terça-feira, 18 de maio de 2010

Guiné 63/74 - P6417: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (15): Obrigado, Mortágua, salvaste-me a vida!


Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Sector de Contuboel > Contuboel > Ponte sobre o Rio Geba > 16 de Dezembro de 2009 > Foto de João Graça, médico e músico, membro da nossa Tabanca Grande. O Cherno Abdulai Baldé, o Chico de Fajonquito,  é natural de Fajonquito, que pertence ao Sector de Contuboel, Região de Bafatá. Entre os de Fajonquito (na fronteira com o Senegal) e os de Contuboel (que,  no meu tempo,  Junho/Julho de 1969, era centro de instrução militar, foi lá que foi formada a futura CCAÇ 12...) havia (ou ainda há) uma certa rivalidade... nomeadamente em termos futebolísticos (diz-nos o Cherno).


Foto: © João Graça (2010). Direitos reservados

1. Mensagem do guineense Cherno Baldé, amigo e membro do nosso blogue, com data de 17 do corrente

Caro Luis Graça,

Na continuação das crónicas de Chico (Cherno Baldé,  de Fajonquito), envio mais esta, esperando que suscite reacções mais positivas do que as anteriores.

De notar, entretanto, que não existe nenhuma motivação, pró ou contra relativamente ao nome de Mortágua ou de outras possiveis conotações.Tudo foi fruto do simples gosto de escrever recordações e de partilhar pontos de vista. Como poderão notar, não conheço esta localidade ou freguesia e nunca convivi com outra pessoa que tivesse estas origens salvo o soldado a que me refiro e do qual me lembro vagamente.

Cherno Abdulai Baldé - A partir de Bissau.


2. Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (15):  O Mortágua (*)


Para todos aqueles que conhecem minimamente terras Lusas, Mortágua deve significar uma aldeia, vila, freguesia ou cidade,  situadas algures no centro norte de Portugal. Para as crianças "rafeiras" do quartel de Fajonquito por volta de 1970/72 (**), Mortágua era o nome dado a um dos soldados cozinheiros da messe dos oficiais,  situada nas traseiras da casa comercial Ultramarina, onde trabalhava o meu pai. 

Por detrás desta cozinha, encontrava-se o salão de futebol de cinco, onde passávamos a maior parte do tempo a brincar ou a observar aquelas crianças adultas, como lhes chamava a minha avó, que eram, nesse caso, os soldados portugueses, a jogar a bola no meio de gritos e, quase sempre, como que para impor a ordem, um ou outro oficial espectador junto ao murro que circundava o salão.

Indiferente, sorumbático e a destoar de tudo e de todos,  estava o Mortágua ocupado nos seus afazeres de todos os dias. O homem não era muito vulgar, a começar por seu tamanho que saltava fora do comum dos portugueses. Era alto e possuía enormes pés,  sempre descalços,  ou em chinelas que mais pareciam trompas de elefante, pintados de nódoas pretas da caldeira da cozinha e o corpo invariavelmente habitado por cascas de batata, penas de galinha e restos de comida. 

Tanto o víamos ocupado à volta da sua cozinha que pensávamos que ele passava lá as noites. Quando matava as galinhas, não se dava ao trabalho de cortar a garganta e segurá-las até esfriar para não saltitarem enquanto lutavam entre a vida e a morte, momentos que todos os seres humanos devem respeitar, como mandam as regras. Ele, ao contrário, segurava nelas e batia a cabeça das pobres criaturas contra as bordas salientes de um tanque e, de seguida deixava-as rolar no chão até perderem a vida. 

Esta crueldade da parte de um homem, certamente, criava um misto de medo e de ódio contra ele da parte das crianças e por extensão da aldeia, também. Não era dado a passear ou a brincar, nem tão pouco frequentava a aldeia, plantada mesmo ao pé do quartel,  doutro lado da estrada para além da vedação de arame farpado. A sua postura de homem solitário, triste e cruel,  fazia pensar numa alma infeliz.

Ora, ai é que estava o cerne da questão, e que me intrigava sobremaneira. Na minha opinião, era difícil imaginar que pudesse haver pessoas infelizes num sítio com tanta abundância de alimentos e de vida, jovem e saudável. Certamente, estes brancos não sabiam a felicidade que Deus lhes tinha concedido ao enviar-lhes neste mundo sem as mazelas que atormentavam a população nativa, pensava eu. 

Se não vejamos: Não tinham bebés para amamentar e levar as costas, aliás não eram obrigados a aturar as birras das mulheres que diariamente engendravam mil e um conflitos nas nossas moranças criando fissuras na coesão social e familiar com as suas histórias trelelé, sem pés nem cabeça, nascidas da sua eterna insatisfação sexual; não tinham velhotas intrometidas como a minha avó que queria saber e controlar tudo e todos ao pormenor só para se manter ocupada e não definhar; não tinham doenças, pelo menos, nunca tinha visto sequer um soldado que o estivesse, salvo algumas diarreias que entupiam as casas de banho em certas ocasiões.

