Madrid > Museu do Prado > Francisco Goya (1746-1828) > 1814 > O 3 de Maio [de 1808: o fusilamento dos patriotas, defensores de Madrid, às mãos do exército napoleónico]. Quadro a óleo.
Fonte: Wikipedia: the Free Encyclopedia (Imagem do domínio público).
46ª Parte da série Operação Macaréu à Vista, da autoria de Beja Santos (ex-alf mil, comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) (1). Texto enviado a 27 de Abril de 2007. Subtítulos do editor do blogue.
Caro Luís, já li o episódio que hoje publicaste e agradeço do coração o teu desvelo. Os livros já seguiram. Prevejo que amanhã vamos viver uma heróica e pacífica jornada e eu preciso de receber alento para os episódios das próximas semanas, tal o cansaço e o sofrimento que me está reservado para estes úlitmos meses em Missirá. Recebe a gratidão do Mário.
O reencontro em Sinchã Corubal
por Beja Santos
Eram homens para encarar as trevas de frente. ("Coração das Trevas", por Joseph Conrad)
Convoco de surpresa Domingos da Silva, Nhaga Macque e Benjamim Lopes da Costa para trabalharmos pelas 11h da noite naquele dia de 16 de Maio [de 1969]. Tenho uma confiança ilimitada nos meus três cabos africanos e pretendo transmitir-lhes cuidadosamente o modo de actuação que quero que se venha a adoptar na emboscada nocturna que iremos desencadear em breve à volta de Sinchã Corubal.
Não há dúvida que a gente de Madina [, sita a noroeste do Mato Cão, com Sinchã Corubal pelo meio,]percorre com desfaçatez duas picadas que vêm de Cabuca (qualquer coisa como a dois quilómetros do acampamento de Madina) e à volta do rio de Ganturandim avançam em direcção à estrada de Saliquinhé/Mato de Cão/Gambaná e daqui vão até aos Nhabijões ou a Mero/Santa Helena para se reabastecerem e colherem informações.
Quando a gente de Madina vinha a Bambadinca abastecer-se de tabaco, cola e comida
Passados estes anos todos, continuo intrigado quanto à periodicidade e finalidades destas viagens. Em novo frente-a-frente com Queta Baldé, volto a questioná-lo mas a sua resposta mantém-se inalterável:
- Nosso alfero, eles pretendiam tabaco, cola e comida que não há no mato, trocando com o que produziam em alimentos e esteiras. Queriam informações sobre quem estava em Missirá, porque nunca acreditaram que dois pelotões africanos fossem diariamente a Mato de Cão, pensavam que havia ali uma companhia. Vinham mais civis que militares, aprendi nos Comandos que punham à frente dois apontadores de RPG2 e mais alguns com Kalash, depois vinham civis com os produtos para trocar. Fugiam do contacto connosco porque sabiam que íamos a Mato de Cão a qualquer hora do dia ou da noite e que emboscávamos à volta de Missirá e Finete. Quando souberam que havia patrulhamentos à volta do Geba, entre Boa Esperança e Aldeia do Cuor, rodearam-se de cautelas e esperavam horas e horas a ver se havia movimento do nosso lado. Mas tinham que desafiar este perigo para vir até Bambadinca para comprar e espiar. Não imaginaram que quando nosso alfero ia a Mato de Cão aproveitava para lhe conhecer os caminhos. Esta maneira de trabalhar no PAIGC via-a também em Gâmbara, na região de Quínara, quando o Spínola mandou a 2º Companhia de Comandos fazer um quartel no mato. Quando os soldados do PAIGC queriam saber coisas a nosso respeito, deixavam as armas num esconderijo, punham um pano à volta do tronco e entravam a rir no nosso quartel, dizendo que vinham fazer compras. Depois partiam e as ordens do Spínola é quem entrava e saía sem armas não devia ser preso.
Mando sentar os três cabos africanos e revelo-lhes os meus planos. Em breve, pode ser esta madrugada, partiremos para um patrulhamento ofensivo. Pretendo esperar a gente e Madina já perto do seu acampamento, na região de Sinchã Corubal. Se o reencontro tiver lugar de dia, estarei rodeado dos apontadores de dilagramas e dos bazuqueiros, quero fogo infernal para intimidar e depois fugimos. Se o reencontro tiver lugar de noite, faz-se terror e também fugimos imediatamente. Emboscaremos as vezes que for preciso, serão patrulhamentos em que levaremos o dobro das munições e obrigatoriamente rações de combate e dois a três cantis de água. Quem decide o fogo e a retirada sou eu.
Quero que aquelas instruções sejam transmitidas vezes sem conta mas só antes de sairmos de Missirá e até lá exijo a todos a boca fechada. Segue-se um período de perguntas. O Domingos pergunta-me se vai o enfermeiro e a resposta é afirmativa. O Benjamim sugere o rádio ao que respondo que é uma brutalidade andar com aquela tonelada às costas a correr de noite sabe-se lá com que lama nos pés. Todos dizem que estão esclarecidos, e aproveito a energia que me resta para escrever aerogramas para os meus entes queridos. O que se segue está registado num aerograma que enviei à Cristina, a 19 [de Maio de 1969].
Um homem fisicamente esgotado, que cai à cama e descobre... o Alexandre O'Neil
Levanto-me para pedir um leite achocolatado e esbarro na escuridão de uma vertigem, ainda guardei nos ouvidos o grito do Cherno quando me viu estatelar-me com estrondo na secretária de onde saltam o livro da contabilidade da cantina e a papelada das burocracias de Bambadinca. A única lembrança é a expressão do David Payne debruçado sobre o meu catre.
- Meu velho, estás mesmo fraquinho. O Adão apareceu-me aos gritos logo de manhã a dizer que devias estar morto pois não te sentia o pulso. Tens a tensão arterial muito baixa, chega de puxar pelo corpo até ao impossível. Para já, vais tomar café, ficas na horizontal e vais tomar vitaminas. Se essas aguilhoadas no coração aumentarem, falamos pela rádio e posso decidir a tua evacuação. Ganha juízo.
Ganhei e não ganhei. Estava, de facto, fisicamente tão derribado que o primeiro dia na cama foi um consolo, portei-me como se estivesse num hotel de luxo. O Ruy Cinatti tinha enviado a obra do Alexandre O'Neill intitulada No Reino da Dinamarca, coligindo toda a sua obra poética entre 1951 e 65. Assim que a cabeça deixou de andar à roda, atirei-me ao encantamento poético deste recém descoberto O'Neill. Os primeiros livros deixaram-me impassível. A partir de 62, o caso fiou mais fino. Logo o "Auto-retrato" no livro de 1962, coisa demasiado nova a aguar-me a vontade de inserir-me neste turbilhão linguístico:
"O'Neill (Alexandre), moreno português,
cabelo asa de corvo; da angústia da cara,
nariguete que sobrepuja de través
a ferida desdinhosa e não cicratizada..."
E vou por aí fora, deslumbrado pela lufada de ar fresco. Por exemplo, o poema "Os Atacadores":
A noiva já e noiva, a noiva já na igreja
e tu não encontras os atacadores!
Já viste na caixa dos sobejos, na mãos dos bocejos?
Já viste na caixa da cómoda?
Já viste nas pregas da imaginação?
Convém-te não encontrar os atacadores?
Há noivas que esperam até murcharem as flores,
noivas de pé, muito brancas e já a fazer beicinho...
Procura... procura sempre, pobrezinho!...
Procura mas não encontres os
atacadores...
E chegamos à poesia de 1965, "Portugal":
Ó Portugal, se fosses só três sílabas,
linda vista para o mar,
Minho verde, Algarve de cal,
jerico rapando o espinhaço da terra,
surdo e miudinho,
moínho abraços com vento
testarudo, mas embolado, e afinal, amigo,
se fosses só o sal, o sol, o sul,
o ladino pardal, o manso boi coloquial,
o rechinante sardinha,
a desancada varina,
o plumitivo ladrilhado de lindos adjectivos,
a muda queixa amendoada
duns olhos pestanítidos...
O'Neill vem juntar-se a outros contemporâneos do meu culto, ao Herberto Hélder e ao Cesariny. Mais uma vez obrigado, Ruy!
Capa do romance policial, A Raposa Que Ri, da autoria de Frank Gruber.
Foto: Luís Graça & Camaradas da Guiné (2007).
Ao segundo dia, a cabeça anda agitada, o Casanova entra e sai, não páro de o chamar, quero saber se Missirá está no mesmo sítio e a vida prossegue em espiral. Recebo dois soldados recém-chegados, um que se chama Sadjo Baldé, nome idêntico àquele que morreu desfeito por uma morteirada em 19 de Março e Queba Baldé, que vem de Badora. O Pires lê-me o correio que vem de Bissau onde fico a saber que o soldado Jalique Baldé, rejeitado pela tropa especial, foi colocado em Missirá, onde chegará em breve. Recebo o régulo, tomamos chá juntos, e dou comigo a aprovar a ideia de se fazer uma construção protectora para o túmulo de seu pai, o régulo Bacari Soncó.
Leio policiais, um divertídissimo Frank Gruber, A Raposa que ri, mais uma história hilariante envolvendo Johnny Fletcher e Sam Cragg, um intelectual e outro musculado que andam de feira em feira a vender um livreco sobre as artes de ter um corpo de Sansão... inevitavelmente, há crimes, a dupla corre o risco de ser incriminada por homicídio e a super inteligência de Fletcher leva a descobrir um velho mistério que é o desaparecimento de Chester Erb, o filho do multimilionário que vai reaparecer no congresso dos criadores de gado, em Cedar City, onde se passam todas estas façanhas.
Ao terceiro dia arrebito e dou a saber que irei fazer emboscada nocturna. E, no dia seguinte, aviso que irei a Mato de Cão. Começou o tempo dos patrulhamentos ofensivos. Um comboio de navios passou à hora aprazada, pelas 11 da manhã, saúdo-os no pontão do ancoradouro e dou instruções ao picador Quebá Soncó:
- Subimos agora o palmeiral de Mato de Cão e vamos ver a velha picada que leva a Sinchã Corubal [, na margem esquerda do Rio Ganturandim, afluente do Rio Geba]. Se descobrirmos um trilho batido, avise-me imediatamente pois não quero que ninguém deixe marcas perto. Se eles descobrem que nós já sabemos o caminho, temos que recomeçar tudo de novo.
Emboscados na bolanha de Sinchã Corubal, a sudeste de Madina
Felizmente que está de chuva, a progressão é lenta porque o capim fere e entrava o passo. Não há sinal de vida, o trilho está mesmo abandonado. Entramos pela orla do palmeiral de Sinchã Corubal, uma verdadeira boca de serpente e subimos como se fôssemos em direcção a Madina. Nada, quem manda ali é a Natureza, as lianas, velhos campos de cultura abandonados, águas estagnadas. Cibo Indjai conversa comigo:
-Vês alfero, as aves piam, não há gente, passou ali gazela, ninguém vive aqui, ninguém passa por aqui.
Em frente a Cabuca, descemos lentamente como se fôssemos Iaricunda, e Quebá Soncó mostra o alívio no rosto, como se tivessemos escapado da catástrofe, ele teme que eu avance de rompante com mais 30 homens e desafie a céu aberto um bigrupo... É na descida à volta do rio de Ganturandim que subitamente Quebá levanta a pica a fazer-me sinal. Fui ver. Era um trilho bem marcado por sandálias de plástico marcadas na lama humedecida. Flanqueando à distância o trilho fomos vendo até aonde ele descia. Olhando a carta, a minha velha carta que se vai desfazendo de tanto manuseio, embora suporte com o desgaste mesmo metida num invólucro de plástico, reparo que a gente de Madina/Belel vai pela velha picada , ou muito perto até estrada de S. Belchior. Seguindo o seu rasto, vamos ver que a picada atravessa a bolanha do Ganturandim e chega ao Geba. As pegadas mais recentes vão em direcção a Madina. Decido que hoje não vale a pena esperar. Amanhã, o barco passa cerca do meio dia, então sim teremos emboscada em Sinchã Corubal e ficaremos lá nem que sejam 48 horas. E assim foi.
Os batelões com material da engenharia e dois barcos civis passam à hora certa, é aqui que acaba o patrulhamento diário e começa o propósito de me reencontrar com Corca Só e agradecer-lhe a cartinha amável que me deixou a ameaçar-me de morte.
São 17 horas de 27 de Maio quando, depois de subirmos a bolanha de Ganturandim estamos posicionados do outro lado da bolanha de Sinchã Corubal. O lusco fusco anuncia-se num céu que já de si tem estado plúmbeo. O que recordo desse dia passo a escrever. Estamos dentro do trilho de Madina, tenho Tomani Sanhá e Mamadu Djau de pé com as bazucas engatilhadas; Cherno Suane tira cargas do morteiro 60 a apalpa o colar de granadas que traz do pescoço ao peito; Queta Baldé examina as fitas da HK21; Mamadu Camará prime os cartuchos e olha com orgulho os seus dez carregadores. E as trevas cobrem totalmente a força emboscada, estamos entregues aos acasos do destino.
A noite vai alta, ouvem-se pequenos ruídos da comida e do líquido a correr dos cantis para os nossos corpos. De vez em quando, um ruído longínquo para lá do Xime, um piar de uma ave, os estalos de matéria viva no arvoredo. As horas passam, é quando temo que a perigosa descontracção arrefeça a vigilância. É nisto que Mamadu Djau com a sua mão direita feita garra me traz à vida agarrando-se ao meu ombro e ciciando:
-Alfero, oiço gente a entrar neste mato.
E de repente, Goya e os fuzilamentos do 3 de Maio
Faço passar a palavra de que sou eu o primeiro a disparar. Um restolhar leve transforma-se num passo cadenciado e como se tivesse aberto uma porta na floresta vários vultos recortam-se na orla tenuemente iluminada pela lua. Os meus nervos resistem, deixo aquela passada toda avançar resoluta, sem suspeitar que a 100 metros está uma zona de morte. De 100 metros passa-se a 50, é mais de uma dezena o número de vultos que consigo distinguir. E no silêncio absoluto daquela mata, levanto-me e desfecho dois carregadores com a garganta seca e o olhar fixo. O fogo brutal das bazucas, dilagramas e morteiro fazem o resto.
Ouvem-se gritos de surpresa, levantam-se braços e durante anos, quando rememorava a noite de Sinchã Corubal, eu pensava sempre no quadro de Goya O massacre de 3 de Maio, não me perguntem porquê, não vi nenhum olhar aterrado, só ouvi o clamor dos gritos aterrorizados pela surpresa, a fuga entre o estampido que flagelava a noite, não sei se há mortos nem feridos, nós só viemos aqui para dizer a Madina que circulamos por onde queremos, que no quartel de Missirá não se treme de medo, somos caçadores e não vamos só a Mato de Cão.
São minutos que demoram horas, e depois do caudal de fogo e da incapacidade de resposta, vendo que o colar de granadas de Cherno está reduzida a quase nada, lanço um grito medonho e assinalo a retirada. O meu maior espanto é como é que os nossos pés voam no patinhado do próprio trilho, sem cuidar sequer na hipótese de um reencontro com um grupo que viesse dos Nhabijões para Madina...
Em menos de uma hora estávamos na estrada, em minutos conferimos o grupo só me lembro dos rostos perlados de suor, reflectido pelo luar. E em passo estugado, por vezes a correr, de Saliquinhé chegámos a Gambaná, daqui até à curva de Canturé, depois dez minutos a recuperar energias, nova correria até à outra curva de Canturé, daqui a Gã Gémeos, depois Sansão e na porta de armas de Missirá todos os soldados sem excepção, o régulo, o clã Soncó e o clã Mané aguardam-nos com a ansiedade estampada. Abraço Malã e digo-lhe:
-Correu tudo bem, vamos dormir que amanhã há muita coisa para fazer.
