segunda-feira, 2 de setembro de 2024

Guiné 61/74 - P25904: Notas de leitura (1723): Breve história da evangelização da Guiné (3) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 3 de Abril de 2023:

Queridos amigos,
Estamos chegados ao Estado Novo e os autores dão-nos conta das atividades desenvolvidas desde a Missão da Guiné, constituída em 1940, até praticamente aos finais do século XX. Esta Missão foi desafetada do bispado de Cabo Verde, começaram grandes desafios para Franciscanos e para as Franciscanas Hospitaleiras, estas ficaram à frente dos Asilos de Bor e Bafatá. Logo a seguir vieram os missionários italianos de duas ordens, dinamizou-se o trabalho na leprosaria de Cumura. Dinamizou-se a atividade educativa que, evidentemente, foi fustigada pela guerra de libertação, e que levou ao encerramento de muitas escolas missionárias. Com a libertação, Roma decide criar a diocese de Bissau, aumentaram as vocações sacerdotais e religiosas, nasceram novas missões, a evangelização abriu as causas da saúde, educação e da promoção da mulher, uma evangelização que abarca hospitais, uma leprosaria, um liceu diocesano e duas escolas profissionais médias. Esta monografia tem o mérito de atualizar o trabalho de referência do padre Henrique Pinto Rema.

Um abraço do
Mário



Breve história da evangelização da Guiné (3)

Mário Beja Santos

Já aqui se deu amplo acolhimento à obra magna do Padre Henrique Pinto Rema, "História das Missões Católicas na Guiné", dela até coligi um resumo para um livro que tenho em preparação sobre os textos fundamentais da presença portuguesa na Guiné. Mas também não se pode descurar outras iniciativas como esta "Breve História da Evangelização da Guiné", da autoria de dois franciscanos devotados a estudos guineenses. Trata-se de uma edição do Secretariado Nacional das Comemorações dos 5 Séculos, datada de maio de 1997. Os autores explicam o significado daquele ano jubilar, tem a ver com a deslocação de D. Frei Victoriano Portuense, há precisamente 300 anos, saiu da sua sede de diocese, na Cidade Velha, na ilha de Santiago, e foi visitar as comunidades cristãs da Guiné; o significado também abrange os 20 anos de existência da Diocese de Bissau.

Já estamos em plenos anos 1940 e 1950. Viviam-se tempos anteriores ao Concilio Vaticano II, a tolerância dialogante sobre valores existentes em todas as religiões eram palavras desconhecidas. A evangelização na Guiné não escapava à regra – religião única era apenas a cristã. Com boa vontade, talvez possamos encontrar duas pequenas exceções a esta regra: o interesse dos Franciscanos no século XVIII em conhecer os usos e costumes dos Pepéis da ilha de Bissau (o desejo de conhecer é o primeiro passo para o respeito e pelo diálogo subsequentes); na morte de Becampolo Có em Bissau, em finais do século XVII, como era cristão o corpo do rei foi sepultado na capela do hospício franciscano em Bissau – os pepéis condescenderam, mas exigiram e conseguiram obter dos frades que nas cerimónias do choro que se pudessem matar vacas, bem como beber e comer à vontade.

Falemos agora da Missão da Guiné, 1940. Em 4 de setembro desse ano, o Papa Pio XII separou definitivamente a Missão da Guiné do bispado de Cabo Verde, ao qual estivera ligado desde 1533. Autónoma nos seus destinos, já com duas congregações religiosas permanentes (Franciscanos portugueses e Franciscanas Hospitaleiras portuguesas) e com a perspetiva de se poder abrir a outras congregações, com uma nova organização missionária voltada para a evangelização e promoção social, a Missão da Guiné trazia amplas expetativas.

