quarta-feira, 23 de outubro de 2019

Guiné 61/74 - P20271: Guiné 61/74 - P19815: Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (São Domingos e Nova Lamego, 1967/69) - Parte LXXI: 1984/85: um regresso, quinze anos depois: (i) a primeira viagem de saudade


Foto nº   16 > Guiné-Bissau > O Virgílio Teixeira junto à instalação da fábrica descascar arroz,  desativada. Bissau, 5Jan85


Foto nº 2 > Guiné-Bissau > Bissau > 3 de janeiro de 1985 >  No Pilão, na porta da casa do nosso taxista fula, de nome Mamadu.


Foto nº 2 > Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá >  3 de janeiro de 1985 >A nova ponte acabada então de inaugurar, em Bafatá, com ligação a Fá Mandinga.


Foto nº 3 > Guiné-Bissau > Região de Gabu > Cabuca > 3 de janeiro de 1985 > Esta era a picada entre Nova Lamego (hoje Gabu) e o aquartelamento de Cabuca, a uns 20 a 30 km da sede do comando do antigo sector L3.

Foto nº 4 > Guiné-Bissau > Região de Gabu > Cabuca > 3 de janeiro de 1985 > Em Cabuca recolhendo terra para amostras de produtividade e rendimento.



Foto nº 5 > Guiné-Bissau > Região de Gabu > Cabuca > 3 de janeiro de 1985 > Aqui estamos numa lagoa, que faz fronteira com a Guiné-Conacri.


Foto nº 6 > Guiné-Bissau > Região de Gabu > Cabuca > 3 de janeiro de 1985 > – Pormenor de um lago lodoso de águas paradas, e o aviso no placard da existência da mosca Tsé-Tsé. O nome escrito diz ONCORSECOSE (a doença mais conhecida por "cegueira do rio").

Foto nº 11 >  Guiné-Bissau > Região de Bissau > 5 de janeiro de 1985 > Vista geral complexo agroindustrial, inacabado e abandonado. Tratava-se de uma fábrica de descasque de arroz.


Foto nº 12 > Guiné-Bissau > Região de Bissau > 5 de janeiro de 1985 > Outra vista das instalações fabris que nunca chegaram a funcionar.


Foto nº 13 > Guiné-Bissau > Região de Bissau > 5 de janeiro de 1985 >  Em primeiro plano, os porcos que se passeiam livremente pelo complexo industrial abandonado.



Foto nº 14 > Guiné-Bissau > Região de Bissau > 5 de janeiro de 1985 >  Vista geral do complexo, Bissau, 5Jan85.


Foto nº 15 > Guiné-Bissau > Região de Bissau > 5 de janeiro de 1985 >  Interior do complexo inacabado, Bissau, 5Jan85

Fotos (e legendas): © Virgílio Teixeira (2019). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




1. Mensagem, de 9 do corrente, do nosso amigo e camarada Virgílio Teixeira, ex-alf mil SAM, chefe do conselho administrativo, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69); é economista e gestor, reformado; é natural do Porto; vive em Vila do Conde; tem já perto de 140 referências no nosso blogue- (*)


Luís, como estás? 

Segue o texto (e as fotos) para o tema T999: foi enviado por mail, em Junho de 1998, já passou mais de um ano. 

Não sei o que se passou, mas devo ter enviado em conjunto, no Wetransfer com prazo de 8 dias, e por isso perdeu-se. 

O interesse é mostrar no que se passou a seguir à Independência, aquele território tornou-se não no 3º mundo, mas uma parcela única do 4º mundo. Naquela altura a Guiné estava classificada como ‘o paíos mais pobre do planeta’… Pobre povo que tanto sofreu com esta mudança! 

Este poste trata de um assunto muito particular da minha vida, e agora estive e reler tudo, e achei que vale a pena tentar, e ver o feedback desta história. Não toquei em nada, foi escrito naquela data, era assim que pensava, e hoje igual. 

Tenho andado agora muito ocupado nas minhas rotas pelo Porto, já vou em mais de 7000 fotos, e eu que pensava conhecer o Porto, e afinal só conhecia as pedras da estrada, o paralelo, o alcatrão, a terra batida, e depois os restaurantes, hotéis e afins. 

Ontem fiz a minha mais dolorosa ronda. Para quem sabe, desci ‘as escadas do Codaçal’ e subi ‘as escadas dos Guindais’. São cerca de 400 escadas para baixo e para cima, mas depressa recuperei desta fadiga. Foram 158 fotos, coisas inéditas para mim, nunca lá tinha ido! 

Um dia talvez venha a publicar algumas, que interessam mais às gentes do Porto e do Norte. 

Quanto ao nosso Tema de hoje, esta descrição, apesar de longa, são 13 páginas, acho eu, está longe do todo, pois esta aventura já está escrita nas minhas memórias há muitos anos, nem me passava pela cabeça este Blogue, isto daria para mais 3 a 4 vezes, e isso, não sei se virei a contar na totalidade. 

O final do projecto não foi muito feliz, e contém tanta coisa pessoal e que tenho de preservar. Acho que, no final de tudo, quase desgracei a minha vida, e já se passaram 35 longos anos, desde que iniciei esta loucura. 

Em todo o caso, é parte da vida de um camarada da Guiné, e julgo que tem interesse para quem quer perceber o curso que seguiu aquele novo País de língua portuguesa. 

Isto como tem muito texto e fotografias, vai ter de se dividir em 3 postes ou em 3 partes, caso consideres que é um assunto de interesse para a malta. 

Um abraço, 

Virgilio Teixeira 

Em, 2019 –10- 09


2. Álbum fotográfico > Guiné 1967/69 

TEMA 999 – O REGRESSO À GUINÉ 15 ANOS DEPOIS

ANOS 1984 E 1985 : UMA VIAGEM DE SAUDADE ; DUAS VIAGENS DE NEGÓCIOS


I - Anotações e Introdução ao presente Tema

Este tema tem tanto de louco como apaixonante,

Não vou entrar em pormenores, porque para qualquer um que tivesse a ousadia de querer ler tudo o que já escrevi sobre o tema, teria aqui tanto para ler que até daria sono ao nosso Presidente Marcelo Rebelo de Sousa.

Já escrevi no meu livro ‘Não editado’ todos os dramas pessoais e familiares que esta saga me trouxe, nunca saberei se valeu a pena, abandonar a família, correr riscos, desbaratar dinheiro que viria a fazer falta, com resultados nulos.

Vou dividir isto em 3 partes que correspondem a 3 viagens, agora apenas escrevo sobre a primeira delas, aquela que mais me marcou, as restantes ficam para mais tarde…:

I Parte – A viagem de saudade à Guiné

II Parte – A viagem de negócios à Guiné e Senegal

III Parte – A viagem de arranque do projecto na Guiné


Parte 1 – A primeira viagem de saudade à Guiné


Corria o ano de 1984, e um dia qualquer, estava eu a ficar, podemos chamar com uma loucura incontrolável, tinha pesadelos diários com a Guiné, acordava todo suado, eram noites seguidas, anos a fio com estes sonhos, o meu regresso à Guiné, e o mais estranho é que até nos sonhos aparecia com a minha família toda, a caminho de lá. Incríveis.  estes sonhos, e porque não aguentava mais, resolvi que tinha de matar os fantasmas.

Vou ao Consulado da Guiné-Bissau no Porto, falo com o major Valentim Loureiro, era o Cônsul da Guiné em Portugal, na altura também era o tutor dos filhos do 'Nino' Vieira, que estudavam aqui no Porto. O Valentim era também já conhecido, ele e o meu pai,  eram já camaradas, estiveram a trabalhar juntos no RI 6 do Porto.

Nunca meti o meu pai nisto, conversei longamente com a minha mulher, expliquei que eu tinha de fazer isto sozinho, aliás ela também nunca iria, tem horror a África. Tinha eu então 41 anos feitos, a caminho dos 42, e a minha mulher em casa com 37 anos, e os meus três filhos, a mais velha com 13 anos, o rapaz seguinte com 12 e a mais nova com 10.

Abandonar a mulher e filhos, quando vivíamos todos felizes, como sempre até hoje, era uma obra do diabo, mas fui fazendo os preparativos para esta aventura de loucos, digo eu.  Passamos aqueles meses anteriores bastante tensos com esta perspectiva, pois nunca nos havíamos separado antes, eu amava a minha mulher e os meus filhos, eles eram todo o meu mundo, eu superprotegia-os. Como vou abandonar isto, e vou para o escuro ?... Há aqui dramas escondidos que só por si davam um romance, mas vamos em frente.