Há sorrisos, contam-se histórias, atrevo-me a perguntar ao Barbosa o que se passa com a boina verde...Foi muita emoção, peço a todos que não se esqueçam que a madrugada está a chegar ao fim. Não voltaremos a emboscar desta maneira, e enquanto se ouve o troar dos morteiros em Madina, sabe-se lá se à nossa procura, sabe-se lá a lembrar-nos o seu poderio dentro daquela floresta, fomos descansar um pouco. Eu não acredito que aquela emboscada aconteceu, não me interessa a contabilidade dos mortos e feridos, a mensagem para dentro de Madina chegou ao destinatário. Retiro a farda encharcada e só recordo, antes de cair de borco na cama, uma pergunta do Cherno se eu queria a luz acessa para ler...
Vou demorar semanas a dimensionar o nosso feito. Porque o galope dos acontecimentos vai alterar tudo logo no dia seguinte. A 28 de Maio, no sector L1 ganhámos consciência que o PAIGC estava forte, suficientemente forte para alterar as regras do jogo: Bambadinca vai sofrer um enorme susto, de Junho em diante não passaremos sem morteiradas sobre Missirá. Entretanto, prossigo alheio a outros perigos: a tropa está exausta, o Casanova adoece, este ritmo de guerra avassala os ânimos, no fundo este ritmo vertiginoso está a ferir as nossas consciências, a queimar os corpos. Pagarei bem caro esta falta de atenção, tanto em Missirá como em Finete.
__________
Nota de L.G.:
(1) Vd. último post desta série > 11 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1748: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (45): A visita do Coronel, o Grande Inquiridor
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
domingo, 20 de maio de 2007
Guiné 63/74 - P1769: Estórias do Gabu (4): O Capitão Comando João Bacar Jaló pondo em sentido um major de operações (Tino Neves)
1. Texto do Tino Neves , ex-1º Cabo Escriturário, CCS/BCAÇ 2893, Nova Lamego (Gabú)1969/71. Enviado em 14 de Março de 2007.
Camarada Luís: Aí vai uma pequena estória (1) do Capitão Comando João Bacar Jaló. Tino Neves.
Um dia passou por Nova Lamego uma coluna de géneros, e parou/estacionou junto do edifício do Comando do Batalhão. O nosso Major de Operações, ao passar na varanda, repara nas viaturas que estavam em baixo cheias de géneros e de militares dos Comandos Africanos, mas o que lhe despertou mais atenção foi, num Sargento, as divisas bem reluzentes e o chapéu à Gringo (chapéu preto, redondo com borlinhas penduradas a todo o perímetro das abas). De imediato chamou pelo Sargento e ordenou-lhe que tirasse aquele chapéu da cabeça, e pusesse a boina ou o quico pertencente ao camuflado.
O Sargento, respondendo ao chamado, levantou-se de imediato, e ficando de pé em cima de um saco de géneros, bateu a pala, aliás bateu a aba (do chapéu), e respondeu que não o tirava. O Major, teimando na ordem para que tirasse aquele chapéu, o Sargento justificou-se porque não o tirava.
- Meu Major, não tiro este chapéu porque sou conhecido através dele, e este chapéu já me salvou a vida por várias vezes!
- Não me interessa! Quem é o seu Comandante e onde está? - inquiriu, autoritário, o major.
- O meu Comandante é o Sr. Capitão João Bacar Jaló, e está precisamente aí em cima a falar com o seu Comandante!
Não me recordo se o Capitão João Bacar Jaló ouviu o que se estava a passar, ou se o Major foi fazer queixas do Sargento ao Capitão, o certo é que o Capitão Jaló deu um raspanete ao Major, dizendo que quem mandava nos seus homens era ele, mais ninguém, e se isso voltasse a acontecer, que iria fazer queixa do Major ao Gen Spínola. E nisto e deitou as mão à camisa, abrindo-a, mostrando o seu corpo nu, cheio de cicatrizes de balas e estilhaços, para que o Major visse o peito dum verdadeiro combatente.
E assim, não só o nosso Major de Operações, como todos nós ficámos a conhecer o celebre Capitão Comando Africano JOÃO BACAR JALÓ.
Um Abraço
Tino Neves
Almada
_________
Nota de L. G.:
(1) Vd. post de 21 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1683: Estórias do Gabu (3): Um capitão, amigo do seu escriturário (Tino Neves)
Camarada Luís: Aí vai uma pequena estória (1) do Capitão Comando João Bacar Jaló. Tino Neves.
Um dia passou por Nova Lamego uma coluna de géneros, e parou/estacionou junto do edifício do Comando do Batalhão. O nosso Major de Operações, ao passar na varanda, repara nas viaturas que estavam em baixo cheias de géneros e de militares dos Comandos Africanos, mas o que lhe despertou mais atenção foi, num Sargento, as divisas bem reluzentes e o chapéu à Gringo (chapéu preto, redondo com borlinhas penduradas a todo o perímetro das abas). De imediato chamou pelo Sargento e ordenou-lhe que tirasse aquele chapéu da cabeça, e pusesse a boina ou o quico pertencente ao camuflado.
O Sargento, respondendo ao chamado, levantou-se de imediato, e ficando de pé em cima de um saco de géneros, bateu a pala, aliás bateu a aba (do chapéu), e respondeu que não o tirava. O Major, teimando na ordem para que tirasse aquele chapéu, o Sargento justificou-se porque não o tirava.
- Meu Major, não tiro este chapéu porque sou conhecido através dele, e este chapéu já me salvou a vida por várias vezes!
- Não me interessa! Quem é o seu Comandante e onde está? - inquiriu, autoritário, o major.
- O meu Comandante é o Sr. Capitão João Bacar Jaló, e está precisamente aí em cima a falar com o seu Comandante!
Não me recordo se o Capitão João Bacar Jaló ouviu o que se estava a passar, ou se o Major foi fazer queixas do Sargento ao Capitão, o certo é que o Capitão Jaló deu um raspanete ao Major, dizendo que quem mandava nos seus homens era ele, mais ninguém, e se isso voltasse a acontecer, que iria fazer queixa do Major ao Gen Spínola. E nisto e deitou as mão à camisa, abrindo-a, mostrando o seu corpo nu, cheio de cicatrizes de balas e estilhaços, para que o Major visse o peito dum verdadeiro combatente.
E assim, não só o nosso Major de Operações, como todos nós ficámos a conhecer o celebre Capitão Comando Africano JOÃO BACAR JALÓ.
Um Abraço
Tino Neves
Almada
_________
Nota de L. G.:
(1) Vd. post de 21 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1683: Estórias do Gabu (3): Um capitão, amigo do seu escriturário (Tino Neves)
sábado, 19 de maio de 2007
Guiné 63/74 - P1768: Guileje: A Fox, rebaptizada, dos Diabos do Texas (Nuno Rubim)
Guiné > Região de Tombali > Guileje > A Fox MG-36-24, que pertenceu aos Pipas, foi sendo sucessivamente rebaptizada...
Fonte: © Nuno Rubim (2007). Direitos reservados.
Caro Luís
Exactamente. São as fotografias do PAIGC (1). Ambos, o Julinho e o Osvaldo [, ex-comandantes do PAIGC, de origem caboverdiana, que estiveram no cerco a Guileje, e que foram recentementemente entrevistados pelo Nuno Rubim e pelo Pepito], não se lembram da data exacta, mas há mais munições no bolso...
Numa fase mais adiantada a mesma Fox (2), sempre em Guileje, já era Diabos do Texas !
Uma estória realmente muito curiosa... A pesquisa histórica sobre Guileje evolui de dia para dia ..., ainda bem !
Boa viagem
Um abraço
Nuno Rubim
_________
Notas de L.G.:
(1) Em resposta ao meu mail: "Nuno: A White e a Fox são mesmo de Guileje, 1973... Encontrei fotos do PAIGC (no álbum do Amílcar Cabral, na Fundação Mário Soares) de viaturas dos Pipas... Terão sido capturadas em Guileje, depois de 22 de Maio de 1973 ? Tenho fotos de Fox e White em Bafatá, se te interessar... Luís
(2) Vd. post de 14 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1759: Guileje, SPM 2728: Cartas do corredor da morte (J. Casimiro Carvalho) (3): Miniférias em Cacine e tanques russos na fronteira
Fonte: © Nuno Rubim (2007). Direitos reservados.
Caro Luís
Exactamente. São as fotografias do PAIGC (1). Ambos, o Julinho e o Osvaldo [, ex-comandantes do PAIGC, de origem caboverdiana, que estiveram no cerco a Guileje, e que foram recentementemente entrevistados pelo Nuno Rubim e pelo Pepito], não se lembram da data exacta, mas há mais munições no bolso...
Numa fase mais adiantada a mesma Fox (2), sempre em Guileje, já era Diabos do Texas !
Uma estória realmente muito curiosa... A pesquisa histórica sobre Guileje evolui de dia para dia ..., ainda bem !
Boa viagem
Um abraço
Nuno Rubim
_________
Notas de L.G.:
(1) Em resposta ao meu mail: "Nuno: A White e a Fox são mesmo de Guileje, 1973... Encontrei fotos do PAIGC (no álbum do Amílcar Cabral, na Fundação Mário Soares) de viaturas dos Pipas... Terão sido capturadas em Guileje, depois de 22 de Maio de 1973 ? Tenho fotos de Fox e White em Bafatá, se te interessar... Luís
(2) Vd. post de 14 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1759: Guileje, SPM 2728: Cartas do corredor da morte (J. Casimiro Carvalho) (3): Miniférias em Cacine e tanques russos na fronteira
sexta-feira, 18 de maio de 2007
Guiné 63/74 - P1767: Spínola e Senghor encontram-se na região de Casamance em 1972 (Pedro Lauret)
Mensagem de Pedro Lauret:
Caros companheiros,
Em 18 de Maio de 1972 Spínola e Senghor encontravam-se na região do Casamance numa tentativa de encontrar uma solução negociada para a Guerra na Guiné.
No blogue da A25A, Avenida da Liberdade, textos do Coronel Carlos Fabião e Prof. Marcello Caetano em Efemérides.
Por considerar que tem interesse para a nossa tertúlia aqui estou a fazer propaganda a este blogue de que sou responsável.
Um abraço
Pedro Lauret
Caros companheiros,
Em 18 de Maio de 1972 Spínola e Senghor encontravam-se na região do Casamance numa tentativa de encontrar uma solução negociada para a Guerra na Guiné.
No blogue da A25A, Avenida da Liberdade, textos do Coronel Carlos Fabião e Prof. Marcello Caetano em Efemérides.
Por considerar que tem interesse para a nossa tertúlia aqui estou a fazer propaganda a este blogue de que sou responsável.
Um abraço
Pedro Lauret
Guiné 63/74 - P1766: Guileje: A Bêbeda, uma Fox do Pel Rec 839 que ficará imortalizada no diorama (Nuno Rubim)
Guiné > Região de Tombali > Guileje > CCAÇ 726 (Out 1964/Jul 1966) > Uma Daimler e uma Fox do Pel Rec 839, que esteve em Guileje de Março de 1966 até Janeiro de 67. A Fox, mais conhecida por a Bêbeda (possivelmente por consumir muito combustível) vai ficar importalizada no diorama de Guileje, que está a ser contruído pelo Nuno Rubim (1). A foto foi gentilmente cedida pelo Teco (Alberto Pires), da CCAÇ 726.
Fonte: Nuno Rubim (2007). Direitos reservados.
1. Mensagem de Nuno Rubim:
Caro Luís Graça:
As fotografias agora publicadas no blogue, da autoria do J. Casimiro de Carvalho (2), são exactamente do tipo que necessito: boas perspectivas, detalhes e até matrículas. Interessa-me pois saber se a White era a que esteve em Guileje [, informação que o nosso camarada já entretanto confirmou por mail].
Precisava também de fotos das Daimler, Atrelado de Água, Atrelado Sanitário, Morteiro de 10,7 cm, Canhão sem-recuo de 106 mm e da viatura Matador que rebocou as peças de artilharia 11,4 cm e os obuses 14 cm.
Junto envio uma curiosa foto de reduzida qualidade, mas de importância no contexto em causa. Pertence à colecção do nosso camarada Teco (Alberto Pires ) da CCAÇ 726 . Na fotografia podem-se ver uma Daimler e uma Fox do Pel Rec 839, que esteve em Guileje de Março de 1966 até Janeiro de 67.
Ora a matrícula da Fox é a mesma que consta numa fotografia tirada por elementos do PAIGC em Maio de 1973, quando ocuparam o quartel! Portanto a Bêbeda ( que vai ficar para a história, representada com essa mesma inscrição no diorama de Guileje ....) terá servido desde 1965 até 1973, integrada nos sucessivos Pel Rec Fox que por lá passaram !
Um abraço
Nuno Rubim
_________
Notas de L.G.:
(1) Vd. post de 12 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1753: Diorama de Guileje, 1965/67 (Muno Rubim)
(2) Vd. post de 14 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1759: Guileje, SPM 2728: Cartas do corredor da morte (J. Casimiro Carvalho) (3): Miniférias em Cacine e tanques russos na fronteira
quinta-feira, 17 de maio de 2007
Guiné 63/74 - P1765: Convívios (8): 30.º Almoço anual dos Especialistas da Força Aérea que estiveram na Guiné, 26 de Maio de 2007 (Victor Barata)
Mensagem enviada pelo nosso camarada Victor Barata, ex-especialista da FAP (Guiné 1971/73)
Boa Tarde, Carlos. Aproveito para pedir a divulgação a todos os camaradas a realização do 30º almoço anual dos Especialistas da Força Aérea que estiveram na Guiné a realizar em Aguiar de Sousa no dia 26.5.2007 na Quinta do Baptista(nosso camarada de Guerra).
É para nós uma honra ter junto de nós todos os Tertúlianos deste Blogue.
Um Abraço
Victor Barata
Boa Tarde, Carlos. Aproveito para pedir a divulgação a todos os camaradas a realização do 30º almoço anual dos Especialistas da Força Aérea que estiveram na Guiné a realizar em Aguiar de Sousa no dia 26.5.2007 na Quinta do Baptista(nosso camarada de Guerra).
É para nós uma honra ter junto de nós todos os Tertúlianos deste Blogue.
Um Abraço
Victor Barata
Guiné 63/74 - P1764: Armamento do PAIGC (1): Metralhadoras pesadas Degtyarev, antiaéreas (Nuno Rubim)
1. Mensagem do Nuno Rubim:
Amigo Luís:
Em complemento das informações que forneceste no blogue, relativamente às fotos enviadas pelo Victor Condeço (1) :
-A única Espingarda com Alça Telescópica, utilizada pelo PAIGC, que até agora descobri é a Vz.54, 7,62mm, de origem checoslovaca, 1954. Existiam 11 no Depósito Central do PAIGC, ca 1971-2. Junto segue uma foto há tempos encontrada na Net.
-As 3 metralhadoras pesadas são as Degtyarev 12,7mm , de origem soviética, em reparos de utilização terrestre e AA [Anti-Aérea].
Um abraço
Nuno Rubim
Guiné > Bissau > Fevereiro de 1968 > Exposição de armamento apreendido ao PAIGC, por ocasião da visita do Presidente da República, Alm Américo Tomás > Metralhadoras pesadas Degtyarev, de origem soviética (1).
Fotos: © Victor Condeço (2007). Direitos reservados .