Em 1932, os Franciscanos portugueses foram quase obrigados a regressar onde, nos séculos anteriores tinham estado mais de 170 anos seguidos. Regressaram e estabeleceram quartel-general em Bula, sendo durante alguns anos os únicos missionários presentes no território. Mas “arrastaram” consigo as Irmãs Franciscanas Hospitaleiras portuguesas (logo em 1933), primeiramente em Bula e depois nos Asilos de Bor e Bafatá e no Hospital Central de Bissau. A seguir chegaram os missionários estrangeiros, os primeiros foram os missionários do Pontifício Instituto das Missões Estrangeiras, e com o seu precioso auxílio foi possível garantir melhor a assistência religiosa permanente a Geba-Bafatá, Bambadinca, Catió, Farim e Suzana. Em 1955, juntaram-se também à missionação os Franciscanos da província de Santo António de Veneza. Deste grupo faziam parte D. Settimio A. Ferrazzetta, o primeiro bispo de Bissau, e Frei Epifânio Cardin, que trabalhou na missão de Cumura. Em 1969, assumiram a direção da leprosaria. Mais tarde estenderiam a sua ação de bem fazer e de evangelização até Bolama, Biombo, Nhacra e Bissau. Também os Franciscanos italianos virão a “arrastar” consigo as Irmãs Franciscanas do Coração Imaculado de Maria, que chegarão à Guiné em 1970, trabalhando primeiro na leprosaria de Cumura e posteriormente em Quinhamel. Em 1969, chegavam à Prefeitura Apostólica da Guiné as Irmãs do Instituto do Santo Nome de Deus, italianas, que se instalaram em Suzana e em Bubaque até 1993.

A ação educativa missionária ir-se-á revelar do maior interesse. A partir da entrega do ensino primário não-oficial às Missões, muitas escolas espalharam-se pelo interior da Guiné. Para o regular funcionamento das aulas, os missionários socorreram-se de professores catequistas, formados sobretudo das escolas das missões de Bula e Bafatá.

Na assistência social e sanitária, foi igualmente relevante o papel das missões católicas em Bor, Bafatá, Bula, Bissau, sem esquecer os internatos menores de Bubaque, Mansoa, Quinhamel e Cumura. A guerra de libertação, como é facilmente compreensível, causou uma enorme perturbação da atividade missionária da Guiné. Muitas escolas missionárias tiveram de fechar as portas por falta de gente que as fizesse funcionar.

E assim chegamos à Diocese de Bissau (1977-1996). Pela Bula Rerum Catholicorum, de 21 de março de 1977, o Papa Paulo VI elevou a Prefeitura Apostólica da Guiné à dignidade de diocese. A sede ficou em Bissau, o seu templo principal é a igreja catedral de Nossa Senhora da Candelária.

Houve um fomento claro e decidido de vocações sacerdotais e religiosas no país. Em 1977 não havia um sacerdote autóctone, em 1997 eram 15. Após 1977 abriram-se mais 6 paróquias em Bissau e novas missões em Tite, Buba, Empada, Bedanda, Ingoré, Cacheu, Caió, Bajob, Betenta, Bigene, Nhoma, Bissorã, entre outras. É uma evangelização que não esquece a promoção social: na saúde, educação e promoção da mulher. Além de 3 hospitais de maiores proporções e de uma leprosaria, há uma trintena de pequenos centros onde diariamente as pessoas acorrem e onde bebés desnutridos ou adultos com toda a sorte de doenças ou problemas vêm procurar alívio.

Por fim, os autores resumem as atividades da educação e da promoção da mulher. A diocese possuiu já um liceu diocesano e duas escolas profissionais médias. Mais de 200 guineenses estudaram fora da Guiné com bolsas obtidas pela diocese, graças aos Amigos das Missões. Hoje as bolsas continuam a ser dadas, mas para estudos dentro do país, no liceu João XXIII e nas faculdades de Medicina e Direito em Bissau.

Trata-se pois de uma monografia que reatualiza o indispensável trabalho do padre Henrique Pinto Rema.


Igreja de Catió, agosto de 1973. Imagem retirada do blogue Arquivo Digital, com a devida vénia
Festa religiosa de Nossa Senhora de Fátima, Padroeira de Catió, 2014
Igreja de Nova Lamego (hoje Gabu), imagem retirada do nosso blogue
Imagem tirada durante a celebração de uma missa no Gabu, 2014
Administração do Crisma a jovens da Paróquia de Santa Isabel de Gabu
Cerimónia presidida pelo segundo bispo de Bissau, D. José Lampra Cá
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Notas do editor:

Vd. post anterior de 26 de agosto de 2024 > Guiné 61/74 - P25882: Notas de leitura (1721): Breve história da evangelização da Guiné (2) (Mário Beja Santos)

Último post da série de 30 de agosto de 2024 > Guiné 61/74 - P25896: Notas de leitura (1722): Factos passados na Costa da Guiné em meados do século XIX (e referidos no Boletim Official do Governo Geral de Cabo Verde, ano de 1873) (18) (Mário Beja Santos)

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