Desde o primeiro contacto, para mim, o quartel transformou-se irremediavelmente num local atractivo porque era o lugar ideal, quase perfeito, para viver, longe das misérias do mundo. Os homens em geral têm tendência natural para justificar as suas fraquezas. Foi assim que, confrontados com a força conquistadora e dominante dos Portugueses, os nossos velhos encontraram uma forma subtil e engenhosa de explicar a supremacia e também, a sorte dos brancos. Diziam: "A eles, Alá (Deus) deu tudo o que desejavam neste mundo e a nós, pretos, Deus nos reservou o paraíso na eternidade, na condição de sermos pacientes e cumpridores das obrigações contidas nos cinco pilares da religião". 

Todavia, não era assim tão simples no espírito de uma criança que tinha fome e muita curiosidade. E mais, a fome podia ser enganada ou controlada mas era mais difícil ocultar a evidência, para lá das barreiras e dos dogmas.

Desculpem pois, estava a falar do Mortágua. Pensava eu ser esse o seu nome, todos o chamavam assim. Não raras vezes, gritávamos, escondidos noutro lado do murro do pequeno salão: 
– Mortábua !!! Mortábua !!!

Era uma festa de risos e assobios, após uma breve escapada, seguros da nossa impunidade. Mais que a zombaria, era a sonoridade do nome que nos divertia. Mas ele nunca reagia as nossas provocações, continuando impávido a descascar batatas ou a depenar as suas galinhas dessacralizadas.

Num dia em que me tinha levantado mais cedo que o habitual como que empurrado pelo Satanás, fui ao centro da aldeia, onde se situava a única escola e, como não estava ninguém naquela hora do dia, desci para os lados do quartel. No refeitório cruzei-me com o sempiterno Zeca Mané, auxiliar da cozinha, ainda com os vestígios da bebedeira de ontem, a lavar as panelas e a pôr lenha no fogão para o café da manhã, acompanhado de algumas crianças que o ajudavam a troco dos restos de comida da véspera. Do forno da padaria, situado entre a cozinha e a caserna dos condutores, saia o cheiro agradável do pão a cozer mas, ainda a maior parte da malta estava dentro das casernas a preparar-se para o novo dia que começava.

Encostado ao murro do refeitório, para não ser visto por Matos,  o Chefe da cozinha, que por razões que não sei explicar, não simpatizava comigo, dirigi-me aos colegas suplicando-lhes que me dessem um pouco dos restos de comida, para segurar a barriga . Talvez devido à vida de rafeiros que levavam no quartel, normalmente nenhuma das crianças cedia em tais condições em oferecer comida aos outros. Nenhum deles sequer olhou para mim. Como não respondiam, dirigi-me para o local onde sabia estar escondida a comida e então chamaram o patrão:
- Xô Matos, olha o desenfiado!

O Matos era um brutamontes e, sabendo do perigo que corria, deixei o refeitório e afastei-me para os lados do salão. Estas circunstâncias salvaram-me de uma morte certa mas, vamos por partes.

Sem saber ao certo o que fazer perante a recusa dos colegas que sabia ser irreversível mas ainda com a barriga vazia, dirigi-me para os lados do salão de futebol e, aí, avistei uma figura conhecida, era o Mortágua nas suas lides diárias. Inclinado sobre um caixote de madeira semi-aberto, ele apanhava com uma das mãos as batatas inglesas munido de uma faca de cozinha. Talvez devido a monotonia da hora e, sem pensar nas consequências, chamei:
- Mortábua!

Como que picado por uma vespa, o homem levantou-se com uma facilidade que não suspeitava nele e lançou-se na minha direcção com a faca em punho. Com a surpresa do momento, ainda perdi alguns segundos sem reagir. Pensei em fazer marcha atrás mas, na cozinha estava o Matos mais um grupo de soldados da companhia de operacionais, que não hesitaria em caçar-me. Pensei em fugir e entrar na caserna dos condutores mas ainda alguns estavam na cama e arriscava-se a levar dupla porrada. A única saída eram os arames farpados.

Com o medo à flor da pele, dei meia volta, como que a querer dirigir-me a cozinha, de seguida virei na primeira porta do refeitório e que dava para a padaria, tendo voltado de novo ao salão do qual saltei o primeiro e o segundo murro sem dificuldades, tendo-me, depois, lançado em grande velocidade, em direcção ao cercado mais distante, situado ao sul e que dava acesso ao morcunda, bairro Mandinga. A distância a correr era razoável e convinha fazê-lo rapidamente e em ziguezague senão arriscava-me a ser atropelado pelo monstro.

O Mortágua não cedia um passo. Não podia supor, nem por um triz que aquele calmeirão fosse tão ágil e resistente na corrida. Sentia o bafo de ar quente por cima da minha cabeça e eu corria e corria. No quartel, já se tinha perfilado um certo número de curiosos a observar a corrida. Só pedia a Deus que a sentinela estivesse a dormir, senão... Sentia que as pernas estavam cada vez mais pesadas e as mãos do gigante me arranhando as costas no desespero de me agarrar. Socorro!

O que o Mortágua não sabia era que tudo estava calculado, de antemão, assim como fazem os animais que vivem sob ameaça permanente. Havia sítios onde tínhamos feito aberturas com as pontas redondas do arame viradas para cima, de modo a permitir a passagem de um corpo minúsculo e, foi por ai que me escapuli, deixando cair o corpo a terra e rolando por baixo, da mesma forma que nos tinha ensinado o nosso "instrutor militar". 

