sexta-feira, 6 de setembro de 2024

Guiné 61/74 - P25915: Nos...tal...gia(s): há 50 anos entregámos os nossos quartéis ao PAIGC e regressámos a casa (1): Buba, 4/9/1974 (António Alves da Cruz, ex-fur mil at inf, 1ª C/BCAÇ 4513/72, Buba, 1973/74)



Foto nº 1 > A velhinha e ferrugenta LDG 105, NRP Bombarda... um "elo de ligação a Bissau", o que queria a dizer, "do cu de Judas a Bissau, porta de saída para casa", a três horas de avião, ou cinco dias de barco... 

Foto fantástica (de antologia!)  com a malta e a tralha  a acomodar-se e a aprontar-se para partir, enquanto um "djubi" espreita, do pontão de abicagem, aquele monstro de ferro que fez as maravilhas de muitos de nós...  antigos combatentes... Se há viagem que quase ninguém poderá esquecer, mais do que as dos Niassa, dos Uige, dos Ana Malfalda... foram as de LGG e LDM pelos rios da Guiné... (A 6 dias da independêcia do territ6ório, "de jure et de facto", aquele "djubi" não parece nada alvoraçado com a perspetiva galganizante e histórica da chegada dos "libertadores" do PAIGC...Antes, pelo contrário, ele parece querer gritar aos "tugas": "Eh!, nos furié Cruz, leva djubi no barco grandi!).



Foto nº 2 >  Outra fota fabulosa!... Os últimos soldados do império e os seus trastes velhos, amontoados na LDG 105 NRP Bombarda, de saudosa memória para muitos de nõs, com as instalações militares de Buba ao fundo...

Guiné > Região de Quínara> Buba > 1ª C/BCAÇ 4513/72 (Bula, 1973/74)  


Fotos: © António Alves da Cruz (2024). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


António Alves Cruz


1. "Guiné 04/09/74: Faz hoje 50 anos que foi entregue Buba ao PAIGC e o nosso regresso a casa", escreveu o nosso grão-tabanqueiro António Alves da Cruz na sua página do Facebook...   

Não foram tempos fáceis, os dos últimos soldados do império... Como eu entendo o amargo comentário do Cruz: 

"Tanto sofrimento,  para quê ?!,,, A  entrega de Buba ao PAIGC, o arrear da nossa bandeira nacional,  e o hastear da bandeira do PAIGC"...

 António Alves da Cruz (ex-fur mil at inf, 1ª C/BCAÇ 4513/72, Buba, 1973/74) tem, no nosso blogue, o melhor álbum fotográfico sobre a Buba do seu tempo, incluindo a cerimónmia da desativação e entrega do aquartelamento ao PAIGC (*)

O dia 4 de setembro de 1974 foi  o último dia da sua estadia em Buba, na sequência da execução do plano de retracção do dispositivo e a desativação e entrega do aquartelamento ao PAIGC, de acordo com os compromissos assumidos no Acordo de Argel, assinado em 25 de agosto de 1974, e que fixou a independência da Guiné-Bissau em 10 de setembro desse ano.

Dois dias depois, a 6 de setembro de 1974, o António Alves da Cruz estava em casa (regresso de avião, através dos TAM - Transportes Aéreos Militares). Depois da "peluda", trabalhou na Lisnave. Desse tempo tem saudades, não da guerra,  mas dos seus verdes anos...Como todos nós.  E da sua "Lisnave". E do seu gato. E da Guiné só voltou a lembra-se quando se reformou. Como muitos de nós...

Há imagens que valem por mil palavras... Estas duas terão, obrigatoriamente, que figurar no álbum derradeiro da Tabanca Grande, que iremos organizar, quando um dia destes (não sabemos quando, mas esse dia há de chegar...) fecharmos de vez o nosso blogue... (Na realidade, vinte anos a blogar, é um quarto das nossas vidas, dez comissões na Guiné!)

Obrigado, Cruz, estas tuas duas fotos arrasaram-me, emocionalmente falando!... Para mais sempre detestei  o mês de setembro, o fim do verão, o fim das férias grandes, do "docle far niente", da irresponsabilidade, a estação terminal da alolescència,  a antecâmara do pecado, dos amores românticos e breves, das ejaculaçóes precoces, da vida adiada pela tropa e pela guerra, o adeus à casa paterna, a difícil aprendizagem da arte de ser homem, a descoberta da liberdade... 

