quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Guiné 63/74 - P10990: Efemérides (116): 50 anos anos da guerra colonial no CTIG ? 23 de janeiro de 1963, o fim do princípio ou o princípio do fim (José Martins / Carlos Silva)


Guiné > 1964 > PAIGC > Cassacá > I Congresso.do PAIGC, Quinta, 13 de Fevereiro de 1964 - Segunda, 17 de Fevereiro de 1964, Da esquerda para a direita,Abdulai Barry, Arafam Mané, Amílcar Cabral, Domingos Ramos e Lai Sek.


Fonte: (1964-1964), "Abdulai Barry, Arafam Mané, Amílcar Cabral, Domingos Ramos e Lai Sek durante o I Congresso.do PAIGC, em Cassacá", CasaComum.org, Fundação Mário Soares, Disponível HTTP: http://www.casacomum.org/cc/visualizador?pasta=05224.000.056 (2013-1-22)


1. Passam hoje 50 anos sobre o "início da guerra colonial" na Guiné, segundo uma certa historiografia (por ex., a do PAIGC e seus "simpatizantes"). Alguma imprensa portuguesa (Correio da Manhã, por exemplo) vai dar algum destaque à efeméride. A questão não é pacífica, nem este dossiê está fechado: a guerra (colonial) na Guiné começou, de facto, em 23/1/1963, com o ataque ao quartel de Tite, liderado pelo Arafan Mané (versão do PAIGC) ou ainda antes (1961, 1962) ? 

Em 1962, por exemplo, o exército, a  par da PIDE e da polícia administrativa,  está já envolvido em operações de repressão mais de natureza policial do que militar. Destacados dirigentes da guerrilha, ainda em organização, são aprisionados ou abatidos em 1962. [ Por exemplo, Vitorino Costa, irmão de Manuel Saturnino da Costa  é morto, numa emboscada em 1962, antes do início oficial da guerra, por um grupo da CCAÇ 153, comandado pelo Cap Inf José Curto, na região de Darsalame; Vitorino e Manuel Saturnino são dois dos históricos militantes enviados para a China para receber treino político-militar, juntamente com João Bernardo Vieira (Nino), Francisco Mendes, Constantino Teixeira, Pedro Ramos, Domingos Ramos, Rui Djassi, Osvaldo Vieira  e Hilário Gomes, tendo sido recebidos pelo "grande timoneiro", Mao Zedong, em 1961]

Enfim, já demos para este "peditório". O nosso camarada Carlos Silva sobre esta questão (o ataque a Tite, descrito pelo seu amigo Gabriel Moura,) já deu, aqui, em tempos um valiosíssimo contributo (*). Não temos entretanto  dados novos. Não fazemos de investigação de arquivo, não somos historiógrafos, publicamos de preferência os materiais que nos chegam às mãos, inéditos, da autoria dos nossos camaradas, ex-combatentes da Guiné. Isso não nos impediu de pedir ao José Martins, nosso colaborador permanente, bem como ao Carlos Silva, um pequeno apontamento sobre esta data. Aqui vão duas pequenas notas.

2. Mensagem de José Martins [ foto à esquerda]: 

23 de Janeiro de 1963: o Fim do Principio ou o Principio do Fim

50 anos depois... O ataque ao aquartelamento de Tite é considerado quer pelo PAIGC quer pela Comissão de Estudos das Campanhas de África 1961-1974, como o inicio da “guerra na Guiné”, pelo que esta data marcará, na nossa opinião, o “Principio do Fim”, dado que a partir dela as acções, de parte a parte, só vieram a terminar após o 25 de Abril de 1974.

Ainda apareceram “teses” de que o inicio das confrontações se reportavam a 3 de Agosto de 1959, o massacre de Pidjiguiti, ou ao ataque ao aquartelamento de São Domingos, na noite de 20 para 21 de Julho de 1961.

À época a localidade de Tite estava guarnecida com o Batalhão de Caçadores nº 237, apenas com comando reduzido, pelo Pelotão de Morteiro nº 19, pelo Destacamento de Manutenção de Material nº 245 e, provavelmente, um pelotão da Companhia de Caçadores nº 275.

No cinquentenário deste combate, lembremos três homens que ficarão ligados a este acontecimento: (i) Arafan Mané (,comandante do PAIGC, vd. foto acima); e os militares portugueses (ii) Gabriel Moura, e (iii) Veríssimo Godinho Ramos.

Arafan Mané (nome de guerra, "Ndajamba"), militante do PAIGC, destacado Combatente da Liberdade da Pátria, é considerado o “responsável” pelo inicio das hostilidades na Guiné, ao ter disparado a primeira rajada de metralhadora e comandado a ofensiva.  Teria na altura menos de 20 anos. Veio a falecer em 2004, em Espanha, de doença prolongada, com o posto de coronel.



Guiné > Região de Quinara > Setor de Tite >  1961/63 >  Gabriel Moura, do pel Mort 19, junto a um cavalo de frisa.

Foto: ©  Gabriel Moura / Carlos Silva (2008). Todos os direitos reservados.


Gabriel Moura, natural de Gondomar (tal como o Carlos Silva, seu amigo, ) foi mobilizado pelo Regimento de Infantaria nº 6, do Porto, para o Pelotão de Morteiros nº 19. Foi o primeiro militar português, quando se encontrava de guarda ao aquartemanento, a responder ao fogo da força que atacou as instalações de Tite. Na reacção ao fogo de que foi alvo, consumiu todas as munições de que dispunha, provavelmente três carragadores, assim como utilizou as duas granadas que lhe estavam distribuídas para o serviço. Faleceu em 2004,  dois anos após ter editado as suas impressões sobre o acontecimento, e por coincidência no mesmo ano da morte de Arafan Mané.

Veríssimo Godinho Ramos [na foto, à esquerda, é o do meio], Soldado Condutor Auto Rodas nº 834/59, da Batalhão de Caçadores nº 237, mobilizado no Regimento de Infantaria nº 6, no Porto,  era solteiro, Filho de Joaquim Ramos e Ricardina Joaquim Godinho. Natural da freguesia de Vale de Cavalos, concelho de Chamusca, faleceu no dia 23 de Janeiro de 1963 durante o ataque a Tite, vitima de ferimentos em combate. Foi inumado no Cemitério de Vale de Cavalos. Há ainda dúvidas dúvida se a causa dos ferimentos foram ou não de “fogo amigo”, dada a surpresa do ataque e a forma da reação das NT.

Por falta de mais elementos  novos sobre o acontecimento de 23 de Janeiro, "imaginei" criar um texto que se apresentasse uma visão mais global, ainda que resumidamente, do que se passou desde 1446 [, descoberta da Guiné pro Tristão da Cunha,] até Janeiro de 1963.

Quando li ou reli o texto do Moura, senti-me "muito pequeno", pelo que estava a ler. É um texto que emociona qualquer um. quer tenha ou não experiência de combate. É realista e, para mim, muito credível. Proponho que o seu nome passe a figurar, entre os "grã-tabanqueiros que da lei da morte se foram libertando". Seria uma forma de honrar a sua memória.

Pelo exposto, e pensando "com os meus botões", achei oportuno lembrar os que se tinham distinguido, para o bem ou para o mal, o facto de que se vai ao perfazer os 50 anos: Quem atacou, quem reagiu e quem tombou. Daí a sugestão de (re)leitura dos  postes do Carlos Silva/Gabriel Moura (*).

 José Marcelino Martins

19 de Janeiro de 2013 (**)

3. Mensagem do Carlos Silva [, foto à esquerda,com o António Camilo, no Saltinho, 2008]:

A brochura que o meu falecido amigo e conterrâneo [Gabriel Moura,]  escreveu com textos também do meu diário e fotos minhas, fala de algo mais.

Já li dezenas de livros e tenho mais dezenas para ler, que já não leio nem na cova e não há absolutamente nada escrito sobre o tema tão desenvolvido como o Gabriel fez.

Eu acompanhei-o pessoalmente nessa tarefa em busca de camaradas do pelotão dele quer em Lisboa quer em Porto de Mós e falámos pessoalmente com eles para ele escrever a história que tanto ansiava e praticamente nada ouvi da boca deles. Não se lembravam de nada.

Aliás, até um Ten Cor creio que do BCaç 237, do qual não existe História da Unidade, não se lembra de nada ao responder a uma pergunta sobre o tema ao AHM.

Do lado do PAIGC nada, apenas umas alusões ao início da guerra

O jornalista José Carlos Marques, do Correio da Manhã (companheiro de route no Simpósio de Guiledje) vai publicar um artigo, falou comigo ao telefone, e eu  enviei-lhe as fotos que tinha. Ele disse-me que iria publicar o artigo invocando o meu site, disse-lhe para não publicar tretas, pois já tenho visto muita coisa com a ganância de publicar (...).

Poucas testemunhas deve haver relativamente a tais factos, mas devem estar um quanto chés-chés, pois segundo  me contava o Gabriel que bem se esforçou porque tinha formação académica (, era economista,) e tem outros escritos, eles diziam que não sabiam, não se lembravam etc etc. O costume.

Zé, quanto a idade do Arafan (...), não se sabe que idade tinha, nem os do PAIGC sabem e basta ler vários (poucos) livros que se contam pelos dedos de malta do PAIGC que nada sabem, nem o Aristides Pereira, tal como ele revela nos 2 livros, apenas o Amilcar Cabral era o detentor da informação, isto afirmado por ele Aristides, irmão Luís e mais um ou outro.

Portanto, meus amigos, nada se sabe e estou curioso por ver o artigo do Zé Carlos, que admito possa acrescentar algumas lérias se encontrou alguém dessa altura do pelotão do Gabriel, o BCaç 237 [ Pel 237 + Pel Mort 19 ] mas que não vejo que tenha a desenvoltura que o Gabriel tinha e a forma como escreveu a brochura, parte em minha casa de Porto de Mós e de elementos que recolheu em minha casa e meus. Agora, só se falarem pelo que escreveu o Gabriel.