__________
Nota de L.G.:
(1) Vd. post de 13 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1756: Exposição de armamento apreendido ao PAIGC, aquando da visita de Américo Tomás (Bissau, 1968) (Victor Condeço)
Amigo Luís:
Em complemento das informações que forneceste no blogue, relativamente às fotos enviadas pelo Victor Condeço (1) :
-A única Espingarda com Alça Telescópica, utilizada pelo PAIGC, que até agora descobri é a Vz.54, 7,62mm, de origem checoslovaca, 1954. Existiam 11 no Depósito Central do PAIGC, ca 1971-2. Junto segue uma foto há tempos encontrada na Net.
-As 3 metralhadoras pesadas são as Degtyarev 12,7mm , de origem soviética, em reparos de utilização terrestre e AA [Anti-Aérea].
Um abraço
Nuno Rubim
Guiné > Bissau > Fevereiro de 1968 > Exposição de armamento apreendido ao PAIGC, por ocasião da visita do Presidente da República, Alm Américo Tomás > Metralhadoras pesadas Degtyarev, de origem soviética (1).
Fotos: © Victor Condeço (2007). Direitos reservados .
__________
Nota de L.G.:
(1) Vd. post de 13 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1756: Exposição de armamento apreendido ao PAIGC, aquando da visita de Américo Tomás (Bissau, 1968) (Victor Condeço)
Guiné 63/74 - P1763: Quando a PIDE/DGS levou o Padre Puim, por causa da homília da paz (Bambadinca, 1 de Janeiro de 1971) (Abílio Machado)
Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Xitole > 1970 > O Padre Puim, capelão militar, de origem açoriana, com o furriel Guimarães da CART 2716. Devido às suas homilias, este capelão teve problemas com a PIDE/DGS, acabando por ser expulso do Exército, em 1971, tal como outros (o caso talvez mais famoso foi o do Padre Mário da Lixa, membro da nossa tertúlia).
Infelizmente, é a única foto que possuímos do ex-Padre Puím, hoje enfermeiroo no Hospital de Ponta Delgada, segundo a informação que tenho. Obrigado ao Abílio, pela evocação desses tempos difíceis de Bambadinca (é o adjectivo mínimo que posso aqui utilizar), coincidindo com a parte final da minha comissão da serviço, como se dizia eufemisticamente. Obrigado também por te lembrares do Henriques, um gajo apanhado, e honrá-lo com a tua amizade. Sei que andou por aí algures, a tentar esquecer... Mas, de facto, não se esquece a Guiné (1)
Foto: © David J. Guimarães (2005). Direitos reservados.
Mensagem do Abílio Machado (ex-Alf Mil da CCS do BART 2917, Bambadinca, 1970/72) (2), enviado com data de 31 de Março último:
Meu Caro:
Vê, por favor, o texto em anexo. Aparte o trecho final sobre o Puim, foi escrito - se bem tenho presente - logo na semana seguinte à minha presença no almoço da [CART] 2716 do Xitole, o ano passado, aqui no Porto . Encontrei-o aqui nas minhas coisas. Era já nessa altura minha intenção enviá-lo para o teu blogue . Mas perdi o endereço e por aqui ficou esquecido. Carecerá de actualizações mas vai mesmo assim.Vale o que vale e o que a memória deixa.
Um abraço
Abilio Machado
____________
O pudor em falar da guerra...
por Abílio Machado
Tenho a ideia de ter lido há muito, muito tempo – cada vez mais o tempo é pouco - num dos cadernos do Expresso - passe a publicidade - uma referência a algo cujo título se parecia muito com o tema deste blogue.
É uma reminiscência longínqua, confusa, que nada terá de real, eivada, portanto, dos erros e partidas que a memória nos vai pregando ao longo da vida. Relaciono essa leitura com uma época em que, por efeméride ou acaso, vários textos de ficção sairam sobre a guerra colonial.
Não é demência senil - espero - será antes o propósito confesso de esquecer.
A participação numa guerra é sempre uma baliza que ficará a marcar o campo onde as nossas vidas se jogam ou jogarão: mais ainda se a oposição a essa guerra é já uma ideia construída e consciente, como era o caso de muitos de nós.
Esta contradição de estarmos numa guerra de que ideologicamente, politicamente, discordávamos não foi, por certo, a menor das “culpas“ que tivemos de carregar e solucionar no íntimo de cada um de nós. Talvez por isso se contem pelos dedos - como eu me lembro de contar pelos dedos : quando uma mão não chegava, socorria-me dos lábios para continuar a contagem da outra – as vezes que falei às minhas filhas da guerra em que o pai estivera engajado.
Já o meu avô, velho combatente da 1ª Grande Guerra, nunca contou aos filhos as agruras que passou nas trincheiras, o que comiam (tudo o que mexia ), a fuga desordenada para a rectaguarda dos sobreviventes após o desastre da Batalha de La Lys, os gases tóxicos. A minha mãe pasmava, de olhos desorbitados :
-Quem te contou tudo isso?
É impressivo em demasia para ser contado… É uma reserva íntima. Assunto para ser guardado em baú de sótão, como as velhas fotografias de família.
Mas vamos ao que interessa. Por que acedo a este blogue? Não escondo que o faço sentindo que a emoção se me escapa para os dedos e para o teclado. Lá onde quer que a emoção habite …
Num almoço-convívio recente da Companhia sedeada no Xitole, para que fui convidado, o Guimarães deu-me conta e endereço do blogue e de quem se esconde por trás de um nome tão inócuo como Luís Graça.
Meu caro Henriques (desvenda-se o mistério do nome ) : os nomes serão inócuos, as pessoas que eles ocultam, nem sempre o são. E há-as bem carregadas de contra-indicações e efeitos secundários. E incómodas, como o diabo...
Aquela noite em Bambadinca … Ainda lembras ou também queres esquecer? Ainda hoje não sei - ou sei - como escapaste à psiquiatria … O que, naquelas circunstâncias, seria, apesar de tudo, o mal menor. Antes louco que preso. Seria ?
O exemplo do padre Puim - já não é padre: quem o é nos tempos de hoje? Uma instituição caduca! – é o paradigma do que poderiam ter feito naquela situação. E não o terão pensado?
O Puim. Outro exemplo impressivo. Memória perene. Porque há actos que, por dolorosos, queremos rejeitar, mas pelo exemplo não podemos esquecer. E ficam-nos como um padrão, ou uma tatuagem, ou um ferrete. Recortados no horizonte ou cravados na carne a frio são uma referência ou uma lembrança.
A coragem de um padre que não abdicou de o ser lá onde era o seu sítio: o altar. Já corriam, porventura trazidos pela brisa que vinda de certa Casa ribeirinha se espalhava às vezes serena, às vezes inquieta pela parada do quartel, uns ditos de que o padre Puim se desmandava nas homilias.
Os textos, ditos ou escritos, não eram visados pelo lápis azul. O Puim saberia disto? Não vou revelar o que penso, não quero ser inconfidente… E choveram relatórios para Bissau, por certo. Alguém que era regular nas missas.
E chegou o dia 1 de Janeiro – Dia Mundial da Paz. Ainda é ? Era-o em 1971. Ao que me disseram ( eu não ia à missa : as minhas missas com o Puim eram grandes conversas, edificantes, pela noite fora ), o Puim falou sobre a Paz.
Nessa semana, à socapa – houve um silêncio quase opressivo ou é efabulação minha? - aterrou uma DO. Alguém discreto fez-me chegar a nova de que algo se passava com o Puim. Fui ver. Encontro o Puim sentado na cama, nervoso mas determinado, olhando uns sujeitos que impiedosamente lhe desmantelavam o quarto descarnado, de asceta, à cata de … Abriam, fechavam gavetas, apressados … Acabei retirado do quarto.
E levaram-no com eles . Vi-o passar. Parecia mais sereno . Chegou-nos que teria sido mal tratado em Bissau até pela própria Igreja . E que teria sido exilado para a sua terra: haverá coisa pior? Um exílio no próprio chão que o viu nascer?
Ninguém é profeta na sua terra nem fazem milagres os santos que conhecemos. Mais tarde soubemos que estava de facto nos Açores. E que despira o hábito … Mas abraçara outro sacerdócio … A igreja será agora o Hospital de Ponta Delgada.
___________
Notas de L.G.:
(1) Vd. post de Dezembro 08, 2005 > Blogantologia(s) II - (22): Esquecer a Guiné (Luís Graça)
(2) Vd. post de 29 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1635: Amigos, enquando vos escrevo, bebo um Porto velho à nossa saúde (Abílio Machado, CCS do BART 2917, Bambadinca, 1970/72)
Foto: © David J. Guimarães (2005). Direitos reservados.
Mensagem do Abílio Machado (ex-Alf Mil da CCS do BART 2917, Bambadinca, 1970/72) (2), enviado com data de 31 de Março último:
Meu Caro:
Vê, por favor, o texto em anexo. Aparte o trecho final sobre o Puim, foi escrito - se bem tenho presente - logo na semana seguinte à minha presença no almoço da [CART] 2716 do Xitole, o ano passado, aqui no Porto . Encontrei-o aqui nas minhas coisas. Era já nessa altura minha intenção enviá-lo para o teu blogue . Mas perdi o endereço e por aqui ficou esquecido. Carecerá de actualizações mas vai mesmo assim.Vale o que vale e o que a memória deixa.
Um abraço
Abilio Machado
____________
O pudor em falar da guerra...
por Abílio Machado
Tenho a ideia de ter lido há muito, muito tempo – cada vez mais o tempo é pouco - num dos cadernos do Expresso - passe a publicidade - uma referência a algo cujo título se parecia muito com o tema deste blogue.
É uma reminiscência longínqua, confusa, que nada terá de real, eivada, portanto, dos erros e partidas que a memória nos vai pregando ao longo da vida. Relaciono essa leitura com uma época em que, por efeméride ou acaso, vários textos de ficção sairam sobre a guerra colonial.
Não é demência senil - espero - será antes o propósito confesso de esquecer.
A participação numa guerra é sempre uma baliza que ficará a marcar o campo onde as nossas vidas se jogam ou jogarão: mais ainda se a oposição a essa guerra é já uma ideia construída e consciente, como era o caso de muitos de nós.
Esta contradição de estarmos numa guerra de que ideologicamente, politicamente, discordávamos não foi, por certo, a menor das “culpas“ que tivemos de carregar e solucionar no íntimo de cada um de nós. Talvez por isso se contem pelos dedos - como eu me lembro de contar pelos dedos : quando uma mão não chegava, socorria-me dos lábios para continuar a contagem da outra – as vezes que falei às minhas filhas da guerra em que o pai estivera engajado.
Já o meu avô, velho combatente da 1ª Grande Guerra, nunca contou aos filhos as agruras que passou nas trincheiras, o que comiam (tudo o que mexia ), a fuga desordenada para a rectaguarda dos sobreviventes após o desastre da Batalha de La Lys, os gases tóxicos. A minha mãe pasmava, de olhos desorbitados :
-Quem te contou tudo isso?
É impressivo em demasia para ser contado… É uma reserva íntima. Assunto para ser guardado em baú de sótão, como as velhas fotografias de família.
Mas vamos ao que interessa. Por que acedo a este blogue? Não escondo que o faço sentindo que a emoção se me escapa para os dedos e para o teclado. Lá onde quer que a emoção habite …
Num almoço-convívio recente da Companhia sedeada no Xitole, para que fui convidado, o Guimarães deu-me conta e endereço do blogue e de quem se esconde por trás de um nome tão inócuo como Luís Graça.
Meu caro Henriques (desvenda-se o mistério do nome ) : os nomes serão inócuos, as pessoas que eles ocultam, nem sempre o são. E há-as bem carregadas de contra-indicações e efeitos secundários. E incómodas, como o diabo...
Aquela noite em Bambadinca … Ainda lembras ou também queres esquecer? Ainda hoje não sei - ou sei - como escapaste à psiquiatria … O que, naquelas circunstâncias, seria, apesar de tudo, o mal menor. Antes louco que preso. Seria ?
O exemplo do padre Puim - já não é padre: quem o é nos tempos de hoje? Uma instituição caduca! – é o paradigma do que poderiam ter feito naquela situação. E não o terão pensado?
O Puim. Outro exemplo impressivo. Memória perene. Porque há actos que, por dolorosos, queremos rejeitar, mas pelo exemplo não podemos esquecer. E ficam-nos como um padrão, ou uma tatuagem, ou um ferrete. Recortados no horizonte ou cravados na carne a frio são uma referência ou uma lembrança.
A coragem de um padre que não abdicou de o ser lá onde era o seu sítio: o altar. Já corriam, porventura trazidos pela brisa que vinda de certa Casa ribeirinha se espalhava às vezes serena, às vezes inquieta pela parada do quartel, uns ditos de que o padre Puim se desmandava nas homilias.
Os textos, ditos ou escritos, não eram visados pelo lápis azul. O Puim saberia disto? Não vou revelar o que penso, não quero ser inconfidente… E choveram relatórios para Bissau, por certo. Alguém que era regular nas missas.
E chegou o dia 1 de Janeiro – Dia Mundial da Paz. Ainda é ? Era-o em 1971. Ao que me disseram ( eu não ia à missa : as minhas missas com o Puim eram grandes conversas, edificantes, pela noite fora ), o Puim falou sobre a Paz.
Nessa semana, à socapa – houve um silêncio quase opressivo ou é efabulação minha? - aterrou uma DO. Alguém discreto fez-me chegar a nova de que algo se passava com o Puim. Fui ver. Encontro o Puim sentado na cama, nervoso mas determinado, olhando uns sujeitos que impiedosamente lhe desmantelavam o quarto descarnado, de asceta, à cata de … Abriam, fechavam gavetas, apressados … Acabei retirado do quarto.
E levaram-no com eles . Vi-o passar. Parecia mais sereno . Chegou-nos que teria sido mal tratado em Bissau até pela própria Igreja . E que teria sido exilado para a sua terra: haverá coisa pior? Um exílio no próprio chão que o viu nascer?
Ninguém é profeta na sua terra nem fazem milagres os santos que conhecemos. Mais tarde soubemos que estava de facto nos Açores. E que despira o hábito … Mas abraçara outro sacerdócio … A igreja será agora o Hospital de Ponta Delgada.
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Notas de L.G.:
(1) Vd. post de Dezembro 08, 2005 > Blogantologia(s) II - (22): Esquecer a Guiné (Luís Graça)
(2) Vd. post de 29 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1635: Amigos, enquando vos escrevo, bebo um Porto velho à nossa saúde (Abílio Machado, CCS do BART 2917, Bambadinca, 1970/72)
quarta-feira, 16 de maio de 2007
Guiné 63/74 - P1762: II Encontro de Pombal (15): Estórias do Caco Baldé (Spínola) (J.L. Vacas de Carvalho, J. Mexia Alves e outros)
Videoclipe (3 m 21 s) > Estórias do Caco Baldé (Spínola)... Vozes: Joaquim Mexia Alves, J. L. Vacas de Carvalho, António Barroso e Paulo Salgado... Viola: J. L. Vacas de Carvalho. Para reproduzir o vídeo, basta clicar duas vezes na imagem e ligar o som... (1).
Vídeo: © Luís Graça (2007). Direitos reservados. Vídeo alojado no álbum de Luís Graça > Guinea-Bissau_Videos. Copyright © 2003-2007 Photobucket Inc. All rights reserved.