Sonhava que iria encontrar aquilo que lá deixei em 1969, um país normal de África, com todas aquelas mordomias que tinha quando lá estava, uma cidade de Bissau limpa, as esplanadas com aquelas maravilhosas ostras, os mariscos, a musse de chocolate gelada do Solar dos 10, e os restantes bons petiscos, e tudo bem acompanhado de cerveja gelada e uns uísques com muito gelo, o Grande Hotel, uns bons restaurantes, nada a faltar. Aquele calor insuportável, a humidade, tudo o que era de bom e mau, eu estaria mesmo louco.

Não vou descrever mais, sobre os dramas da partida, os preparativos, os encontros com outras pessoas que pudessem conhecer aquilo melhor, isto são coisas do nosso íntimo e não são fáceis para os outros perceberem. Posto isto, pedir o visto no passaporte por 15 dias, e a surpresa é que tive de esperar mais de um mês pela autorização do visto, mas o Valentim Loureiro alertou-me para não ir, que já não era nada daquilo que fora no tempo da tropa, mas desvalorizei, estava com umas palas como os burros e só via para a frente, ninguém me desviava do meu sentido.

E lá fui, depois de imensas peripécias que vou passar à frente, chego ao Aeroporto da Portela, pois o voo era por volta da meia-noite, de um sábado, como todos os voos para a Guiné, naquela época, em 20 de Outubro de 1984, chegando a Bissau na madrugada de 21 de Outubro. Vai fazer agora 35 longos anos, de recordação e muita angústia.

Era tudo escuro, os passageiros eram na maioria africanos, a confusão indescritível na fila para fazer o check-in e enviar as malas. Como já era hábito aquilo estava carregado de guineenses, que estavam cá a trabalhar ou a passar tempo, e, quando me apercebo,  já estava cercado por uns quantos que me entregavam caixas e embrulhos para meter na minha bagagem, e o peso não tinha importância pois a TAP facilitava isso.

Eu só pensei numa coisa. Se me metem droga nas malas e nas caixas deles, e quando lá chego e me revistam,  entro logo na prisão. Bom, em conversas acesas, pois eu não queria levar nada comigo, as hospedeiras convenceram-me que não havia problemas, era normal, eles só diziam que era ‘leite pra minino que está no Bissau’. Bom,  lá meteu mais uns 20 kg de carga e não paguei mais por isso, ainda perguntei a quem vou entregar aquilo, mas eles dizem que não se preocupe, alguém vai ter comigo e leva as embalagens.

O voo levantou uma hora mais tarde, pois aquilo era uma confusão total, mas eu estava decidido e já tinha gasto com a preparação da viagem e com a Agência, quase 200 contos [, 200  contos em 1984 é o equivalente a 4.754,87 €, a preços de hoje], incluindo viagens mas de fora a estadia. Eu não sabia nem tinha ideia para onde ia, tinha como referência o Grande Hotel de Bissau, mas nunca falei com ninguém nem marquei nada, fui mesmo à aventura, às cegas. 

Como já era normal, paramos no Sal, e comecei a sentir aquela sensação que já não estava habituado, aquilo não era uma Província de Portugal, é um País novo, e as pessoas, ainda com a sua jovem independência, olhavam e tratavam-me de uma forma não muito simpática. Eu tantas vezes lá tinha pousado, no antes, e era tudo nosso, fazia o que me apetecia. Mas não deixaram sair do aeroporto, agora já mais moderno, onde comprei qualquer coisa para entreter o estômago, afinal ainda era jovem, tinha os meus 41 anos, tinha apetite.

Lá deixamos aquilo, e voltamos ao avião Boeing 707 da TAP. Passado uma hora estava a sobrevoar aquela Guiné que já conhecia, os céus a mesma coisa, e cá para baixo a mesma paisagem. Como era ainda cedo, a neblina estava lá presente.

Escrevi durante a viagem, desde que deixei a família com um aperto enorme na garganta, uma carta com aquilo que estava a sentir, angústia e ansiedade. Já levava um envelope endereçado à minha mulher e, quando estava perto de aterrar,  chamei uma hospedeira, mostrei a carta com selo e endereço, e disse que ia metê-la no envelope, pedindo que ela na volta a Lisboa a colocasse no correio, e assim foi.

A aterragem deu-se pelas 9 horas da manhã, na mesma hora em que eu lá tinha chegado da primeira vez, em 21 de Setembro de 1967, ou seja 17 anos depois.  Mas agora era o dia 21 de Outubro de 1984, e estava num novo país independente.

Quando as portas se abrem, saindo daquele ar condicionado frio, pois ainda nos deram umas mantas para não se sentir aquele gelo dentro do avião, leva-se então com aquela baforada de ar quente e húmido, como se tivesse entrada no forno da minha cozinha. Entro da sala do aeroporto, e sem ar condicionado, tudo fechado, imediatamente o suor começa a cair pelas faces, pela roupa e em pouco tempo estou encharcado até à ponta dos pés. Nada que eu já não conhecesse, mas agora mais grave, pois cheguei a um novo país, ainda na minha mente um país... "inimigo" de Portugal.

As filas eram intermináveis para o check-in, pois o pessoal africano tinha prioridade sobre os brancos, e assim fui derretendo as poucas banhas que tinha. Chega a minha vez, apresento o passaporte de turista, e logo perguntam com grande autoridade: o que vem cá fazer? Eu disse que vinha fazer uma visita, não me veio mais nada à cabeça. Acharam estranho e, pouco tempo depois já me tinham chamado a uma sala reservada, eu levava comigo uma pasta preta de boa qualidade e marca conhecida, e uns homens, deduzo que da Polícia política local, ainda me perguntam se pertenço a algum ‘corpo diplomático’ e respondi que não, vinha apenas matar saudades dos tempos em que lá tinha estado na guerra colonial, há muitos anos atrás. Deram ordens para avançar, e fui para outra sala para a revista de tudo. Aí os guardas, como em todo o lado, logo me apanharam algumas coisas, era recordações para eles e família, cigarros, isqueiro, roupa, e coisas assim. Não levantei problemas.

Estava tudo em ordem, lá colocaram o visto de turista para 15 dias no passaporte. Voltei à fila do check-in, e perguntaram-me qual era a minha morada na Guiné, onde ia ficar. Fiquei indeciso, pois não tinha nenhum sítio marcado, disse que talvez fosse para o Grande Hotel. Escreveram tudo. Depois foi a vez do dinheiro, quanto é que levava, claro que declarei menos, e tive logo que cambiar o mínimo de 50 USD no Banco Local no aeroporto, tendo recebido 5.668,50 Pesos Guineenses, e alertaram que o câmbio de rua era ilegal, era crime e dava prisão. Ficou tudo escrito no passaporte. Eles olhavam-me muito desconfiados, não acreditavam em nada do que eu dizia. Mas finalmente consegui abandonar aquele forno.

Cá fora, lá estavam eles à minha espera, nem precisaram de procurar muito, pois os seus familiares em Lisboa devem ter dado todas as informações físicas da pessoa a contactar. E foi bom, porque tinham lá uma carrinha de caixa aberta e deram-me boleia até às portas do Grande Hotel. Despediram-se e foram à sua vida, e lá fiquei eu com a bagagem.

Mas o mais espantoso vem a seguir. Eu que estive na Guiné dois anos, e nunca vesti mais do que uma camisa, e de mangas curtas a maioria das vezes, levava então nesta viagem de loucos, já vestido um fato e gravata, e, num saco em separado, outro fato. Para quê? Só me estorvou o tempo todo. Meti-o na mala, ficou todo amachucado e deixei aquele apêndice que me estorvava os movimentos.

Quando desembarco do avião, aquela garra toda desaparece, como da primeira vez, e de imediato fico novamente apanhado pelo clima, e passo a andar como os outros, muito devagar, devagarinho, não há pressa para nada, nem capacidade física. E enquanto estou de viagem desde Bissalanca – agora aeroporto Osvaldo Vieira -, até à cidade, vou então confirmando os meus receios após a chegada, ou seja, que estou no sítio errado, aquilo não era a Guiné que conhecia.

A miséria era geral, e a falta de tudo em particular, era uma evidência. Vou passando pelos pontos conhecidos, A Base Aérea nada tinha, o quartel dos Comandas não existia, o quartel dos Paras nem se viu, passamos o quartel dos Adidos estava tudo destruído, até que passei pelo Hospital Militar e estava tudo coberto de mato, nada existia, a população levou tudo para casa ou para vender, e o edifício, o melhor hospital daquela zona do mundo, não existia mais.

Quando chego à entrada de Bissau, lá estava o mercado de Bandim, o cheiro era impressionante, o lixo abundava por todo o lado, passamos pela Bissau nova e está quase tudo em degradação, ainda fomos pela avenida principal, a antiga Avenida do Império, e não havia um único café, cervejaria, restaurante, casa de pasto, ou de comes e bebes, nada, tudo tinha desaparecido como se uma peste tivesse varrido a cidade de Bissau.