O resto para mim, são tretas, a menos que veja alguma coisa escrita com credibilidade o que não vi até agora. Como sabem, nem os nossos amigos Leopoldo Amado o Julião, historiadores, nada falam sobre o assunto apesar das suas investigações em numerosos arquivos, apenas abordam levemente a data 23-01-1963, cujo trabalho já fiz e publiquei no blogue.

Recebam um abraço amigo

Carlos Silva
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Notas do editor

(*) Vd. postes de:

11 de outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3294: O ataque a Tite, em 23 de Janeiro de 1963 (Parte I) (Carlos Silva / Gabriel Moura )

12 de outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3298: O ataque a Tite, em 23 de Janeiro de 1963 (Parte II) (Carlos Silva / Gabriel Moura)

13 de outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3308: O ataque a Tite, em 23 de Janeiro de 1963 (Parte III) (Carlos Silva / Gabriel Moura)

(**) Último poste da série > 13 de janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P10936: Efemérides (115): Nhabijões, 13 de Janeiro de 1971, morte na picada (Luís Rodrigues Moreira)

Guiné 63/74 - P10989: Um Amanuense em terras de Kako Baldé (Abílio Magro) (2): Colocado na CSJD/QG/CTIG

1. Mensagem do nosso camarada Abílio Magro (ex-Fur Mil Amanuense (CSJD/QG/CTIG, 1973/74), com data de 12 de Janeiro de 2013, com o segundo capítulo da sua série Um amanuense em terras de Kako Baldé.


Um Amanuense em terras de Kako Baldé*

2 - Colocado na CSJD/QG/CTIG

Em 02ABR73 apresento-me na CCS/QG/CTIG e sou colocado na CSJD - Chefia de Serviço de Justiça e Disciplina.

O Comandante do CTIG era, na altura, o Brigadeiro Alberto da Silva Banazol e o 2º Comandante o Coronel Tirocinado Octávio de Carvalho Galvão de Figueiredo.

A CSJD era chefiada, na altura, pelo Major do SGE Mário Lobão, mais tarde substituído pelo Ten-Coronel do SGE Manuel de Moura, se não me falha a memória. Naquele serviço eram tratados todos os processos judiciais, louvores, doenças, acidentes, feridos, mortos, etc. relativos a todo o pessoal do exército, bem como ao pessoal civil ao seu serviço.

Os processos, instruídos nas Companhias ou Batalhões, eram para ali enviados onde eram analisados e dado o respectivo encaminhamento – envio para Tribunal, proposta de atribuição de louvor e, no caso das doenças, ferimentos ou morte, se eram consideradas ou não em serviço, em campanha ou em combate.

Estas tarefas eram realizadas por Alf. Milicianos, licenciados em Direito, coadjuvados por Fur. Milicianos. Àqueles ninguém tratava por Alf. Milº, mas sim por Doutor, incluindo a Chefia.

Foi aí que conheci o Dr. Celso Cruzeiro, único Alf. Milº que participou nas reuniões do Movimento de Capitães em Bissau, antes do 25 de Abril. Advogado em Aveiro, foi quem defendeu, anos mais tarde, o Dr. Paulo Pedroso no processo da Casa Pia.

Na CSJD fiquei a prestar serviço na Secção designada eufemisticamente como de “doenças” e que tratava dos processos de doenças, acidentes, feridos e mortos em serviço, em campanha ou em combate.
Uma das principais tarefas que executava era a de verificar se os processos continham todos os documentos e procedimentos obrigatórios, antes de seguirem para o Alf. Milº que os ia apreciar – Dr. Dias.

A burocracia era mais que muita e os processos andavam para trás e para a frente enquanto, na Metrópole, os familiares aguardavam penosamente pela concessão da pensão de sangue, no caso de morte de um seu familiar militar.

Atendendo à distância temporal que nos separa dos acontecimentos, ressalvem-se possíveis lapsos de memória e, neste contexto, poderei resumir assim:
- O militar morria em combate;
- O Comandante de Companhia (julgo eu) organizava o processo que tinha de conter toda a documentação do militar desde a incorporação, relatório sucinto de como se deram os acontecimentos atestados por 2 testemunhas e certidão de óbito.
- Tudo pronto, era enviado à CSJD, muitas das vezes através de colunas de reabastecimento, quando as havia.

Na CSJD era por mim recebido, catalogado e feita a respectiva “inspecção”, isto é: se continha todos os elementos para que pudesse seguir em “frente”.

A “inspecção” constava, para além da verificação da presença de todos os documentos necessários e se estes estavam nos “conformes”, em sublinhar, a marcador, os factos mais significativos, a fim de propiciar uma apreciação mais célere ao Dr. Dias.

E é nesta fase que começo a tomar consciência do ridículo de alguma burocracia e, pior ainda, da injustiça para com aqueles que, vivendo as agruras de um interior empobrecido, perdiam um ente querido ao serviço da Pátria e tardavam em receber, ao menos, uma pequena pensão de sangue que lhes mitigasse minimamente a situação económica.

De facto, até que o processo fosse concluído, havia que efectuar diversos procedimentos que atrasavam imenso a sua conclusão e a tarefa mais frequente que realizava e que mais mal me fazia ao “fígado” era a de devolver todo o processo ao remetente “a fim de as testemunhas serem devidamente ajuramentadas”.

Isto é: o Comandante da Companhia tinha de substituir a folha onde constavam os depoimentos das testemunhas que confirmavam os factos e acrescentar “as testemunhas juraram por Deus dizer a verdade e só a verdade”.
Caso em que as testemunhas não fossem católicas, “por não serem católicas, as testemunhas juraram por sua honra dizer a verdade e só a verdade".

Enquanto isto, o processo andava de cá para lá e de lá para cá, ao sabor da disponibilidade de transporte.

“E eu a vê-los passar!”, como dizia o mecânico das Dyane.

A acrescentar a tudo isto, há a realçar o facto de eu ter ido substituir um Cabo Milº africano do recrutamento local e que tinha sido preso ou “despachado” para outro lado qualquer por “bom comportamento” e que, segundo constatei mais tarde, teria o hábito de arquivar papelada “à molhada”, pois vim a encontrar alguns processos com dezenas de boletins da JHI (Junta Hospitalar de Inspecção) referentes a outros militares e importantes para atribuição de graus incapacidade aos feridos em serviço, campanha ou combate.

Em suma, a minha “guerra” rivalizava perfeitamente com a do saudoso Raul Solnado.

(*) Para quem não sabe, Kako Baldé era o nome por que era conhecido, entre a tropa, o General Spínola. Kako – (caco) lente que o General metia no olho. Baldé – Nome muito comum na Guiné
AM

(Próximo capítulo – (3) Sargento da Guarda ao QG/CTIG)
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Nota de CV:

Vd. primeiro poste da série de 16 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P10950: Um Amanuense em terras de Kako Baldé (Abílio Magro) (1): A chegada

Guiné 63/74 - P10988: Diário de Iemberém (Anabela Pires, voluntária, projeto do Ecoturismo, Cantanhez, jan-mar 2012) (2): A adaptação

1. Continuação da publicação do Diário de Iemberém, da nossa grã-tabanqueira Anabela Pires, técnica superior de serviço social no Ministério da Agricultura, nascida em Moçambique, reformada, amiga dos nossos  grã-tabanqueiros JERO e Alice Carneiro... Esteve na Guiné-Bissau cerca de três meses (, de meados de janeiro a meados de abril de 2012), a trabalhar como voluntária no projeto do Ecoturismo, da AD - Acção para o Desenvolvimento, em Iemberém, Região de Tombali, Parque Nacional do Cantanhez. Chegou em Iemberém, do dia 17/1/2012. E fiquei hospedada nas instalações locais da AD, a ONGD que é dirigida pelo nosso amigo Pepito (*)


2. Diário de Iemberém, por Anabela Pires [, que escreve de acordo com a antiga ortografia]  > Parte II

 20 de Janeiro de 2012 [A adaptação]
São quase 10 horas da noite. Estou constipada. As noites e manhãs têm estado frescas, eu não trouxe um pijama de meia estação e só agora desencantei o meu xaile indiano que estava na mala que ainda não tive tempo de desmanchar. Os dias têm sido bem ocupados!

Hoje é sexta-feira, feriado na Guiné, e vêm 9 pessoas passar o fim-de-semana prolongado aqui aos bungalows. Estive até há pouco à espera deles com a Maria Pónu e a Satu mas, como se atrasaram, e me sinto adoentada, vim para casa.

A vinda destes clientes ocupou-me o dia de ontem e de hoje a acompanhar/ensinar a Mariama e a Maria Pónu a preparar os 3 bungalows que têm no conjunto 10 camas. Creio que ficaram acolhedores, com as condições existentes neste momento. Pela primeira vez colocaram uma jarra com flores em cada bungalow. As jarras foram feitas de garrafas de água de litro e meio (de plástico)! Não havia outras e aqui na tabanca também não as há à venda.

Muito há a melhorar mas a Mariama, que limpa estes alojamentos e faz as camas, pareceu-me com boa capacidade de aprendizagem e sensibilidade para este tipo de trabalho. As suas mãos alisavam os lençóis com delicadeza. Pela primeira vez limpou o chão com uma esfregona (costumam limpá-lo com um trapo molhado) e gostou. Disse-me que faz menos dores nas costas, que é mais fácil. Ainda não se atreve a falar português mas creio que compreende a maior parte do que digo.

À tarde estive com a Satu a fazer as Laranjas da Rosinda mas sem licor de whisky. Para além daqui não existir tal coisa, a Satu é muçulmana e como tal não poderia provar as laranjas se elas levassem álcool. A ideia é apresentar as laranjas de outra maneira que não seja ao natural, para variar.