Pombal > 28 de Abril de 2007 > 2º encontro da malta do nosso blogue > Restaurante O Manjar do Marquês > Fim de tarde > Artistas: J. Luís Vacas de Carvalho e J. Mexia Alves... Audiência (participante): Eu, o Paulo Santiago e o seu filho João, o Humberto Reis e a Teresa, o Victor Tavares, o Artur Soares e o António Barroso.... A este pequeno grupo ainda se juntaria depois o Tino Neves e a esposa (acabados de chegar... de Coimbra)... Para além de se cantar (2), também se contou estórias... Por exemplo, a respeito do nosso Com-Chefe, carinhosamente conhecido como Caco Baldé. (LG)
___________
Notas de L.G.:
(1) Vd. post de 6 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1735: Tertúlia: Encontro em Pombal (14): Vídeo do Hugo Moura Ferreira
(2) Vd. videoclipes anteriores, relativos ao encontro de Pombal:
5 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1734: Tertúlia: Encontro em Pombal (13): Paco Bandeira: Lá longe, onde o sol castiga mais.. (J. L. Vacas de Carvalho / J. Mexia Alves)
1 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1717: Tertúlia: Encontro em Pombal (8): Ah, tigres! Ou uma dupla de fadistas (J.L. Vacas de Carvalho / J. Mexia Alves)
1 de Maio de 2007 Guiné 63/74 - P1720: Tertúlia: Encontro em Pombal (9): (Não) me tirem daqui (Sousa de Castro / Vacas de Carvalho / Mexia Alves)
terça-feira, 15 de maio de 2007
Guiné 63/74 - P1761: A floresta-galeria na escrita de Rui Ferreira
Foto: © Humberto Reis (2005). Direitos reservados.
1. Mensagem do nosso camarada Rui Ferreira, coronel na situção de reforma, residente em Viseu, autor do livro de memórias Rumo a Fulacunda (1) e que, apesar dos actuais problemas de saúde, nos deu a honra e o prazer da sua presença em Pombal, no passado dia 28 de Abril de 2007:
Meu caro Luís:
Passei a olhar com mais respeito e a dar mais valor ao meu computador quando aderi de alma e coração à nossa tertília.
Todos os dias cá subo ao meu sotão onde num soberbo aproveitamento me fiz rodear das minhas recordações, livros, discos e cassetes que constituem o meu mundo e acabo fatalmente a abrir o correio e a ver as novas do nosso contentamento.
Tenho todo o gosto que um dia tu ou qualquer um dos outros que, por acaso ou não, visite Viseu me dê o prazer de me fazer uma visita. Aqui fica o convite.
Mas não só por isso te estou a contactar. Penso que para além das historias, peripécias e acontecimentos por que duma maneira geral todos fomos passando e que são obviamente muito importantes e têm por direito o seu lugar garantido, poderíamos alargar horizontes com a introdução de novos temas.
E para te falar deles começaria por sugerir que de uma forma absolutamente pessoal cada um se referisse como viu e como viveu e sentiu quando confrontado com coisas tão simples como os obstáculos naturais, o terreno, o clima, a humidade, o calor, as chuvas tropicais, a floresta, a guerra de minas, o culto da velhice nas sociedades africanas, o choro, a grandiosidade do nascer ou a beleza do pôr do Sol em África, a existência de Deus, o cheiro da terra depois das primeiras chuvas, o silêncio de morte, o medo, a angústia duma mutilação, ou mais terra a terra sobre o anexo do Hospital Militar de Campolide, a inadaptação da hierarquia militar à guerra de Àfrica, as comissões dos filhos e as dos enteados, enfim um nunca mais acabar de assuntos possíveis.
E para inaugurar, se assim o entenderes aqui te vou transcrever o que sobre a floresta escrevi
( In Rumo a Fulacunda, pag 218):
(...) a floresta- essa sim bem especial, pois, em alguns recantos perdidos e remotos da nossa área de acção, ela sendo senhora e soberana, em absoluto interferia na nossa actividade. Virgem, brava e selvagem, sôfrega na conquista dos espaços devolutos, desgovernada na expansão, abandonada ao acaso, perdida nas vastidões inocupadas das terras que não eram de ninguém, intocada, altiva e serena, misteriosa e sombria, era de um profundo espanto observar o contraste entre o soturno melancólico das sombras, dos escuros e dos tons de cinzento e negro do seu interior face ao luxo e ao esplendor do verde deslumbrante que ao Sol se expunha.
Crescendo ao deus-dará, resistindo à penetração e indiferente ao correr dos anos, numa amalgama de formas e tamanhos, numa profusão de variedades e numa imensidão de espécies que, disputando o mesmo espaço, a um tempo se irmanavam no mesmo propósito e antagonizavam na conquista da luz que mais não era que a própria vida.
Enlaçando-se, acomodando-se, coabitando, lutando e crescendo, lado a lado, fetos e arbustos, lianas e trepadeiras, canaviais e palmeiras, ramagens e raízes, frutos e flores, folhagens de recorte tão diverso, do ínfimo ao grandioso, do ridículo ao monumental, árvores novas e de pequeno porte, espinheiras, enfim um verdadeiro e absoluto matagal, intrincado e sem sentido, desordenado e sem solução.
Sobressaindo, tudo culminando e suplantando as demais, majestosas e frondosas, dominando em seu redor, se erguiam árvores de tão grande como inimaginado porte. Junto delas nos sentiamos pouco menos que insectos numa confrontação entre as suas impensáveis alturas e a nossa ridícula pequenez, entre a sua longevidade milenar e a nossa curta passagem por este mundo de Deus.
Na floresta não eramos mais que ínfimos seres desambientados e no seu interior, tão denso como se numa noite cerrada se tivesse entrado, pavorosamente tão sombrio, o que negro já era, se voltava a sentir não os mesmos infantis e inocentes temores da meninice ao escuro associados, mas um imenso e real pavor, tanto mais assustador quanto consciente, face ao desconhecido e misterioso. (...).
E por aqui me fico por hoje . Num grande abraço toda a consideração e a amizade do
Rui
________
Nota de L.G.:
(1) Sobre o autor e o livro, vd posts:
17 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1285: Bibliografia de uma guerra (14): Rumo a Fulacunda, um best seller, de Rui Alexandrino Ferreira (Luís Graça)
1 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1718: Lendo de um fôlego o livro do Rui Ferreira, Rumo a Fulacunda (Virgínio Briote)
Guiné 63/74 - P1760: Estórias do Zé Teixeira (16): Tarde de Domingo com sorte (José Teixeira, ex-1.º Cabo Aux Enf)
Guiné > Região de Quínara > Empada > CCAÇ 2381 > 1969 > O 1º Cabo enfermeiro Teixeira, um operacional a tempo inteiro (... hoje um notável contador de estórias).
Foto: © José Teixeira (2006). Direitos reservados.
Texto do José Teixeira (1º cabo auxiliar enfermeiro, CCAÇ 2381, Buba, Quebo, Mampatá, Empada, 1968/70) com mais uma das suas estórias:
TARDE DE DOMINGO COM SORTE
por Zé Teixeira
O Reencontro
Trinta e sete anos depois do regresso, reencontrei o camarada Nuno Rosa. Para além da grande alegria pelo encontro, selada com um forte e comovido aperta costelas, surgiram logo de imediato as estórias do costume. Lembras-te daquele ataque … e daquele… das formigas que nos acordaram de noite … das malditas abelhas… etc, etc.
Algumas das estórias já estavam no sótão da memória, provavelmente cheias de pó. Outras continuam activas a bailar no consciente, só que há pormenores que nos escaparam. Assim as estórias tomam outra dimensão, talvez mais realista e sobretudo, após este desfiar de flashes por vezes bem dolorosos, acabam por se deslocarem para o sótão, até ao descanso eterno do guerreiro.
Uma emboscada ao domingo
Estávamos em Buba, no fim do Verão de 1969. O Joaquim Agostinho, com 26 anos devorava etapas na Volta A Portugal. Era o ciclista prodígio, o fora de série que tinha sido descoberto em Torres Vedras. Como o grosso do pessoal da CCAÇ 2381 era Ribatejano, não se falava de outra coisa na caserna.
Era domingo. Logo após o almoço, depois de um Sábado passado em patrulhamento para os lados da bolanha dos passarinhos, surge nova ordem de mobilizar para novo patrulhamento para os lados de Sinchã Cherno e emboscar algures na estrada que se andava a construir até Aldeia Formosa (Quebo), muito perto do local onde cerca de um mês antes tínhamos sofrido uma emboscada, junto a um campo de minas, uma das quais roubou a perna ao Miguel. Este, logo após o acalmar do fogo levantou-se e . . . descobriu que estávamos a pisar um campo, onde foram levantadas 27 minas A/P. e localizados buracos, tipo campas abertas com cruzes e com papéis escritos do género: "Tugas é isto que vos espera”, “Ida para a vossa terra” etc.
Bolsa de enfermeiro às costas, cantil cheio... Os efeitos da velhice não só dava, em resultado das experiências vividas, para um redobrar de atenção e um poder de reacção e desenrasque maior, como também, em certas ocasiões, para um aventureirismo exagerado com graves riscos para a pele.
Naquele dia, partimos à desportiva, bem dispostos, bem bebidos, quando muito, chateados pelo quebrar da rotina, pois em Portugal ao domingo não se trabalhava.
No primeiro local seguro (?) que encontramos, montamos tenda, quer dizer, a emboscada e preparamo-nos para ficar ali o resto da tarde. De repente ouve-se um tiro muito perto e o ruído de algo a cair de uma árvore. Como velhinhos ficamos quietos na expectativa, apenas redobramos de atenção, e eis que surge um dos furriéis com um magestático pato bravo, com seis/sete quilos, que o mesmo tinha abatido a tiro de G3.
A isto chama-se brincar em serviço, pelo que levantamos de imediato a embosca e partimos para outro sítio algures mais à frente. Sem saber que estávamos a cair para a boca do lobo, lá nos colocamos de novo em posição de combate. Agora sim, um pouco abandalhados. O homem que levava o prato do morteiro 60 não ficou junto do morteiro e o municiador do lança roquetes trocou o lugar por mim.
O Nuno com o seu colete de roquetes estava preocupado, pois faltava-lhe o municiador, o qual também trazia uma fornada de granadas. Ao comentar a sua preocupação eu respondi-lhe:
-Não te preocupes que se os turras atacarem, eu municio-te.
O IN que estava emboscado um pouco à frente, deixou-nos pousar e aproximou-se com cuidado ( Creio mesmo que se avançássemos mais uns cem metros, tínhamos caído no seu campo de mira).
De repente o ambiente aqueceu com o IN a cair em cima de nós com toda o seu potencial de fogo, ao qual se segui a nossa resposta rápida. Uma das primeiras roquetadas IN foi rebentar numa árvore por cima da minha cabeça. Os seus estilhaços barreram as folhas das árvores e este camarada procurou de imediato um lugar mais seguro. O roqueteiro bem olhou para trás, à minha procura, mas eu tinha voado para junto de uma árvore, mais segura.
Acabado o desafio, um autêntico Porto/ Benfica de que resultou um empate, ambos os contendores pensaram em fugir, o que foi a minha sorte.
Chega-me a informação de que há um ferido. Logo me aproximo e verifico que o homem do morteiro não hesitou em enviar umas morteiradas, colocando o cano do morteiro na terra mole, de que resultou ter ficado com um rasgão na mão, pois o morteiro ao enterrar-se pelo impacto, pela terra dentro, deixou marcas. Passo a palavra de que há um ferido ligeiro e logo ali me disponho a fazer o tratamento como era o meu dever.
O alferes é que não esteve com meias medidas e decidiu retirar de imediato. Acabado o tratamento, logo verifico que estávamos sozinhos. Duas hipóteses, ou ficar quietos, aguardar algum tempo e depois regressar a Buba, ou correr atrás dos camaradas que iam a 400/500 metros algures na mata!
Como já era fim de tarde, resolvemos procurar seguir os colegas que, entretanto, para mais rapidamente se afastarem, seguiam já na estrada que se avistava ao longe. Até porque ouvíamos ruídos e vozes por perto ( penso que era o IN a afastar-se, caso contrário podiam ter feito ronco e apanhar-nos à mão ou enviar-nos para casa no sobretudo de madeira).
O nosso roqueteiro, o Nuno Rosa, relembrou-me agora, na altura teve um pressentimento de que estava a ser seguido e olhou para trás. Dois dos seus colegas vinham lá longe. Então ajoelhou, colocou as últimas granadas, pois como bom ex-comando, nunca gastava todas as munições que levava, e bateu a mata que ficava à nossa retaguarda, impedindo o IN de qualquer veleidade.
Os outros camaradas continuaram apressadamente o seu caminho com o alferes à frente e o Furriel a sonhar com o arroz de pato, que nunca mais largou
Assim ficaram três homens desarmados, no meio da mata; um morteiro sem granadas, um roqueteiro sem roquetes e um enfermeiro, num fim de tarde domingo que toda a gente queria calmo e pacífico.
Quando em 2005 tive oportunidade de voltar à Guiné, estive muito próximo deste lugar, mas confesso que nada me veio à memória.
Obrigado, Nuno, por teres partilhado esta aventura comigo.
Zé Teixeira
_____________
Nota de L.G.:
(1) Vd. post de 20 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1614: Estórias do Zé Teixeira (14): Voluntário na tropa... nem para comer!
10 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1059: Estórias do Zé Teixeira (13): A Maria-tira-cabaço-di-branco
7 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1055: Estórias do Zé Teixeira (12): O Balanta que fugia do enfermeiro
4 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1044: Estórias do Zé Teixeira (11): As vitaminas abortivas
4 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1043: Estórias do Zé Teixeira (10): O embalsamador amador
4 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1042: Estórias do Zé Teixeira (9): camaleões, putos e cobras
26 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCXCVI: Estórias do Zé Teixeira (8): Do tan-tan ao pum-pum, um casamento em Mampatá
20 de Abril de 2006 > Guiné 63/74 - DCCXIX: Estórias do Zé Teixeira (7): Síndrome de guerra
19 de Abril de 2006 > Guiné 63/74 - DCCXVIII: Estórias do Zé Teixeira (6): um atribulado regresso
21 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCXLVIII: Estórias do Zé Teixeira (5): as abelhas, nossas amigas
21 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCXLVII: Estórias do Zé Teixeira (4): o lugar do morto
15 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXXXVIII: Estórias do Zé Teixeira (3): a festa da vida
11 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXXIV: Estórias do Zé Teixeira (2): o Conceição ou o morrer de morte macaca
9 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXIII: Estórias do Zé Teixeira (1): Dôtor, Bô ka lembra di mim ?
Foto: © José Teixeira (2006). Direitos reservados.
Texto do José Teixeira (1º cabo auxiliar enfermeiro, CCAÇ 2381, Buba, Quebo, Mampatá, Empada, 1968/70) com mais uma das suas estórias:
TARDE DE DOMINGO COM SORTE
por Zé Teixeira
O Reencontro
Trinta e sete anos depois do regresso, reencontrei o camarada Nuno Rosa. Para além da grande alegria pelo encontro, selada com um forte e comovido aperta costelas, surgiram logo de imediato as estórias do costume. Lembras-te daquele ataque … e daquele… das formigas que nos acordaram de noite … das malditas abelhas… etc, etc.
Algumas das estórias já estavam no sótão da memória, provavelmente cheias de pó. Outras continuam activas a bailar no consciente, só que há pormenores que nos escaparam. Assim as estórias tomam outra dimensão, talvez mais realista e sobretudo, após este desfiar de flashes por vezes bem dolorosos, acabam por se deslocarem para o sótão, até ao descanso eterno do guerreiro.
Uma emboscada ao domingo
Estávamos em Buba, no fim do Verão de 1969. O Joaquim Agostinho, com 26 anos devorava etapas na Volta A Portugal. Era o ciclista prodígio, o fora de série que tinha sido descoberto em Torres Vedras. Como o grosso do pessoal da CCAÇ 2381 era Ribatejano, não se falava de outra coisa na caserna.