Quando entro do Grande Hotel aquilo estava a cair de podre, não havia ninguém, fui ver um quarto, meteu-me nojo, os preços eram pagos em Pesos Guineenses. Pediram 3500 Pesos por dia, que feitos os diversos câmbios oficiais, dava uns 2000$00 [, o equivalente a 47, 55 € a preços de hoje], por noite, ou seja o dobro do que tinha pago no dia anterior no Hotel Roma em Lisboa.

Claro que este valor pago com Pesos da candonga, significava então uns 200 Escudos Portugueses [, 4,75 €]... Claro que recusei logo, pois nem de graça eu lá ficava, abundava o lixo e a degradação total. Inacreditável o que via. Voltei a ver naquele espaço que tanto frequentei, os célebres "jagudis",  os abutres, à procura de carne podre, e os grandes lagartos a subir e a descer pelas palmeiras já minhas conhecidas.

Ter-me-ia enganado no local para onde comprei o Bilhete? Pelo sim, pelo não, fui logo de imediato à agência da TAP, que ficava na antiga Praça do Império, para ver se ainda podia apanhar o voo de regresso para Lisboa, mas já não era possível, então marquei logo para o próximo, uns 3 a 4 dias depois, quando a ideia era ficar 15 dias.

Lá fui ter não sei como, talvez num daqueles táxis que param em todo o lado para entrar e sair passageiros, e vou directo a Santa Luzia, onde diziam que havia o Hotel 24 de Setembro,  que era o melhor nessa época. O meu espanto é que estava a chegar ao antigo Club de Oficiais do tempo chamado agora de colonial. Eles fizeram daquele belo espaço um Hotel. Ainda construíram mais umas suites individuais, nos antigos terrenos e edifícios do Biafra, que era o sítio onde ficavam os oficiais milicianos quando passavam por Bissau.

Fui à recepção, e pedi um quarto, o preço eram 10 US Dólares, por dia – 2.000$00  [, o equivalente a 47, 55 € a preços de hoje] -, sem direito a nada. Com a ajuda de uma empregada negra, fomos para o quarto. Novo espanto, estava tudo partido, não havia ar condicionado, nem ventoinha, a água era escassa, os chuveiros estavam estragados, as baratas abundavam, e não tinha sanita, ou seja a sanita estava partida, não dava para uma pessoa se sentar, a empregada encolhia os ombros. Onde é que eu me meti, pensei com os meus botões?

Vou à recepção, o homem lá se desculpa, diz que há falta de manutenção, isso já eu sabia! Eu não queria aquele quarto, por isso ele sugeriu outro, dos novos, eram melhores, o preço era a 40 US Dólares por dia – 8.000$00  [190,19 €]...

Ok, fico para já, estava cansado e tinha novamente de pegar na bagagem e levar para outro quarto. Com o calor e de fato vestido, é fácil ver a cena. Instalei-me e tomei banho, deitei os fatos para o lado, e vesti calça e camisa. Tomei alguma coisa no bar, mas não havia quase nada, nem cerveja, nem uísque, só água com rótulo não conhecido. Mas tinha pressa em sair e ir conhecer melhor a cidade.

Fui a pé pela estrada de Santa Luzia abaixo, as bermas não existiam, estava tudo esburacado, as casas estavam em grande degradação. Procurei e encontrei logo a casa da minha primeira amiga cabo-verdiana, mas os novos inquilinos e vizinhos não sabiam nada dela nem da mãe. Fiquei desiludido, mas lembrei-me quando lá fui em fins de Julho de 1969 para me despedir dela e da mãe, me terem dito que ela tinha regressado a Cabo Verde, talvez seja verdade, e desejei que estivesse bem.

Fui por ali abaixo, na sombra dos grandes poilões, até chegar ao famigerado Pilão de Bissau. A população tinha aumentado para o dobro, as condições eram inimagináveis, nada que me fizesse lembrar as outras más condições do tempo colonial, agora aquilo eram mesmo bairros de lata ‘made in África’.

Vamos à Cidade, avenida abaixo, o calor e a sede aperta, procuro uma cerveja mas não há nada. Andam uns rapazes com uns bidões de barro com água e sumo de limão, diga-se que não estava quente nem fria. O serviço era em pé e na rua, e bebe-se pelo mesmo caneco sem lugar a lavagem, porque não há onde lavar. Paga-se qualquer coisa em pesos, era assim que se tratava o turismo de Bissau. Cansado sento-me na berma de um passeio, sempre na sombra de alguma árvore, o sol não perdoa, era implacável.

É preciso comer, aparece um dos muitos miúdos, que já antes existiam, com sacos ao pescoço, com mancarra descascada e torrada – amendoim, como se diz por cá – mas tão saboroso que parece marisco, era ainda igual àquela que se comia antes, uma primeira boa recordação. E mais umas canecas de água, tudo servido ali sentado no passeio esburacado.

Isto é surreal, estou sozinho sem saber o que fazer, mas vou continuar. Vou ter ao mercado local, onde há fruta e vegetais à venda. Os preços incrivelmente baratos. Compro ananás, bananas, mangas, limões, laranjas, e vou comendo tudo com a mão. Felizmente tinha levado um canivete suíço que dava para descascar aquilo. Já composto vou ver o que há para beber e comer, as primeiras necessidades.

Vou à antiga Casa Gouveia – agora são os Armazéns do Povo –, entro e está tudo vazio. Procuro nas prateleiras não há nada, mas encontro numa delas, isto fica na memória, pois não se pode esquecer..., encontro duas embalagens pequenas de sumos da Compal, daquelas latas pequenas de abrir com abre-latas em bico. Milagre. Vou ver os prazos já tinham passado vários anos de validade, e ainda por cima estão tipo caldo, não arrisquei, ficaram na memória, e na prateleira para o próximo cliente.

Não vou continuar mais a falar nisto, pois as surpresas acontecem à velocidade a que me desloco, não há lojas como antigamente, o famoso Café Bento desapareceu, as lojas fecharam, ainda vou até à Catedral de Bissau, pois está sombra e mais fresco. Rezei para que tudo corra bem para mim e para os meus familiares.

Agora os câmbios... I dinheiro que troquei no aeroporto e ficou registado no passaporte, eram 50 USD e deram-me um maço de Pesos Guineenses, a um câmbio que ficava tudo muito caro. Logo aparece sempre gente a tentar trocar Escudos ou US Dólares, por Pesos, a um câmbio 10 a 20 vezes menos do que o oficial. Ponderei para ver se não era nenhuma armadilha, depois arrisquei, e com 5 contos [, 118, 86 €, a preços de hoje,] fiquei com dinheiro para comprar quase tudo, o que era Nacional.

Mas não havia nada para comprar em divisas, só na segunda viagem já tinha aberto um chamado ‘Free Shopping’, onde se poderia comprar algumas coisas com moeda estrangeira. Mas o que havia era na maioria bebidas e pouco para comer. Daí que o mercado local era o abastecimento preferencial, comprava-se tudo por meia dúzia de tostões.

As surpresas estavam para vir, ao jantar no Hotel pouco ou nada havia, uns peixes secos daqueles que nunca antes havia comido, algum bife duro, pão só até acabar, vinho de garrafão fraco, quente, ou misturado com pedras de gelo da água do Geba. Não havia nem cerveja, quente ou fria. Sopa de estrelinhas, e compo sobremesa a fruta da época. Café de saco e nada de bebidas extras. Preço para isto tudo rondava os 1000 pesos, que com o câmbio no mercado paralelo, isto seria no nosso dinheiro 10 ou 20 escudos, nada mais [.o equivalente hoje a 0,24 € ou 0,48 €, respetivamente]. Tenho as facturas disto tudo, eram talões numerados com papel químico, e pagava no fim da estadia.

De manhã ainda pior, o café com leite, café de saco que não sabia a café, e o leite era ao natural, não tratado, aquilo e a manteiga derretida meteu-me nojo e só comi o pão sem nada, com uma chávena de café simples – digamos chicória.

Bom, a solução era mesmo o mercado, comprei tudo o que havia, muita fruta de toda a espécie, os preços ridículos, e assim comecei a comer no quarto a maioria das vezes. Tinha um frigorífico, onde também entravam as baratas, tirava-se um ananás inteiro, com a minha faca canivete cortava às rodelas e ia para a porta comer aquilo tudo, só com as mãos, tipo um sem-abrigo, enchia a barriga de fruta de vária categoria e sabia muito bem. O sumo de laranja fazia eu, partia várias laranjas a meio e com as mãos apertava aquilo e enchia um copo de sumo. Era tudo básico, não dá para acreditar. Era o mesmo com os limões.