O Mortágua, incrédulo e impotente,  começou a mandar vir com imprecações acompanhadas de mil ameaças caso voltasse a pisar o quartel. Atirou-me ainda algumas pedras mas a partida já estava perdida para ele, pelo menos, desta vez. Pelos vistos, era preciso mais que a fúria de um gigante para encurralar um rafeiro.

Como se nada tivesse acontecido, com o corpo riscado de arranhões e a camisa em tiras, juntei-me ao grupo de rapazes que seguia para Morcunda. Agora era preciso encontrar os mantimentos necessários e juntos partir para a bidal, ponto de encontro da malta jovem nos períodos matinais. Devíamos preparar alguma provisão em mangas que íamos roubar no bairro mandinga. E foi ai que começou o desenrolar do drama que dava sequência ao episódio do refeitório e que viria a ceifar a vida de alguns dos nossos colegas.

Os primeiros sinais foram de náuseas e vómitos mas não tardou a que todos aqueles que tinham passado pelo refeitório e que se tinham servido da comida da véspera no quartel, estivessem estatelados no chão sem forças. Pusemo-los dentro dos caixotes que nos serviam de carros para os arrastar mas as cordas cediam e, então,  fomos obrigados a carregá-los nas costas até à casa Gouveia, no centro da aldeia, onde funcionava o hospital ou o que fazia passar por tal. Antes de chegarmos ao local já uma das crianças estava morta. As outras, ainda receberam alguma assistência e medicamentos mas muitas vieram, mais tarde, a sucumbir. Os mortos foram enterrados e a vida continuou, era o destino.

O que tinha acontecido? Segundo as informações que depois circularam, eles tinham comido carne de atum em mau estado de conservação que as tinha intoxicado. Esta carne vinha em latas largas e redondas. Verdade ou não e, como não podia avaliar do seu estado, nunca mais voltei a comer atum, pelo menos, enquanto durou a presença das tropas em Fajonquito.

Durante algum tempo, impediram a entrada dos civis no quartel, mas a medida durou pouco e não teve o efeito desejado pois, apesar disso,  nós entrávamos no quartel violando as ordens com conivência dos nossos amigos e os soldados que, também, continuavam a fugir a coberto da noite para visitar as suas bajudas nas nossas moranças. Era inútil.

Este acontecimento ilustra, se necessário fosse demonstrá-lo, a grande capacidade de sofrimento humano e de perdão de que são imbuídas as populações Africanas e, também da sua força espiritual na crença em Deus ou algo de transcendência superior. Quantas vezes, estes comportamentos passivos, lentos e conformistas,  não foram entendidos como sinais de fraqueza e de incapacidade. Uma vez, o meu pai, que raramente entrava em conversas inúteis, quando ouviu falar da chegada dos brancos à Lua, falou naqueles seus monólogos que nos tinha habituado, dirigindo-se a nós: 
- Estes brancos, sempre apressados, para onde nos hão-de levar?

Ainda hoje pergunto-me a mim mesmo, o que teria feito ao Mortágua para suscitar tanta raiva nele? Seriam as nossas provocações infantis ou o facto de o chamar pelo nome que, suponho, não seria o dele mas da sua terra de origem? Ou então, foi Deus que quis salvar-me por seu intermédio?

Ainda, passados muitos anos, estas questões me habitam e, esteja onde estiver, quero que saiba que ele salvou-me de uma morte quase certa, mesmo que o tenha feito de uma forma muito estranha. Espero, também, que,  com idade madura, ele tenha percebido da importância de lidar com a vida com a simplicidade e o sacramento que a nossa existência como humanos nos impõe. Obrigado,  Mortágua.

Bissau, Abril de 2010.

Guiné-Bissau > região de Gabu > Fajonquito > c. 1975 > "A nossa equipa de futebol de salão no quartel de Fajonquito entre 1974-1975, podendo-se ver em pé: Mamudo, Algássimo e o professor António Tavares; sentados: Eu (Cherno) e Aruna (filho do antigo padeiro) à minha esquerda" (CB)

Fotos: © Cherno Baldé (2009). Direitos reservados

3. Comentário de L.G.:

Obrigado, Chico,  grande rafeiro de Fajonquito, e sobretudo obrigado  meu amigo e irmãozinho Cherno. Já conquistaste o coração destes tugas que nos idos tempos de 1963/74 tu conheceste e admiravas, com um misto de reverência, terror, curiosidade, simpatia e compaixão... Já aqui escreveste páginas admiráveis, e únicas (que nenhum de nós poderia escrever), sobre a inocência em tempo de guerra, sobre a condição dos meninos guineenses dentro e fora do arame farpado, sobre o quotidiano dos soldados portugueses visto pelo desarmante e fascinante olhar infantil, sobre a vida e a morte das crianças numa tabanca fronteiriça  militarizada, sobre a atracção e a repulsa da cultura europeia... 

