noticias tristes destas todos os meses, e depois mais tarde, todos os dias. Esta passagem do tempo não tem dó, e os vindouros um dia darão valor àqueles que estiveram 'lá'.
Virgílio Teixeira,
Em 6 de Janeiro de 2018
Caro Luis Graça,
Nunca falei com o Álvaro, nunca fomos apresentados, mas tínhamos uma amiga comum, que tinha sido aluna dele e que me falava do Álvaro com tanta admiração, tanto carinho, que sempre que o Álvaro aparecia nos debates televisivos ou nos jornais, eu parava, para saber o que ele tinha a dizer, sobre o assunto em questão.
Que esteja em paz, na sua nova morada.
Um Abraço.
Meu bom amigo Luís Graça
É difícil não ficar sensibilizado com este artigo.
Pela morte de mais um camarada.
Pela homenagem que lhe prestas.
Apenas envio um pensamento de luto para a família e um forte abraço para ti.
Hélder Sousa
O meu amigo Álvaro, da minha/nossa geração, sendo médico, tinha algumas (poucas) probabilidades de ir parar à Guiné ou a outro TO ultramarino (Angola, Moçambique)... Acabou o curso, creio que em 1969 (, já estava eu na Guiné, trocámos um ou outra carta...), mas foi fazer logo a especialidade. E escolhei uma especialidade que dava adiamento... Mudou entretanto para psiquiatria... Entretanto, veio o 25 de abril, a descolonização... Já casado (com a futura ministar da saúde, Ana Jorge) e pai de filhos (ou, pelo menos de um, o Miguel), é chamado, já tarde, aos 30 e tal anos, para fazer o serviço militar. Um amigo comum, médico, da Lourinhã, contou-me como foram esses tempos de Vendas Novas (, se não me engano)...
Não tenho a certeza se ele chegou a ir á Guiné, em alguma missão de formação ou de assessoria na área da saúde... Estivemos pelo menos uma vez juntos em Angola, ele pela Direção Geral de Saúde, eu pela Escola Nacional de Saúde Pública... E, num jantar de grupo, ouvimos, "impávidos e serenos"..., pela boca de um histórico general como foi o fim da Cita Vales: "Deixámo-la ter o filho e depois fuzilámo-la"... Na realidade, o filho já nascera antes dos terríveis acontecimentos do 27 de maio de 1977... Cita Vales, a "pasionara", angolana de nascimento, goesa de ascendência, estudara medicina em Lisboa, não tendo chegado a acabar o curso...Era quintanista... Foi enterrada numa vala comum... E ainda hoje a sua história trágica mexe com todos nós, portugueses e angolanos da nossa geração... As revelações feitas por esse general mexeram connosco, comigo e com o Álvaro...
Há um lapso factual... O meu amigo Álvaro ainda era estudante de medicina, enquanto eu estive na Guiné (1969/71)...Não tenho a data exata, mas deve ter-se licenciado em 1972, 1973 ou 1974, no máximo... O seu grande amigo Dr. João França Gouveia, nascido também em 1948, no Funchal, dois meses mais novo, licenciou-se em 1972... Francisco George, que é de 1947, mas também do memsmo curso, acabou em 1973...
Tenho que confirmar o ano em que o meu saudoso amigo e conterrâneo acabou o curso de medicina... Já algures a data de 1974... LG
Permitam-me reproduzir uma belíssima, comovente, terna, evocação do Álvaro Carvalho, por parte de uma colega e colaboradora... Está no blogue da Sociedade Portuguesa de Psicanálise (SPP), que ele também ajudou a fundar e a desenvolver.
https://www.sppsicanalise.pt/as-arvores-morrem-de-pe-homenagem-postuma-a-alvaro-de-carvalho/
9 de Janeiro de 2018
AS ÁRVORES MORREM DE PÉ – Homenagem póstuma a Álvaro de Carvalho,
por Conceição Tavares de Almeida
Morreu um homem bom. Médico, Psiquiatra, Diretor do Programa Nacional para a Saúde Mental, formado na (e pela) Psicanálise. Nome de árvore, o Álvaro de Carvalho era um homem vertical, um humanista e uma excelente pessoa.
Nosso colega na SPP conheci-o melhor nestes últimos anos, na Direção-Geral de Saúde, onde tenho sido sua Assessora para a Infância e Adolescência desde 2012. Tive esse privilégio de privar com ele, acompanhando-o nas suas rotinas, observando-o nas suas batalhas, aprendendo com os seus conhecimentos teóricos, práticos, mas especialmente de vida, daquilo que é a realidade da saúde mental, na sua história, nacional e internacional, na sua relação com os poderes políticos, e o seu lugar na área da saúde e nas suas interfaces.
Sempre aberto a novas ideias, senti-me ouvida e respeitada, incentivada a ser criativa, apoiada nas dificuldades do caminho, criticada, reassegurada e orientada quando as pedras do mesmo me questionavam.
Afável, disponível, o Álvaro era estimado por todos. Tinha uma presença solar, era daquelas pessoas que emanava luz e calor. Galanteador, era o rumor de risos femininos no edifício labiríntico da DGS que, normalmente, fazia anunciar a sua chegada. Vinha da terra dos dinossauros mas mantinha no olhar uma alegria e no seu espírito uma jovialidade que o tornavam um homem atual e traçava o seu rumo inspirado pela utopia do respeito por todos, com uma determinação e uma inspiração cativantes e contagiantes.
Recordo viajar com ele por esse país fora, no Renault Clio do serviço, pequeno demais para as suas pernas (e para as suas metas), conduzido pelo leal motorista cujo nome lhe denunciava a alma (o Sr. Valente). De alguma forma foi-se impondo na minha mente a imagem do Dom Quixote (e Sancho Pança), nas suas demandas, nas suas lutas contra a incompreensão e contra o conformismo, em defesa dos mais vulneráveis e invisíveis, guiado pelo sonho e pelo valor da justiça.
De uma verticalidade e generosidade extremas, vejo no Álvaro um cavaleiro dos nossos tempos, um homem fiel aos seus princípios, leal aos seus amigos, movido pela defesa dos seus objetivos e ideais. Mas, ao mesmo tempo, conhecedor do inconsciente, capaz de (o) escutar, identificando conflitos e defesas, podendo conter as angústias e ajudar a re-significar as experiências.
Morreu um homem bom. Foi velado num dia triste de Janeiro, em que o céu chorou ininterruptamente. E foi sepultado na sua terra natal, pequena vila cujo nome faz rima com amanhã. O caminho ascendente, estreito e labiríntico entre casas e rostos rústicos, levaram-nos à sua última morada: a Igreja do Castelo, destacando-se verticalmente no horizonte, estrutura sólida, de porte majestoso mas sóbrio, combinando o estilo gótico com um interior “franciscano”, simples, mas verdadeiro.
As árvores morrem de pé. E as pessoas que amamos vivem dentro de nós.
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