O que fazer então?... Levava um contacto, o Ministro das Finanças local, fui falar com ele ao Ministério, que ficava num daqueles edifícios que se vê do cais na Marginal, à frente do Quartel da Amura. Recebeu-me porque eu levava o nome do Valentim, que por acaso também tratava das coisas dos filhos cá em Portugal. Apresentamo-nos, ele era mais velho do que eu, já tinha os cabelos meio brancos, falava com toda a educação e delicadeza. Acabamos por saber que tínhamos frequentado a Faculdade de Economia do Porto mais ou menos ao mesmo tempo, talvez nos tenhamos encontrado nos dois primeiros anos de 1964-66. Ficamos ‘amigos’, e até me convidou para ir jantar um dia a casa dele, ficava na Bissau nova, nas vivendas bem tratadas, onde não faltavam também nas paredes, dentro de casa, as ‘osgas’ que se passeavam calmamente. Chama-se Dr. Francisco Godinho. Foi-me orientando e até me apresentou outros Ministros e Secretários de Estado, das áreas do Comércio e Agricultura, que lhe chamavam de ‘desenvolvimento rural’.

Andei a deambular os primeiros dias, fui ver o novo Porto de Bissau, enorme, uma mudança radical, já tinha cais para encostarem os grandes navios, foi um investimento de um Banco Árabe, e construído por uma empresa portuguesa, a Somague.

Mas eu tinha de me desenrascar, e assim uma noite no Bar do Hotel, à volta dos copos e a sacudir e afugentar os mosquitos, estava um grupo de pessoas, falavam Português e notei logo pelo sotaque que eram do Porto, não me enganei. Eram uns 5 personagens, 4 de Portugal e um da Alemanha, Harald Muller. Estavam todos picados e com os braços inchados das picadelas dos mosquitos, e viram como eu estava normal sem os efeitos das picadelas dos mosquitos, pois eles não me pegavam, daí o início de uma conversa entre nós.

Expliquei que já lá tinha estado, contei a velha história, e que os mosquitos quando me ferravam eles é que morriam, o meu sangue era venenoso, eles não aguentavam. Acharam graça mas era assim, nunca tive nenhuma marca de mosquitos apesar de sentir as picadelas, acho que tem a ver com a cor e tipo de pele, a minha é escura, a deles era branquinha, os mosquitos aterravam e só largavam depois de lá deixar o ferrão, comigo felizmente não. Apesar de ter apanhado a Paludismo por duas vezes em 1968, não era imune a isso e não tomava nada para salvaguarda dos efeitos colaterais.

Resumindo vim a perceber que andavam por lá, com o aval do major Valentim Loureiro – que era o Cônsul da Guiné Bissau em Portugal – amigo do nosso ‘amigo’ Nino' Vieira–  , para um grande projecto agro-industrial no valor global de 20 milhões de US Dólares. Eram 4 milhões de contos [, o equivalente a 95 milhões de euros , a preços de hoje], o câmbio nessa altura era a 200$00 por cada Dólar.

Já tinham conseguido um ‘aval’ do presidente 'Nino', no qual era cedida ao grupo uma área bruta de 7000 hectares de terreno, nas margens do Rio Corubal, a 200 quilómetros da foz, por causa dos efeitos do sal, com o centro em Cabuca que eu já conhecia. Já tinham mapa de toda a área, e a cedência era pelo período de 100 anos.

Era preciso passar tudo por muitos estudos, e lutar ferozmente contra os ‘consultores’ do Leste que não queriam lá os ‘Tugas’. O Governo só confiava nos pareceres do Leste. Aquelas pessoas que encontrei, nenhuma delas tinha conhecimentos nem capacidade para demonstrar ao Governo que o seu projecto era viável, e muito.

Precisavam de um Economista para elaborar todo o projecto económico e financeiro, e tratar de toda a burocracia que um Investimento Estrangeiro precisa. Bateram na porta certa, pois já tinha no meu CV dezenas de projectos e estudos, e conhecia muitíssimo bem o CIE, os procedimentos do investimento estrangeiro, pois a Guiné Bissau, ‘copiou’ linha a linha o nosso Código do Investimento Estrangeiro (CIE), que eu tão bem conhecia por ter trabalhado com os Suecos tantos anos e que tinha de ser aplicado em Portugal. Estava nas minhas quintas.

Daí para diante tudo mudou, pois entrei dentro do sistema que estava já montado, são os amigos de negócios, e assim havia um esquema com as empresas de construção que lá estavam instaladas, a Somague, a Soares da Costa e muitas outras, portuguesas. Todas tinham os seus estaleiros e não faltava nada, era só mesmo ‘entrar’.

Regressei a Portugal ao fim dos 14 dias com os novos amigos e futuros sócios, e passamos a trabalhar no projecto no escritório deles no Porto, perto da Rua da Boavista, dedicando-me a 100% a este projecto, pois as expectativas eram muito grandes.

Depois disto, tem uma história muito longa, pois durou cerca de um ano inteiro, com 3 viagens à Guiné e uma a Dakar. Um dia talvez volte a este assunto, que não me é nada grato voltar a lembrar-me dele, pois não teve um fim feliz, mas é uma história verídica, e que ainda hoje não sei como fui capaz de embarcar em semelhante ‘loucura’! Fica para os próximos capítulos, se os houver.

Em, 06-06-2018 - Virgílio Teixeira


II - Legendas das fotos:

Nota: O primeiro parágrafo da legendagem explica o que significa a foto. Já nos seguintes, são notas e observações que faço em relação à história e contexto de cada foto no seu tempo.


F1 a F6 – INTRODUÇÃO:

– No Pilão em Bissau, na porta da casa do nosso Taxista Fula de nome Mamadu.

Fomos a casa dele para nos alugar o seu táxi – Citroen Mehari. Ele ficou 15 dias sem trabalhar e recebeu o mesmo como se andasse a trabalhar, foi um bom negócio para ele, e também para nós que ficamos sempre de carro, totalmente descapotável. Bissau, 02Jan85.

F2 – A nova ponte acabada de inaugurar, em Bafatá, com ligação a Fá Mandinga.

Esta ponte veio substituir outro troço de caminho, que não tinha ponte e era necessário dar umas voltas para o contornar. Acho que faz a ligação para Fá Mandinga, e assim fica uma ligação completa por estrada asfaltada, entre Bissau até Gabu e daí até Pirada na fronteira com o Senegal. E tem portagem perto de Safim. Pagávamos 2 pesos e meio para abrirem a barreira. Bafatá 03Jan85.

F3 – Esta era a picada entre Nova Lamego – Gabu – e o aquartelamento de Cabuca, a uns 20 a 30 km da sede do comando do sector L3.

Este troço estava em 1985 completamente tapado, de mato, árvores, capim, e muitos buracos no troço da picada. Foram precisas algumas horas até chegar ao local de destino, que era a zona onde se iria desenvolver um projecto agrícola de 7000 há. Cabuca, 03Jan85

F4 – Em Cabuca recolhendo terra para amostras de produtividade e rendimento.

Em primeiro plano o Isidro Quaresma Gomes, o Técnico agrícola vindo de Angola como refugiado, e que levou a cabo este estudo complicadíssimo. Depois tem mais 3 técnicos locais do Ministério do Desenvolvimento Rural da Guiné Bissau. O Jeep era do Estado, O fotógrafo era eu que não ficou na foto. Cabuca, 03Jan85.

F5 – Aqui estamos numa lagoa, que faz fronteira com a Guiné-Conacri.

O barco segundo me parece, pertencia a alguém que fazia a prospecção de diamantes na lagoa, o homem do leme era o responsável por isso, Nunca soube ao certo o que faziam, era tudo muito secreto. Na foto está o Quaresma, o barqueiro e o Virgílio, sou eu. Cabuca 03Jan85.

F6 – Pormenor de um lago lodoso de águas paradas, e o aviso no placard da existência da mosca Tsé-Tsé. O nome escrito diz ‘ONCORSECOSE’ deve ser o nome latim da mosca do sono.

Dado o perigo eminente desta maldição, não ficamos lá muito tempo, viemos embora sem olhar para trás, não vá aparecer alguma mosca maldita. Cabuca, 03Jan85.

F11 A F16 – Série de Fotos tiradas no complexo agroindustrial de uma fábrica de descasque de arroz, construída do lado esquerdo da foz do Geba, completamente abandonado. Acho que é o local se chamava de Cumeré.

Chamo a atenção que este complexo enorme, quase pronto, mas inacabado, nunca funcionou, estava ali uma fortuna enterrada em obras e equipamentos. O nosso objectivo seria recuperar o complexo e depois apoiar o projecto agrícola do arroz.

Isto tudo foi financiado pela Comunidade Internacional, numa ajuda ímpar à Guiné Bissau, país na cauda da miséria, que recebeu,  segundo estimativas dessa época, a maior ajuda mundial "per capita", que foi dada a um país, em termos de relação – montante investido, versus área e população.