Era domingo. Logo após o almoço, depois de um Sábado passado em patrulhamento para os lados da bolanha dos passarinhos, surge nova ordem de mobilizar para novo patrulhamento para os lados de Sinchã Cherno e emboscar algures na estrada que se andava a construir até Aldeia Formosa (Quebo), muito perto do local onde cerca de um mês antes tínhamos sofrido uma emboscada, junto a um campo de minas, uma das quais roubou a perna ao Miguel. Este, logo após o acalmar do fogo levantou-se e . . . descobriu que estávamos a pisar um campo, onde foram levantadas 27 minas A/P. e localizados buracos, tipo campas abertas com cruzes e com papéis escritos do género: "Tugas é isto que vos espera”, “Ida para a vossa terra” etc.
Bolsa de enfermeiro às costas, cantil cheio... Os efeitos da velhice não só dava, em resultado das experiências vividas, para um redobrar de atenção e um poder de reacção e desenrasque maior, como também, em certas ocasiões, para um aventureirismo exagerado com graves riscos para a pele.
Naquele dia, partimos à desportiva, bem dispostos, bem bebidos, quando muito, chateados pelo quebrar da rotina, pois em Portugal ao domingo não se trabalhava.
No primeiro local seguro (?) que encontramos, montamos tenda, quer dizer, a emboscada e preparamo-nos para ficar ali o resto da tarde. De repente ouve-se um tiro muito perto e o ruído de algo a cair de uma árvore. Como velhinhos ficamos quietos na expectativa, apenas redobramos de atenção, e eis que surge um dos furriéis com um magestático pato bravo, com seis/sete quilos, que o mesmo tinha abatido a tiro de G3.
A isto chama-se brincar em serviço, pelo que levantamos de imediato a embosca e partimos para outro sítio algures mais à frente. Sem saber que estávamos a cair para a boca do lobo, lá nos colocamos de novo em posição de combate. Agora sim, um pouco abandalhados. O homem que levava o prato do morteiro 60 não ficou junto do morteiro e o municiador do lança roquetes trocou o lugar por mim.
O Nuno com o seu colete de roquetes estava preocupado, pois faltava-lhe o municiador, o qual também trazia uma fornada de granadas. Ao comentar a sua preocupação eu respondi-lhe:
-Não te preocupes que se os turras atacarem, eu municio-te.
O IN que estava emboscado um pouco à frente, deixou-nos pousar e aproximou-se com cuidado ( Creio mesmo que se avançássemos mais uns cem metros, tínhamos caído no seu campo de mira).
De repente o ambiente aqueceu com o IN a cair em cima de nós com toda o seu potencial de fogo, ao qual se segui a nossa resposta rápida. Uma das primeiras roquetadas IN foi rebentar numa árvore por cima da minha cabeça. Os seus estilhaços barreram as folhas das árvores e este camarada procurou de imediato um lugar mais seguro. O roqueteiro bem olhou para trás, à minha procura, mas eu tinha voado para junto de uma árvore, mais segura.
Acabado o desafio, um autêntico Porto/ Benfica de que resultou um empate, ambos os contendores pensaram em fugir, o que foi a minha sorte.
Chega-me a informação de que há um ferido. Logo me aproximo e verifico que o homem do morteiro não hesitou em enviar umas morteiradas, colocando o cano do morteiro na terra mole, de que resultou ter ficado com um rasgão na mão, pois o morteiro ao enterrar-se pelo impacto, pela terra dentro, deixou marcas. Passo a palavra de que há um ferido ligeiro e logo ali me disponho a fazer o tratamento como era o meu dever.
O alferes é que não esteve com meias medidas e decidiu retirar de imediato. Acabado o tratamento, logo verifico que estávamos sozinhos. Duas hipóteses, ou ficar quietos, aguardar algum tempo e depois regressar a Buba, ou correr atrás dos camaradas que iam a 400/500 metros algures na mata!
Como já era fim de tarde, resolvemos procurar seguir os colegas que, entretanto, para mais rapidamente se afastarem, seguiam já na estrada que se avistava ao longe. Até porque ouvíamos ruídos e vozes por perto ( penso que era o IN a afastar-se, caso contrário podiam ter feito ronco e apanhar-nos à mão ou enviar-nos para casa no sobretudo de madeira).
O nosso roqueteiro, o Nuno Rosa, relembrou-me agora, na altura teve um pressentimento de que estava a ser seguido e olhou para trás. Dois dos seus colegas vinham lá longe. Então ajoelhou, colocou as últimas granadas, pois como bom ex-comando, nunca gastava todas as munições que levava, e bateu a mata que ficava à nossa retaguarda, impedindo o IN de qualquer veleidade.
Os outros camaradas continuaram apressadamente o seu caminho com o alferes à frente e o Furriel a sonhar com o arroz de pato, que nunca mais largou
Assim ficaram três homens desarmados, no meio da mata; um morteiro sem granadas, um roqueteiro sem roquetes e um enfermeiro, num fim de tarde domingo que toda a gente queria calmo e pacífico.
Quando em 2005 tive oportunidade de voltar à Guiné, estive muito próximo deste lugar, mas confesso que nada me veio à memória.
Obrigado, Nuno, por teres partilhado esta aventura comigo.
Zé Teixeira
_____________
Nota de L.G.:
(1) Vd. post de 20 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1614: Estórias do Zé Teixeira (14): Voluntário na tropa... nem para comer!
10 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1059: Estórias do Zé Teixeira (13): A Maria-tira-cabaço-di-branco
7 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1055: Estórias do Zé Teixeira (12): O Balanta que fugia do enfermeiro
4 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1044: Estórias do Zé Teixeira (11): As vitaminas abortivas
4 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1043: Estórias do Zé Teixeira (10): O embalsamador amador
4 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1042: Estórias do Zé Teixeira (9): camaleões, putos e cobras
26 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCXCVI: Estórias do Zé Teixeira (8): Do tan-tan ao pum-pum, um casamento em Mampatá
20 de Abril de 2006 > Guiné 63/74 - DCCXIX: Estórias do Zé Teixeira (7): Síndrome de guerra
19 de Abril de 2006 > Guiné 63/74 - DCCXVIII: Estórias do Zé Teixeira (6): um atribulado regresso
21 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCXLVIII: Estórias do Zé Teixeira (5): as abelhas, nossas amigas
21 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCXLVII: Estórias do Zé Teixeira (4): o lugar do morto
15 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXXXVIII: Estórias do Zé Teixeira (3): a festa da vida
11 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXXIV: Estórias do Zé Teixeira (2): o Conceição ou o morrer de morte macaca
9 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXIII: Estórias do Zé Teixeira (1): Dôtor, Bô ka lembra di mim ?
segunda-feira, 14 de maio de 2007
Guiné 63/74 - P1759: Guileje, SPM 2728: Cartas do corredor da morte (J. Casimiro Carvalho) (3): Miniférias em Cacine e tanques russos na fronteira
Guiné > Região de Tombali > Guileje > CCAV 8350 (1972/73) > O Fur Mil Op Esp José Casimiro Carvalho, no topo de uma Fox, viatura blindada do Esquadrão de Reconhecimento Fox. Estas unidades de cavalaria também possuíam viaturas White (ver foto a seguir) (1).
Guiné > Região de Tombali > Guileje > CCAV 8350 (1972/73) > Viatura blindada White, de matrícula MG-34-69, pertencente ao Pelotão de Reconhecimento Fox, estacionado em Guileje. Documento que faz parte do álbum fotográfico do Casimiro Carvalho, sem data nem legenda. Segundo o Casimiro Carvalho, o pelotão chamava-se Os Pipas (LG).
Guileje, SPM 2728: Cartas do corredor da morte (J. Casimiro Carvalho) (2): 1ª quinzena de Maio de 1973: Miniférias em Cacine e tanques russos na fronteira (2)
Cartas enviadas pelo José Casmiro Carvalho à família. A selecção, a revisão e a fixação do texto são da responsabilidade do editor do blogue (LG) .
Cacine, 6/5/3
Mãezinha. (…) Chamaram-me no dia 4 e disseram-me: Você vai para Cacine receber os mantimentos para toda a época das chuvas, durante um mês. E cá estou…
Tem praia onde tomo banho todo os dias. Come-se assim: Jantar: arroz de frango (aquele escuro, com sangue), mas com frango; meia pera de conserva, 1 banana, vinho à discrição com gelo; café. Almoço: pato com batatas às rodelas, uma espécie de Espanhola, bastante pato, canja (uma delícia), 2 babanas e café. Como vê !!!?
PS – Junto foto contado o patacão.
Guiné > Região de Tombali > Guileje > CCAV 8350 (1972/73) > O Fur Mil Op Esp José Casimiro Carvalho contando o patacão.... Foto enviada à mãe.
Cacine, 6/5/73
Querido pai: A sorte desta vez escolheu-me para ser protegido, pois mandaram-se para Cacine, terra de praia e sol, cocos, mangos, bananas, nada que fazer, nada de patrulhas nem trabalho… Só quando vêm batelões de Bissau é que tenho que conferir tudo (ao todo, durante este mês são 120 toneladas de reabastecimentos) e depois acompanhar de batelão até Gadamael (a 18 km de Guiledje) e voltar para Cacine, à espera de mais.
Sob o meu comando, estão um cabo e um soldado para ajudar. Em dois dias já estou mornaço.
(…) Aqui vai [uma foto de ] um dos carros de combate de Guileje.
(…) Um abraço sincero do seu Operações Especiais que de especial não tem nada. With Love.
Os aviões voltarão a voar, promete o Spínola
Cacine, 13/5/73
Mãezinha: (…) Fui até Gadamael de batelão (isto é que é viajar de barco!) e passei lá uma noite, noite em que Guileje foi atacada.. Também choveu torrencialmente e eu cá fora só de calções a apanhá-la e os soldados, com sabão, debaixo das caleiras a tomar banho” (…)
(…) Todos os dias, praia e banho. Não é nada mau, não acha ? Estou mesmo preto. Ando a sofrer por causa da ‘lica’: são centenas de borbulhinhas que com o suor picam como mil agulhas” (…).
Cacine, 13/5/73
Bijou: (…) Tenho andado aqui de batelão, comido cocos e bananas nem se fala. Mangos (fruta saborosa) há qui aos tombos.
Come-se bem aqui, e continua (hoje bifes de cebolada). Guileje foi atacado outra vez, mas eu não estava lá.
Parece que vai haver aviões outra vez no mato. Disse o Spínola anteontem em Guileje. Um beijo (…).
Carros de combate russos na fronteira
Cacine, 15/5/73
Paizinho: (…) A guerra aqui está cada vez pior. O Hospital de Bissau (3) está repleto (infelizmente). Só em Guidaje ,[ no norte], 40 feridos, alguns dos quais com membros amputados (já a cheirar mal devido a terem esperado 2 ou 3 dias por coluna para serem evacuados). Aviões já não vão lá.
No Cantanhez (todos estes locais que menciono são no sul, onde estou), 13 feridos numa emboscada. Guileje foi atacada outra vez e passados dois dias os melhores homens que tínhamos lá (dois furriéis milicianos) morreram, em consequência de uma mina anticarro que iam levantar. Andamos tods transtornados.
A 18 km de Guileje fica Gadamael e foram para lá 4 canhões sem recuo e 35 homens para os guarnecer. Levaram também granadas anti-tanque, pois foram vistos carros de combate na fronteira da República [da Guiné-Conacri].
O meu serviço aqui é receber os géneros e artigos de cantina que vão para Guileje, para o isolamento, pois com as chuvas ficamos como que numa ilha e não podemos sair de lá, só de avião ou barcos de borracha. Aviões não há. Portanto só de barco (o que é muito perigoso)…
________
Notas de L.G.:
(1) Vd. Não sei qual era o nº do Esquadrão. No meu tempo (1969/71), havia um Esquadrão de Reconhecimento em Bafátá, a que pertenceu o nosso camarada Manuel Mata. Vd. posts:
2 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DXCVII: Esquadrão de Reconhecimento Fox 2640 (Bafatá, 1969/71) (Manuel Mata) (1)
3 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCIII: Esquadrão de Reconhecimento Fox 2640 (Manuel Mata) (2)
25 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCLII: Esquadrão de Reconhecimento Fox 2640 (Bafatá, 1969/71) (Manuel Mata) (3)
2 de Abril de 2006 > Guiné 63/74 - DCLXXI: Esquadrão de Reconhecimento Fox 2640 (Manuel Mata) (4): Elevação de Bafatá a Cidade
(2) Vd. posts anteriores desta série:
25 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1699: Guileje, SPM 2728: Cartas do corredor da morte (J. Casimiro Carvalho) (1): Abatido o primeiro Fiat G 91
3 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1727: Guileje, SPM 2728: Cartas do corredor da morte (J. Casimiro Carvalho) (2): Abril de 1973: Sinais de isolamento
(3) Vd. post de 7 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1738: Hospital Militar de Bissau (2): O terminal da guerra, da morte e do horror (Carlos Américo Cardoso, 1º cabo radiologista)
Guiné > Região de Tombali > Guileje > CCAV 8350 (1972/73) > Viatura blindada White, de matrícula MG-34-69, pertencente ao Pelotão de Reconhecimento Fox, estacionado em Guileje. Documento que faz parte do álbum fotográfico do Casimiro Carvalho, sem data nem legenda. Segundo o Casimiro Carvalho, o pelotão chamava-se Os Pipas (LG).
Guileje, SPM 2728: Cartas do corredor da morte (J. Casimiro Carvalho) (2): 1ª quinzena de Maio de 1973: Miniférias em Cacine e tanques russos na fronteira (2)
Cartas enviadas pelo José Casmiro Carvalho à família. A selecção, a revisão e a fixação do texto são da responsabilidade do editor do blogue (LG) .
Cacine, 6/5/3
Mãezinha. (…) Chamaram-me no dia 4 e disseram-me: Você vai para Cacine receber os mantimentos para toda a época das chuvas, durante um mês. E cá estou…
Tem praia onde tomo banho todo os dias. Come-se assim: Jantar: arroz de frango (aquele escuro, com sangue), mas com frango; meia pera de conserva, 1 banana, vinho à discrição com gelo; café. Almoço: pato com batatas às rodelas, uma espécie de Espanhola, bastante pato, canja (uma delícia), 2 babanas e café. Como vê !!!?
PS – Junto foto contado o patacão.
Guiné > Região de Tombali > Guileje > CCAV 8350 (1972/73) > O Fur Mil Op Esp José Casimiro Carvalho contando o patacão.... Foto enviada à mãe.
Cacine, 6/5/73
Querido pai: A sorte desta vez escolheu-me para ser protegido, pois mandaram-se para Cacine, terra de praia e sol, cocos, mangos, bananas, nada que fazer, nada de patrulhas nem trabalho… Só quando vêm batelões de Bissau é que tenho que conferir tudo (ao todo, durante este mês são 120 toneladas de reabastecimentos) e depois acompanhar de batelão até Gadamael (a 18 km de Guiledje) e voltar para Cacine, à espera de mais.
Sob o meu comando, estão um cabo e um soldado para ajudar. Em dois dias já estou mornaço.
(…) Aqui vai [uma foto de ] um dos carros de combate de Guileje.
(…) Um abraço sincero do seu Operações Especiais que de especial não tem nada. With Love.
Os aviões voltarão a voar, promete o Spínola
Cacine, 13/5/73
Mãezinha: (…) Fui até Gadamael de batelão (isto é que é viajar de barco!) e passei lá uma noite, noite em que Guileje foi atacada.. Também choveu torrencialmente e eu cá fora só de calções a apanhá-la e os soldados, com sabão, debaixo das caleiras a tomar banho” (…)
(…) Todos os dias, praia e banho. Não é nada mau, não acha ? Estou mesmo preto. Ando a sofrer por causa da ‘lica’: são centenas de borbulhinhas que com o suor picam como mil agulhas” (…).
