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domingo, 7 de setembro de 2025

Guiné 61/74 - P27191: A nossa guerra em números (38): Em 27 de maio de 1974, existiriam no CTIG 1960 "bombas de napalm" (1170 de 350 litros e 790 de 100 litros)... ou apenas os invólucros

FIAT G-91 R4 em voo. 
Foto: Mário Correia (editada por Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, 2025)


No TO da Guiné, pelo menos em 1972/73, de até à entrada dos Strela (março de 1973), 5%  das missões do Fiat G-91 eram de bombardeamento com napalm a objetivos estritamente militares (de acordo com a caderneta de voo do António Martins de Matos, cuja comissão vai de maio de 1972 a fevereiro de 1974)



Gráfico (nº 1)  com as missões de Fiat G-91 (a laranja) (n=386)  e DO-27 (a azul) (n=114), realizadas pelo então ten pilav António Martins de Matos (de maio de 1972 a fevereiro de 1974) (Total=500)  

Infografia: António Martins de Matos (2010) (**)

Legenda do autor:
  • A laranja estão as minhas missões em Fiat-G91, e a azul as de DO-27;
  • Nos meses de nov72 e ago73 estive de férias;
  • Os mísseis Strela apareceram em abr73;
  • Guidaje, Guileje e Gadamnael foram em maio/junho 73;
  • Canquelifá e Copé em janeiro de 1974.


Gráfico (nº 2)  com as missões de Fiat G-91, realizadas pelo então ten pilav António Martins de Matos (de maio de 1972 a fevereiro de 1974): missões de alerta (a laranja)(n=78)  e missões planeadas (a verde)(n=308). Total=386

Infografia: António Martins de Matos (2010) (**)

Legenda do autor:

  • As missões a verde eram planeadas,  de véspera (por ex. ida a Cumbamori, no Senegal);
  • As missões a laranja eram as solicitadas pela rede do Exército para apoio urgente;
  • Em termos práticos representam o número de quartéis a quem fui dar apoio imediato (n=78);
  • Quanto mais “laranja” apresentar o gráfico,  tanto mais violenta estaria a guerra;
  • Em maio73 o apoio foi maioritariamente a Guidage e Guileje; em janeiro74 a Canquelifá e Copá.

I.  O nosso tabanqueiro António Martins de Matos, ex-ten pilav, BA 12, Bissalanca, 1972/74, hoje ten gen ref, não podia ser mais claro ao comentar no poste P27184 (*):


Da minha caderneta de voo, [ constam ] 17 missões napalm, entre 20mai72 e 1fev73 [ em oito meses,  foram 2 em média, por mês ].
 
Os alvos eram instalações dissimuladas nas orlas das matas. 

Como agora em Gaza, “à procura do Hamas, a população a sofrer”.  É sempre assim.

AMM

sexta-feira, 5 de setembro de 2025 às 14:12:18 WEST

Recorde-se que o AMM era o nº 2, na escala hierárquica da Esquadra 121 (Fiat G-91, T-6 e DO-27), tendo 6 pilotos de Fiat, "Os Tigres", que voavam também um dos outros aviões; e mais 14 pilotos, milicianos, alferes e furriéis, que voavam indistintamente o T-6 e o DO-27.

O número de missões que executou no Fiat G-91, de maio de 1972 a fevereiro de 1974, com dois meses de férias (novembro de 1972 e agosto de 1973) totalizou as 386 (77% do total, Fiat G-91 + DO-27)... 

As 17 missões com napalm representam apenas 4,4% do total das missões com Fiat G-91, realizadas até fevereiro de 1973 (**).
 
Segundo o António Martins de Matos, deixaram-se de realizar bombardeamentos de napalm a partir de março de 1973, quando os Strela passaram a ser usados pelo IN.

De qualquer modo, as suas missões  dos Fiat G-91 intensificaram-se, na segunda metade da comissão, apesar do aparecimento do Strela nos céus da Guiné. O que só prova que o PAIGC não "calou" a FAP, e muito menos o ten pilav António Martins de Matos; mandou para o "estaleiro" o Miguel Pessoa, mas também não o "arrumou", porque ele voltou ao CTIG...).

II. Sabemos, por outro lado, que no final da guerra havia, na BA 12, Bissalanca, na Guiné, um "pequeno arsenal" de bombas de napalm (ou, pelo ,menos os seus "invólucros", segundo o testemunho do nosso António Martins de Matos)...  