A Satu cozinha muito bem mas carrega no sal! Hoje comi uns peixinhos fritos com um molho e batatas-doces fritas. Estava uma delícia, o almoço! Se não tiver cuidado, penso que em vez de emagrecer vou engordar! Ontem trabalhei com ela as ementas para este fim-de-semana. A maior dificuldade são os legumes que não existem por aqui. Com tantos afazeres acabei por não enviar uma SMS de parabéns à Fátima Real e ao Vasquinho do Celso. Não me esqueci dos aniversários mas aquilo que não fiz logo de manhã acabou por me passar!

E agora vou-me deitar pois de manhã terei de fazer, com a Satu, uma tarte de coco e banana, receita da Odile, para o almoço. Espero que não saia asneira pois nunca a fiz, não tenho balança e o coco em vez de seco é fresco! Bem, falta dizer que a Satu é a senhora que explora o restaurante que a AD construiu e que serve os turistas que cá vêm. Ah, e é minha vizinha, casada com o técnico agrícola da AD, o Abubacar Serra, responsável pelo sector de Bedanda. São aqui o meu “porto de abrigo”.

21 de Janeiro de 2012  [Os bangalós] 


[Foto à direita, créditos fotográficos: AD - Acção para o Desenvolvimento, 2008. Vd. aqui precário]

Levantei-me antes das 7 horas mas só agora, às 8 horas, começo a ver alguma coisa dentro de casa. É das coisas que mais me está a custar – a falta de luminosidade dentro das casas mesmo quando lá fora já é ou ainda é dia. Contribui para isto o facto de aqui existirem muitas árvores, enormes, entre as quais mangueiras, que fazem muitas sombras. É uma grande vantagem quando ando na rua mas dentro de casa há pouca luz. Sempre tive dificuldade em trabalhar com pouca luz e aqui tenho de lidar com isso. Ainda ontem, quando fomos limpar os bungalows quase não se via nada lá dentro. Têm umas janelinhas pequenas, para protecção do calor, mas dificilmente se vê o que está sujo. Assim é difícil fazer uma boa limpeza. Temos de pensar numa solução para isto.

Bem, tenho de me ir vestir mas queria registar que a esta hora oiço todos os dias o som do varrer dos meninos do Abubacar. Varrem as folhas que caem todos os dias em abundância no terreiro em frente às nossas casas. Estamos no Inverno, apesar de durante o dia eu transpirar. As vassouras são de pauzinhos e ainda assim, até agora, não consegui comprar uma e outra não tenho. Varrem curvados. Ainda terei de apurar se sofrem da coluna mais ou menos do que nós.

22 de Janeiro de 2012 [ Aqui há pão fresco]

[Foto à esquerda: meninos de Iemberém, 9 de dezembro de 2009; créditos fotográficos, João Graça, 2013]

Ontem à noite já não estranhei o restolhar que ouvia lá fora logo depois de apagar a luz. Há dias atrás, ouvi restolhar tanto lá fora a partir da meia-noite! Não imaginando o que pudesse ser, pensei que talvez andassem javalis por aqui à procura de comida.

De manhã levantei-me e vi o meu vizinho padeiro a trabalhar no forno do pão. Pensei que ele estava a começar o trabalho mas de repente vi que o pão já estava cozido! Então percebi que o barulho que tinha ouvido durante a noite era ele a varrer o forno do pão! Ri-me sozinha da minha ignorância e imaginação.

O meu vizinho padeiro começa a fazer pão à meia-noite e pela manhã, quando me levanto, vou à varanda buscar pão fresquinho. Só é pena ele não trabalhar todos os dias mas aqui os padeiros são amigos e têm estabelecida, entre si, uma rotação de produção. Ainda não sei quantos padeiros existem em Iemberém mas produzem rotativamente. Hoje comi pão acabadinho de fazer mas recebi visitas e logo de manhã o pão acabou. Por sorte o negócio correu bem ao meu vizinho e ele já está a fazer outra fornada, sem ainda ter dormido. Os pães são do tipo cacete e as pessoas andam com eles nas mãos como em França.


 [A visita da Cadi]

Falando nas visitas ….. a Cadi, mãe da Alicinha , foto à esquerda, maio de 2010,] , afilhada da Alice Carneiro, veio visitar-me. É tão bonita e elegante a Cadi! Como aliás muitas das mulheres guineenses. E que bem que se vestem, muitas vezes até quando andam a trabalhar mas sobretudo quando saem da sua tabanca e em dias de festa.

A Cadi já fala razoavelmente português. O seu marido [, António Baldé, fula de Contuboel, com casa em Caboxanque, futuro apicultor,]  está em Lisboa e há 2 anos que não vem cá. Ela mora em Farim de Cantanhez, uma tabanca que fica aqui a uns 10 km. É uma pena ela não viver em Iemberém, poderia ajudá-la a preparar-se para ir para Portugal ter com o seu marido. Mas o mais preocupante é que ela anda doente. Diz-me que sente calor na barriga, diz-me que é do estômago, que tem a tensão baixa mas …. não vomita, quis comer pão com queijo. Depois ouvi-a tossir e fiquei a pensar se não será algum problema pulmonar. Ela veio hoje a Iemberém, a pé, para tentar arranjar transporte para ir a Bissau ao médico.

(Continua)

[Legendas, subtítulos ou notas dentro de parênteses retos, a par das fotos, são da responsabilidade do editor]
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Nota do editor:

Último poste da série > 21 de janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P10978: Diário de Iemberém (Anabela Pires, voluntária, projeto do Ecoturismo, Cantanhez, jan-mar 2012) (1): A chegada


Guiné 63/74 - P10987: Parabéns a você (527): Augusto Silva Santos, ex-Fur Mil da CCAÇ 3306 (Guiné, 1971/73), Francisco Godinho (Barão do K3), ex-Fur Mil da CCAÇ 2753 (Guiné, 1970/72) e José Albino, ex-Fur Mil do Pel Mort 2117 e BAC 1 (Guiné, 1969/71)

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Nota de CV:

Vd. último poste da série de Guiné 63/74 - P10981: Parabéns a você (526): Rogério Freire, ex-Alf Mil Art MA da CART 1525 (Guiné, 1966/67)

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Guiné 63/74 - P10986: História da CART 1742 (2): Actividade operacional (Alberto Alves / Abel Santos)



1. Segundo poste do trabalho trazido até ao Blogue, em mão, pelo nosso tertuliano Abel Santos [foto à direita] (ex-Soldado Atirador da CART 1742 - "Os Panteras" -, Nova Lamego e Buruntuma, 1967/69).

Esta História da CART 1742 foi elaborada por Alberto Alves, um dos Panteras, em Maio de 2007, para ser distribuída pelos camaradas presentes num dos Encontros desta Unidade.



HISTÓRIA DA CART 1742 (2)


(Continua)
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Nota de CV:

Vd. primeiro poste da série de 21 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P10980: História da CART 1742 (1): Tudo começou aqui... (Alberto Alves / Abel Santos)

Guiné 63/74 - P10985: O nosso livro de visitas (159): João Correia, ex-Alf Mil da CCS/BCAÇ 4615/73 (Teixeira Pinto, 1973/74)



1. Mensagem, de 19 de Janeiro de 2013, do nosso camarada leitor, João Correia, ex-Alf Mil da CCS/BCAÇ 4615/73 que esteve em Teixeira Pinto nos anos de 1973/74:

Caro amigo: 
A propósito de um almoço convívio de antigos combatentes do BCAÇ 4615, que vai decorrer em 2 de Fevereiro em Almeirim, ao investigar na Internet encontrei este Blog e resolvi enviar uma foto da minha equipa da mecânica. 

Um abraço 
João Correia 
(Ex-Alferes miliciano)


2. Comentário de CV:

Caro camarada João Correia, muito obrigado pelo teu contacto.
Se descobriste só agora o Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, também conhecido por Tabanca Grande, aconselho-te a que te inteires do seu conteúdo, em textos e fotos, e, se quiseres também colaborar
nesta feitura de memórias, adere à nossa tertúlia.

Para o efeito, manda uma foto do teu tempo de tropa e uma actual, diz-nos o teu nome, posto, especialidade, unidade em que foste integrado para a Guiné, datas de ida e regresso, locais onde estiveste operacionalmente e outros elementos que aches necessários para te conhecermos minimamente. Podes também, como jóia de entrada, contar uma pequena história.

Se quiseres publicitar melhor o vosso convívio, estamos ao teu dispor para o efeito.