A visão que me impressionou foi ver que no cais de desembarque de Bissau, encontravam-se centenas de contentores, arrumados há anos, nunca abertos, que continham componentes para montar várias fábricas, mas que por uma inoperância dos sucessivos governos locais, nunca foi levada a efeito, ficou tudo a apodrecer, ninguém queria trabalhar, o que interessavam eram os sacos de arroz que desembarcavam de ajuda alimentar mundial. Vi isso com os meus olhos. Bissau, 05Jan85.

(Continua)

Em, 06-06-2018 - Virgílio Teixeira

Propriedade, Autoria, Direitos Reservados: Virgílio Teixeira, Ex-alferes Miliciano do SAM – Chefe do Conselho Administrativo do BCAÇ 1933 / RI 15, Tomar, Guiné 67/69, Nova Lamego, Bissau e São Domingos, de 21SeT67 a 04Ag69.

[Revisão / fixação de texto / conversão de escudos para euros, através do conversor da Pordata, para efeitos de edição neste blogue: LG]

_____________

Nota do editor:

Último poste da série > 22 de maio de 2019 > Guiné 61/74 - P19815: Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (São Domingos e Nova Lamego, 1967/69) - Parte LXX: Viagem, de regresso, do Gabu a Bissau, em 26/2/1968: no 'barco turra', a partir de Bambadinca (II)

32 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Virgílio, se as fotos 11 a 16 são do complexo agroindustrial do Cumeré, então na margem direita do Rio Geba, e não na margem esquerda... As margens contam-se no sentido da foz...É isso ?

Sobre os ambiciosos e, infelizmente falhados, porque faraónicos, projetos industriais do Luís Cabral, vd. aqui dois postes do nosso camarada, e crítico literário, Beja Santos:


<7 DE SETEMBRO DE 2012
Guiné 63/74 - P10344: Notas de leitura (398): Guiné-Bissau - O Estado da Nação (1) (Mário Beja Santos)



10 DE SETEMBRO DE 2012
Guiné 63/74 - P10358: Notas de leitura (399): Guiné-Bissau - O Estado da Nação (2) (Mário Beja Santos)

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Aqui vai um excerto da notas de leitura, da autoria do Beja Santos, sobre O Estado da Nação, de Luís Cabral:

(...) Em 9 de Maio de 1978, Luis Cabral, Presidente do Conselho de Estado da República da Guiné-Bissau, dirigiu-se aos deputados presentes na Assembleia Nacional Popular. Foi um longuíssimo discurso, têm-se sérias dúvidas que estas 200 páginas correspondam à sua comunicação ao longo do dia. Mas o que interessa é o conteúdo, temos aqui uma grande angular das medidas de política encetadas e prometidas, estão aqui os sonhos de progresso entremeados de críticas ríspidas e elogios aos comissários e suas equipas.

Esta comunicação, como se referiu em texto anterior, partiu de uma série de considerações sobre o planeamento, daqui saltou-se para o orçamento e para a situação das importações e exportações; logo a seguir aflorou a política agrícola, a necessidade de melhorar a alimentação dos guineenses, o reforço do controlo do comércio numa economia tendencialmente estatizada e depois anunciou os projetos industriais, destacando pela sua previsível importância o ambicioso projeto do Cumeré que, segundo ele, iria permitir transformar toda a mancarra em óleo bruto, criar condições para o descasco de arroz, o complexo do Cumeré fabricaria sabão e óleo refinado para o consumo nacional e de Cabo Verde. A fábrica do Cumeré começara com todos os sacrifícios, já que não havia ainda financiamento externo.

Outros projetos de grande porte tinham sido modificados e reduzidos, caso do projeto para uma fábrica de açúcar e a prevista central em Porto Gole, que daria luz para todo o norte da Guiné. Havia queixas sobre a fábrica Titina Silá, que era a primeira fábrica feita na Guiné, do princípio ao fim, com a ajuda da Holanda. Havia críticas, importava perceber as dificuldades técnicas: “O sistema que ali foi colocado para encher os pacotinhos de sumo de fruta não funciona bem: o ar entra nos pacotes provocando a fermentação do sumo. Há uma coisa que não podemos compreender: como é que uma fábrica daquelas, nesta altura do ano – o período mais importante da campanha de frutas: do mango e do caju – parou por não ter dinheiro para comprar fruta! E qual o motivo por que as compotas da fábrica são arrecadadas no armazém e não se vendem? Isto é bastante grave”.

Feita a admoestação, veio o elenco de mais promessas, caso dos silos que levam mais de 3 toneladas de produto, seria ali que se iria guardar a mancarra destinada à fábrica do Cumeré; iria ser construída uma fábrica de cerâmica em Bafatá, uma fábrica de descasque de castanha de caju em Bolama, uma fábrica de curtumes em Bissau, fábricas de óleos de palma em Cacheu e nos Bijagós, uma pequena fábrica semi-artesanal de produção de cal nos Bijagós. (...)

Fernando Ribeiro disse...

A oncocercose, também chamada "cegueira dos rios", não é transmitida pela mosca tsé-tsé, mas sim por um mosquito, tal como se pode ler na página "linkada".

A mosca tsé-tsé transmite, se estiver infetada, a tripanossomíase ou tripanossomose, mais conhecida por "doença do sono". Segundo este site, o risco da tripanossomíase na Guiné-Bissau é marginal.

ManuelLluís Lomba disse...

Virgílio:
Quando o Major Valentim Loureiro foi nomeado o cônsul no Porto da Guiné-Bissau, já o Laurindo Costa, accionista da Soares da Costa, era o tutor das filhas do Nino Vieira e pagava-lhe os estudos no Colégio do Sardão, em Vila Nova de Gaia.
Abr.
Manuel Luís Lomba

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Fernando, ainda bem que estavas atento... No cartaz, lê-se apenas "oncocercose" e há uma figura humana sentada no chão...

A oncocercose é uma infecção transmitida pelo verme nematódeo Onchocerca volvulus. Ela causa coceira, erupção cutânea, às vezes com formação de cicatriz, assim como sintomas nos olhos que podem levar à cegueira.

A infecção se propaga pela picada de moscas negras fêmeas, que se reproduzem em riachos,

https://www.msdmanuals.com/pt-pt/casa/infecções/infecções-parasitárias/oncocercose

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Veja-se este e outros textos que temos aqui publicado no contexto de viagens de regresso à Guiné-Bissau, em turismo ou negócios, sempre naquela perspetiva que está de acordo com a orientação editorial do nosso blogue: a Guiné-Bissau é um país amigo, mais, um país irmão, fundador da CPLP; não confundamos o Estado, os políticos, os funcionários e os agentes do Estado,os partidos políticos, com o povo guineense...

Recorde-se aqui a 7ª das nossas 10 regras editoriais:

(vii) não-intromissão, por parte dos portugueses, na vida política interna da actual República da Guiné-Bissau (um jovem país em construção), salvaguardando sempre o direito de opinião de cada um de nós, como seres livres e cidadãos (portugueses, europeus e do mundo).

https://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/2011/07/guine-6374-p8588-excitacoes-143.html

Valdemar Silva disse...

Não consegui perceber, se o Luís Cabral não fosse deposto teriam avançado os tais empreendimentos faraónicos.
Sofre as moscas, ou melhor uns grandes moscardos pretos com as asas cruzadas, lembro-me de as ver nas idas a Cabuca e nossos soldados avisarem do perigo dessas moscas, mas por aqueles lados não havia muito perigo por não ser uma zona de fêmeas.
Também se falava que para os lados de Cabuca, as minúsculas sementes fixas na sumaúma das árvores que caiam na água provocavam a cegueira.
Valdemar Queiroz

Anónimo disse...

Em relação à mosca, ou seja o que for, os nossos condutores habitantes africanos, alertaram para sair dali rápido, foi o que fizemos, não tinha a menor ideia dos muitos perigos, mas já quando lá tinha ido em 67 ou 68, se falava da mosca tse-tse, e ficou na memória. Obrigado pelas doutas explicações.
Luis, aquele faraónico complexo, eu li já depois, na altura nem sabia onde era, nem o nome, o Cumeré, acho até que foi aqui no Blogue. Por isso pelo até para quem saiba mesmo, onde ficava esse complexo.
Eu sei bem como as margens são, eu disse esquerda, porque, salvo melhor opinião, era um acesso fácil de fazer por via terrestre, como fomos lá, no nosso auto-táxi Mehari, do amigo Mamadu, descapotável, de produção nacional, que nessa altura já tinha sido encerrada a fábrica.
Eu tenho muita coisa escrita sobre estas viagens, mas não é possível transcrever tudo, só sei, que no novo e internacional Porto de Bissau, construído pela Somague, com dinheiros de alguém, no seu imenso cais, existiam centenas de contentores, empolados uns nos outros, com equipamentos para montagem das mais diversas fábricas desde plásticos a automóveis, as quais, até à minha saída, nunca foram abertos, isto não é critica, é uma constatação, e não fui eu a ver, foram eles, os Técnicos do Governo de Bissau que me disseram.
A que não faltou foi logo a fábrica da cerveja, que era insuficiente, e por isso só se conseguia uma grade delas, a troco, não de dinheiro, mas de algo palpável, que fosse como uma moeda de troca. Por exemplo, troquei uns sapatos por uma grade de cervejas, isto já na 2ª viagem!