Cherno, as tuas crónicas, pela emoção que nos provocaram, pela autenticidade do teu testemunho, pelo fascínio das tuas memórias de infância e pela beleza literária da tua narrativa,  já bem merecem um editor português. Não tenho dúvida, não temos dúvidas: és um talentoso escritor de língua portuguesa. E o nosso blogue orgulha-se de estares entre nós, como guineense, como homem, como amigo, como lusófono. Espero que esta crónica chegue ao conhecimento do Mortágua, onde quer que ele esteja, dos Mortáguas que tu conheceste e que, como dizia a tua avó, não eram mais do que crianças crescidas que a guerra veio roubar às suas famílias e às suas tabancas...  
________________

Notas de L.G.:

(*) Vd. postes anteriores:

24 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6244: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (14): Cap Figueiredo: Capiton Lelö dahdè ou capitão cabeça inclinada



10 de Agosto de 2009 > Guiné 63/74 - P4806: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (11): Filho da p... de barrote queimado...... Ou as sobras do rancho

8 de Agosto de 2009 > Guiné 63/74 - P4802: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (10): Futebol: ser do Benfica ou do Sporting, eis a questão

5 de Agosto de 2009 > Guiné 63/74 - P4782: Memórias do Chico,menino e moço (Cherno Baldé) (9): Futebol, rivalidades, bajudas... e nacionalismos(s)

 27 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4746: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (8): Misérias e grandezas de Fajonquito, 1970/75

21 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4714: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (7): As profecias do velho Marabu de Sumbundo

13 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4679: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (6): Uma gesta familiar, de Canhámina a Sinchã Samagaia, aliás, Luanda

6 de Julho de 2009 >Guiné 63/74 - P4646: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (5): A família extensa, reunida em Fajonquito, em 1968

30 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4611: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (4): O ataque dos meus primos a Cambajú e o meu pai que foi um herói

25 de Junho de 2009 >Guiné 63/74 - P4580: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (3): A chegada dos primeiros homens brancos a Cambajú em 1965: terror e fascínio

24 de Junho de 2009 > Guine 63/74 - P4567: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (2): Cambajú, uma janela para o mundo

19 de Junho de 2009 >Guiné 63/74 - P4553: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (1): A primeira visão, aterradora, de um helicanhão

Vd. também:

18 de Junho de 2009 >Guiné 63/74 - P4550: Tabanca Grande (153): Cherno Baldé (n. 1960), rafeiro de Fajonquito, hoje engenheiro em Bissau...

7 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4650: (Ex)citações (32): A Tabanca Grande ou... Global: de Contuboel, Fajonquito e Bissau com amizade (Cherno Baldé)

20 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4710: Blogoterapia (119): As Fantas, as Marias, as Natachas, ou o amor em tempo de guerra e de diáspora (Cherno Baldé)

(**) Vd. poste de 3 de Abril de 2009 >Guiné 63/74 - P4136: As Unidades que passaram por Fajonquito (José Martins)

(...) Companhia de Caçadores n.º 1501, comandada pelo Capitão de Infantaria Rui Antunes Tomaz, unidade orgânica do Batalhão de Caçadores n.º 1877, mobilizada em Tomar no Regimento de Infantaria n.º 15, assumiu a responsabilidade do subsector, rendendo a CCaç 1497, em 26 de Janeiro de 1967, vindo a ser substituída pela CCaç 1685 em 19 de Setembro de 1967.

Companhia de Caçadores n.º 1685, comandada pelo Capitão de Infantaria Alcino de Jesus Raiano, unidade orgânica do Batalhão de Caçadores n.º 1912, mobilizada em Évora no Regimento de Infantaria n.º 16, assumiu a responsabilidade do subsector, rendendo a CCaç 1501, em 19 de Setembro de 1967, vindo a ser substituída pela CCaç 2435 em 14 de Dezembro de 1968.

Companhia de Caçadores n.º 2435, comandada pelo Capitão de Infantaria José António Rodrigues de Carvalho e, posteriormente, pelo Capitão de Infantaria Raul Afonso Reis, unidade orgânica do Batalhão de Caçadores n.º 2856, mobilizada em Abrantes no Regimento de Infantaria n.º 2, assumiu a responsabilidade do subsector, rendendo a CCaç 1685, em 07 de Dezembro de 1968, vindo a ser substituída pela CCaç 2436 em 20 de Abril de 1970.

Companhia de Caçadores n.º 2436, comandada pelo Capitão de Infantaria José Rui Borges da Costa, unidade orgânica do Batalhão de Caçadores n.º 2856, mobilizada em Abrantes no Regimento de Infantaria n.º 2, assumiu a responsabilidade do subsector, rendendo a CCaç 2435, em 20 de Abril de 1970, vindo a ser substituída pela CArt 2742 em 13 de Agosto de 1970.

Companhia de Artilharia n.º 2742, comandada pelo Capitão de Artilharia Carlos Borges de Figueiredo e, posteriormente, pelo Alferes Miliciano de Artilharia Baltazar Gomes da Silva, unidade orgânica do Batalhão de Artilharia n.º 2920, mobilizada em Penafiel no Regimento de Artilharia Ligeira n.º 5, assumiu a responsabilidade do subsector, rendendo a CCaç 2436, em 13 de Agosto de 1970, vindo a ser substituída pela CCaç 3549 em 21 de Maio de 1972.

Companhia de Caçadores n.º 3549, comandada pelo Capitão Quadro especial de Oficiais José Eduardo Marques Patrocínio e, posteriormente, pelo Capitão Miliciano Graduado de Infantaria Manuel Mendes São Pedro, unidade orgânica do Batalhão de Caçadores n.º 3884, mobilizada em Chaves no Batalhão de Caçadores n.º 10, assumiu a responsabilidade do subsector, rendendo a CArt 2742, em 27 de Maio de 1972, vindo a ser substituída pela 2.ª Companhia do BCaç 4514/72 em 15 de Junho de 1974.