Recebe um abraço do camarada
Carlos Vinhal
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 22 de Janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P10983: O nosso livro de visitas (158): António Gonçalves Teixeira procura camaradas de Galomaro, do seu tempo (meados de 1969/abril de 1970), da CCS/BCAÇ 2851

Guiné 63/74 - P10984: Do Ninho D'Águia até África (46): A menina Teresa não sai de cima de mim (Tony Borié)

1. Quadragésimo sexto episódio da série "Do Ninho de D'Águia até África", de autoria do nosso camarada Tony Borié (ex-1.º Cabo Operador Cripto do Cmd Agru 16, Mansoa, 1964/66), iniciada no Poste P10177, chegado até nós em mensagem do dia 20 de Janeiro de 2013:


DO NINHO D'ÁGUIA ATÉ ÁFRICA (46)


O Cifra já não andava envergonhado, pelo contrário, a sua reputação no aquartelamento agora é grande com respeito a masculinidade, até já vinham ter com ele amigos de alguns seus amigos meterem uma “cunha”, para esses amigos, que o Cifra não conhecia, mas diziam que eram amigos dos amigos dos seus amigos, que queriam ir com ele para a Tabanca.
Era mais ou menos como quando o Cifra era criança, e se chamava Tó d”Agar, e vivia na sua aldeia do vale do Ninho d”Águia, e alguém queria meter uma “cunha” ao senhor “Regedor” ou ao “Guarda Rios”, para fazer uma represa nas terras alagadiças do lameiro, passando por cima de todos, roubando-lhes a água, que muita falta lhes fazia às suas sementeiras, e ficando a rir-se dos outros, sem tirar a referida licença. A estes “amigos”, o Cifra ouvia-os e depois ficava a rir-se baixinho, pois as “bajudas” que o Cifra levava algumas vezes ao cinema, eram raparigas dignas, com personalidade, bons sentimentos, tinham bom coração, dedicavam-se e eram carinhosas, mas só para quem confiavam e acreditavam. Tinham olhos na cara e eram inteligentes, mas derivado ao local onde viviam, também eram um pouco selvagens, primitivas, tal como gazelas, primeiro tinham que “cheirar” o corpo e sentirem o sabor da pele, e só depois, o seu instinto, um pouco selvagem, aceitava ou não conversa e convivência, e até acreditarem, confiarem e começarem a ver os sentimentos da pessoa que com elas falavam, por dezenas e dezenas de vezes, ia uma eternidade. O seu pai o “homem grande”, não deixava ninguém aproximar-se, sem ser recomendado e verificar muito bem se é de confiança e quais as suas intenções, em outras palavras, era muito difícil o contacto com essas “bajudas”, e se esse contacto fosse forçado, era considerado crime, tanto na lei “Balanta”, como na lei de Portugal.

Depois desta introdução, dizendo que o Cifra já anda um pouco de cara levantada, vamos à continuação da história da menina Teresa, que o Cifra já tinha dado como terminada, pelo menos na Guiné, e que os antigos combatentes e não só, já devem de estar fartos de ouvir, e vão dizer, lá vem outra vez com a história da menina Teresa, que eu já não posso ouvir, e é verdade, o Cifra também não. A menina Teresa, é de mais, sufoca, e por mais voltas que dê, não sai de cima de mim. Mas vamos continuar, pois o Cifra tem que desabafar com alguém e as vítimas são vocês todos que têm pachorra para lerem estes escritos. Continuando. Finalmente foi encontrado quem executasse o objecto que a menina Teresa tinha encomendado ao Cifra, e que os amigos antigos combatentes e não só, já sabem do que se trata, mas para os que só agora estão a ler a história, era um “Falo”, ou seja um “Phallus”, ou mais propriamente um “Pénis” em madeira de ébano preta, que a menina Teresa, uma solteirona que já tinha passado dos “cinquentas”, e dizia que era para lhe dar melhor sorte na vida, queria que o Cifra lhe levasse da Guiné, pois tinha visto numa revista francesa, quando ia à cabeleireira na vila, fazer a permanente e pôr um produto, que os antigos combatentes, também já sabem de outros textos, onde ela é a protagonista, produto este, que até cheirava mal, que também vinha de França, mas lhe fazia desaparecer o bigode por uns tempos.

Ora o Cifra já tinha o objecto em seu poder e querendo, mais uma vez, tirar este peso, que é a menina Teresa, de cima de mim, manda dizer num aerograma, que mandou para a mãe Joana, para dizer à menina Teresa que já tinha arranjado, e tinha em seu poder, a sua encomenda. Pronto, logo na próxima carta da mãe Joana, lá vinha uma nota, bem visível num canto, a dizer mais ou menos isto:
- “Tó d’Agar, não calculas a minha alegria. És um bom menino, diz-lá, é grande? É jeitoso? É assim uma coisa que se veja? Por favor manda-me a fotografia”!

O Cifra não teve outra solução, pegou na máquina, tirou uma foto ao objecto mas como a máquina não tinha “flash”, que é aquele clarão de luz, para tirar fotos dentro de casa, trouxe o objecto cá para fora, onde havia sol, portanto sujeitou-se mais uma vez aos comentários impertinentes do costume, quando o viam com o objecto na mão, a ajeitá-lo, para o colocar em posição de apanhar melhor luz, e também quando o amigo Braga, que lhe revelava as fotos, de “borla”, nos Serviços Cartográficos do Exército, na capital da província, viu a foto, também lhe mandou um comentário não muito abonatório, mas vamos em frente. Mandou a foto dentro de uma carta, com um selo dos grandes, tipo losango, com a imagem de animais, que comprou nos correios da vila.

A mãe Joana, quando o senhor Ezequiel, o carteiro, que andava a fazer a distribuição das cartas de porta em porta, com uma bicicleta, que tinha uma placa que dizia, “Propriedade do Estado”, com uma bolsa de cabedal pendurada no guiador, que por sua vez, também tinha fama de “galdério”, que na linguagem do povo era andar a trás de tudo o que fosse saia, e era o marido da dona Manuela, por sinal uma das maiores coscuvilheiras da vila, que até diziam que já tinha ido ao posto da GNR, por diversas vezes, por levantar “falsos testemunhos” e algumas “más línguas”, até chegavam a dizer “que os punha”, que na linguagem também do povo, que não era uma esposa fiel ao senhor Ezequiel, pois andava metida com o senhor Jaime da Serração, pelo menos da fama não se livrava. Continuando, a mãe Joana, ao receber a carta, apalpa-a e vendo-a com algum volume, viu logo que devia ser fotografias. Pediu ao senhor Ezequiel, carteiro, que tinha fama de “galdério”, se a podia abrir e ler para saber novidades do seu querido filho, que andava a dar o corpo às balas, lá na Guiné.
Resultado, na próxima carta que o Cifra recebeu da mãe Joana, vinha lá tudo explicado mais ou menos, com o escândalo que se passou, quando o senhor Ezequiel, o carteiro “galdério”, abriu a carta com a foto do “Pénis” de madeira de ébano preta, com a legenda, "menina Teresa, veja se gosta".

E vocês antigos combatentes, e não só, agora vejam o resultado, a mãe Joana devia de pôr as mãos na cabeça dizendo que o filho era um “mal educado”, pois insultava a menina Teresa, a quem devia tantos favores, dizendo aquelas palavras, daquele modo, com fotografia e tudo, e logo assim secamente, “veja se gosta”. O senhor Ezequiel, o carteiro “galdério”, ficou logo a saber que a menina Teresa procurava um “objecto dos grandes”, com toda a certeza que contou à esposa dona Manuela, que era a maior coscuvilheira da vila, e que diziam que andava metida com o senhor Jaime da Serração, enfim, por algum tempo, a menina Teresa, que apesar de ser uma grande desenvergonhada, pelo menos ainda não andava nas bocas do povo, mas talvez com vergonha, não devia de ter vindo à vila fazer a permanente, e o seu bigode, já se devia de parecer com o do senhor Marechal Carmona, que não tem culpa nenhuma de ser para aqui chamado, mas de quem o Cifra, com todo o respeito, mostra a fotografia, só para exemplificar o bigode.
O senhor Marechal Carmona até devia de ser muito boa pessoa, pois quando morreu deu dois ou três feriados ao Cifra, que nessa altura se chamava Tó d’Agar, pois em sinal de luto, e a bem da Nação, não houve aulas na escola na vila.

Se a menina Teresa, por qualquer outra razão, continuar a ser um peso e não sair de cima do Cifra, ele tem que desabafar, e todos vocês vão ser as vítimas, mas se ela lhe der um pouco de descanso, quando o Cifra regressar a Portugal, vão saber a desenvergonhada, que afinal ela era.
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Vd. último poste da série de 19 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P10963: Do Ninho D'Águia até África (45): Os meus galões (Tony Borié)

Guiné 63/74 - P10983: O nosso livro de visitas (158): António Gonçalves Teixeira procura camaradas de Galomaro, do seu tempo (meados de 1969/abril de 1970), da CCS/BCAÇ 2851

1. Mensagem de António Gonçalves Teixeira [, foto à esquerda], com data de ontem


Assunto: Contactos com antigos combatentes que estiveram em Galomaro


Por acaso ao pesquisar na Net, encontrei a página que tu tens, sobre os camaradas que passaram pelaGuiné, mais concretamente por Galomaro.

Pois,  caro camarada de armas, eu estive em Galomaro, nos meados de 69 até Abril de 70. Fazia parte da CCS do Batalhão de Caçadores 2851.

Fomos nós que o inauguramos [, o quartel de Galomaro]. Quando lá chegamos, não tínhamos luz nem água. A água era transportada por um Unimog conhecido por burro do mato [, 411,], de uma nascente, que ficava uns 600, 700 metros antes de chegarmos ao quartel, na estrada que vinha de Bafatá. 

Sobre a luz, só depois de ai estarmos é que recebemos um gerador, passados uns três a quatro meses. A cantina era de lona. As oficinas eram de cibos de palmeira, e coberta de chapas de bidons e zinco, O refeitório, era feito do mesmo material, igual ao das oficinas. 

Quando isso foi inaugurado só existiam os abrigos e o edifício do comando, que ficava à direita da porta de armas. Penso, pelas fotos que vejo, vocês já tiveram outras condiçoes. Já agora me esquecia de acrescentar, que o nosso banhoera dado debaixo de bidons , que tíhamos em cima de uns troncos de palmeira. Para fazermos as nossas necessidades era numa vala junto ao arame farpado.

Como podes verificar, eram condições "5 Estrelas". As vossas,  se calhar, pouco terão melhorado.

 P.S. - Aproveito para te dizer que sou muito, mas mesmo muito, piriquito nisto da Net. Pois só ando nisto, desde novembro. Até essa data não tinha tocado numa tecla. Mas acho a coisa interessante. Por isso, peço desculpa por alguns erros,e podes contar comigo para fazer parte da Tabanca. Junto deixo o meu contacto (...)