Reproduz-se a seguir um  documento  que vai ter que passar pelo crivo do contraditório:

 

Repartição de Operações 

AO GENERAL CHEFE DO ESTADO-MAIOR GENERAL DAS FORÇAS ARMADAS 

Nº 10.078/C 

 PARA CONHECIMENTO: 

Pº  CZACVG 

ASSUNTO: BOMBAS NAPALM

 1. Existem no TO.

 – 1170 bombas NAP de 350 litros

 – 790       "          "   de 100 litros


2. Dado que, pelo seu volume, não é possível subtraí-las das vistas a possíveis observadores, e ainda porque a utilização de Napalm tem sido motivo de acérrimas críticas feitas pelo In, na sua campanha diplomática e psicológica, torna-se necessário retirá-las do TO.

3. De contacto havido entre a ZACVG e o Estado-Maior da Força Aérea foi estabelecido, com o que este Comando concorda, que as bombas em referência fossem transportadas para a Ilha do Sal, de onde lhes seria dado posterior destino, salvaguardando, no entanto, uma dotação de emergência, a manter no TO. 

4. Solicita-se a V. Exa. uma decisão sobre o assunto. 

Bissau, 27 de Maio de 1974 

O COMANDANTE-CHEFE 

CARLOS ALBERTO IDÃES SOARES FABIÃO, BRIGADEIRO 


III. O documento que acima se transcreve é um dos quatro que os investigadores António de Araújo e António Duarte Silva  publicam em artigo de 2009, numa publicação académica ("O uso de napalm na Guerra Colonial - quatro documentos", Relações Internacionais R:I, n.º 22, junho de 2009, pp. 121-139). (***)

Os documentos reproduzidos pelos autores foram localizados no Arquivo da Defesa Nacional, em Paço de Arcos, onde se encontram sob a cota Cx. 1011, 1011/12, tendo sido desclassificados, a seu pedido,  por despacho de 17 de setembro de 2008. 

O documento em questão (o n º 2 de 4):

(i) é um oficio em papel timbrado do Comando-Chefe das Forças Armadas da Guiné (Quartel-General – Repartição de Operações), classificado «Secreto», datado de Bissau, 27 de Maio de 1974;

(ii) está assinado pelo comandante-chefe, brigadeiro graduado Carlos Alberto Idães Soares Fabião;

(iii) é um ofício, os dactilografado, de uma página, dirigido ao chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, gen Costa Gomes; 

(iv)  Com conhecimento ao Comando da Zona Aérea de Cabo Verde e Guiné (CZACVG);

(v) em que se solicita instruções quanto ao destino a dar às "bombas de napalm" (sic) existentes no CTIG (1170 bombas NAP de 350 litros e 790 bombas NAP de 100 litros). 

(v) possui um carimbo a óleo que certifica a sua recepção no Gabinete do Estado-Maior General das Forças Armadas, em 6 de junho de 1974, com as indicações «Pº 2034, N.º 3107»:

(vi) à margem, encontra-se exarado um despacho manuscrito, do seguinte teor: «Urgente. Ao CEMFA para proceder de acordo com o n.º 3. Lisboa 15-6-74. ass). Francisco da Costa Gomes». 

Nesse ofício, sugere-se a  transferência das "bombas de napalm" (sic) para a ilha do Sal, em Cabo Verde, salvaguardando-se, todavia, uma «dotação de emergência» (sic), que permaneceria no CTIG.  Esta sugestão é feita após ter sido estabelecido um contacto com o Estado-Maior da Força Aérea. 

De acordo com o despacho manuscrito, de 15 de junho de 1974, os autores inferem  que tal sugestão foi acolhida (não se podendo no entanto saber qual foi o destino final dado ao material).

Citemos ainda os autores, a respeito do uso do napalm no teatro da guerra do ultramar:

(...) "Apesar de ainda ser controversa, a presença de bombas incendiárias nos territórios portugueses em África é relativamente conhecida, não tendo, porém, sido divulgados, ao que sabemos, elementos comprovativos da sua utilização em combate por parte das Forças Armadas Portuguesas. (...)