Cacine, 13/5/73
Bijou: (…) Tenho andado aqui de batelão, comido cocos e bananas nem se fala. Mangos (fruta saborosa) há qui aos tombos.
Come-se bem aqui, e continua (hoje bifes de cebolada). Guileje foi atacado outra vez, mas eu não estava lá.
Parece que vai haver aviões outra vez no mato. Disse o Spínola anteontem em Guileje. Um beijo (…).
Carros de combate russos na fronteira
Cacine, 15/5/73
Paizinho: (…) A guerra aqui está cada vez pior. O Hospital de Bissau (3) está repleto (infelizmente). Só em Guidaje ,[ no norte], 40 feridos, alguns dos quais com membros amputados (já a cheirar mal devido a terem esperado 2 ou 3 dias por coluna para serem evacuados). Aviões já não vão lá.
No Cantanhez (todos estes locais que menciono são no sul, onde estou), 13 feridos numa emboscada. Guileje foi atacada outra vez e passados dois dias os melhores homens que tínhamos lá (dois furriéis milicianos) morreram, em consequência de uma mina anticarro que iam levantar. Andamos tods transtornados.
A 18 km de Guileje fica Gadamael e foram para lá 4 canhões sem recuo e 35 homens para os guarnecer. Levaram também granadas anti-tanque, pois foram vistos carros de combate na fronteira da República [da Guiné-Conacri].
O meu serviço aqui é receber os géneros e artigos de cantina que vão para Guileje, para o isolamento, pois com as chuvas ficamos como que numa ilha e não podemos sair de lá, só de avião ou barcos de borracha. Aviões não há. Portanto só de barco (o que é muito perigoso)…
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Notas de L.G.:
(1) Vd. Não sei qual era o nº do Esquadrão. No meu tempo (1969/71), havia um Esquadrão de Reconhecimento em Bafátá, a que pertenceu o nosso camarada Manuel Mata. Vd. posts:
2 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DXCVII: Esquadrão de Reconhecimento Fox 2640 (Bafatá, 1969/71) (Manuel Mata) (1)
3 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCIII: Esquadrão de Reconhecimento Fox 2640 (Manuel Mata) (2)
25 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCLII: Esquadrão de Reconhecimento Fox 2640 (Bafatá, 1969/71) (Manuel Mata) (3)
2 de Abril de 2006 > Guiné 63/74 - DCLXXI: Esquadrão de Reconhecimento Fox 2640 (Manuel Mata) (4): Elevação de Bafatá a Cidade
(2) Vd. posts anteriores desta série:
25 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1699: Guileje, SPM 2728: Cartas do corredor da morte (J. Casimiro Carvalho) (1): Abatido o primeiro Fiat G 91
3 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1727: Guileje, SPM 2728: Cartas do corredor da morte (J. Casimiro Carvalho) (2): Abril de 1973: Sinais de isolamento
(3) Vd. post de 7 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1738: Hospital Militar de Bissau (2): O terminal da guerra, da morte e do horror (Carlos Américo Cardoso, 1º cabo radiologista)
Guiné 63/74 - P1758: Convívios (7) : BCAÇ 2893 (Nova Lamego 1969/71), Figueira da Foz, 26 de Maio de 2007 (Tino Neves)
Mensagem enviada pelo camarada Constantino Neves, ex-1º Cabo Escriturário da CCS do BCaç 2893 ( Nova Lamego, 1969/71).
BCAÇ 2893 > CCS/CCAÇ 2617/CCAÇ 2618/CCAÇ 2619 + Pel Mort 2105/Pel Re Daimler
5.º Encontro/Convívio > Figueira da Foz, 26 de Maio de 2007
Quinta de Castros
Serra de Castros - Maiorca
Figueira da Foz
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Entradas > Enchidos grelhados; Salgadinhos
Bufê > Sapateira recheada; Gambas cozidas; Polvo (salada); Ovas; Salmão em espelho; Saladas frias; Bacalhau espiritual; Lombo recheado; Batata assada; Arroz árabe; Sopa de alho francês
Mesas de Doce e de Fruta
Mesas de Doce e de Fruta
BAR ABERTO
Bolo de Aniversário e Espumante
PREÇO: 32,00 € (Crianças até aos 4 anos não pagam, dos 5 aos 10 pagam 16,00€ ).
CONFIRMAÇÃO: Até ao dia 12 de Maio de 2007
PONTO DE ENCONTRO
PREÇO: 32,00 € (Crianças até aos 4 anos não pagam, dos 5 aos 10 pagam 16,00€ ).
CONFIRMAÇÃO: Até ao dia 12 de Maio de 2007
PONTO DE ENCONTRO
Concentração em frente à Câmara Municipal da Figueira da Foz, até às 11,30 horas.
NOTA: Agradecia que me confirmassem logo após a recepção desta carta a intenção de estarem presentes, a fim de calcular atempadamente,quantos de vós estareis presentes.
NOTA: Agradecia que me confirmassem logo após a recepção desta carta a intenção de estarem presentes, a fim de calcular atempadamente,quantos de vós estareis presentes.
Para os camaradas que ainda não disponibilizaram uma foto, tipo passe ou outra, agradecia que o fizessem, pois é de grande utilidade, para melhor os reconhecer, quando só o nome não chega.
Escrevam no verso o nome, posto e Companhia. Agradecido.
CONTACTO:
Constantino Neves
Telefone: 21 017 32 26
Telemóvel: 93 437 03 52
Endereço de correio electrónico > constantino.neves@gmail.com
Laranjeiro, 23 de Abril de 2007
Escrevam no verso o nome, posto e Companhia. Agradecido.
CONTACTO:
Constantino Neves
Telefone: 21 017 32 26
Telemóvel: 93 437 03 52
Endereço de correio electrónico > constantino.neves@gmail.com
Laranjeiro, 23 de Abril de 2007
Guiné 63/74 - P1757: Convívios (6): CART 2339 (Fá Mandinga e Mansambo,1968/69), Carvalhos, 19 de Maio de 2007 (Carlos Marques dos Santos)
Mensagem enviada pelo nosso camarada Carlos Marques Santos, ex-Fur Mil da CART 2339 (Fá Mandinga e Mansambo, 1968/69)
16.º CONVÍVIO > 19 de Maio de 2007
16.º CONVÍVIO > 19 de Maio de 2007
Guiné, Fá Mandinga e Mansambo , CART 2339 (1968/69). Celebram-se este ano os 40 anos da Companhia: em 28 de Agosto de 1967, em Évora, dava-se início à Formação da CART 2339.
O Almoço-Convívio realizar-se-á, nos Carvalhos, Vila Nova de Gaia, a 19 de Maio, pelas 13.00 horas.
Antes e pelas 11.00 h todo o pessoal deve encontrar-se na Igreja da N.ª Sr.ª da Saúde – Carvalhos, que fica próxima do local do Encontro e é um local amplo.
Portanto não esqueças. INSCREVE-TE COM TEMPO e passa palavra. Contactos:
Antes e pelas 11.00 h todo o pessoal deve encontrar-se na Igreja da N.ª Sr.ª da Saúde – Carvalhos, que fica próxima do local do Encontro e é um local amplo.
Portanto não esqueças. INSCREVE-TE COM TEMPO e passa palavra. Contactos:
Carlos Marques dos Santos – Telm 91 921 21 13
Rua Gago Coutinho, 17A-6.ºA
3030 – 326 Coimbra
Ernesto Ribeiro – Telm 96 649 56 02
R. Sarmento Pimentel, 376
4450-790 Leça da Palmeira
Um Grande Abraço
Marques dos Santos
Rua Gago Coutinho, 17A-6.ºA
3030 – 326 Coimbra
Ernesto Ribeiro – Telm 96 649 56 02
R. Sarmento Pimentel, 376
4450-790 Leça da Palmeira
Um Grande Abraço
Marques dos Santos
domingo, 13 de maio de 2007
Guiné 63/74 - P1756: Exposição de armamento apreendido ao PAIGC, aquando da visita de Américo Tomás (Bissau, 1968) (Victor Condeço)
Guiné > Bissau > Fevereiro de 1968 > Exposição de armamento apreendido ao PAIGC, por ocasião da visita do Presidente da República, Alm Américo Tomás > Anti-aéreas Degtyarev, de origem russa.
Guiné > Bissau > Fevereiro de 1968 > Exposição de armamento apreendido ao PAIGC, por ocasião da visita do Presidente da República, Alm Américo Tomás > Espingarda com alça telescópica, V 3272, calibre 7,62. Origem: URSS.
Guiné > Bissau > Fevereiro de 1968 > Exposição de armamento apreendido ao PAIGC, por ocasião da visita do Presidente da República, Alm Américo Tomás > Em primeiro plano, Metralhadora Ligeira MG 42, Borsig, calibre 7,92. Origem: Alemanha Oriental.
Guiné > Bissau > Fevereiro de 1968 > Exposição de armamento apreendido ao PAIGC, por ocasião da visita do Presidente da República, Alm Américo Tomás > Met Lig MG 42.
Guiné > Bissau > Fevereiro de 1968 > Exposição de armamento apreendido ao PAIGC, por ocasião da visita do Presidente da República, Alm Américo Tomás > A pistola-metralhadora Sudaev, PPS, m/1943 PPS, variante da famosa costureirinha. Origem: URSS.
Segundo a Wikipedia, a PPS-43 é uma variante da PPSH-41. Foi desenhada por Aleksei Sudaev e testada, com grande eficácia, na Batalha de Estalinegrado. Foi o resultado da simplificação da PPSH-41. É considerada a melhor pistola-metralhadora da Segunda Guerra Mundial.
Guiné > Bissau > Fevereiro de 1968 > Visita do Presidente da República, Alm Américo Tomás > Passagem do cortejo junto à catedral de Bissau.
Guiné > Bissau > Fevereiro de 1968 > Visita do Presidente da República, Alm Américo Tomás > Passagem do cortejo junto à Catedral de Bissau.
Fotos: © Victor Condeço (2007). Direitos reservados.
Mensagem do Victor Condeço (ex- Fur Mil Mecânico de Armamento, CCS do BART 1913, Catió 1967/69) (1). :
Meus caros, Nuno Rubim e Luís Graça:
Logo na primeira solicitação do Nuno tinha digitalizado este material com vista ao seu envio, no entanto não o cheguei a fazê-lo por não ver nele muito interesse. Perante a lamentação de que ninguém respondeu (2), resolvi enviar o que possuo e que é muito pouco, mas diz o povo que, “quem dá o que tem a mais não é obrigado”!
Devo dizer que, embora sendo do meu álbum fotográfico, estas fotos não foram tiradas por mim, mas sim pelo delegado do BART 1913, em Bissau.
Estas fotografias retratam uma exposição de armamento capturado ao PAIGC que teve lugar na Amura em Bissau, quando da visita do Presidente da República Américo Tomás em Fevereiro de 1968 à Guiné. Duas das fotos mostram momentos dessa visita junto à catedral de Bissau.
Se considerarem que as mesmas têm algum préstimo, façam o favor de lhe dar o uso que cada um de vós entender.
Um abraço para ambos.
Victor Condeço
2. Comentário de L.G.: Obrigado, Victor, em meu nome e do Nuno. Deixo ao Nuno a tarefa de fazer uma apreciação mais detalhada deste material fotográfica. Ele é que é o especialista. Arrisquei, no entanto, pôr algumas legendas nas fotos.
3. Teor do e-mail que o Nuno Rubim acaba de mandar ao Victor:
Caro Victor Condeço:
Muito obrigado pelas imagens que enviou. Bem haja, é o primeiro camarada que me responde.
São importantes no contexto da guerra colonial e sugeria-lhe que as enviasse, (cópias) ao Arquivo Histórico Militar, pois ficariam assim resguardadas para o futuro. Lá ficariam, para sempre, registadas no seu nome.
Não tenho tido problemas com o material utilizado pelo PAIGC, visto que tenho obtido todas as informações que julgo necessárias, bem como numerosas fotografias e desenhos. Curiosamente, tenho tido mais dificuldades em obter informações e fotografias de interesse sobre as as armas, viaturas, etc..., que nós utilizámos ...
Um abraço
Nuno Rubim
__________
Notas de L.G.:
(1) Vd. post de 3 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1335: Um mecânico de armamento para a nossa companhia (Victor Condeço, CCS/BART 1913, Catió)
(2) Vd. post de 12 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1753: Diorama de Guileje, 1965/67 (Muno Rubim)
Guné 63/74 - P1755: Tabanca Grande (8): Carlos Vinhal, co-editor do nosso blogue (Carlos Vinhal / David Guimarães)
1. Mensagem do nosso co-editor Carlos Vinhal, ex-Fur Mil Art Minas e Armadilhas, CART 2732, Mansabá, 1970/72):
Caros amigos e camaradas:
Para que eu tenha algum préstimo, sugiro que todos os mails relativos ao nosso Blogue sejam enviados preferencialmente para luisgracaecamaradasdaguine@gmail.com, endereço a que tenho acesso directo.
O Luís continuará a coordenar toda a correspondência para aqui enviada, podendo eu mais facilmente cumprir as orientações dele emanadas.
Qualquer assunto de ordem mais restrita poderá continuar a ser enviado para os endereços antigos do nosso comandante Luís. Estou ao vosso dispor para, por exemplo, divulgar encontros das vossas Unidades.
Um abraço do camarada
Carlos Vinhal
Leça da Palmeira
2. Comentário do David Guimarães:
Ex-camarada e meu grande amigo Carlos...
Na guerra viu-se muitas vezes mobilizações mal feitas e armas mal atribuídas... Um dos meus soldados, coitado, tivemos que finalmente lhe dar uma vassoura para varrer a parada , enfim para se ir entretendo, passar a comissão e regressar para casa são e salvo. Ele não tinha vocação, nem jeito nenhum, para as armas, é verdade...
Pegámos no homem da Pesada 2 em Vila Nova de Gaia e eu e o comandante de meu pelotão (já falecido) levámo-lo, pois já era a terceira mobilização que falhava por falta de habilidade do mínimo das habilidades. E olhem, esse sim, nem sei para que o apuraram para a tropa... Fizemos a obra, não doeu a consciência e que esteja vivo na terra dele é o que desejamos...
Era um rapaz sério, era gente boa... humilde ao máximo. Mandava-se voltar à direita e todo o pelotão voltava e ele, coitado, nunca acertou, era sempre ao contrário... Quando se marchava, lá ia um só com o passo trocado: era ele...
Em tiro, no apoiado e só , tinha que estar alguém do lado a ajudá-lo... A única coisa que ele fazia bem era beber uns copos... (isto é verdade) Não sairia mais da tropa, creio e então levámo-lo e devolvêmo-lo ao seu lar... Ao menos isso... Lá, na Guiné era o homem que dormia com dois camuflados e para o banho, lá ia sempre acompanhado senão não ia, pronto...
Agora, Carlos, tu és dos mobilizados para isto que aprovo com claps claps de palmas pois tens sido um dos grandes bloguistas e ainda bem... De intervenção oportuna - mas eu sou suspeito ao gabar-te, é que gabo um atirador de minas e armadilhas.... (Ficou bonito)...
Estás muito bem mobilizado...
Um abraço, Carlos Vinhal, anotei a direcção e vamos em frente...
David
ex-furriel miliciano
Atirador Artilharia e Minas e Armadilhas
Xitole 70/72
que... andou contigo na recruta (Caldas da Rainha), na especialidade (Vendas Novas) e em minas e armadilhas (Casal do Pote, em Tancos) e só há pouco é que nos conhecemos... A vida tem destas coisas... mas por isso, e só, é que a vida é mais bela ainda... porque é dificil acreditar que tantas vezes tropeçámos um no outro...