2. Comentário do editor:

Camarada de Galomaro, da CCS/BCAÇ 2851!... Obrigado pela tua visita. Eu também estive na zonta leste, mas no setor L1, em Bambadinca, ao tempo do BCAÇ 2852 que veio convosco para a Guiné em meados de 1968, no mesmo navio, o Uíge... A minha unidade era a independente CCAÇ 2590, mais tarde CCAÇ 12. Passámos algumas vezes por Galomaro. Fazíamos frequentes colunas logísticas para vocês e para a malta do Saltinho.

Sobre o teu batalhão, o BCAÇ 2851, temos aqui umas quinze referências. Temos malta da CCAÇ 2401, da CCAÇ 2402 e da CCAÇ 2403, inscrita na Tabanca Grande. Da tua CCS (a CCS/BCAÇ 2851, Mansabá e Galomaro, 1968/70), temos aqui dois camaradas teus, o Hernâni Acácio Figueiredo (ex-alf mil trms) e o António Pimentel (ex-alf mil pel rec inf). Vais, por certo, ficar feliz por encontrá-los. Vê se os reconheces. É possível que haja mais, mas estes dois já cá estão no nosso  blogue, há uns anos valentes. (Peço desculpa, se omito alguém). Quanto a Galomaro, temos aqui mais de 150 referências...

Bom, registo com agrado o teu pedido de entrada na Tabanca Grande. Já temos uma foto tua, atual, falta-nos uma foto antiga, tua, do tempo de Mansabá ou de Galomaro. Vê se consegues arranjar essa e outras, que tenhas no teu álbum, e queiras partilhar com os teus camaradas. Manda-nos também mais alguma informação (ou até história que tenhas para contar) da tua CCS. 

Dou-te os parabéns pelos teus progressos no uso da Net. À medida que fores praticando, vais ver como te sentes mais confiante. Fico então à espera das tuas fotos, para te poder apresentar à Tabanca Grande. Um Alfa Bravo (ABraço).

PS - Já agora, dá-nos mais elementos sobre ti:  posto, especialidade, local onde moras, etc.

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Nota do editor:

Guiné 63/74 - P10982: Memória dos lugares (207): Visita da Cilinha ao Olossato, ao tempo da CCAÇ 2402, em maio ou junho de 1969 (Raul Abino)


Amadora > RI 1 > 1968 > CCAÇ 2402, em formação > "De pé, da esquerda para a direita: Aspirantes Francisco [Henriques da Silva] e Raul Albino, e Capitão Vargas Cardoso".



Amadora > RI 1 > 1968 > CCAÇ 2402, em formação > "De pé e da esquerda para a direita, o primeiro sou eu, o segundo é o Francisco [Henriques da] Silva e a seguir o Medeiros Ferreira. Só falta nesta fotografia de grupo o Beja Santos, que, por qualquer razão, andava desenfiado. Também aqui falta o comandante da companhia, Capitão Vargas Cardoso" (RA).

Fotos (e legendas): © Raul Albino (2006). Todos os direitos reservados [Editadas por L.G.]


1. Mensagem,  com data de 20 do corrente, do Raul Albino, ex-alf mil da CCAÇ 2402, pertencente ao BCAÇ 2851 (Mansabá, Olossato, 1968/70), que embarcou no Uíge, em finais de Julho de 1968, juntamente com o BCAÇ 2852 (Bambadinca, 1968/70).

Assunto: Visita da Cilinha ao Olossato

Viva,  Luis Graça,

Sobre o assunto em epígrafe, falei com o coronel  na reforma Vargas Cardoso, comandante da CCaç 2402 no período 68/70, para saber se ele se lembrava duma visita ao Olossato em meados de 69. Ele confirma que sim, pelo que lhe pedi um pequeno texto sobre o acontecimento. Ele prometeu-me redigi-lo no final deste mês, porque ia ser operado à vesícula na próxima semana, o que impedia de o escrever e de tentar encontrar fotos do evento que ele julga possuir.

A visita terá acontecido entre a segunta quinzena de Maio e a primeira de Junho de 1969 (o período em que eu estive de férias), portanto já no fim da época seca.

De qualquer modo adiantou que se encontrava nessa altura no hospital de Bissau e,  quando soube que ela ia de helicóptero ao Olossato, apressou-se a pedir autorização para a acompanhar na viagem, confirmando que passaram por várias localidades antes de chegarem ao Olossato.

Tem também relatos da sua presença em Bafatá aquando da sua 2ª comissão na Guiné, onde foi Major de Operações nessa localidade [, BCAÇ 3884, 1972/74].

Aguardemos pois pelos seus relatos. Um abraço,

Raul Albino
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Nota do editor:

Último poste da série > 19 de janeiro de 2013 >  Guiné 63/74 - P10964: Memória dos lugares (206): Olossato, anos 60, no princípio era assim (2) (José Augusto Ribeiro)

Guiné 63/74 - P10981: Parabéns a você (526): Rogério Freire, ex-Alf Mil Art MA da CART 1525 (Guiné, 1966/67)

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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 21 de Janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P10976: Parabéns a você (525): João Graça, músico e médico que, nesta qualidade, já fez voluntariado na Guiné-Bissau.

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Guiné 63/74 - P10980: História da CART 1742 (1): Tudo começou aqui... (Alberto Alves / Abel Santos)



1. Começamos hoje a publicar um trabalho trazido até ao Blogue, em mão, pelo nosso tertuliano Abel Santos [foto à direita] (ex-Soldado Atirador da CART 1742 - "Os Panteras" -, Nova Lamego e Buruntuma, 1967/69).

Esta História da CART 1742 foi elaborada por Alberto Alves, um dos Panteras, em Maio de 2007, para ser distribuída pelos camaradas presentes num dos Encontros desta Unidade.



HISTÓRIA DA CART 1742 (1)


(Continua)

Guiné 63/74 - P10979: História da CCAÇ 2679 (60): Ir ou não ir para a vala... eis a questão (Cândido Morais)

1. Importa fazer uma espécie de introdução a mais esta História da CCAÇ 2679, apresentando uma troca de mensagens entre os camarada José Manuel Matos Dinis e Cândido Morais, este muito recentemente entrado para o nosso convívio:

Assim, em 5 de Janeiro dizia Zé Dinis ao Cândido:

Viva Morais,
[...]  Entretanto, lembro-te de que prometeste enviar duas estórias da tua passagem pela heróica 2679.
Cá fico a aguardar para lhes dar a relevância que os heróis merecem.

Um abraço
JD

E, ainda no mesmo dia, a resposta foi:

Pois, meu caro,
Vou escrever isso neste fim de semana.
Uma de cada vez...
[...]
Um abraço
CMorais

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2. O resultado veio no dia 8 de Janeiro

Pois és. Tu sempre foste um sacana dum amigo. Mas aqui vai, em traços largos, para tu poderes fazer o relato segundo os cânones do blog. 
A história é verdadeira e, curiosamente, alguns deles lembram-se dela, mas outros não. 
Já lá vão 40 anitos bem contados...
CMorais

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HISTÓRIA DA CCAÇ 2679 (60)

IR OU NÃO IR PARA A VALA... EIS A QUESTÃO

Por Cândido Morais, ex-Fur Mil da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71

Durante toda a minha comissão de serviço, sempre passada na zona leste da Guiné-Bissau, que detinha maioritariamente fronteira com a Guiné Conakry, tive oportunidade de comandar três pelotões da minha Companhia, uma Companhia de Caçadores cujos pelotões operacionais eram compostos por madeirenses, com graduados do Continente.

Obviamente que sempre estive englobado num Pelotão, mas, por ausência dos oficiais e sargentos do 2.º e 4.º Pelotões - fossem eles de férias ou estivessem adoentados -, tive ensejo de contactar mais intensivamente com os dois citados. E foi no comando efectivo do meu Pelotão, o 1.º que se passou o episódio que vou relatar e que ainda hoje me impressiona e marca, pela lealdade dos homens que tive a honra de comandar.

Os outros Pelotões, na altura, estavam todos comandados por alferes, sendo eu portanto, na minha condição de furriel, o menos graduado de todos os comandantes. Ora, na altura, era necessário abrir uma vala na frente norte, constituindo-se essa tarefa de extrema dificuldade, dado o calor que se fazia sentir. Por esse motivo, os homens descansavam nos abrigos e nas casernas, aproveitando todas as sombras e locais mais frescos que pudessem encontrar.

Contudo, o Comandante da Companhia resolveu lembrar-se que seria nessa precisa altura que a vala seria aberta, e por isso mandou chamar-me ao seu gabinete, dando-me ordem para reunir os homens e iniciar os trabalhos. Respeitosamente, disse-lhe que seria mais adequado iniciar os trabalhos noutra altura do dia, aproveitando o tempo mais fresco e menos desmotivador, e lembrei-lhe também que, na respectiva escala, não era ao meu Pelotão que competia tal tarefa, indicando-lhe aquele a quem pertencia essa responsabilidade no momento.

A resposta foi peremptória e também muito irritante:
 - Eu disse que é agora que se vai fazer esse trabalho, e disse que são os seus homens que terão de o fazer!

Na verdade, eu sempre alimentei uma grande admiração e empatia por aqueles homens e a experiência dizia-me que, quando enfrentavamos um trabalho do mesmo género, bastava eu chamá-los e, pegando na picareta ou na pá, exemplificar-lhes o que pretendia. De imediato me retiravam esse instrumento da mão, atirando-se ao trabalho de modo a completá-lo com a maior brevidade possível. E eu sabia disso.

Ora, talvez fosse por isso mesmo e por que o tom do nosso Comandante foi bastante irritante, que resolvi insistir:
- O meu Comandante desculpe, mas será um mau exemplo para os homens prejudicá-los na escala de serviço, ainda para mais dando-se a circunstância de eu ser um furriel e demonstrar, assim, fraca resistência a uma ordem que não se afigura justa. O meu Comandante sabe que eu tenho de lhes transmitir a máxima confiança, para poder contar com eles nas alturas difíceis.