 Mário Canongia Lopes («A história do F-84 na Força Aérea Portuguesa». In Mais Alto. Revista da Força Aérea. Suplemento. Ano XXVI. N.º 258. Março-Abril de 1989, p. 12), citado pelos autores,  "afirma ter sido o napalm 'utilizado contra objectivos militares bem definidos, tais como posições de artilharia antiaérea (AAA) ou veículos', acrescentando que o napalm era carregado 'em depósitos de origem americana de 750lbs. [340 kgs] ou portuguesa de 660 lbs. [300 kgs] sendo o pó [combustível] fornecido por Israel' ".

" (...) Por outro lado, é reconhecido o uso de bombas de 50 quilos e de 60 litros de napalm em certas operações de destruição de meios antiaéreos do PAIGC (por exemplo, nas operações com o nome de código «Resgate» e «Estoque»)" (Fonte citada pelos autores: Luís Alves Fraga, "A Força Aérea na Guerra em África – Angola, Guiné e Moçambique (1961-1974)". Lisboa: Prefácio, 2004, pp. 109-111).

Não restam dúvidas, que os documentos publicados por António Araújo e António Duarte Silva.   "permitem afirmar, com um elevado grau de fiabilidade, que, pelo menos até meados de 1973, as Forças  Armadas Portuguesas utilizaram napalm e outras bombas incendiárias nos três teatros de operações em África." (...)

Veremos, em próximo poste, com mais detalhe os outros documentos (nº 1, 3 e 4). Mas, para já,  adiantaremos, citando  os autores, que "a Guiné era o território onde mais se recorria a este tipo de armamento", sendo "o consumo médio mensal" o seguinte;

  • 42 bombas incendiárias de 300 quilos;
  • 72 bombas incendiárias de 80 quilos; 
  • 273 granadas incendiárias M/64
Convertido em litros de napalm, teríamos um consumo médio mensal de 22 mil litros de napalm. Total anual médio (estimado): 264 mil...  (****)

A utilização de napalm no TO da Guiné, por parte de Portugal, foi repetidas vezes denunciada por Amílcar Cabral nas instâncias internacionais, e nomeadamente na ONU (Comissão de Descolonização, Comissão de Direitos do Homem, Assembleia Geral, Conselho de Segurança),  tendo-se tornado um cavalo de batalha na frente diplomática e uma dor de cabeça para o governo português.   

Os autores estranham que "Costa Gomes haja afirmado nada saber quanto ao uso de napalm na Guiné".

 Já quanto a António de Spínola, escrevem que, "apesar de nunca se ter pronunciado expressamente sobre o tema (...)  havia reconhecido, numa entrevista concedida a Peter Hannes Lehman, da revista alemã Stern, que as armas químicas eram usadas 'para limpar o mato de ambos os lados das estradas, para evitar emboscadas' " (o que nos parece uma "blague").

IV. Comentário de António Martins de Matos, âs 11.15 de hoje:

.(...) Na Guiné, em 1974 não existiam 1960 bombas napalm, quanto muito os seus invólucros, vazios. Ainda menos os fantásticos meio milhão de litros, capazes de incendiar a Terra.

 O napalm era fabricado apenas e só na quantidade necessária para as saídas programadas.

Isto para dizer que:

  • Em 1974, havia na Guiné zero bombas napalm, apenas invólucros;
  • Napalm larga-se junto à copa das árvores;
  • Em 1974, e por via do Strela, deixou de ser utilizado;
  • Napalm em stock, só no ChatGPT;
  •  O ChatGPT é uma merda;
  • O Brig Fabião sabia de napalm tanto ou menos que eu sei de submarinos;
  • O Blogue costumava ser mais cuidadoso com o que vai divulgando;
  • Não gostei de ver a minha foto num poste tão aldrabado.(...)
 
domingo, 7 de setembro de 2025 às 11:15:00 WEST 

3. Comentário do editor LG

Obrigado, António.

Tens toda razão, devia ter-te consultado previamente, a ti e ao Miguel Pessoa. Vou tentar,  se possível,  reparar os estragos. E ter mais cuidado no futuro...Retiro a tua foto, mas os gráficos são oportunos e elucidativos...O documento do QG/CIFAG reproduzido existe (foi publicado num artigo académico, que eu cito).  Os autores deveriam também ter mais cuidado no que escreveram, levando o leitor, leigo como eu,  a confundir "bombas" com "invólucros"... 

Acredito que o Carlos Fabião soubesse pouco ou nada de napalm... Eu ainda menos sei, que não andei na Academia Militar.  Eliminei a segunda parte do poste, baseada em pesquisas do assistente de IA... 