2.ª Companhia do BCaç 4514/72, comandada pelo Capitão Miliciano de Infantaria Ramiro Filipe Raposo Pedreiro Martins, unidade orgânica do Batalhão de Caçadores n.º 4514/72, mobilizada em Tomar no Regimento de Infantaria n.º 15, assumiu a responsabilidade do subsector, rendendo a CCaç 3549, em 15 de Junho de 1974, vindo a iniciar o deslocamento para Bissau a partir de 30 de Agosto de 1974, tendo um pelotão efectuado a desactivação e entrega, ao PAIGC, do aquartelamento em 01 de Setembro de 1974. (...)

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Guiné 63/74 - P6416: Controvérsias (75): A nossa postura face ao PAIGC no pós-Abril (Manuel Marinho)

1. Mensagem de Manuel Marinho* (ex-1.º Cabo da 1.ª CCAÇ/BCAÇ 4512, Nema/Farim e Binta, 1972/74), com data de 11 de Maio de 2010:


A(s) NOSSA(s) POSTURA(s) FACE AO PAIGC NO PÓS-ABRIL

Ultimamente as discussões sobre a postura dos camaradas que estavam na Guiné face aos acontecimentos pós-Abril relacionados com o PAIGC, têm ocupado espaço considerável no blogue, e na minha opinião, com elevado respeito por opiniões diversas entre camaradas que na expressão feliz de alguém, “tiveram que fechar as portas da guerra”.

Vamos lá ver se sou capaz de expressar o que sinto em relação a esses acontecimentos sem beliscar a postura de ninguém.

A minha posição quanto a essa questão já a manifestei por várias vezes quando o tema é mesmo esse, isto é sou e fui contra todas as formas de regozijo para com o PAIGC.

Apenas e só, respeito a sua luta que travaram pela emancipação do seu povo, de igual modo exijo-lhes o mesmo em relação aos meus companheiros de armas que lutaram com brio e honra, por uma causa que a esmagadora maioria considerava um dever pátrio, e que pagaram muito caro essa luta.

Não merecem mais, porque entre outras coisas, é de muito mau gosto, ”sou educado” senão a palavra era outra, levar a esses encontros de reconciliação na altura, algumas peças de equipamento de guerra pertencentes a camaradas nossos, e que eles ostentaram de forma “vitoriosa” junto dos nossos camaradas, em alguns encontros perante o silêncio e a vergonha de alguns soldados que a eles assistiam.

Se fosse o contrário o que seria?

Já se imaginaram a levar alguma peça de farda do PAIGC a encontros com o IN na altura? Seria essa a melhor forma de reconciliação?

Lamento mas não posso deixar de pensar assim, se calhar o defeito é meu e (posso) poderei estar errado na apreciação que faço dos meus ex-inimigos, mas cada vez mais sinto a minha razão fortalecida, ao ler e ver alguns posts, e saber o que aconteceu depois aos que a nosso lado combateram.

Não respeito o vencedor que não respeita o vencido.

Como abomino o abuso do forte sobre o fraco.

Ou será que não foi o mesmo PAIGC que agiu no caso dos fuzilamentos?

Mas a questão principal prende-se com toda a envolvência na guerra que travamos ao longo de 13 longos anos, e que se não foi resolvida pela via política, teria forçosamente de o ser pela classe militar.

E é bom que lembremos que fomos nós que acabamos com as hostilidades, não havendo motivos para que se exagerasse nos festejos.

Mas não foi o melhor que nos podia ter acontecido? Claro! Nem podia pensar de outra maneira.

Queríamos vir embora rapidamente? É óbvio que sim.

Poupou dezenas de vidas de ambos os lados? É evidente e não tem discussão.

Mas a saída teria de ser outra! E não a que se verificou!

Mas estes acontecimentos serão mais tarde analisados e contados por historiadores que farão a História da guerra colonial, (no caso da Guiné este blogue é imprescindível) e eu apenas sou mais um, que deixo modesto contributo no sentido de evitar que qualquer dia estejamos todos a bater palmas ao PAIGC, porque nos deixaram vir em paz para a nossa “santa terrinha”, em 1974.

Respeito sem o mínimo de reservas os que pensam de maneira contrária, mas tenho que deixar expresso o meu testemunho do que pensava na altura, e que hoje já com idade para ter mais juízo (escusava de falar disto), os factos passados ao longo destes anos, reforçaram a minha opinião.

Para mim a coerência deve ser acompanhada de juízos de valor que à época tínhamos, eu até podia refugiar-me na minha juventude de então.

Mas não será que nesses 2 anos terríveis que todos nós passamos em comissão, não amadurecemos demasiado depressa em comparação com os nossos amigos de então?

É que hoje camaradas, sinto em diversas leituras que éramos todos muito politizados, e era bom que também aqui no blogue se afirmasse que havia muitos soldados que se lhes perguntava o porquê da ida para a Guiné, a resposta era mais ou menos esta:

Defesa da Pátria ou da Bandeira, e sempre por obrigação e dever.

Havia de facto uma minoria mais politizada, sei do que falo, mas daí até pensarmos que no dia 25 Abril estávamos todos a gritar “abaixo a guerra / regresso imediato”, vai uma grande distância.