E a resposta, não trouxe qualquer espécie de vacilação:
- O senhor faz porque eu mandei e não admito mais contestação!

Disse-lhe eu então, no mesmo tom e na mesma velocidade:
- Saiba o meu Comandante que não o farei, porque acho injusto o seu posicionamento!
- Pois, se não reunir já os homens para efectuar o trabalho, pode ficar certo que será alvo duma valente "porrada"! - informou-me ele de imediato.
- Pois, saiba o meu Comandante que eu respeito os meus homens acima de tudo, e nunca lhes pregarei tal partida. Fará o favor de mandar proceder disciplinarmente contra mim.

E saí do gabinete, confesso que visivelmente irritado, dirigindo-me para a caserna onde me deitei a descansar, cogitando nas injustiças que podem acontecer por força de um Comando que se afirmava prioritariamente junto dos menos graduados.
Passado cerca de um quarto de hora o Cabo da Secretaria veio ter comigo dizendo que o Comandante queria saber se continuava com a mesma ideia, ao que eu respondi que sim, e logo adormeci, pouco preocupado.

Não sei quanto tempo passou, quando novamente o Cabo escriturário me acordou, dizendo que o nosso Capitão queria que eu lá fosse. Disse-lhe que não valia a pena, a minha resolução era inabalável e ele que procedesse conforme entendesse. E foi aí que o Cabo me disse, algo agitado:
- Mas é que não é por isso, é por causa dos seus homens!
- Dos meus homens? E que têm eles a ver com isso?
- Por favor, venha comigo e já vai ver! - disse-me ele, ostentando certa preocupação.

Fiz-lhe a vontade, e ainda meio ensonado dirigi-me às instalações do Comando do Quartel de Bajocunda - pois foi aí que isto aconteceu -, pensando para comigo o que estaria a acontecer. E não foi preciso andar muito para ver o que se passava: o meu Pelotão estava todo formado em frente ao Comando, armado até aos dentes, com todo o armamento que, habitualmente, levava para o mato, desde dilagramas, HK, morteiro, bazooka... E creio que foi o Cabo Freitas que me dirigiu a pergunta fulcral, depois de eu lhes perguntar o que estavam ali a fazer:
- Disseram-nos que o meu furriel vai levar uma "porrada" por defender o nosso Pelotão. É verdade?
- Parece-me que é, disse eu. Mas não se preocupem, eu saberei defender-me disso e só tomei esta atitude porque a considerei justa.
- Pois então, vai fazer o favor de dizer ao nosso Comandante que nós não sairemos daqui, até sabermos se o nosso furriel vai levar uma "porrada". E diga-lhe também que, se a porrada sair, a caserna do Comando vai levar com tudo isto em cima, e hoje não ficará em pé.
- Oh rapazes, disse eu já bastante preocupado. Eu posso dizer-lhe isso, mas acho que é melhor vocês irem embora, o problema é meu e vou ser eu a resolvê-lo. Por favor não se metam nisto.
- Meu furriel, vá para dentro e diga isso ao nosso Capitão!

E lá fui. Logo que entrei, o Capitão deu-me ordem para mandar dispersar os homens, ao que eu respondi que já o tinha feito, mas eles desobedeceram-me. O Capitão insistiu e eu voltei a dizer-lhe que me achava incapaz de os obrigar a retirar, pelo que sugeria que fosse lá ele, pois certamente lhe obedeceriam melhor.

Mantivemos ali uma acesa troca de argumentos durante fartos minutos, ambos com posições inamovíveis, até que ele cedeu e disse para dizer aos homens para se retirarem, que ele reconsideraria a "porrada". Eu disse-lhe que nunca gostei de mentir ao Pelotão e perguntei-lhe se havia "porrada" ou não havia. Ele reflectiu algum tempo e, depois, disse-me:
- Pode ir e dizer-lhes isso. Tem a minha palavra.

Saí então e dirigi-me aos homens, dizendo-lhes:
- O nosso Capitão garantiu-me que não me atingirá com nenhum castigo e manda-os ir para a caserna.
- Tem a certeza disso, meu furriel?
- Tenho. e agradeço a vossa atitude, que eu não pedi, mas registo.

E foram mesmo para a caserna. Entretanto, não foi o meu Pelotão a fazer o trabalho que nos eras requerido - também já não me lembro qual foi - e, mais tarde, já na ausência do Capitão e quando a Companhia era comandada pelo Alferes do meu Pelotão, fui surpreendido com um significativo louvor. Não com o fundamento deste relato, mas por ouitras ocorrências que lá se encontravam devidamente descritas.

******

Finaliza a conversa com esta troca de mensagens:

Lindo menino!
Às vezes precisas de ser espicaçado, mas depois compensas-nos com belos resultados.
Ainda assim, faço dois reparos à descrição: esqueceste-te de citar a fronteira com o Senegal, afinal aquela onde se situava Bajocunda e onde permanecemos mais tempo?

"Os outros Pelotões, na altura, estavam todos comandados por alferes" - referes a seguir. 
Se a acção decorreu entre a deslocação para Bajocunda e Setembro de 70, então não há nada a alterar, mas se foi noutra ocasião posterior, devo dizer-te que o Foxtrot já não estaria nessa situação.

São apenas dois pormenores, porque o que é relevante é o conteúdo da tua descrição.
Com um abraço agradecido
JD
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Olá meu velho 
Na verdade, eu não posso localizar isso no tempo, e apenas fiquei com a ideia de que os outros eram todos alferes, na altura. De qualquer modo, podes "ajeitar" à tua maneira, de modo a que não ocorra contestação, falando, talvez, em termos gerais. 
Quanto ao que dizes sobre a fronteira, quando me refiro à zona leste, estou convencido de que ela é maioritariamente ligada à Guiné Conakry. Sobre Bajocunda, vou revelar-te a minha inteira ignorância sobre se ainda é com o Senegal ou não. Mas podes alterar o que quiseres. O miolo da história é esse. 
Depois, se quiseres, conto-te a do soldado Vieira e do reforço nocturno. 

Um abraço 
CM


3. Cabe agora um comentário do editor para esclarecer que das duas histórias referidas, sendo a de hoje a segunda, a primeira foi publicada no P10947.

Esperemos que o Cândido não esmoreça e nos continue a brindar, assim como o "velho" Zé Manel Dinis, com histórias para a História da CCAÇ 2679.
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Nota de CV:

Vd. poste anterior da série de 15 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P10947: História da CCAÇ 2679 (59): Grande farra no Funchal (José Manuel Matos Dinis / Cândido Morais)

Guiné 63/74 - P10978: Diário de Iemberém (Anabela Pires, voluntária, projeto do Ecoturismo, Cantanhez, jan-mar 2012) (1): A chegada


1. A nossa amiga Anabela Pires [, foto à esquerda,] (*)  chegou no dia 17, do corrente, a Auroville, no sul da Índia, onde vai viver nos próximos seis meses, até ao início do nosso verão.  Mandou-nos duas mensagens, ontem, que reproduzimos:

(i) Comentário do poste P10930

 (...) Muito obrigada aos grã-tabanqueiros pelas mensagens enviadas. Já estou em Auroville desde 5ª feira (dia 17). [. Vd a fotogaleria do sítio de Auroville]. Isto aqui também é "mato" mas um "mato" com mais recursos e mais organizado. Estou e estarei em fase de adaptação com algumas limitações - o meu mau inglês, o facto de não me poder deslocar sozinha depois do pôr do sol por ser perigoso (esta é a pior de todas e difícil de vir a ser ultrapassada) e a tentativa que estou a fazer de me deslocar de bicicleta - falta de treino para fazer vários quilómetros pois Auroville é bem maior do que eu imaginava. Um abraço grande (...)

(ii) Mensagem pessoal:

(...) Luís, com toda a justiça tens a minha autorização (*) Não me esqueci da minha promessa e tenho um post-it neste PC a dizer "ver Diário da Guiné" mas como estou sempre a adiar ..... OK! Confio que farás a devida triagem mas lamento dar-te a ti esse trabalho. Passou um ano depois que cheguei à Guiné, é justo que não esperes mais. Agora comecei a escrever a minha experiência por aqui e .... bem, como já não quero andar stressada , o mais natural era ir adiando esse trabalho. Um grande abraço para ti e para a Alice. Até breve, Anabela

(*) Resposta da Anabela ao meu mail do dia anterior, que dizia o seguinte:

(...) Minha malandra: primeiro, parabéns, por teres chegado "sã e salva"... Espero que seja mais uma experiência enriquecedora para ti. Segundo, foste-te embora sem me dares "autorização" para publicar no blogue o teu diário de Iemberém, expurgado naturalmente de referências mais intimistas ou pessoais...O que importa são as tuas impressões dos lugares e das gentes... Autorizas-me a que faça uma "edição" do teu diário, só com a parte da tua "leitura sociológica"?  Seria interessante para todo nós e para futuros viajantes... Prometo que faço uma boa "triagem"...Diz-me da tua justiça... Beijinhos meus e da Alice.   (...)

2. Vamos começar hoje a publicar excertos do Diário de Iemberém, da Anabela Pires, chegada a Iemberém, no Cantanhez,  há justamente um ano atrás, a 18 de janeiro de 2012, para trabalhar como voluntária no projeto de ecoturismo da AD - Acção para o Desenvolvimento.

Vamos utilizar dois tipos de parênteses para indicar eventuais alterações ao texto original: (i) parênteses curvos, seguidos de três pontos (...) para assinalar eventuais cortes feitos pelo editor (por ex., referências muito pessoais a terceiros) ; e os (ii)  parênteses retos  [ ] para indicar texto ocasionalmente inserido pelo editor  (subtítulos, links, informações adicionais, etc.). O ficheiro, em formato doc, que temos à nossa disposição,  tem 30 páginas, e vai de 18 de janeiro a 25 de março de 2012. 

