quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Guiné 63/74 - P12222: Estórias cabralianas (81): Em Vendas Novas, de ronda, na Tasca das Peidocas (Jorge Cabral)

1. Estórias cabralianas (81) > De ronda, na Tasca das Peidocas

por Jorge Cabral

[, foto à esquerda, em Sobreiro, Mafra, 1968,   ainda cadete, num jantar comemorativo do fim da recruta, na EPI- Escola Prática de Infantaria] (*)

Em Janeiro de 1969, eis-me garboso aspirante na E.P.A. [Escola Prática de Artilharia], em Vendas Novas.

Ao contrário dos outros aspirantes, encarregados da instrução no C.S.M. [, Curso de Sargentos Milicianos], eu fui colocado na Secção de Justiça e na Acção Psicológica, sendo ainda nomeado árbitro de andebol da Região Militar.

Tantas eram as tarefas que não fazia nada... Quando me calhava em escala, era oficial de piquete ou oficial de ronda.

A força de piquete contava com doze soldados e sempre que soava o respectivo toque, tinha que os reunir para irem... descascar batatas. Gostava mais de estar de ronda. Saía do quartel, bem ataviado, de arreios e pistola à cinta, seguido por uma praça, para fiscalizar a postura e o comportamento dos militares. Corríamos os cafés junto ao quartel rapidamente, seguindo depois para os arrabaldes da vila, onde abundavam tascas com belos petiscos.

Entre as muitas tascas existentes, a melhor era a das Peidocas. Foi lá que conheci o Senhor Ladrão, homem muito considerado que só roubava em Lisboa. As Peidocas, eram mãe e duas filhas gémeas, Isménia e Leocádia, uns amores de raparigas. Tão estranho apelido fora herdado do pai e avô, um Cabo Artilheiro, que ganhara um desafio, realizado há muitos anos, no dia de Santa Bárbara, patrona da Artilharia. O desafio consistira..... pois, "ventosidades anais", curiosa terminologia que aprendi num Acordão do Tribunal da Relação de Évora, que sempre referi aos meus alunos:
- Expelir ventosidades anais em direcção de outrem consubstancia o crime de injúria!

E não é, que quando dava esta aula, me lembrava sempre das adoráveis raparigas Peidocas!...

Jorge Cabral
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Nota do editor:

Último poste da série > 13 de setembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12035: Estórias cabralianas (80): As mulatas de Luanda (Jorge Cabral)

(...) Numa noite, no início de Maio de 1968, apareceu-me irritado o meu amigo Filipe. Ia para a tropa.
– Tens a certeza Filipe? Olha vamos passar por lá, pela Junta de Freguesia. (Onde à porta afixavam as listas).

E fomos. Corri os olhos pelo edital e era verdade. Lá constava, Filipe Narciso Gonçalves da Silva. Só que, um pouco mais abaixo, encontrei o meu nome, Jorge Pedro de Almeida Cabral. Devia ser engano, um erro, eu tinha direito a adiamento. Que o Filipe fosse, não era para admirar. De igual idade e entrados ao mesmo tempo na Faculdade, ele não passara do primeiro ano, enquanto eu contava acabar o curso no ano seguinte. (...)

13 comentários:

Luís Graça disse...

Alfero Cabar5l, vê-se que está em "modo de produção artesanal"... A tua última história tem dois meses e meio!... Pou-te a pau, que ainda te extingue o post de trabalho!....

Mas vamos ao que interesse aos nossos leitores, sobretudo os mais jovens: será que ainda existe a Tasca das Peidocas ?

Passava muitas vezes a Vendas Novas quando ia para o sul... Agora já vou menos. Ou vou mais raramente ao sul. Aliás, não vou para o sul nem para o norte. Deixo-me ficar por onde estou... para poupar energia.

Mas satisfaz-me lá a curiosidade: a tasca ainda existe ?