Caros amigos e camaradas:
Para que eu tenha algum préstimo, sugiro que todos os mails relativos ao nosso Blogue sejam enviados preferencialmente para luisgracaecamaradasdaguine@gmail.com, endereço a que tenho acesso directo.
O Luís continuará a coordenar toda a correspondência para aqui enviada, podendo eu mais facilmente cumprir as orientações dele emanadas.
Qualquer assunto de ordem mais restrita poderá continuar a ser enviado para os endereços antigos do nosso comandante Luís. Estou ao vosso dispor para, por exemplo, divulgar encontros das vossas Unidades.
Um abraço do camarada
Carlos Vinhal
Leça da Palmeira
********************
2. Comentário do David Guimarães:
Ex-camarada e meu grande amigo Carlos...
Na guerra viu-se muitas vezes mobilizações mal feitas e armas mal atribuídas... Um dos meus soldados, coitado, tivemos que finalmente lhe dar uma vassoura para varrer a parada , enfim para se ir entretendo, passar a comissão e regressar para casa são e salvo. Ele não tinha vocação, nem jeito nenhum, para as armas, é verdade...
Pegámos no homem da Pesada 2 em Vila Nova de Gaia e eu e o comandante de meu pelotão (já falecido) levámo-lo, pois já era a terceira mobilização que falhava por falta de habilidade do mínimo das habilidades. E olhem, esse sim, nem sei para que o apuraram para a tropa... Fizemos a obra, não doeu a consciência e que esteja vivo na terra dele é o que desejamos...
Era um rapaz sério, era gente boa... humilde ao máximo. Mandava-se voltar à direita e todo o pelotão voltava e ele, coitado, nunca acertou, era sempre ao contrário... Quando se marchava, lá ia um só com o passo trocado: era ele...
Em tiro, no apoiado e só , tinha que estar alguém do lado a ajudá-lo... A única coisa que ele fazia bem era beber uns copos... (isto é verdade) Não sairia mais da tropa, creio e então levámo-lo e devolvêmo-lo ao seu lar... Ao menos isso... Lá, na Guiné era o homem que dormia com dois camuflados e para o banho, lá ia sempre acompanhado senão não ia, pronto...
Agora, Carlos, tu és dos mobilizados para isto que aprovo com claps claps de palmas pois tens sido um dos grandes bloguistas e ainda bem... De intervenção oportuna - mas eu sou suspeito ao gabar-te, é que gabo um atirador de minas e armadilhas.... (Ficou bonito)...
Estás muito bem mobilizado...
Um abraço, Carlos Vinhal, anotei a direcção e vamos em frente...
David
ex-furriel miliciano
Atirador Artilharia e Minas e Armadilhas
Xitole 70/72
que... andou contigo na recruta (Caldas da Rainha), na especialidade (Vendas Novas) e em minas e armadilhas (Casal do Pote, em Tancos) e só há pouco é que nos conhecemos... A vida tem destas coisas... mas por isso, e só, é que a vida é mais bela ainda... porque é dificil acreditar que tantas vezes tropeçámos um no outro...
sábado, 12 de maio de 2007
Guiné 63/74 - P1754: Convívios (5): CART 3494 (Xime e Mansambo, 1972/74), Amarante, 9 de Junho de 2007 (Sousa de Castro)
Mensagem enviada pelo nosso camarada Sousa de Castro:
XXII Convívio CART 3494 (Fantasmas do Xime)
(Guiné, Dez 1971 / Abr 1974)
9 de Junho 2007 em AMARANTE
Restaurante Grelha - Edifício TOP
Recta de Ramos - Telões - Amarante
XXII Convívio CART 3494 (Fantasmas do Xime)
(Guiné, Dez 1971 / Abr 1974)
9 de Junho 2007 em AMARANTE
Restaurante Grelha - Edifício TOP
Recta de Ramos - Telões - Amarante
Programa:
10,00 horas - Concentração no Parque Florestal de Amarante
11,00 horas - Visita histórica a Amarante
12,30 horas - Almoço com animação musical
Contacto: José Carlos Mendes Pinto > TLM 937 206 088 ou Telef. 255 105 270
11,00 horas - Visita histórica a Amarante
12,30 horas - Almoço com animação musical
Contacto: José Carlos Mendes Pinto > TLM 937 206 088 ou Telef. 255 105 270
(ex-1º Cabo TRMS Radio ,
CART 3494 / BART 3873 ,
1972/74)
Contacto > Viana do Castelo > sousadecastro@sapo.pt
Guiné 63/74 - P1753: Diorama de Guileje, 1965/67 (Muno Rubim)
Guiné > Região de Tombali > Guileje> Diorama do aquartelamento e tabanca (1965/67)
Fonte: Nuno Rubim (2007). Direito reservados.
Nuno Rubim, ex-capitão da CCAÇ 726, Guileje, 1964/74, um dos oficiais mais condecorados da Guiné (onde fez duas comissões), hoje coronel na reforma e historiador militar. Foi também um dos capitães do MFA, da primeira hora. É membro da nossa tertúlia. Está a colaborar com a AD - Acção para o Desenvolvimento, no âmbito do Projecto Guiledje.
Foto: © Luís Graça (2006). Direitos reservados.
1. Mensagem de 18 de Abril de 2007, enviada pelo nosso camarada e amigo Nuno Rubim (1):
Caro Luís,
Se entenderes por bem publica o seguinte no blogue:
O apelo feito no post de 27 de Março (2) não obteve qualquer resposta.
Talvez os camaradas tenham entendido que pedido se referia a armamento e viaturas em Guildeje. Ora o material era o mesmo, pintado da mesma maneira, qualquer que fosse o local onde se encontrasse. Por isso renovo o meu pedido, esperando que desta feita tenha mais sorte.
Quanto ao diorama de Guileje (3) segue em bom andamento. Ainda há "pequenas arestas a limar" ... Ainda falta, por exemplo, determinar o traçado da rede de arame farpado e a disposição da iluminação exterior.
O diorama ficará implantado numa base de 2m x 2m.
Junto envio o desenho definitivo ( espero eu ... ) do aquartelamento, em 1965-67, já que durante esse período as alterações foram mínimas ( se estou enganado, agradece-se a correcção ). O desenho, já preparado para a escala 1:72, baseou-se no levantamento topográfico efectuado em 2005, por Fidel Midana Sambú, sob os auspícios da AD (Carlos Schwarz, mais conhecido por Pepito) e 4 fotografias aéreas da época, uma das quais efectuada à vertical.
Verifiquei que o levantamento oferecia alguma pequenas distorções, naturais devido à dificuldade de circulação na zona, originada pelas destruições provocadas pelo alegado bombardeamento aéreo das FAP em Maio ou Junho de 1973 (que ainda permanece
um mistério ... ) e pelo extraordinário desenvolvimento da vegetação.
Caso curioso, a maioria das localizações das cubatas é concordante! Alguns dos camaradas poderão agora comparar este desenho com o que apresentei há tempos, de memória, e chegar à mesma conclusão que eu: o tempo não perdoa e é preciso ter algum cuidado quando se lida com as recordações do passado que não foram registadas por escrito ou fotograficamente na altura ...
Estou agora a desenhar, também à escala, os edifícios, abrigos e palhotas (estas 60 !, e de 4 diâmetros diferentes !). Já estão a ser elaboradas as miniaturas de uma DO-27 e de vários tipos de viaturas então utilizadas.
Ainda preciso de consultar os meus camaradas da altura sobre a localização de portas e janelas nos diversos edifícios. As fotografias serão fundamentais.
Para além do diorama estou a estudar a feitura de um poster sobre o ataque de Maio de 1973. Prevê-se ainda a construção de kits de armamento e viaturas, quer portuguesas, quer do PAIGC, mas em várias escalas, visto que foi necessário recorrer ao que o mercado fornece. E no caso das Fox e Unimog, estas terão de ser feitas de raiz (!), pois não existem, ao meu conhecimento, kits comercializados.
Um abraço
Nuno Rubim
2. Comentário do editor do blogue:
Parabéns ao Nuno e à sua equipa (4)... Faço daqui um apelo à colaboração dos nossos camaradas que possam ter elementos de interesse documental ou museológico (nomeadamente fotografias, plantas, relatórios...) relativos a Guileje, para os fornecerem ao Nuno, ou a mim próprio. Os originais serão cedidos (ou não) a título de empréstimo. Parabéns também ao Pepito e à AD por este esforço de preservação da memória da guerra... e da paz. LG
_____
Notas de L. G.:
(1) Vd. post de 18 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1189: O tertuliano Nuno Rubim, especialista em história militar
(2) Vd. post de 27 de Março de 2007 > Gúiné 63/74 - P1628: Projecto Guiledje: fotografias de armamento e equipamento, das NT e do PAIGC, precisam-se (Nuno Rubim)
(3) Vd. post de 12 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P870: Ideias para um diorama do quartel ou quartéis de Guileje (Nuno Rubim)
(4) Vd. post de 14 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1173: A fortificação de Guileje (Nuno Rubim, Teco e Guedes, CCAÇ 726)
Fonte: Nuno Rubim (2007). Direito reservados.
Nuno Rubim, ex-capitão da CCAÇ 726, Guileje, 1964/74, um dos oficiais mais condecorados da Guiné (onde fez duas comissões), hoje coronel na reforma e historiador militar. Foi também um dos capitães do MFA, da primeira hora. É membro da nossa tertúlia. Está a colaborar com a AD - Acção para o Desenvolvimento, no âmbito do Projecto Guiledje.
Foto: © Luís Graça (2006). Direitos reservados.
1. Mensagem de 18 de Abril de 2007, enviada pelo nosso camarada e amigo Nuno Rubim (1):
Caro Luís,
Se entenderes por bem publica o seguinte no blogue:
O apelo feito no post de 27 de Março (2) não obteve qualquer resposta.
Talvez os camaradas tenham entendido que pedido se referia a armamento e viaturas em Guildeje. Ora o material era o mesmo, pintado da mesma maneira, qualquer que fosse o local onde se encontrasse. Por isso renovo o meu pedido, esperando que desta feita tenha mais sorte.
Quanto ao diorama de Guileje (3) segue em bom andamento. Ainda há "pequenas arestas a limar" ... Ainda falta, por exemplo, determinar o traçado da rede de arame farpado e a disposição da iluminação exterior.
O diorama ficará implantado numa base de 2m x 2m.
Junto envio o desenho definitivo ( espero eu ... ) do aquartelamento, em 1965-67, já que durante esse período as alterações foram mínimas ( se estou enganado, agradece-se a correcção ). O desenho, já preparado para a escala 1:72, baseou-se no levantamento topográfico efectuado em 2005, por Fidel Midana Sambú, sob os auspícios da AD (Carlos Schwarz, mais conhecido por Pepito) e 4 fotografias aéreas da época, uma das quais efectuada à vertical.
Verifiquei que o levantamento oferecia alguma pequenas distorções, naturais devido à dificuldade de circulação na zona, originada pelas destruições provocadas pelo alegado bombardeamento aéreo das FAP em Maio ou Junho de 1973 (que ainda permanece
um mistério ... ) e pelo extraordinário desenvolvimento da vegetação.
Caso curioso, a maioria das localizações das cubatas é concordante! Alguns dos camaradas poderão agora comparar este desenho com o que apresentei há tempos, de memória, e chegar à mesma conclusão que eu: o tempo não perdoa e é preciso ter algum cuidado quando se lida com as recordações do passado que não foram registadas por escrito ou fotograficamente na altura ...
Estou agora a desenhar, também à escala, os edifícios, abrigos e palhotas (estas 60 !, e de 4 diâmetros diferentes !). Já estão a ser elaboradas as miniaturas de uma DO-27 e de vários tipos de viaturas então utilizadas.
Ainda preciso de consultar os meus camaradas da altura sobre a localização de portas e janelas nos diversos edifícios. As fotografias serão fundamentais.
Para além do diorama estou a estudar a feitura de um poster sobre o ataque de Maio de 1973. Prevê-se ainda a construção de kits de armamento e viaturas, quer portuguesas, quer do PAIGC, mas em várias escalas, visto que foi necessário recorrer ao que o mercado fornece. E no caso das Fox e Unimog, estas terão de ser feitas de raiz (!), pois não existem, ao meu conhecimento, kits comercializados.
Um abraço
Nuno Rubim
2. Comentário do editor do blogue:
Parabéns ao Nuno e à sua equipa (4)... Faço daqui um apelo à colaboração dos nossos camaradas que possam ter elementos de interesse documental ou museológico (nomeadamente fotografias, plantas, relatórios...) relativos a Guileje, para os fornecerem ao Nuno, ou a mim próprio. Os originais serão cedidos (ou não) a título de empréstimo. Parabéns também ao Pepito e à AD por este esforço de preservação da memória da guerra... e da paz. LG
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Notas de L. G.:
(1) Vd. post de 18 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1189: O tertuliano Nuno Rubim, especialista em história militar
(2) Vd. post de 27 de Março de 2007 > Gúiné 63/74 - P1628: Projecto Guiledje: fotografias de armamento e equipamento, das NT e do PAIGC, precisam-se (Nuno Rubim)
(3) Vd. post de 12 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P870: Ideias para um diorama do quartel ou quartéis de Guileje (Nuno Rubim)
(4) Vd. post de 14 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1173: A fortificação de Guileje (Nuno Rubim, Teco e Guedes, CCAÇ 726)
Guiné 63/74 - P1752: Estórias cabralianas (22): Alfa, o fula alfacinha (Jorge Cabral)
O Fado (1910 ) > A célebre pintura a óleo de José Malhoa (1855-1933). Fonte: Wikipedia: The Free Encyclopedia.
Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > Um fula... em traje domingueiro, diria um tuga. Difícil é imaginá-lo em Lisboa, no Bairro Alto ou em Alfama, em bairros populares de Lisboa onde nasceu o fado há 170 anos... e com ele a nata da malandragem alfacinha. (LG).
Foto: © Humberto Reis (2007). Direitos reservados.
Foto: © Humberto Reis (2007). Direitos reservados.
Estória nº 22 da série Estórias Cabralianas. Autor: Jorge Cabral , ex- Alferes Miliciano de Artilharia, comandante do Pel Caç Nat 63, Fá Mandinga e Missirá, Sector L1 - Bambadinca, Zona Leste, 1969/71. Era estudante universitário, em Lisboa, quando foi convocado para a tropa. Hoje é advogado, escritor e docente universitário, na Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, sendo o coordenador do curso de pós-graduação em Criminologia.
_________
Alfa, o Fula Alfacinha
por Jorge Cabral
No final do ano de 1970, apresentou-se em Missirá um soldado fula – chamemos-lhe Alfa – vindo da prisão de Bissau, onde cumprira pesada pena. Razão da punição – ausência ilegítima durante cento e oitenta dias, quando após intervenção cirúrgica no Hospital Militar Principal, desaparecera em Lisboa.
Impecavelmente fardado, com blusão e tudo, usava uma vistosa popa e farfalhudas patilhas, conservando sempre um palito dependurado ao canto da boca. Falava um calão lisboeta e aparentava ser um verdadeiro rufia alfacinha.
Quando aos domingos se vestia à paisana, envergava fato completo com colete, e na gravata vermelha brilhava um alfinete de ouro. Exibia duas valiosas pulseiras e até, calculem, botões de punho.
A poucos dias de vir de férias, não tive tempo de averiguar o que fizera na Capital, embora me tivesse causado algum espanto, a profissão que me indicou – cobrador comissionista.
No início de Janeiro, na véspera da minha partida, todos fizeram uma longa fila, a fim de dizerem o que queriam, que eu lhes trouxesse de Lisboa. Ciente da impossibilidade de os satisfazer, mesmo assim, apontei escrupulosamente todos os pedidos, incluindo os treze alfinetes de gravata, os dezoito pares de botões de punho, e as catorze pulseiras. O último da fila, foi o Alfa, que ao contrário dos outros, apenas solicitou que levasse quatro mangas, oferta para umas senhoras amigas de Lisboa. Tomei nota da morada, e prometi a entrega.