3. Diário de Iemberém, por Anabela Pires

18 de Janeiro de 2012  [Chegada a Bissau e Iemberém]

Cheguei ontem a Iemberém (sector de Bedanda ou Cubacuré, região de Tombali, Guiné-Bissau).

[ Foto à esquerda: um avião da TAP, no Aeroporto Internacional de Bissau, 29 de fevereiro de 2008, foto de L.G. ]




São já 7 horas e 8 minutos, os galos já cantam, o dia começa a clarear mas ainda não vejo nada dentro de casa, sem luz. Acordei há já uma hora e é com a lanterna a energia solar, que a Catarina me trouxe da Índia, que ando dum lado para o outro. De vez em quando jogo instintivamente a mão aos interruptores da luz! 

Finalmente embarquei em Lisboa no dia 13, sexta-feira, às 21.30 e cheguei a Bissau às 2 da manhã do dia 14. O voo saiu com atraso de Lisboa pois o avião vinha completamente cheio. Para minha admiração metade do avião era ocupado por não guineenses! Desde um grupo de 30 brasileiros(as) que foram para Gabu fazer 20 dias de voluntariado no hospital, a freiras e padres italianos, havia um pouco de gente de diversas partes do mundo.

À minha espera estava o Gibi, colaborador da AD (Acção para o Desenvolvimento, ONG guineense para onde vim como voluntária) e o Domingos, motorista da AD.

O aeroporto de Bissau tem um aspecto apresentável. Recordo-me de a Dulce me ter contado que uma amiga dela, que aqui veio há uns anos, lhe ter referido que os funcionários escreviam em cima de caixas vazias. Portanto, algumas coisas vão mudando na Guiné-Bissau.

Fui instalada no Centro de Formação de Hotelaria que a AD tem no Bairro de Quelélé, nos arredores de Bissau.

Apesar de já ter visto imagens do Bairro de Quelélé na televisão e no site da AD, não imaginava o que encontrei. O Bairro fica entre o aeroporto (a 8 km da cidade) e a cidade e é um bairro bem popular em que a maioria das casas são as tradicionais palhotas. As ruas são mal definidas e todas em terra batida. A minha chegada a este bairro às 3 da manhã contribuiu para alguma perplexidade! Não o imaginava como é de facto e muito mais me espantou o facto dos mais importantes dirigentes da AD nele viverem. A AD tem todas as suas instalações no Bairro Quelélé e quem a dirige vive também no bairro. Há, portanto, uma grande fusão entre a AD e o Bairro Quelélé.

(Continua)
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Nota do editor:

(*) Vd. alguns postes anteriores da (ou referentes à)  Anabela Pires:

12 de janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P10930: Os nossos seres, saberes e lazeres (50): A caminho de Auroville, a "cidade do amanhecer", no sul da Índia... Mas se pudesse escolher, era já para Iemberém que eu queria voar (Anabela Pires)

(...) Vou voar de hoje a oito dias na companhia aérea dos Emirados Árabes - Lisboa- Dubai - Chennai. Dia 16 ficarei a dormir em Chennai e dia 17 irei então para Auroville num táxi da sua companhia de táxis. Chegarei no mesmo dia em que o ano passado cheguei a Iemberém. E se pudesse escolher era para Iemberém que voaria também este ano. 

 Penso passar a 1ª quinzena a conhecer Auroville e a integrar-me. Depois ou opto por uma participação ativa, ajudando onde for preciso - penso que vou privilegiar as quintas para continuar a aprender a cultivar - ou opto por um projeto de voluntariado. Tudo vai depender dos projetos de voluntariado que houver. Tenho como limitação a língua mas pelo menos espero regressar a falar inglês mais fluentemente. Penso regressar/chegar a Portugal dia 3 de Julho. (...)

5 de junho de 2012 > Guiné 63/74 - P9998: Em busca de... (191): Pessoal da 26ª CCmds, camaradas do João Gertrudes Luz, natural de Faro, sold cond comando (Brá e Teixeira Pinto, 1970/71), tragicamente desaparecido em 2007 (Anabela Pires, de regresso à Pátria)

(...) Recorde-se que a Anabela Pires esteve em Iemberém, na Região de Tambali, desde janeiro de 2012, como voluntária da AD, a trabalhar no projeto do ecoturismo do Cantanhez. Na sequência do golpe de estado de 12 de abril, acabou por ir para São Domingos e depois Dacar, no Senegal, por razões de segurança... Esteve lá mais de um mês, na casa de um amiga casada com um diplomata... Regressou há uma semana e picos a Portugal, na esperança de voltar à Guiné, em 2013, depois das "prometidas" (pelos golpistas!) novas eleições presidenciais...

Entretanto, ela tinha-me falado deste seu amigo, o João Gertrudes Luz, nosso camarada, tragicamente desaparecido em 2007, e da "dívida" que ela ainda tinha para com ele... Simbolicamente, com a publicação deste poste, fica saldada essa "dívida" em aberto, embora infelizmente tenhamos poucas notícias, no nosso blogue, da 26ª CCmds... Mas contamos, desde já, com os resultados das boas diligências dos nossos leitores, tabanqueiros e não tabanqueiros... Por certo que teremos resposta ao pedido da Anabela. (...)


21 de maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9931: Ser solidário (127): Anabela Pires, voluntária da AD, de regresso a casa, depois das suas (des)venturas em Iemberém e em Dakar

(...) Sinto que preciso de fazer o "luto" da minha experiência interrompida na Guiné e por isso não tenho, para já, o meu coração muito aberto a um trabalho como voluntária noutra ONG. Como há muitos anos que desejo aprender a cultivar estou à procura de uma quinta, de preferência de agricultura biológica, que me queira receber em troca de trabalho. Estou a procurar no WWOOF. Pode ser em Portugal ou noutro país desde que a viagem para o mesmo não seja muito cara. Tenho especial interesse em aprender a cultivar legumes e eventualmente árvores de frutos. Gostaria de começar o mais tardar em Outubro uma vez que, pelo menos em Portugal, é o início do ano agrícola. O ideal seria encontrar uma família portuguesa, daquelas que deixou a vida da cidade para ir para o campo. Se a família tiver uma componente de turismo rural tanto melhor pois aí também posso dar "uma mão". Gostaria de ir viver para o campo e ter uma actividade física. (...)


16 de abril de 2012 > Guiné 63/74 - P9753: O Nosso Livro de Visitas (132): Não se preocupem se não der notícias - só estamos sem eletricidade porque o gasóleo acabou! (Anabela Pires, Iemberém, Cantanhez)

(,,,) Acabou-se o gasóleo que sustenta as nossas 4 horas de luz por dia e a água no depósito! Portanto, estamos novamente sem luz e sem água nas torneiras (aqui em casa tenho 2 no WC o que é muito bom). Isto significa que é mais difícil recarregar a bateria do computador. A minha amiga francesa que mora a 3 km e tem painel solar leva-me o PC e põe-o a carregar mas tudo isto demora mais tempo e posso estar por isso mais "ausente".

Como alternativa posso comprar uns litros de gasolina e pedir à Satu que ligue o gerador do restaurante para carregar os aparelhos. Mas o dinheiro também se acabou - está em Bissau à espera de transporte para cá chegar. Não sei quando vem o carro, era para ter vindo na 6ª feira, mas com os problemas em Bissau ..... aguardamos. Bem, esta do dinheiro é um bocadinho brincadeira pois a Satu certamente me emprestará dinheiro se eu precisar! (,,,)


12 de janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9346: Tabanca Grande (317): Anabela Pires, voluntária no projeto Ecoturismo do Cantanhez, nossa tabanqueira nº 536, aqui saudada pelo Hélder Sousa

(...) Esta notícia que o JERO [, José Eduardo Oliveira, amigo da irmã da Anabela, que vive em Alcobaça, ] nos enviou, com todos os ingredientes que a compõem, bem assim como as achegas que vieram dos comentários, tem várias coisas que são notáveis.

A primeira é, obviamente, a decisão de Anabela Pires em ocupar a sua reforma em algo que lhe é útil (também) mas em que dirige os seus conhecimentos, saberes e força de vontade em algo que enriquece quem toma esse tipo de atitudes e que é o de 'ajudar os outros'. Provavelmente o seu nascimento em África pode ter contribuído para o 'apelo' mas acho que o 'contágio' com a Guiné explica-se através do que foi referido sobre os contactos e os conhecimentos. (...)


7 de janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9328: O Nosso Livro de Visitas (120): Anabela Pires, em vias de ir para Iemberém, no Cantanhez, trabalhar como voluntário na AD - Acção para o Desenvolvimento, procura cartas da região de Tombali e elogia o nosso blogue

(...) Olá, Luís! Desculpe antes demais o tratamento informal mas visitando frequentemente o blogue Luís Graça e camaradas da Guiné, conhecendo a Alice e estando a pensar partir para a Guiné-Bissau em Janeiro [de 2012], onde vou trabalhar com a AD [- Acção para o Desenvolvimento], quase me sinto como membro da Tabanca Grande.

Realmente o Mundo é Pequeno mas a vossa Tabanca... é Grande! Certamente a Alice já lhe contou como fui ter ao blogue e como descobri que o seu fundador é casado com a Alice Carneiro! Bom, tudo começou por eu andar à procura de cartas/mapas da Guiné-Bissau. Situar-me geograficamente é sempre um ponto de partida.  (...)


7 de janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9325: Ser solidário (119): Anabela Pires: A caminho de Iemberém como voluntária da ONG AD - Acção para o Desenvolvimento (JERO)

(...) Conheci a Anabela Pires, em Coimbra, no dia do falecimento de sua Mãe.Já lá vão um bom par de meses. A conversa foi de circunstância e a minha presença na cerimónia religiosa, no dia do funeral, deveu-se à minha relação fraterna com a sua irmã Margarida Pires, professora em Alcobaça e camarada de boas causas (Defesa de Património Cultural e outras).