As perguntas mais frequentes nesse dia eram, “o que é isso de revolução”?

Eu até fui eleito para representar os meus camaradas na classe de Cabos e Praças, (eram 4, um Alferes, um Furriel e dois Cabos) a ideia era travar ímpetos de quem comandava as Companhias para que não pudessem pôr em causa o cessar fogo entretanto a ser negociado, isto é, os representantes(?) do MFA nos quartéis no mato tinham por missão impedir possíveis saídas para o mato, determinadas por algum Comandante de Companhia que entendesse o contrário.

No nosso caso até nem foi difícil, pois durante toda a comissão o “senhor” que nos comandava saiu duas ou três vezes para o mato e julgo que por ordens superiores que o ditaram.

A partir daí para nós acabou-se a guerra, porque se o cessar fogo corresse mal já não tínhamos a possibilidade de fazer frente ao PAIGC, restava-nos entregar os aquartelamentos e pedir por favor para virmos embora, pois os aquartelamentos ficaram à mercê deles pois eles movimentavam-se à vontade, enquanto nós esperávamos o final das conversações a ver no que dava, esta é a minha opinião, vale o que vale.

E na altura o PAIGC nem tinha a força de um ano antes, pelo menos na minha ZO, ou será que eles não passavam dificuldades na altura do 25 de Abril?

Seria só o nosso lado a ter problemas?

Se na altura se entendia que era uma provocação ao PAIGC o facto de andarmos armados, o que pensar quando leio hoje alguns camaradas dizerem que eram mandados parar por forças do PAIGC armados?

Já houve camaradas que disseram que só quando chegaram a Bissau, entregaram o armamento, no nosso caso foi entregue em Binta, para depois termos de tornar a pegar em armas para apagar “fogos” ateados pelos “festejos exagerados” que se fizeram em Guidaje, e para o qual tivemos de ser nós a apagar os mesmos, (quando puder conto), e era para intervir contra os nossos camaradas africanos.

E mais uma questão, alguém consegue explicar os comportamentos desiguais que eles tiveram nas diversas Unidades, numas entravam e bebiam, noutras pediam por favor, e finalmente havia outras que eles tinham vergonha de franquear as entradas, porque seria?

Um grande abraço para todos vós.
Manuel Marinho
__________

Notas de CV:

(*) Vd. postes do nosso camarada no marcador Manuel Marinho

Vd. último poste da série de 9 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6350: Controvérsias (74): Como eu vi o fim da guerra (Fernando C. G. Araújo, ex-Fur Mil OpEsp / RANGER da 2ª CCAÇ / BCAÇ 4512)

Guiné 63/74 - P6415: O nosso blogue em números (5): O novo contador da Bravenet... e o nosso pedido de desculpa aos portugueses dos Açores e da Madeira (Luís Graça)





O Contador Bravenet dava-nos, hoje, às 9h27, a posição (geográfica) de 10 visitantes recentes do nosso blogue: 2 no Brasil, 1 na Inglaterra, e os restantes 7 em Portugal Continental...


1. Em 13 do corrente, circulou pelo correio interno da nossa Tabanca Grande, uma mensagem dos editores com o seguinte teor:

Assunto: Estatística diária do nosso blogue
Amigos e camaradas:

Para todos vocês, os 415 membros inscritos da nossa Tabanca Grande, para quem fazemos o blogue, todos os dias, e que são uma força motivadora para prosseguirmos... (às vezes contra ventos e marés). E que nos ajudam a fazer o blogue, que é hoje, sem dúvida, um blogue colectivo...

Uma gracinha, uma prendinha... Passam a ter à vossa disposição uma pequena ferramenta que permite o apuramento estatístico do nosso movimento bloguístico (visitas por hora, por dia, por semana...). É só clicar no contador (Bravenet) na coluna à esquerda, ao alto... (Clicar em "View Site Stats")... Para aqueles que têm menos conhecimentos de inglês, uma breve explicação dos links (...).

Este contador foi posto no domingo à noite [, dia 9], daí só termos dados a partir de então... O saldo acumulado era de 1.730.000 (+/-)... Mesmo com a forte concorrência do Santo Padre, esta semana estamos com uma média de 2500 páginas visitadas /dia e 800/900 visitantes/dia...(portanto mais do dobro dos nossos "inscritos")...

Hoje verifiquei que havia gente a consultar-nos a partir do Brasil, dos EUA, do Canadá, da França, da Holanda, além de Portugal (incluindo Açores)... A nossa hora de ponta ("busiest time") é depois do almoço (das 2h00 às 2h59, PM)...


Obrigados pela vossa atenção, carinho, fidelidade, camaradagem, amizade... 

Os editores LG/CV/EMR/VB

2. A expressão (algo infeliz) "além de Portugal (incluindo Açores)" causou alguns reparos, reticências, senão mesmo calafrios... por parte de alguns camaradas. E com toda a razão. Por exemplo, o Jorge Portojo, escreveu o seguinte: " Parabéns,  pessoal. Mas essa graça do Portugal, incluindo Açores, é triste. Boto abaixo. Um abraço"...

 Respondi-lhe, tentando fazer graça (forçada): " Jorge: Na melhor nódoa... cai o pano! Que os Açores me perdõem!"... Mas desta vez fui capaz de ter ofendido os madeirenses, os nossos compatriotas da  Região Autónoma da Madeira, tão dura e tragicamente atingida  este ano pela fúria dos elementos da Natureza...