Quase a acabar o mês de licença é que me lembrei das mangas, que entretanto já haviam apodrecido. Corri à Baixa tentando encontrar frutos tropicais, e à falta de melhor, consegui arranjar tâmaras. No dia seguinte fui à procura das tais senhoras. A casa ficava na Rua do Mundo em pleno Bairro Alto. Bati à porta e entrei de imediato numa sala, onde sete senhoras sentadas pareciam aguardar.
Levantou-se logo uma que me informou – “Quatrocentos escudos e só ao natural!”
Percebi então, quem eram as senhoras amigas do Alfa e como ele passara aqueles seis meses.
Cobrador pois e até comissionista… Lá lhes dei notícias e as tâmaras.
Regressado, não contei a ninguém sobre a respeitável actividade do Alfa em Lisboa, mas junto dele louvei a beleza das amigas, das quais adivinhara a excelência profissional.
Anos depois, já Advogado, também eu trabalhei para as tais senhoras. Nunca tive clientes mais honestas e cumpridoras. Pagaram sempre os meus serviços. Só que às vezes não foi em dinheiro…
Jorge Cabral
________
Nota de L.G.:
(1) Vd. último post > 24 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1696: Estórias cabralianas (21): O Amoroso Bando das Quatro em Missirá (Jorge Cabral)
_________
Alfa, o Fula Alfacinha
por Jorge Cabral
No final do ano de 1970, apresentou-se em Missirá um soldado fula – chamemos-lhe Alfa – vindo da prisão de Bissau, onde cumprira pesada pena. Razão da punição – ausência ilegítima durante cento e oitenta dias, quando após intervenção cirúrgica no Hospital Militar Principal, desaparecera em Lisboa.
Impecavelmente fardado, com blusão e tudo, usava uma vistosa popa e farfalhudas patilhas, conservando sempre um palito dependurado ao canto da boca. Falava um calão lisboeta e aparentava ser um verdadeiro rufia alfacinha.
Quando aos domingos se vestia à paisana, envergava fato completo com colete, e na gravata vermelha brilhava um alfinete de ouro. Exibia duas valiosas pulseiras e até, calculem, botões de punho.
A poucos dias de vir de férias, não tive tempo de averiguar o que fizera na Capital, embora me tivesse causado algum espanto, a profissão que me indicou – cobrador comissionista.
No início de Janeiro, na véspera da minha partida, todos fizeram uma longa fila, a fim de dizerem o que queriam, que eu lhes trouxesse de Lisboa. Ciente da impossibilidade de os satisfazer, mesmo assim, apontei escrupulosamente todos os pedidos, incluindo os treze alfinetes de gravata, os dezoito pares de botões de punho, e as catorze pulseiras. O último da fila, foi o Alfa, que ao contrário dos outros, apenas solicitou que levasse quatro mangas, oferta para umas senhoras amigas de Lisboa. Tomei nota da morada, e prometi a entrega.
Quase a acabar o mês de licença é que me lembrei das mangas, que entretanto já haviam apodrecido. Corri à Baixa tentando encontrar frutos tropicais, e à falta de melhor, consegui arranjar tâmaras. No dia seguinte fui à procura das tais senhoras. A casa ficava na Rua do Mundo em pleno Bairro Alto. Bati à porta e entrei de imediato numa sala, onde sete senhoras sentadas pareciam aguardar.
Levantou-se logo uma que me informou – “Quatrocentos escudos e só ao natural!”
Percebi então, quem eram as senhoras amigas do Alfa e como ele passara aqueles seis meses.
Cobrador pois e até comissionista… Lá lhes dei notícias e as tâmaras.
Regressado, não contei a ninguém sobre a respeitável actividade do Alfa em Lisboa, mas junto dele louvei a beleza das amigas, das quais adivinhara a excelência profissional.
Anos depois, já Advogado, também eu trabalhei para as tais senhoras. Nunca tive clientes mais honestas e cumpridoras. Pagaram sempre os meus serviços. Só que às vezes não foi em dinheiro…
Jorge Cabral
________
Nota de L.G.:
(1) Vd. último post > 24 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1696: Estórias cabralianas (21): O Amoroso Bando das Quatro em Missirá (Jorge Cabral)
Guiné 63/74 - P1751: Convívios (4): CART 1690 (Geba 1967/69): Sever do Vouga, Couto de Esteves, 2 de Junho de 2007 (A. Marques Lopes)
Mensagem enviada pelo nosso camarada A. Marques Lopes , Coronel (DFA) na situação de Reforma, ex-alferes miliciano da CART 1690 (Geba,, 1967) e da CCAÇ 3 (Barro, 1968).
CART 1690 – XIV CONVÍVIO – 2 DE JUNHO DE 2007
É verdade. Já passaram 40 anos sobre a nossa partida para a Guiné. Assiste-nos pois o direito a celebrar condignamente, data tão significativa. E vamos fazê-lo, em pleno, num local já conhecido de muitos.
É verdade. Já passaram 40 anos sobre a nossa partida para a Guiné. Assiste-nos pois o direito a celebrar condignamente, data tão significativa. E vamos fazê-lo, em pleno, num local já conhecido de muitos.
Ali bem perto de Sever do Vouga, em COUTO DE ESTEVES, o restaurante O Júnior espera por nós no dia 2 de Junho, a partir das 11,00 horas.
O preço será de 25 € por pessoa e as respectivas inscrições serão recepcionadas até 25 de Maio pelos ex-furriéis:
Nogueira - telef. 219 800 687 - telem. 969 031 853
Salvado - telef. 214 313 931
Silva - telef. 217 933 682 - telem. 962 764 936
Vasconcelos - telef. 229 730 562 - telem. 962 792 507
Contamos contigo e esperamos que promovas junto ao companheiro, ainda indeciso, a ideia que não poderá faltar – é sempre gratificante haver mais um e dos Nossos – a data merece um recorde de presenças.
O preço será de 25 € por pessoa e as respectivas inscrições serão recepcionadas até 25 de Maio pelos ex-furriéis:
Nogueira - telef. 219 800 687 - telem. 969 031 853
Salvado - telef. 214 313 931
Silva - telef. 217 933 682 - telem. 962 764 936
Vasconcelos - telef. 229 730 562 - telem. 962 792 507
Contamos contigo e esperamos que promovas junto ao companheiro, ainda indeciso, a ideia que não poderá faltar – é sempre gratificante haver mais um e dos Nossos – a data merece um recorde de presenças.
Até lá, um forte abraço
A. Marques Lopes
sexta-feira, 11 de maio de 2007
Guiné 63/74 - P1750: Com os Gringos de Guileje... em Nhacra (Herlander Simões)
Guiné > Região de Bissau > Nhacra > CCAÇ 3477 (1971/73) > A equipa de futebol dos Gringos
Guiné > Região de Bissau > Nhacra > CCAÇ 3477 (1971/73) > O Fur Mil Herlander Simões numa patrulha nas imediações de Nhacra.
Guiné > Região de Bissau > Nhacra > CCAÇ 3477 (1971/73) > O Fur Mil Herlander Simões 'posando' para a fotografia, na margem direita do Rio Geba.
Guiné > Região de Bissau > Nhacra > CCAÇ 3477 (1971/73) > O Fur Mil Herlander Simões (o quarto da esquerda, na fila do lado esquerdo, seguido do Alf Mil Boavida) e outros camaradas na festa de aniversário do Fur Mil Mendes (no topo da mesa).
Guiné > Região de Bissau > Nhacra > CCAÇ 3477 (1971/73) > O Fur Mil Herlander Simões, sentado, aplaudindo o discurso do Alf Mil Boavida (de pé) na festa de aniversário do Fur Mil Mendes...
Guiné > Região de Bissau > Nhacra > CCAÇ 3477 (1971/73) > O Fur Mil Herlander Simões sentado no bar do quartel.
Fotos: © Herlander Simões (2007). Direitos reservados.
1. Mensagem, com data de 1 de Março de 2007, do novo membro da nossa Tabanca Grande, Herlander Simões:
Caro camarada Luís Graça:
Tomei conhecimento do teu Blogue,durante uma das minhas buscas na Net procurando notícias dos meus antigos camaradas de armas.
Sou o ex-Furriel Miliciano Herlander Simões e estive na Guiné entre Maio de 72 e Janeiro de 74.
Fui com destino à CCAÇ 16 onde nunca cheguei a ser colocado. Fui primeiro para os Duros de Nova Sintra (1) e depois para os Gringos de Guileje [, CCAÇ 3477, 1971/73], entretanto já sediados em Nhacra.
Espero através deste nosso sítio conseguir algumas notícias dos meus antigos camaradas, colocando-me desde já totalmente dísponivel para dar o meu modesto contributo a esta nobre causa.
Vou tentar enviar algumas fotos tiradas com os Gringos nas proximidades de Nhacra.
Um abraço!
Herlander Simões
_________
Nota de L.G.:
(1) Vd. post de 10 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1747: Tabanca Grande (1): Apresenta-se o ex-Fur Mil Herlander Simões, um dos Duros de Nova Sintra (1972/74)
(2) Sobre os Gringos de Guileje, a CCAÇ 3477 (1971/73):
8 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1574: Uma estória dos Gringos de Guileje (CCAÇ 3477): Estás f..., pá! (Amaro Samúdio)
18 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1293: Guileje: do chimpanzé-bébé aos abrigos à prova do 122 mm (Amaro Munhoz Samúdio, CCAÇ 3477)
10 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1162: Guileje: CCAÇ 3477, os Gringos Açorianos (Amaro Munhoz Samúdio)
Guiné > Região de Bissau > Nhacra > CCAÇ 3477 (1971/73) > O Fur Mil Herlander Simões numa patrulha nas imediações de Nhacra.
Guiné > Região de Bissau > Nhacra > CCAÇ 3477 (1971/73) > O Fur Mil Herlander Simões 'posando' para a fotografia, na margem direita do Rio Geba.
Guiné > Região de Bissau > Nhacra > CCAÇ 3477 (1971/73) > O Fur Mil Herlander Simões (o quarto da esquerda, na fila do lado esquerdo, seguido do Alf Mil Boavida) e outros camaradas na festa de aniversário do Fur Mil Mendes (no topo da mesa).
Guiné > Região de Bissau > Nhacra > CCAÇ 3477 (1971/73) > O Fur Mil Herlander Simões, sentado, aplaudindo o discurso do Alf Mil Boavida (de pé) na festa de aniversário do Fur Mil Mendes...
Guiné > Região de Bissau > Nhacra > CCAÇ 3477 (1971/73) > O Fur Mil Herlander Simões sentado no bar do quartel.
Fotos: © Herlander Simões (2007). Direitos reservados.
1. Mensagem, com data de 1 de Março de 2007, do novo membro da nossa Tabanca Grande, Herlander Simões:
Caro camarada Luís Graça:
Tomei conhecimento do teu Blogue,durante uma das minhas buscas na Net procurando notícias dos meus antigos camaradas de armas.
Sou o ex-Furriel Miliciano Herlander Simões e estive na Guiné entre Maio de 72 e Janeiro de 74.
Fui com destino à CCAÇ 16 onde nunca cheguei a ser colocado. Fui primeiro para os Duros de Nova Sintra (1) e depois para os Gringos de Guileje [, CCAÇ 3477, 1971/73], entretanto já sediados em Nhacra.
Espero através deste nosso sítio conseguir algumas notícias dos meus antigos camaradas, colocando-me desde já totalmente dísponivel para dar o meu modesto contributo a esta nobre causa.
Vou tentar enviar algumas fotos tiradas com os Gringos nas proximidades de Nhacra.
Um abraço!
Herlander Simões
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Nota de L.G.:
(1) Vd. post de 10 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1747: Tabanca Grande (1): Apresenta-se o ex-Fur Mil Herlander Simões, um dos Duros de Nova Sintra (1972/74)
(2) Sobre os Gringos de Guileje, a CCAÇ 3477 (1971/73):
8 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1574: Uma estória dos Gringos de Guileje (CCAÇ 3477): Estás f..., pá! (Amaro Samúdio)
18 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1293: Guileje: do chimpanzé-bébé aos abrigos à prova do 122 mm (Amaro Munhoz Samúdio, CCAÇ 3477)
10 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1162: Guileje: CCAÇ 3477, os Gringos Açorianos (Amaro Munhoz Samúdio)
Guiné 63/74 - P1749: O Nosso Livro de Visitas: Orgulho no meu pai, da CCS do BCAÇ 2852, por ter representado bem o meu país (João Atalaia, filho)
Mensagem do João Atalaia, filho, enviada ao editor do Blogue e ao Paulo Raposo (ex-Alf Mil da CCAÇ 2405, BCAÇ 2852, Mansoa, Galomaro e Dulombi, 1968/70):
Caros amigos:
Em meu nome, e em memória do meu falecido pai [vd. foto ao lado do soldado recruta João Atalaia, em 1967, mobilizado em 1968 para a Guiné como soldado condutor auto da CCS do BCAÇ 2852] (1), escrevo-lhes para vos dizer que apreciei e me emocionei bastante com as vossas palavras e que, apesar de tudo pelo que passaram, tenho muito orgulho que o meu pai conjuntamente com outros camaradas tenham representado bem o país.
Apenas vos contactei por curiosidade, após visualizar alguns documentos que meu pai me deixou, e que hoje guardo para sempre. Tenho intenção de informar os meus dois filhos (8 anos e 6 meses) de que um dia Portugal se envolveu numa guerra, e que o seu avô participou nela.
Continuarei sempre a acompanhar o blogue.
Obrigado
João Atalaia
2. Comentário do editor do blogue:
João: Registo o seu interesse em ficar connosco. Vamos criar uma secção, na lista da nossa tertúlia, só para os filhos, netos, irmãos, viúvas e outros familiares de camararadas nossos já desaparecidos. É uma forma de honrar a sua memória, através dos vivos. (LG).
_______
Nota de L.G.:
(1) Vd. post de 10 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1744: Camaradas que já nos deixaram (1): Sold condutor auto João Atalaia, CCS / BCAÇ 2852 (Bambadinca, 1968/70) (João Atalaia, filho)
Caros amigos:
Em meu nome, e em memória do meu falecido pai [vd. foto ao lado do soldado recruta João Atalaia, em 1967, mobilizado em 1968 para a Guiné como soldado condutor auto da CCS do BCAÇ 2852] (1), escrevo-lhes para vos dizer que apreciei e me emocionei bastante com as vossas palavras e que, apesar de tudo pelo que passaram, tenho muito orgulho que o meu pai conjuntamente com outros camaradas tenham representado bem o país.
Apenas vos contactei por curiosidade, após visualizar alguns documentos que meu pai me deixou, e que hoje guardo para sempre. Tenho intenção de informar os meus dois filhos (8 anos e 6 meses) de que um dia Portugal se envolveu numa guerra, e que o seu avô participou nela.
Continuarei sempre a acompanhar o blogue.
Obrigado
João Atalaia
2. Comentário do editor do blogue:
João: Registo o seu interesse em ficar connosco. Vamos criar uma secção, na lista da nossa tertúlia, só para os filhos, netos, irmãos, viúvas e outros familiares de camararadas nossos já desaparecidos. É uma forma de honrar a sua memória, através dos vivos. (LG).
_______
Nota de L.G.:
(1) Vd. post de 10 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1744: Camaradas que já nos deixaram (1): Sold condutor auto João Atalaia, CCS / BCAÇ 2852 (Bambadinca, 1968/70) (João Atalaia, filho)
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