Tive paludismo, e de que maneira, embora tomasse todas as “pilulas” que nos davam.
Fui salvo pelo Furriel Miliciano Enfermeiro N.º 09309564, José Jorge Fernandes Durães, que tanto procuro. Ninguém conhece o seu paradeiro.
Não me abandonou – julgo ter entrado num tipo estado de coma – visto não me recordar de nada. Tive, segundo me disseram depois, altíssimas febres. O Durães acompanhou-me sempre molhando-me o rosto com aquilo que denominavam água, mas na altura muito me ajudou.
A partir de pouco tempo na Guiné cortei relações com a água porque só me havia criado ralações. Cerveja sim – até um protocolo assinei com a Sagres – e fiz inclusive um contrato. A palavra de ordem era “Sagres Sempre”. Sagres ao pequeno-almoço, almoço, jantar e nos intervalos.
Mas o paludismo concedeu-me uns dias de folga das operações constantes. Terminada a Comissão continuei, durante um certo período, a tomar as ditas “pílulas”, e não foi do Exército que as recebi. A minha mulher trazia-as do Laboratório Farmacêutico onde trabalhava.
Onde quer que estejas Durães, vai um grande abraço!
Tive matacanha por três vezes, e até tenho sinais num pé; fui atacado, mordido e remordido pela formiga dos bagabagas, logo nos primeiros dias de Guiné, encontrava-me no destacamento de Ganturé, só em Julho de 67 fui para Gadamael Porto; atacado em força pelos mosquitos demolidores e caí numa emboscada de abelhas quase no fim da Comissão numa grande Operação que se fez na zona do “corredor da morte”, ou “corredor de Guileje”, que é “gato com o rabo de fora” – algo que existiu mas não oiço falar – comandada em terra pelo então Capitão Cadete.
Sobre estes últimos casos muito tenho para contar, mas como se fala em paludismo…
Julgo que o camarada assinalado pela seta seja Fur Mil Enf Durães
Mário Vitorino Gaspar
Ex-Fur Mil Art MA
CART 1659
************
2. Carlos Vinhal, ex-Fur Mil Art MA da CART 2732, Mansabá, 1970/72
Também tive paludismo, a primeira vez confirmado pelo Fur Mil Enf da minha Companhia, Luís da Costa Marques, Enfermeiro na vida civil no Hospital de Braga. Foi no dia 8 de Outubro de 1970 (quinta-feira), pela hora de almoço, quando assistia, na qualidade de Sargento de Dia, ao almoço da malta.
De repente, lembro-me de um aumento súbito de temperatura e de um mal-estar geral. Fui directamente para a cama, já não almoçando. Como perdi completamente o apetite, o Marques levou-me umas latas de fruta para a cabeceira da cama para eu ir comendo a fim de evitar ficar ainda mais debilitado. Segundo os meus registos, atingi os 40º de temperatura. Durante uns tempos nem fumar conseguia. Com o tratamento adequado e dois dias e meio de cama tudo se resolveu.
Convém aqui abrir um parênteses para dizer que eu nesta altura ainda não era operacional. Chegado a Mansabá em ABR70, fui destacado para a Secretaria. Como em 05OUT70 (3 dias antes de eu adoecer) tinha morrido o Alf Mil Art MA Armando Couto, vítima de uma mina IN, e o alferes Bento, CMDT do meu pelotão, também atingido pela explosão e evacuado para o HM 241, era necessária a minha ajuda na "feitura da guerra no mato". Estou a lembrar-me que o Fur Mil Gardete Correia, também do meu pelotão, estava de férias na metrópole, pelo que o nosso camarada Fur Mil Fernando Nunes ficou sozinho. Nem a (des)propósito o ataque de paludismo que sofri, que reforço, foi comprovado.
Voltando ao assunto, no sábado recebi a inesperada visita, no quarto, do meu Comandante, Capitão C (lembras-te dele amigo Jorge Picado?), meu inimigo de estimação, que me incentivou a ficar bom porque necessitavam de mim. Fiquei estupefacto, então o "C" veio pessoalmente desejar-me as melhoras!!!
Mas pensando melhor, achei que o que ele foi ver é se eu estava a fingir doença para me baldar a ir para o mato. Aquilo é que me saiu uma peça!!!
No domingo, dia 11OUT70, houve uma homenagem ao malogrado Alf Mil Couto, com missa campal e cerimónia militar. Com algum esforço levantei-me para participar nas cerimónias e, de certeza, na semana seguinte comecei a sair para o mato para alinhar em pequenas operações, montes de colunas, etc.
Tive ainda na Guiné um segundo ataque de paludismo, muito leve, e mais tarde já em casa, e casado, no inverno de 1972, tive as mesmas reacções que combati com as injecções que trouxemos de prevenção, fornecidas pelo Exército Português a quando da desmobilização.
Cabe aqui ainda salientar que tomava religiosamente os comprimidos profiláticos que nos punham junto aos pratos, ao almoço das quintas e domingos. Acabada a refeição, complementava, tentando matar o bicho, neste caso a bicha, com VAT 69 ou White Horse.
Como a água não era de confiança, embora fosse de um furo e bombeada para um depósito, bebia normalmente água Castelo ou Perrier, muita Coca-Cola e outros refrigerantes. Cervejinha sempre às refeições e raras vezes fora delas. Em dias festivos, que eram quando nós queríamos, bebia umas garrafitas Casal Garcia para desenjoar. Moderação, muita, porque a vida iria continuar para além da guerra.
Na foto: Fur Mil Enf Luís Marques, Fur Mil Op Esp Luís Pires e Furs Mil At Ismael Santos e Carlos Vinhal
Mansabá, 11OUT70 - Cerimónia de homenagem ao nosso camarada Alf Mil Art MA José Armando Santos do Couto - Desfile do 3.º Pelotão/CART 2732. À frente o Cabo Corneteiro José Pedro Barge, seguido dos Furs Mil Fernando Nunes, Carlos Vinhal e o resto da malta.
Carlos Vinhal,
ex-Fur Mil Art MA
CART 2732
Mansabá, 1970/72