Apresento as minhas desculpas à malta da FAP, e aos nossos leitores.  Aceita tu, também, as minhas desculpas. E os protestos da minha amizade e camaradagem. Luís

Observações - Posso concluir, depois das explicações dadas pelo ten gen ref António Martins de Matos, que, a Guiné, durante a guerra colonial, o napalm não vinha em “bombas” prontas a largar, como  muitos "leigos" (como eu) imaginam.

O que havia eram invólucros ou depósitos (bombas de queda livre, por exemplo de 350 ou 100 litros) que podiam ser carregados com diferentes recheios. 

O napalm era preparado localmente, “na hora”, a partir de gasolina misturada com espessantes (por vezes alumínio em pó ou sabões metálicos) que lhe davam a consistência gelatinosa e adesiva.

Assim, o “stock" mantido era sobretudo de gasolina e aditivos, não de bombas já cheias de napalm. O enchimento dos invólucros era feito na BA 12, Bissalanca, conforme a necessidade das operações. Daí a confusão que por vezes se gera entre o conceito de bomba (o invólucro, reutilizável em termos logísticos) e o de carga incendiária (o napalm, preparado "ad hoc")

Obrigado, António, pela lição. Espero não ter dececionado o professor, com este resumo.


(Revisão / fixação de texto, negritos: LG)

______________



(i) é a revista do Instituto Português de Relações Internacionais, da Universidade NOVA de Lisboa (IPRI-NOVA), 

(ii)  é publicada desde março de 2004;:

(iii) é uma publicação académica trimestral, de reflexão e debate sobre questões internacionais;

(iv) tem como objetivos abordar as grandes questões da atualidade internacional numa perspetiva pluralista e multidisciplinar, e fomentar o debate teórico na área das Relações Internacionais;

(v) áreas primordiais de publicação: política internacional, história, estratégia, segurança e defesa, política comparada, economia, direito internacional.


4 comentários:

António Martins Matos disse...

Mais um Post com demasiados disparates e algumas ”invenções”.
Na Guiné, em 1974 não existiam 1960 bombas napalm, quanto muito os seus invólucros, vazios. Ainda menos os fantásticos meio milhão de litros, capazes de incendiar a Terra. O napalm era fabricado apenas e só na quantidade necessária para as saídas programadas.
Isto para dizer que:
. Em 1974, havia na Guiné ZERO BOMBAS NAPALM, apenas invólucros;
- Napalm larga-se junto à copa das árvores, Em 1974, e por via do STRELA, deixou de ser utilizado;
- Napalm em stock, só no ChatGPT;
- O Brig. Fabião sabia de napalm tanto ou menos que eu sei de submarinos;
. O Blogue costumava ser mais cuidadoso com o que vai divulgando;
- Titulos bombásticos é no Correio da Manhã;
- O ChatGPT é uma merda;
- Aquele Fiat G91 do Post , o 5443, é um R-3, nunca foi a África;
- Não gostei de ver o meu texto corrigido, a necessitar confirmação. De quem?
- Não gostei de ver a minha foto num Post tão aldrabado.
Cumprimentos
AMM

Eduardo Estrela disse...

O Napalm foi usado em missões de bombardeamento aéreo na guerra da Guiné , ponto!!
Presumo que questões de quantidade e de conhecimentos acerca do mesmo em 1974 não sejam assim tão importantes.
Abraço
Eduardo Estrela

José Botelho Colaço disse...

O tenente general Martins de Matos que eu conheço pessoalmente dos convívios da tabanca da linha é "pão pão queijo queijo" não gosta e com toda a razão que alguém altere aquilo que ele viu e viveu e com muita razão. Também detesto alguns "historiadores" que querem impor a sua verdade falsa. Abraço amigo.

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Não alterei nada...apenas expressei uma dúvida sobre o período a que correspondiam as 17 missões de bombardeamentos com napalm: está certo, é de maio de 72 a fevereiro de 73; a partir dos Strela não há mais bombardeamentos dos Fiat G-91 a rasar a copa das árvores.. Obrigado ao António pelo esclarecimento, que foi muito importante para mim e os nossos leitores... E para a História!... O Napalm ocupou apenas 4,4% do seu precioso tempo como bravo piloto do Fita G-91, no CTIG.