É de todo improvável!... Com o fascismo sanitário aí à solta, há muito que a ASAE "arrebentou" com as tascas (imundas, proletárias, perigosas, subversivas...) deste país de gente que não se sabe governar (nem se deixava governar), agora finalmente com rédea curta, imposta pelo estrangeiro de fora (com a cumplicidado do estrangeirados de dentro)...

Outra hipótese foi ter-se transformado em Casa das Bifanas... que é o que está a dar em Vendas Novas, há um porrada de anos...

Este país ainda vai exportar bifanas de Vendas Novas, tal como já está a fazê-lo com o famoso pastel de nata...

Ele há gente valente e empreendedora!

Mas voltando a Vendas Novas: acabou-se a guerra, o pum-pum, a artilharia é agora uma arma obsoleta, as "ventosidades anais" deixaram de ter pilhéria... Emfim, é a "apagada e vil tristeza" de que já se queixava o nosso vate, Luís de Camões, há 400 e tal anos...

Quando lá passei, no verão de 2012, não resisti à força do "marquetingue" e lá fui provar as bifanas...

Os gajos já "franchisaram" a marca: imagina que fui encontrar no Porto. numa essas catedrais do da religião do ventre, uma Casa das Bifanas de Vendas Novas!

Meu caro alfero Cabral... estamos a ficar velhos... Eu, como alguém me dizia hoje, de manhã, um respeitado nome da saúde pública, "temos os genes a lutar contra nós"...

Para te confessar a verdade, começo a - não me interpretes mal! - pensar muitas vezes em (, não é ter saudes de...) o tempo em que havia neste país "coisas imundas" como a Tasca das Peidocas e mancebos que comiam coiratos para matar a fome, antes de ir parar a Guidaje, Guileje, Gadamael...

Ando a pensar muitas vezes nestas "coisas imundas" do passado... Acho que, um dia destes, me vou confessar ao padre de Beirais...

Luís Graça disse...

Alfero Cabral, "peidoca" não vem no dicionário (formal)... Mas se um falante da língua portuguesa do Brasil ler a tua estória, vai pensar que "peidoca" é sinónimo de peidoquinha, menina novinha, "bobinha de tudo".

"Olha aquela peidoquinha ali!
Aquela guria é uma peidoca!"

Não me parece que, em Vendas Novas, fosse o caso, com as "peidocas" rodeadas, por todos os lados, de artilheiros e de artilharia da pesada...

Um abraço. Um bom português nos entendemos. LG

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Fonte: http://www.dicionarioinformal.com.br/peidoca/

Tony Borie disse...

Olá Jorge Cabral.
Mais um texto, que me fez rir e, continuar bem disposto.
É disto que nós precisamos, boa disposição!
Afinal foi um retrato fiel e sincero, de uma passagem da vida de um militar, que por ali andava, esperando a ordem para ir lá na África, "dar o corpo às balas"!.
Um abraço companheiro.
Tony Borie.

mario gualter rodrigues pinto disse...

O nosso Alfero Cabral a quem eu por acaso conheci como Cadete o que se havia de lembrar.
Vendas Novas naquele tempo era bem conhecida pela malta da EPA que frequentava as tascas e cafés da Vila nos seus momentos de ócio, também pouco mais havia.
Por alguns motivos alguns desses lugares se tornaram celebres no meio da melitagem. Lembro-me por exemplo do Café das Patas que muitas vezes mais parecia uma parada da Escola que um café normal de tanta farda lá contida, devido ás boas FEBRAS, leia-se GARINAS, que lá trabalhavam e serviam. Quanto ás bifanas as melhores e as mais frequentadas pela malta eram de uma tasca/adega em Bombel, creio mesmo que no meu tempo e do Alfero Cabral ainda não existia a casa das Bifanas, pelo menos como a conhecemos hoje.

Um abraço e obrigada Alfero por esta lembrança

Mário Pinto

José Pardete Ferreira disse...