Virgilio Teixeira

Anónimo disse...

Obrigado Manuel Luis Lomba pela correcção a estas memórias já com tantos anos.
O Laurindo Costa, conheci-o mais ou menos, quer pela Major Valentim, quer por outros pessoas do seu staff, ainda a sede era ali no Amial, e o meu cunhado trabalhava lá como Técnico Engº orçamentista, depois mudou-se para Lisboa, onde agora é a sua terra.
A confusão, e agradeço todas as achegas positivas, eu andava muito com o 'Major' era assim que nós o chamávamos sempre, e fomos visitar e levar coisas que trazia de Bissau para os filhos, ou simples 'mantanhas', quer do Nino, quer do Dr. Godinho Ministro das Finanças, cujos filhos, esses sim, frequentavam um colégio, na Rua da Torrinha, ainda há poucos dias o fui fotografar, e devo ter confundido, 'alhos com bugalhos' o que não é relevante para a história.
Mas fica a correcção, e agora tenho de ir procurar nas minhas memórias onde escrevi isso, e corrigir, pois lembro-me agora muito bem de se falar num colégio de Gaia.

Virgilio Teixeira

Anónimo disse...

Luis, essa observação de 'não intromissão na politica interna dos estados soberanos' não era para mim, acho eu! Eu não faço juizos de valor, até porque não tenho essa capacidade intrinseca, isso é só para alguns.

Eu descrevo aqui, e os próximos capítulos dirão mais, aquilo porque passei, nas minhas loucas viagens à Guiné e Senegal, este ainda mais corrupto que qualquer outro.

Os técnicos e governantes com quem contactei sempre me trataram bem, só que aos 'capitalistas' de Leste, tratavam melhor, e o que eles dissessem era sagrado, nós seriamos sempre vistos como oportunistas, com sede do lucro fácil, e não os outros que depois tomaram as rédeas aos governos africanos.
O Dr. Godinho Lopes, convidou-me para jantar em sua casa, com a sua familia, parece que fomos colegas dos mesmos anos da faculdade de economia do Porto.
Também eu o convidei para um lauto jantar de lagosta, no tal Clube de Oficiais - isto é, o Hotel 24 de Setembro - cujos produtos teríamos de os ir comprar à lota, aos armazéns, e novamente a troco de algo que não de dinheiro vivo.

Isto é muito complicado, só estando lá metido nestas alhadas é que se percebe.

Para complementar tínhamos sempre ao mosso lado, como companhia, um PIDE ( o equivalente na Guiné ) que zelava para ver o que andávamos a fazer, e assim, ele bebia no dito Hotel, às nossas custas, até cair para o lado, só Whisky, mas agora com gelo e água mesmo do rio Geba.

Virgilio Teixeira








Tabanca Grande Luís Graça disse...

Virgílio, nada de suscetibilidades... Sabes que eu não sou de mandar recados para ninguém, tenho apenas que fazer o meu papel de gerir esta barco, que já é grande, e onde há diferentes sensibilidades, visões, experiências, opiniões... O blogue é lido em toda a parte, dos EUA a Cabo Verde, da França à Guiné-Bissau, e a sua missão é criar pontes...

Quando falo em "intromissão" é em relação à política atual, partidária... seja na nossa terra, seja na terra dos nossos amigos guineenses e cabo-verdianos (e alguns ex-camaradas, que combateram ao nosso lado, caso do Zeca macedo, por exemplo).

Também voltei à Guiné, muito mais tarde do que tu, já em 2008, ainda o 'Nino' estava no poder, conheci-o ao vivo, fiz vários vídeos com ele a falar, na sua casa, para um grupo de vinte e tal estrangeiros onde eu me incluía... E senti, apesar das naturais "reservas" em relação ao então presidente da República, que ele muito desejava e pedia o aumento da cooperação dos professores de língua portuguesa... Isto foi em 7 de março de 2008, um ano depois, em 2 de março de 2009, ele era barbaramente assassinado...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Muitos camaradas nossos voltaram à Guiné, depois da independência, em viagens com fins diferentes: turismo de saudade, missões de cooperação, missões humanitárias, negócios, etc.... E temos publicado inúmeros postes, com fotos e notas de reportagem... Esse material é precioso, e mostra como na Guiné, na generalidade dos casos, não ficaram ressentimentos de parte a parte... Mas é uma guerra é uma guerra, para mais longa, de 13 anos... O nosso blogue faz questão de não deixar apagar a(s) memória(s), as boas e as más... E todos os ex.combatentes têm direito à memória... Daí ser importante ser incentivar e respeitar a liberdade de expressão... LG

Anónimo disse...

“Epifania”

Não sendo religioso sempre respeitei os que têm a sorte de experimentar Epifanias.
Ou seja,aparição ou manifestação inesperada de algo divino.
Um bom exemplo será a conversão de Paulo quando Jesus lhe apareceu quando este se dirigia a Damasco.
Depois de ler 2/3 do texto deste poste nas suas continuadas descrições das realidades guineenses dos anos oitenta senti-me obrigado a relembrar as descrições dos países do Leste europeu durante a ocupação comunista.
Não as ponho em dúvida.
Mas,felizmente,surge a Epifania.
Isto,nas pessoas de alguns portugueses e um alemão que procuram estabelecer uma empresa comercial neste país.
Malgrado todo o negativismo anterior,certamente justificado em período tão difícil,o autor de imediato aproveita a oportunidade surgida de tornar-se participante nesta empresa que,francamente o espero, procurava lucros nos seus planeamentos.
Miseráveis miseráveis mas haverá alguns tostões a sacar!
“Precisavam de um economista para elaborar todo o projecto económico e financeiro,e tratar de toda a burocracia que um investimento estrangeiro precisa.”
“O tal código de investimento estrangeiro-CIE-que tão bem conhecia por ter trabalhado com os suecos tantos anos,e que tinha de ser aplicado em Portugal.”

Não tenho conhecimentos académicos quanto a regras económicas.
Tenho no entanto bons e longos conhecimentos quanto às regras juristas internacionais que englobam o CIE.
Ficam-me dúvidas sérias quanto ao facto de a Guiné-Bissau ter copiado “linha a linha” o Código Português de Investimentos Estrangeiros.
A Suécia dos inícios dos anos oitenta pautava os seus investimentos e outras relações comerciais por regras anteriores ao citado CIE.

Mas os anos oitenta já estão bem distantes.
As nossas memórias já (felizmente?) não serão o que eram.
Mas Epifanias continuam a ser...Epifanias.

J.Belo


Antº Rosinha disse...

Quem investiu e parece que intensamente em África, (Angola), segundo as leituras dos jornais, foi o Salgado do BES.

Partiu a cara com muita pinta, segundo todos os jornais.

Foi cada barretada, à procura da arvore das patacas!

Sempre houve tanta ilusão com África...e continua!

Anónimo disse...

Com este comentario da Andra Maria Lupu finalmente estou a ter a tal...”EPIFA” !

J.Belo

patricio ribeiro disse...

Rectificação para os amigos.

Quem construiu o novo porto de Bissau, assim como muitos outros mais pequenos portos e rampas no interior da Guiné, não foi a SOMAG, mas sim a SOMEC que já não existe.

Eu também participei nestes trabalhos, a partir de Julho de 1984, assim como o nosso amigo António Rosinha e mais uma "centena" de Portugueses.

Fiscalização dos trabalhos, era uma empresa Holandesa e penso, que o financiamento era do Banco Mundial.

Abraço

Tabanca Grande Luís Graça disse...


epifania | s. f.

e·pi·fa·ni·a
(grego epifáneia, -as, aparição, manifestação)
substantivo feminino
1. [Religião] Manifestação de Jesus aos gentios, nomeadamente aos Reis Magos.

2. [Religião] Festa religiosa cristã que celebra essa manifestação. = DIA DE REIS

3. Qualquer representação artística dessa manifestação.

4. [Religião] Aparecimento ou manifestação divina.

5. Apreensão, geralmente inesperada, do significado de algo.


"epifania", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013, https://dicionario.priberam.org/epifania [consultado em 25-10-2019].

Tabanca Grande Luís Graça disse...