No último Verão soube pela Margarida que a sua irmã Anabela queria fazer serviço voluntário na Guiné. Falei-lhe do nosso Pepito (nickname do Engenheiro Agrícola Carlos Schwarz da Silva), que vive e trabalha em Bissau desde 1975, sendo um dos fundadores da AD - Acção para o Desenvolvimento.  O mundo é pequeno e a Anabela Pires tinha sido colega e amiga da Alice Carneiro, mulher do nosso Editor Luís Graça. (...)





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Guiné 63/74 - P10977: Notas de leitura (451): Guiné-Bissau: A Destruição de um País, por Julião Soares da Silva (1) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 29 de Outubro de 2012:

Queridos amigos,
A proposta do conceituado historiador guineense Julião Soares Sousa é um documento redigido com franqueza e profundo afecto pelos sofrimentos do seu povo, passa em revista as sucessivas crises, tumultos, intentonas e inventonas desde 1974 ao presente.
Desvela contradições e a posse maníaca pelo poder, recorda como as elites se divorciaram dos interesses da maioria e vivem em permanente locupletação.
Enuncia uma série de pontos que ele considera relevantes para levantar o Estado. E pede debate.
Os guineenses que têm este blogue como sala de conversa, parece-me, têm agora ensejo para depor nos termos construtivos que são o apanágio deste guineense que está a fazer carreira científica brilhante entre nós.

Um abraço do
Mário


Guiné-Bissau: A destruição de um país (2)

Beja Santos

“A estabilização da Guiné-Bissau passa essencialmente pela desmilitarização da política, pela despartidarização das Forças Armadas e pelo fim das lutas pelo controlo do poder na esfera político-partidária. A resolução da crise nacional depende, única e exclusivamente, da nossa capacidade em assumirmos coletivamente os erros cometidos ao longo de quase 40 anos de independência. Depois de tantas convulsões, da desagregação da sociedade guineense e das ameaças que pairam sobre o seu futuro imediato, parece ter chegado o momento de grandes decisões. A única saída é vencer a fragmentação da nossa sociedade, através de uma discussão livre, com a participação de todos os sectores da vida nacional; a recuperação do país e das instituições do Estado é uma matéria que deve interessar e envolver todos os guineenses”, escreve Julião Soares Sousa nas reflexões finais do seu livro “Guiné-Bissau: A destruição de um país” (edição de autor, Coimbra, 2012, contacto: juliaosousa@hotmail.com).

No texto anterior procedeu-se a uma análise sumária das crises, choques político-ideológicos que invadiram a vida da jovem república da Guiné-Bissau, praticamente desde a sua fundação. Retomamos o fio desta meada exatamente com conflito de 1998-1999, que introduziu uma viragem neste ciclo de autoritarismo e despotismo. Se é facto que Nino Vieira, após o golpe de Estado de 14 de Novembro de 1980, introduziu uma modificação radical nas relações entre o partido/Estado e a sociedade, durante cerca de 20 anos as Forças Armadas foram progressivamente saindo da dependência do poder político, misturaram-se com dirigentes políticos no acesso ilícito de bens, foram coniventes em perseguições e assassínios, e por fim no tráfico de armas. Em 1998, a sociedade guineense ainda estava em estado de choque pela passagem ao franco CFA, a questão dos antigos combatentes e os vencimentos das Forças Armadas eram questões graves, eternamente dependentes; acresce a divisão do PAIGC e o confronto entre Nino e Ansumane Mané. Ciente da falta de apoios interno, Nino pede a intervenção do Senegal e da Guiné Conacri: o Senegal intervinha para liquidar os rebeldes do Casamansa e, conforme escreve o autor “A precipitação do Senegal em direção à Guiné foi instigado pelo facto de, logo nas primeiras horas, constar que os rebeldes do MFDC combatiam em Bissau ao lado da Junta Militar; a Guiné Conacri e o regime de Lânsana Conté vieram retribuir o apoio que Nino lhes dera a quando da rebelião militar de Fevereiro de 1986, que se saldou em 50 mortos, Nino e Lânsana tinham um acordo de ajuda reciproca, alicerçado em relações pessoais antigas e interesses privados em Lânsana na Guiné-Bissau. Foi um longo conflito de onze meses com vários acordos de cessar-fogo que, mal assinados eram rasgados".

Ainda na presidência de Nino, em Fevereiro de 1999, Francisco Fadul foi designado primeiro-ministro à frente de um Governo de Unidade e Reconciliação Nacional. Depois de desafios e tensões, a junta militar tomou poder em Maio, Nino renunciou e Malam Bacai Sanhá ascendeu ao cargo de presidente da República interino. O que se seguiu trouxe a revelação que os militares não queriam abandonar o poder, exigiram um pacto de transição, confiscaram poderes constitucionais do presidente da República, ao mesmo tempo que o PAIGC em congresso expulsava uma dezena de personalidades de primeiro plano. Seguiu-se um período em que à sombra do desgaste do PAIGC Kumba Ialá soube impor-se pelo seu popularismo. Este período da presidência de Kumba o autor chama-lhe a IV República. A paz não chegou à Guiné. Ansumane Mané foi assassinado, os militares demitiram Kumba em 2003, nunca mais pararam as tricas entre a presidência da República, o primeiro-ministro e a oposição, isto enquanto a situação económica e financeira tinham resvalado para um novo caos. Os militares voltaram à ribalta, exigiram a criação de um Conselho Nacional de Transição Política. O líder do comité militar, Veríssimo Seabra, foi assassinado em Outubro de 2004, Henrique Rosa foi a personalidade escolhida pelas chefias militares e pela sociedade civil para ocupar o cargo de presidente interino, depois do golpe de Estado que depôs Kumba. Nino irá apresentar-se a eleições em Junho de 2005 que derrotará Kumba na segunda volta. É este o marco da fundação da V República, segundo o autor. A instabilidade não parou: em três anos de mandato Nino nomeou três chefes de Governo. Em 2009, em dois dias consecutivos, são assassinados Tagma Na Waie, CEMGFA, e Nino. Repetiu-se a dança do presidente interino, Carlos Gomes Júnior e Zamora Induta foi nomeado CEMGFA. O PAIGC entregou-se a novas lutas internas dilacerantes entre Carlos Gomes Júnior e Malã Baicai Sanhá. Houve novas querelas na hierarquia do mando, desta feita Malam Sanhá exonerou o Procurador-Geral da República, em condições nada pacíficas.

Julião Soares Sousa explica ao detalhe todas estas convulsões, e assim chegamos às eleições de 18 de Março de 2012, interrompidas por novo golpe de Estado militar que iniciou mais um doloroso período com afastamento da Guiné-Bissau da cena internacional. Refletindo sobre a função presidencial, o autor reflete sobre os equívocos e interpretações erróneas dos presidentes que se excederam no uso do poder e escreve: “O regime presidencialista é o que menos serve os interesses do nosso país. O chefe de Estado deve ser suprainstitucional, ter a função de moderação nos grandes debates nacionais. Os presidentes da República eleitos em lugar de serem presidentes de todos os guineenses são por norma presidentes das clientelas, daqueles grupos que apenas sobrevivem bajulando o poder e com grande capacidade para fomentar intrigas e semear ódios”. A sua observação prossegue pelo estado das finanças públicas e a grande desconfiança da comunidade internacional, fala na necessidade de projetos novos na área do turismo, da agricultura, das pescas e da exploração das riquezas de subsolo. Propõe, em consequência, uma alteração, maioritariamente aceite pelo povo guineense para o desempenho macroeconómico reapetrechamento do aparelho de Estado, a dignificação dos funcionários, a coesão da política educativa, uma nova política externa de credibilidade e de boa governança. O que pressupõe um diagnóstico rigoroso e uma energia para superar contradições entre o interesse público e o mercado liberal. Desde os anos 1980 que a Guiné-Bissau promete implementar reformas económicas e políticas, o resultado é a manutenção do poder típico de regimes totalitários e a deriva neoliberal, temos assim explicada a estagnação do país.

O apelo deste insigne historiador é a favor do poder democrático alicerçado em reformas: redução dos poderes do presidente da República; clarificação dos poderes do Procurador-Geral da República, e dessa recuperação política há que passar para a recuperação das instituições do Estado como entidade promotora de bem-estar. Este apelo é escrito na convicção de que a Guiné-Bissau está no limite entre a clarificação democrática e a penosa e inglória ditadura militar. Apela a um grande debate e lembra as palavras do bispo D. Septímio Ferrazzeta, proferidas na sede de Bissau, em 9 de Agosto de 1998: “O povo da Guiné-Bissau é pacato, sabe sofrer, mas até certo ponto… Quando cada um de nós pergunta as razões desta guerra, a resposta estará nos pontos seguintes: ninguém dá ao poderoso direito de ser arrogante; ninguém dará ao soberbo o direito de ser prepotentes; ninguém dará a quem exercer o poder o direito de receber o que pertence aos outros; ninguém dará o direito ao corrompido de matar o inimigo”.

É nestes tempos incertos que é preciso encontrar novos rumos em prol do resgate definitivo do nosso país, conclui o historiador guineense neste documento apresentado com uma proposta susceptível de levantar o Estado e garantir a paz a todos os guineenses.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 18 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P10956: Notas de leitura (450): Guiné-Bissau: A Destruição de um País, por Julião Soares da Silva (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P10976: Parabéns a você (525): João Graça, músico e médico que, nesta qualidade, já fez voluntariado na Guiné-Bissau.

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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 19 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P10960: Parabéns a você (524): José Crisóstomo Lucas, ex-Alf Mil Op Esp da CCAÇ 2617 (Guiné, 1969/71) e Manuel Mata, ex-1.º Cabo Apont AP do Esq Rec Fox 2640 (Guiné, 1969/71)