A história está gira. Fui Médico na EPA de Fev. a Out, de 1968. Onde nós íamos era à tasca/"restaurante" do Zé do Calção, junto à estrada, à direita de Sul para Norte, já a Chegar a Bombel(i). Tinha umas febras de porco notáveis. A Casa das Bifanas já trabalhava mas era muito diferente. Os mais abonados iam ao Manel das Bombas (que se licenciou em Direito depois de "enviuvar") ou então a Montemor(i). Havia um Capitão, que regressara da Guiné, depois do jantar, que fazia o trajecto Montemor-Vendas Novas, pela faixa esquerda da estrada para... treinar os reflexos.
Já não me lembro bem mas tnho a impressão que era o Cap. Reis, mas não tenho a certeza. Os anos passam... Abraço.

Anónimo disse...

Luís! A tasca já não existe. Mas as

Peidocas,sim. Encontrei uma há uns

anos no aeroporto de Faro.

Mete lá no dicionário a

palavrinha peidoca..


Mário! Tenho fotos de Vendas Novas,

onde apareces. As bifanas foram

inventadas...para safar o comercio

depois da construção da autoestra-

da..Na grande Tasca de Bombel o

vinho era à discrição...só se

pagavam os comes..

Abraços.

J.Cabral


Anónimo disse...

Isso mesmo o Zé do Calção. Mais tarde

matou-se.

Abraço.

J.Cabral

m disse...

Quem diria que: Peidocas,Calção,Patas,Bombas e Bombel são lugares de comes e bebes e não de fumaça, como se poderia deduzir.
Esta língua é portuguesa, concerteza.
Gostei das notas e comentários, simples e humorísticos. À nossa moda.
Abraços gastronómicos.

manuel maia disse...

Caro Alfero jorge Cabral,

Como de costume,com o sal q.b.
A questão da flatulência configurar crime,desconhecia em absoluto...
Cheguei a assistir a "campeonatos dos ditos em que a contabilidade era feita por um júri de três elementos e onde os concorrentes chegavam a trazer nos bolsos dos casacos bocados de cebola que segundo eles lhes proporcionava uma capacidade ultra especial no efeito sonoro...

Após cada sessão que funcionava no espaço temporal de uma hora,com assistência a quem faltava só pagar bilhete(se fosse hoje ter-me-ia vindo a ideia de ali fazer uns cobres...pois há profissionais para tudo quanto é desporto e aquilo funcionava como tal...) Após cada sessão eram registados os disparos que tinham que ser suficientemente audíveis para os apurados ouvidos do júri... O campeão,recordo,conseguiu 88 trovões no espaço de três sessões batendo o record até aí cifrado em 76 para depois cair de produção e ficar nas cinco sessões em 96,ficando mesmo assim no primeiro lugar a larga distância dos parcos 47 do segundo classificado... foi o Quim Peideiro, a quem saúdo daqui do alto desta tribuna...

Anónimo disse...

Ventosidades anais...umm

No meu tempo um "instruendo" anafado gabava-se que dava os "peidos" que queria...
Apostei com ele em como não conseguia dar 120..se conseguisse pagava-lhe uma bifana no "manel das bombas"..e não é que conseguiu mesmo..

Comeu uma à minha conta e mais quatro à conta dele.."ganda alarve"..

Em Vendas Novas ao longo da rua-estrada havia tascos tasquinhas e tascões..tudo para saciar a "larica" dos artilheiros..sim porque na E.P.A. comia-se muito mal.

C.Martins

Luís Graça disse...

Mais umas achegas para a "cultura artilheira"...

Tudo sobre "ventosidades anais"!... Vd. página na Net:

A Ordem do “Peditum” Azul!
Por Manuel Luciano da Silva, Médico

http://www.dightonrock.com/ordem_do_peditum_azul.htm

Tomo a liberdade de reproduzir aqui alguns excertos do nosso médico que advoga, para os seus utentes, a liberdade do peido, á boa maneira romana... E, como diz o poeta, "cú que não caga, é cú sem opinião"... Sem esquecer o grande Bocage, gentilíssimo, cavalheiro, a quem se atribui a famoso dito: "O peido que aquela senhora deu, não foi ela, fui eu!"...