O Carlos Cordeiro, açoriano, português dos quatro costados, professor universitário, irmão do malogrado capitão pára-quedista  João Pedro Cordeiro, e que é um activíssimo membro do nosso blogue, mandou-me, por sua vez, a seguinte mensagem, que eu agradeço pela elegância, elevação e compreensão:

 Caro Luís,

Não há que preocupar. Percebi muito bem. A Madeira não estava, de facto, em linha. Daí teres dito assim. Podias ter dito, por exemplo, "Portugal (excluindo a Madeira)" ou "Portugal (continente e Açores)". Mas dito como disseste também percebi que era Portugal, incluindo os Açores e excluindo a Madeira.

Nós aqui é que temos mais cuidado, pois houve muita atenção, durante o Estado Novo, a estas questões. No século XIX dizia-se reino, metrópole, mãe-pátria (e pátria madrasta também). Num livro de 1932 dum velho republicano,  livre-pensador e adepto do federalismo ("Em Prol da Descentralização"),  o autor, Francisco d'Athayde Machado de Faria e Maia, referia-se ao continente como Portugal ou metrópole. 

A Constituição de 1933 é clara na definição do território português e é a primeira que diz claramente: "Na Europa: o Continente (Pedro da Silveira, julgo que na "Antologia da Poesia Açoriana", goza com essa terminologia dizendo mais ou menos: "Oh, a mania das grandezas!) e os Arquipélagos da Madeira e dos Açores".
Evidentemente que hoje a situação é ainda mais "exigente". Se eu me distraísse e dissesse "vou a Portugal" seria imediatamente taxado de separatista ou independentista. Mas - e bem - ninguém leva a mal se um continental que passe por cá diga o mesmo. Não teria qualquer conotação política. E isto acontece muitas vezes, até com pessoas de elevado nível cultural. O continental que sai de Lisboa ou do Porto de avião sai, geralmente, para o estrangeiro.

Desculpa o arrazoado, mas é para não ficares a pensar que teria sequer pensado no assunto.

Um abraço,
Carlos (*)

3. Comentário de L.G.:

Temos de ter sempre muito cuidado com o que escrevemos, nomeadamente em público... Nestes dias nem sempre tenho estado à altura do meu melhor... Peço desculpa, nomeadamente aos mais susceptíveis. E para que não restem dúvidas, a Constituição da República Portuguesa, de 1976 (na sua versão de 2005, VII Revisão Constitucional)  é peremptória, clara, concisa, precisa, na definição do território do nosso Portugal de hoje:
(...) Artigo 5.º - Território

1. Portugal abrange o território historicamente definido no continente europeu e os arquipélagos dos Açores e da Madeira. (...)

______________

Guiné 63/74 - P6414: Em busca de... (132): Procuro Tobias Queirós, ex-Fur Mil do 15.º Pel Art.ª, Guileje e Gadamael, 1972/73 (Luís Paiva)

1. Mensagem de Luís Paiva (ex-Fur Mil Art.ª, 15.º Pel Art.ª, Guileje e Gadamael, 1972/73), com data de 12 de Maio de 2010:

Caro Vinhal:
Este é um renovado pedido para nova tentativa de localização do Tobias Queirós, ex-Fur Mil de Artilharia que comigo, integrou o 15.º PELART (leia-se Pelotão de Artilharia), estacionado em Guileje/Guiné durante o período dos "Gringos" e posteriormente dos "Piratas" que decorreu entre meados de 1972 e Maio de 1973, altura da retirada de Guileje.

Após a retirada ficámos aínda durante alguns meses afectos à Companhia que então se encontrava em Gadamael.

Depois de termos terminado o serviço militar ainda consegui contactar algumas vezes o Tobias Queirós na Lusalite na Baixa de Lisboa, mas aquela firma faliu há muitos anos e não mais o consegui localizar.

No próximo dia 5 de Junho decorrerá o Convívio Anual dos Piratas em Águeda ao qual ainda não decidi ir, mas certamente ajudaria à decisão se entretanto conseguisse localizar o Queirós e ele pudesse comparecer ao evento também.

Saudações cordiais.
Luís Paiva
Lamego
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 12 de Janeiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5637: Dossiê Guileje / Gadamael (21): Uma especial e pública saudação cordial ao Coronel Coutinho e Lima, a quem pessoalmente ficarei grato até ao final dos meus dias (Luís Paiva, ex-Fur Mil, 15º Pel Art, Guileje, Gadamael e Bula, 1972/74)

(Vd. último poste da série de 17 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6411: Em busca de... (131): Fui à Festa da Flor em demanda do camarada Rui Alberto (António Tavares Oliveira)

Guiné 63/74 - P6413: Elementos para a caracterização sociodemográfica e político-militar do Sector L1 (1): Populações controladas pelas NT e pelo PAIGC, ao tempo do BART 2917 (1970/72) (José Armando F. de Almeida / Luís Graça)




Excertos de: BART 2917: História da Unidade. Cap II. Páginas 11/12

 [Versão policopiada gentilmente ao nosso blogue pelo ex-Fur Mil Trms Inf, José Armando Ferreira de Almeida, CCS/ BART 2917, Bambadinca, 1970/72,  membro da nossa Tabanca Grande, foto à direita]

3. População

a. Generaliades:

São muito ténues as migrações que hoje se verificam no Sector L1 [, com sede em Bambadinca,] que sofreu sucessivas grandes invasões de povos vindos do interior: primeiro os Beafadas, depois os Mandingas no séc. XIV e posteriormente, já no Séc. XIX, os Fulas.

