© Manuel Ferreira (2005)
Tugas da CART 3494 (1972 /74), jantando leitão, na sua caserna-abrigo no Xime (1972).
Texto do João Tunes (que, entre muitos outros talentos, é um conhecido cinéfilo e um artesão da palavra):
O termo tuga não tem a raíz que o Luís lhe atribui. De facto, ele acabaria por ser adoptado pelos nossos soldados (e, espanto dos meus espantos, até serviria recentemente para exaltação de marketing da nossa mobilização futebolística no Euro!).
Mas a origem do termo tuga (abreviatura de portuga que, por sua vez, abreviava o português) foi uma devolução de insulto por parte dos guerrilheiros perante o turra com que a propaganda colonial os tratou (julgo que os mesmos termos - turra e tuga - foram utilizados na Guiné, em Angola e em Moçambique). Ou seja, uma resposta léxica à indução de terrorista mais "estúpido, primário" e que, resultando na força da brevidade insultuosa de turra, permitia injuriar com brevidade, repulsa e força.
Então, a volta do correio no insulto, vinha no tuga (a guerrilha recuperava e devolvia o tu associando terrorismo com a marca de nacionalidade portuguesa e de presença exógena em África).
O facto de o insulto ter sido adoptado pelo insultado (não me constando que, simetricamente, os guerrilheiros alguma vez tenham usado o turra entre eles), quando os soldados portugueses, entre si, se chamavam de tugas, terá a ver com a nossa capacidade de interiorizarmos a noção de pequenez e, afinal, sabermos que a nossa distância civilizacional não estava assim tanto nas antípodas do nível cultural dos que combatíamos.
© Agência de Notícias Xinhua (1972)
Guerrilheiros do PAIGC em posição de combate (ou em pose fotográfica ?) (O termo injurioso turra era usado por alguns de nós para designar os combatentes do PAIGC; apesar de tudo, a guerrilha do PAIGC impunha respeito às NT, em grande parte devido a estatura política e moral do seu líder, o Eng. Amílcar Cabral, mas também pelo valor militar de alguns dos seus comandantes, como o Nino Vieira).
2. Comentário de L.G.
Deixo aqui a resposta de um especialista da língua portuguesa, o angolano Rui Ramos, a uma pergunta de utilizadora do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa (aliás, aconselho vivamente os nossos tertulianos a visitarem este sítio sempre que tiverem dúvidas sobre uma palavra ou uma expressão: é uma caixinha de surpresas, um autêntico consultório da língua portuguesa - procurado diariamente pro milhares de utentes -, um verdadeiro serviço público à lusofonia, um sítio que tem tido uma vida de sobressaltos, depois de criado em 1997 pelo José Mário Costa e pelo saudoso jornalista João Carreira Bom).
Pergunta:
"Li algures que a palavra tuga era pejorativa. Não a encontro em nenhum dicionário mas de facto tornou-se conhecida pois foi o nome dado à Selecção Nacional aquando do Mundial 2002. A pergunta é: a palavra existe? E é pejorativa?" Manuela Couto. Portugal.
Resposta:
"A palavra tuga é de facto pejorativa. Surgiu em contraponto à palavra turra ('terrorista') que os colonos portugueses em África usavam para designar os que, com armas, se opunham ao colonialismo. Surgiu na década de 60, já em plena luta armada de libertação nacional.
"Eu próprio a usava, já inserido na luta clandestina do MPLA em Luanda, para falar dos soldados portugueses em Angola. 'Turra-Tuga' é uma dicotomia que faz parte integrante da luta anticolonial e que, já se vê, define o lado mau da luta.
"Por isso eu desde o início considerei que a palavra tinha sido muito mal escolhida para a selecção portuguesa devido à carga guerreira, colonial e incivilizada, porque parece homenagear um dos períodos mais tristes da História de Portugal.
"Em sentido mais amplo temos a expressão pula (os imigrantes africanos tratam, invariavelmente, os brancos por esta palavra)". Rui Ramos. 07/01/2003.
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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