(...) - “Sr. Doutor, estou cheio de gases!”

-- “As minhas tripas fazem muito barulho!”

--”Largo gases por cima e por baixo!”

Queixas como estas são muito frequentes no consultório médico.

Qual é a quantidade de gases intestinais que cada pessoa produz em 24 horas? Em média, cada indivíduo produz, por dia, um litro de gases intestinais. No entanto, comendo certos alimentos podemos produzir mais de um garrafão!... (...)

(...) Mas afinal o que é que dá o mau cheiro às ventosidades anais? São os sulfuretos produzidos no intestino, parentes do ácido sulfídrico, ou gás dos ovos podres, que dão o perfume característico aos gases expelidos através do ânus. Felizmente que a percentagem dos sulfuretos é pequeníssima, apenas um décimo de centésimo (0,01), de outra maneira morreríamos todos intoxicados à superfície da terra...(...)

(...) Todos nós sabemos, por experiência própria, que há certos alimentos que causam muita produção de gases intestinais. Os feijões, castanhas, grão-de-bico, repolho, cebolas e alhos são os campeões. E por que é que estes alimentos originam tantos gases? Porque a raça humana perdeu, há milhares de anos, a capacidade de fabricar no intestino delgado um enzima ou fermento, chamado alfa-galactosidase, necessário para desfazer ou metabolizar os açúcares chamados oligossacarídeos, que passam intactos para o intestino grosso, onde são fermentados pelas bactérias do cólon, resultando então uma abundância de flatulência, borborismo, ventosidades ou simplesmente gases. (...)

(...) Mas os romanos foram mais severos com os gases intestinais. Chegaram aprovar leis proibindo o “pedare” nos lugares públicos! Foi o Imperador Tibério Cláudio, que sofria de prisão de ventre e flatulência, que no princípio da era cristã, decretou uma lei dando liberdade ao “pedare” nos lugares públicos. Devemos notar que é do verbo latino “pedare” que derivou o substantivo ‘peditum” e que significa “expelir ventosidades” e que deu em português “peido”, palavra, que por falso pudor, faz corar muita gente... A minha saudosa mãe dizia por graça que "na América o dia mais importante era o dia do payday"!... (...)


(...) Se um terço da população mundial produz, diariamente, um litro de metano ou gás das cozinhas, quanta energia se desperdiça por esse mundo fora?!

- “Ai, Sr. Doutor, eu tenho tantos gases!

- Obedeça às leis do imperador Tibério! “Pedare, “Pedare” , faz bem à saúde!... (...)

Anónimo disse...

José Pardete Ferreira
31 out 2013 12:07


Caro Luís Graça,

Na minha última intervenção sobre uma história hilariante de Vendas Novas, escrevi que havia um Capitão, que regressara da Guiné, que quando ia jantar a Montemor voltava pela esquerda para treinar os reflexos. E, embora não me soasse muito bem, chamei-lhe Cap. Reis. Esta noite, às quatro da manhã, acordei: "Rei"! Com efeito, tratavasse do Cap. Rei, que regressava fora de mão com o seu Carocha e que só regessava à sua faixa quando via as luzes.

Abraço
Pardete

antonio graça de abreu disse...


Conversa rasca e de merda. Mas que delícia!
O Jorge Cabral pode e deve melhorar ainda mais esse texto. Peidocas, gémeas, uma delas reencontrada tantos anos mais tarde no aeroporto de Faro, creio que com todas as ventosidades anais controladas. Campeonatos de peidos, traques ao vento, bufas perfumadas.
Escatológico, merdoso, sem dúvida, mas faz parte das nossas vidas.
Qual de nós, dormindo ao lado de uma linda menina ou de uma alambuzada matrona, não acordou a meio da noite com o estrondo e fragrância de um grande peido que a nossa companheira de ocasião, ou de toda uma vida, airosamente soltou?

Abraço, perfumado a cravo e flores de jasmim.

António Graça de Abreu