Em contrapartida, as tuas fotos, a tua/nossa efeméride dos 50 anos das nossas "partidas derradeiras"... não vão para o lixo, para cesta secção do esquecimento... Pelo contrário, vão ser o ponto de partida para uma nova série dedicada à(s)  "Nos...tal...gia(s).  Também temos direito à nostalgia, à saudade, ao exorcismo, à catarse de emoções, sem temermos que nos acusem de... reacionários, saudosistas e outras palavras merdosas com que os portugueses adoram insultar-se uns aos outros, há pelo menos mil anos.
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Nota do editor:

(*) Vd. postes de:

29 de novembro de 2023 > Guiné 61/74 - P24896: Álbum fotográfico do António Alves da Cruz, ex-fur mil at inf, 1ª C/BCAÇ 4513/72 (Buba, 1973/74) (13): cerimónia da desactivação e entrega do aquartelamento ao PAIGC, em 4 de setembro de 1974 - Parte I

30 de novembro de 2023 > Guiné 61/74 - P24902: Álbum fotográfico do António Alves da Cruz, ex-fur mil at inf, 1ª C/BCAÇ 4513/72 (Buba, 1973/74) (14): Cerimónia da desactivação e entrega do aquartelamento ao PAIGC, em 4 de setembro de 1974 - Parte II

5 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Há ainda gente que, nunca tendo estado na Guiné, não percebeu por que é que a maior parte de nós, quando lá chegava, a coisa que mais secreta e intensamente desejava é que chegasse o mais depressa possível o dia do regresso a casa... E mesmo assim todos nos batemos galhardamente para salvar o pêlo, o nosso e o dos nossos camaradas... Nâo há guerras populares, e aquela decididamente nunca a foi. Nem no tempo do Spínola.

José Teixeira disse...

Foi ali que recebi o meu batismo de guerra. Foi nas matas de Buba, logo no dia seguinte que uma vida me fugiu das mãos. Foi ali na mata, que o Velho encontrou a morte, o Miguel e o Alzira ficaram sem uma perna. Ali ao lado que o Banha despediu-se da vida sem saber como aconteceu. Um furriel comando sentiu o som da bailarina pela primeira e última vez e se despediu da vida a que tinha direito. E tantos outros naquele tempo fatídico de 68/70. Meu Deus! Porquê? Para quê?

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Quem nunca esteve na Guiné, nem pisou aquelas picadas e chafurdou naquelas bolanhas, nunca entenderá este comentário do Zé Teixeira...(para mais, sendo um crente que pergunta: "Meu Deus! Porquê ? Para quê ?").

Anónimo disse...

Poucos dias antes, em 24 de Agosto do mesmo ano, chegávamos ( a Cart 6250) a Lisboa. Na verdade, a partir de Agosto de 1974, a evacuação das unidades militares portuguesas entra num ritmo cada vez mais acelerado, de barco e de avião, ao ponto de a diferença de um ano de comissão entre duas unidades não corresponder a mais de uma semana entre a partida da mais velha em relação à mais nova. Era assim que tinha de ser ou só assim poderia ser. Era quem mais desejava ardentemente fugir daquele pântano, até porque não se sabia até onde aquilo iria parar, face à sofreguidão do PAIGC em tomar conta da quinta. Lembro-me bem da algazarra que fizemos no caminho entre Mampatá e Buba. Alguns rapazinhos choravam ao verem-nos partir. Até vi um cão em Buba com ares de não querer deixar o soldado ir-se embora sem ele. O fim da guerra foi de uma indescritível felicidade para nós todos, excepto para alguns de uma elite bem acomodada. Também foi o dia de grande regozijo para os do PAIGC, porque terminou para os do mato o sofrimento, as mutilações e a morte ; para os mandantes, a hora dos galões e do poder. Tenho saudades da minha juventude, não do suor, das agruras, do sangue que vi correr e das vidas de vinte anos a fugirem de corpos dilacerados. Um grande abraço. Carvalho de Mampatá.

António J. P. Costa disse...

Aplaudo a visão/descrição do Carvalho de Mampatá! Um Ab. António J. P. Costa