J. Belo, meu querido amigo e camarada luso-lapão:

Faz referência ao comentário de uma tal Andra Maria Lupu, "andorrenha", escrito em catalão... Levantei-me hoje cedo, como de costume, e verifiquei, de imediato, que estava na presença de SPAM, um comentário indesejável (aliás, meia dúzia...). se não mesmo malicioso...

Primeiro, ela não é ela, pelo registo no "Blogger", é um gajo ("male")... Deve ser o tal professor Karamba lá do sítio, que faz "feitiços de amor", "amarraçºao"..., e que publicita, deste modo, o seu negócio... Tal como as "fake news", compra quem pode e quer...

Já removi o lixo, mas, por curiosidade, fiz uma tradução automática, recorrendo ao senhor Google Tradutor... Aqui vai (, leio o catalão, mas não tenho tempo para rever a tradução)... Enfim, à laia de comentário direi apenas que os pobres também direito a estas "epifanias", à falta de psicoterapeutas para o povo...

O que é que "a rapariga andorrenha" nos queria dizer, afinal, com tanta insistência, a ponto de "atacar o nosso blogue" ?

(...) Meu nome é Andra Maria Lupu, [vivo em] Andorra a Velha. Depois de doze anos de casamento, eu e meu marido estávamos em uma disputa ou outra até que finalmente ele me deixou e se mudou para a Califórnia para ficar com outra mulher.

Senti que minha vida havia terminado e meus filhos pensaram que nunca mais veriam o pai. Tentei ser forte apenas para crianças, mas não consegui controlar a dor que atormenta meu coração, meu coração estava cheio de dor e dor porque estava muito apaixonado por meu marido. Todos os dias e noites penso nele e sempre quero que ele volte para mim, fiquei aborrecido e precisava de ajuda...

Então procurei ajuda on-line e encontrei um site que sugeria que a Dra. Osagiede poderia me ajudar a voltar rapidamente. . Portanto, senti que deveria experimentá-lo. Entrei em contato com ele e ele me disse o que fazer e o que eu fiz, então ele fez um feitiço de amor.

48 horas depois, meu marido realmente me ligou e disse que sentia falta de mim e das crianças, por isso é incrível. Foi assim que ele voltou naquele mesmo dia, com muito amor e alegria, e pediu desculpas por seu erro e pela dor que causou a mim e às crianças. Naquele dia, nosso casamento estava mais forte do que antes, tudo graças ao Dr. Osagiede.

É tão poderoso e eu decidi compartilhar minha história na Internet com a verdadeira e poderosa carta de Dr. Osagiede, que eu sempre oro por um longo tempo para ajudar seus filhos em momentos de dificuldade, se você está aqui e precisa do seu ex. No caminho de volta ou seu marido se mudou para outra mulher, não chore mais, entre em contato agora com esta poderosa pistola. Aqui está o seu email de contato [...]

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Ah!, já agora, o código internacional, que vinha no telemóvel, 234, mandava-nos para a Nigéria!... O tal professor Karamba, afinal, tem consultórios em todo o mundo... Só os nossos amigos africanos é que ainda sabem fazer "feitiços de amor"...

Valdemar Silva disse...

Luís
É caso pra dizer caramba. Estes vendedores de vigésimos premiados até atacam antigos combatentes experientes, que nem nas tretas de fotos aéreas do deserto do Saara os convenciam.

Ab. e as melhoras dos 'ministros'
Valdemar Queiroz

J. Gabriel Sacôto M. Fernandes (Ex ALF. MIL. Guiné 64/66) disse...

Olá Virgilio, não conhecia este teu Post de 06/06/2918.
É bem possível que eu tenha sido o piloto de algum dos voos que nessa altura fizeste a Bissau via Sal pois entre 1976 a 1985 essa era uma viagem que eu fazia frequentemente no velho B-707.
Dormíamos, nessa altura no Hotel Morabesa em Santa Maria, no Sal, onde, também ficavam as tripulações da Aeroflot e da South African Airways. Dois ou três dias depois, logo de manhã, muito cedo, regressávamos a Lisboa via Bissau, onde, no aeroporto tomávamos o pequeno almoço durante uma escala técnica.
Eu também fiz uma viagem de saudade à Guiné em 1992. Também me tocou profundamente o destino daquelas populações. Praticamente não tenho fotografias dessa viagem (nessa altura eu fazia e fiz, video 8 em reportagem do que ia acontecendo).
Fiquei hospedado no Hotel 24 de Setembro que, no meu tempo (1964/1966) era, nem mais, nem menos que a messe dos Oficiais que estavam em Bissau, ali ao lado do Quartel General e do BC 600.
Tive um bom apoio durante essa viagem que partilhei com outro colega meu, também piloto da TAP e que tinha estado na Guiné, como Alferes, depois de mim. Através de um amigo meu de infância, que era caçador e que para o efeito se deslocava com alguma frequência à Guiné para praticar o seu desporto favorito, levei uma recomendação para um madeireiro portugês de que não me recordo o nome, que tinha uma serração creio que na zona de Mansabá e que logo em Bissau nos pôs à disposição um velho Dodge com motorista que nos levou a Mansoa, Mansabá, Farim, Bafatá,Buba, Quebo e Catió. O facto de nessa altura eu ser um tripulante da TAP, também me facilitou a vida em Bissau (procedimentos de entrada e saída sem grandes burocracias…)
Fico à espera do resto das tuas aventuras pós revolução nas terras da Guiné, das quais, apesar de tudo, ainda temos saudades.
Um abraço do,
JS

Valdemar Silva disse...

Em 1969/70, nas viagens de férias na TAP Bissau-Lisboa-Bissau, a viagem de Bissau-Lisboa era directa, mas a de Lisboa-Bissau era via Ilha do Sal-Bissau.
Lembro-me, na paragem no aeroporto no Sal, ver as hospedeiras de terra terem alguma dificuldade em andar de sapatos com saltos altos e de nos terem dito não haver avisos em papel por terem sido pelas cabras. Nunca mais me esqueci deste pormenor.

Valdemar Queiroz

Valdemar Silva disse...

queria dizer
..terem sido comidos pelas cabras.

Valdemar Queiroz

Anónimo disse...

Bom dia,
Como introdução, e respondendo a vários comentários, parece que ainda não tive razão de queixa dos comentadores, mas, à minha maneira, simples, sem rodeios, sem palavrões que não sei o significado, sem tendenciais de escritor e romancista, passo a explicar que:
- Este Poste, e outros que se devem seguir, contem 'partes' de um todo, que está na PEN, onde tenho escritas 2500 páginas da minha vida, não para publicar, mas apenas para deixar aos vindouros. Estes textos, são mais de 100 páginas, desta loucura em que me lancei 'sozinho' retirei apenas o que era possível publicar, pois tenho muitas respostas para tudo, só que não as vou dar, são coisas pessoais que não se partilham. Até porque não têm qualquer interesse, pois o que escrevo não é para ser assim tão escalpelizado, é para passar o tempo. Escrevi isso nos anos 2010-2011 e assim ficou, até agora, está lá tudo, e coisa rara, até tenho pastas que não destruí ainda, desta aventura de um ano.

- Quanto ao CIE - eu já trabalhei com ele em 1969-1970 e por aí em diante, nos projectos de investimento de uma multi nacional sueca, que tinha de obedecer ao que o nosso Código dizia, por isso estou ainda, apesar de 50 anos passados mais ou menos certo de algumas coisas.

- O CIE da Guiné Bissau, no 4º trimestre de 84 e ano de 85, era religiosamente copiado do nosso, com as devidas adaptações, não se trata de coisas da área económica mas sim jurídica, pois também sei e estou a par, ao longo de uma carreira de 60 anos, de muita legislação jurídica, e para quem não sabe, no meu curso de 5 anos, tinha 5 cadeiras anuais de Direito. E trabalhei muito com advogados e tribunais, na minha actividade paralela de administrador judicial em processos de recuperação de empresas.
- Mas ainda tenho esse Código Guineense, bem como os fotocopiados, Diários da Republica da Guiné, as formalidades notariais e outras tudo 'copiado' da nossa legislação, sem querer com isto estar a criticar nada, era assim e ponto final. Se estou enganado façam favor de provar o contrário, não quero nem desejo 'invectivar' os legisladores da nova Republica, que, salvo um ou outro problema, me trataram a mim e aos outros, muitíssimo bem. O Senhor Presidente da Republica 'Nino' quando chegávamos ao seu Gabinete, passamos sempre à frente de todos, e nunca vi nele uma animosidade contra a malta 'tuga'.

... continua....

Virgilio Teixeira





Anónimo disse...

Sacoto, obrigado pelos teus comentários,

Realmente, eu viajei a primeira vez no dia 20out84, saída atribulado muito depois da meia noite de Lisboa, e chegamos ao SAL, como disse. A recepção encontrada naquele país irmão e amigo (não sei se já era nesse tempo) por parte das meninas que estavam a trabalhar no aeroporto, não foi nem de perto amigável! Bem pelo contrário, mas isso não interessa para o caso. Não achei boa recepção e ponto final. Não sei se nas seguintes fui ou não tratado da mesma forma. Talvez porque estava muito abalado, tenha notado algo que até nem pode ser real, mas é aquilo que retenho na memória, já estragada.
Aquela coisa de escrever a carta, entregar à hospedeira, ela prontificar-se a colocar no correio em Lisboa, senti-me em casa, dentro da aeronave da TAP - território Nacional - os velhinhos B707. Lembro-me de alguns nomes 'Humberto Delgado, Vasco da Gama, os outros tenho nos meus arquivos.
Possivelmente nos encontramos, nesse ou no regresso, passados 14 dias, em directo a Lisboa.
Depois o dia inesquecível, acho que vai ainda sair no próximo poste - II parte - a chegada a Bissau no dia 31 de Dezembro de 1984, não vou esquecer, por motivos óbvios, e fiz a mesma coisa com as cartas. Mais tarde em Junho 85, a mesma coisa e as mesmas rotas - Lisboa-Sal-Bissau, para lá, e Bissau - Lisboa para cá, como sempre foi assim, nas minhas duas viagens de férias em 68 e 69.

Numa destas acho que no dia 31 de dezembro 84, apanhamos uma tempestade, na hora de servirem a refeição, o avião apanhava poços de ar, e os tabuleiros foram recolhidos, as luzes apagadas, as cabeças deitadas nas almofadas, e assim se passou uma longa meia hora. Acabou e voltou ao normal. Pudemos comer e beber à vontade, e no final chegados a Bissau, pedimos à hospedeira duas garrafinhas de vinho branco, para festejarmos na passagem de ano.

Também nas minhas 3 viagens, fiquei sempre hospedado no 24 de setembro - o nosso antigo clube de oficiais - onde sempre fui bem tratado, faltavam eram as coisas de comer e beber, até entrar no esquema da Soares da Costa, com os novos 'investidores' que por acaso encontrei no bar do Hotel.

Na primeira viagem não tive essa sorte de arranjar transportes, não os havia, foi muito antes, estava lá una empresa portuguesa a instalar umas camionetas, que depois deu para ir até ao Gabu e Bafatá.
É preciso entender que eu estava só, entregue à bicharada como se diz, levou tempo a chegar aos homens grandes, o Dr. Francisco Godinho ajudou nisso, por causa do Major, já Cônsul da Guiné e que, ao contrário do que eu disse atrás, ele também tratava das coisas dos filhos do Nino, mesmo estando em Gaia, por isso lá fomos, só que não me lembro de pormenores, não significativos para desta viagem e história.

.. continua mais tarde para responder a outras questões e comentários de outros camaradas, mas não vamos fazer disto uma Tese de Doutoramento!!!


Virgilio Teixeira




Anónimo disse...

Ainda vou dar uma achega ao Patrício Ribeiro.

Tens razão, troquei o nome, era mesmo a SAMEC, já falida, e não a Somague, já não me lembrava da SAMEC, e tenho de ir alterar isto na minha história, pois está lá.
Mas em Outubro de 84, o cais estava praticamente pronto, as gruas da Samec estavam lá, e passado mais cerca de uns 9 meses acho que estava tudo pronto, é essa a ideia que tenho, e que trabalhavam lá muitos portugueses, que não andavam muito pela cidade, porque não havia nada para ver, e sim nas suas instalações com tudo o que precisavam, naquelas condições.
O dinheiro veio do Banco Mundial, até acho que tinha la uma placa com essa indicação, mas não ligava muito a isso nessa altura, andava era à procura de melhores dias para comer e beber.

É pena não ter fotografias daquilo, pois era uma obra fantástica.
Do Gabinete do Ministro das Finanças, mais alto na marginal, via-se a grandeza do Porto, nada daquilo que era antes, muita coisa foi feita de bom, esta era uma prioridade.

Virgilio Teixeira



Anónimo disse...

Para acabar peço para não levarem as minhas crónicas a um ponto de analise se era para ir 'abanar' a árvore das patacas ou não.
Isto são, e só isso, crónicas da minha vida, sem interesse nenhum de escalpelizar cada questão.
Mas é óbvio que, após o convite ( eu não me convidei, eles pediram-me, pois não tinham ninguém à altura naquela situação naquele sitio, nunca nos vimos) de um grupo económico forte, suportado politicamente pelo Consul desse pais, e tendo em conta o volume faraónico das verbas envolvidas, e tendo eu já investido numa viagem sem nexo, é natural que aproveitasse, pois essa era a minha função - Consultor económico-financeiro para projectos de investimento, era a minha área que eu felizmente dominava, e era o lucro que sempre estava presente em todos os investimentos. Este fracassou por razões de 'golpe de estado interno' não vou acrescentar mais nada.

O projecto que desenvolvi, junto com os técnicos especialistas na área agro-industrial, foi um sucesso, deixem que lhes diga, que teve de passar pelo Banco de Portugal, o tal CIE obrigava a uma autorização do BP para investimentos no exterior, que teriam de ser suportados por um estudo de viabilidade conclusivo, etc....

O meu projecto (até posso dizer, o nosso projecto - AGRINÉ - ) mereceu um despacho altamente positivo e favorável do Banco de Portugal, com um 'LOUVOR' na capa do despacho, dizendo claramente que nunca havia passado pelo BP um Estudo tão completo e tão conclusivo.

De qualquer modo, gastei do meu bolso e não ganhei nada.

Os próximos capítulos devem falar disto, já não me lembro.

Bom fim de semana, pois agora acabou o dia.

Estou sem email, porque fiz uma grande por engano, próprio da minha idade, uma 'gaita' e o Sapo bloqueou o email até 3ª feira. Vamos ver se vou ter Sapo ou Sapa!

Virgilio Teixeira












Anónimo disse...

Caro Camarada

Espero sinceramente que näo tenha assumido como crítica pessoal o detalhe por mim referido quanto a investimentos internacionais e as suas regras jurídicas.
Para mais, sendo um pequeno parágrafo de um longo e interessante texto.
A jurisprudência na busca de adaptar as normas ás situacöes de facto torna complicada a cópia "linha a linha" de códigos económicos internacionais.
Isto,se a ideia for a de os usar nas realidades envolventes de forma prática e näo abstracta.
Na área específica referida muito se tem vindo a modificar desde os inícios dos anos oitenta.
Entre os países da zona euro e os restantes países europeus fora dela,como o exemplo da Suécia.
E näo só na Europa mas também em relacäo aos outros continentes.
Espera-se que os tais "copiadores" guineenses,em conjunto com alguns conhecidos e renomados cooperantes portugueses (em economia) que por lá estavam nessa altura,continuem activos.

J.Belo

Anónimo disse...

Caro camarada J. Belo,

Não me passou pela cabeça a critica pessoal, essas eu julgo que ainda as detecto, entre as linhas.
Gostei do texto, mas não estou à vontade para falar de 'Epifanias' e outros nomes que para mim são esquisitos.

Era caso para meter aqui, por exemplo, que a TIR do Projecto era de 30%?
A maioria vai ficar a olhar para o lado, o que é isso da TIR?
- Taxa Interna de Rentabilidade.

E o que é isso, dirão outros?
É o mesmo que me acontece a mim quando leio Epifanias e outros nomes estranhos, isto é para brincar sem criticar nada, eu não sou um 'escritor' eu 'escrevo', bem ou mal, tal como falo, cara a cara, daí não conheço muitos adjectivos, nem procuro, porque a minha linguagem é fácil de entender por todos. Excepto no que diz respeito a linguagem técnica das minhas áreas e até essas já estão ultrapassadas, por falta de uso.

Eu, tinha-me esquecido, que ainda fiz uma 'escritura' notarial de uma sociedade da qual sou sócio, ou era, e vou dizer novamente, copiado das nossas escrituras daquela data, mas isso irá ser visto nos próximos capítulos, quando o nosso editor, postar a continuação desta saga...

abraço, do Virgilio



Anónimo disse...

Luís queria terminar isto. O que posso contar de ajuda?

Anónimo disse...

Assinado Virgílio Teixeira

Anónimo disse...

Há muita coisa e nomes que não posso escrever
Já tentei alterar com nomes fictícios, mas não dá certo. Quem conhece a primeira parte logo compreende tufo
Já tens as fotos? Queria fazer um pequeno resumo e publicar as fotos pois me parecem interessantes. Diz me alguma coisa quando for possível. Obg. Virgílio Teixeira lo 9.30 lo