Senhores de um a cultura mais avançada, os Mandingas pacificamente habituam aos Beafadas aos seus costumes e religião (de tal forma que os dois grupos étnicos muitas vezes se identificam), e convertem,  no Sector L1, os seus vencedores Fulas ao seu islamismo, passando a influenciá-los profundamente através dos dignatários religiosos, ainda hoje quase todos eles Mandingas ou a estes subordinados (Confraria Cadiria).

Aliados, os Fulas, aos portugueses nas campanhas de “ocupação”, vêem, por influência das próprias autoridades administrativas, aumentar já no presente século [XX] o seu domínio sobre os restantes grupos étnicos como quasi exclusivos mandatários daquelas autoridades (Cipaios e intérpretes).

Com a ocupação efectiva do Sector L1 pela autoridade portuguesa, dão-se novas migrações, agora do litoral para interior: 

(i) os Papéis acompanhando as casas comerciais especialmente ligadas à navegação;

(ii) os Manjacos acompanhando a expansão da exploração do coconote (são ainda desta etnia a quasi totalidade dos que sobem às palmeiras no corte dos cachos de chabéu);

e (iii) os Balantas, mestiços de Beafada e Papel (?), atraídos pelas extensas e produtivas bolanhas dos Rios Geba e Corubal que ocupam, praticando a cultura alagada do arroz em que são exímios.

Parece também, ser posterior àquelas campanhas a dessiminação dos (iv) Caboverdianos, especialmente ligados, neste sector, ao funcionalismo (veterinária, agricultura, correios, casa Gouveia, etc.).

A actual guerrilha deu origem a novas migrações na área:

(i) o rico regulado do Cuor – praticamente Mandinga - despovoou-se, quase completamente; 

(ii) diminuiu a ocupação dos Regulados do Corubal e do Xime, passando grande parte das suas áreas e populações ao conrtolo IN;

(iii) o Regulado de Badora – ilha de paz na conturbada Guiné - vê aumentar a sua população especialmente com Balantas e Mandingas deslocados do Regulado do Xime e do Cuor, e Fulas vindos do Regulado do Corubal, Gabu e outros onde o IN campeia.

b. Grupos étnicos
 
(1) Na zona controlada pelas NT [Vd. Quadro 3.1,  acima].
 
Verifica-se que predomimam os Fulas nos Regulados do Xime, Corubal e Badora, os Mandingas no Regulado do Cuor e os Balantas no Regulado do Enxalé; estes últimos estão no Regulado de Badora localizados  nos grandes núcleos de Nhabijões, Mero e Santa Helena.
 
Quanto à ocupação branca, ela é muito pequena assim como a caboverdianna, limitando-se quase só a comerciantes e funcionários.
 
(2) Zona controlado pelo IN

Todos os dados de que se dispõe são estimados e as notícias contraditórias. Podem,os contudo, sem grande margem de erro, avaliar em cerca de 5400 pessoas, na sua maioria de etnia Balanta, Beafada  ou Mandinga, a população controlado pelo IN no Sector L1  dividida pelos seguintes núcleos:
- A NW do Sector, espalhada pelso reguados do Enxalé e do Cuor - 1900 pessoas.
- No Regulado do Xime, ao longo do Rio Corubal, e a sul da Ponta do Inglês - 2000 pessoas.
- No Regulado do Corubal, ao lonmgo detse rio e para jusante da foz do rio Pulom - 1500 pessoas.

(Continua)

[ Revisão / fixação de texto  / quadro: L.G.]



Guiné 1969/71 > Croquis do Sector L1 / Zona Leste (Bambadinca) (vd. Sinais e legendas). O Sector L1 era basicamente constituído por 5 regulados: Enxalé e Cuor, a norte do Rio Geba; Xime, Corubal  e Badora, a leste do Rio Corubal. No regulado de Bissari, não havia população controlada pelas NT.

Em 1970/72, o BART 2917 estava sedeado em Bambadinca, com três unidades de quadrícula em Xime e Enxalé (CART 2715), Mansambo (CART 2714) e Xitole e Ponte dos Fulas (CART 2716).


Fonte: História da CCAÇ 12: Guiné 69/71. Bambadinca: Companhia de Caçadores nº 12. 1971
Infogravura: © Luís Graça (2005). Direitos reservados.

Guiné 63/74 - P6412: José Corceiro na CCAÇ 5 (11): Boas recordações de militares da CCAÇ 5, Canjadude - O Tripa


1. Mensagem de José Corceiro* (ex-1.º Cabo TRMS, CCaç 5 - Gatos Pretos , Canjadude, 1969/71), com data de 11 de Maio de 2010:

Amigos Luís Graça, Carlos Vinhal, J. Magalhães.
Grato pela atenção, que possa ser dada à recordação dum militar da CCAÇ. 5, que era Nativo, O “Tripa”.

Um abraço
José Corceiro



José Corceiro na CCAÇ 5 (11)

BOAS RECORDAÇÕES DE MILITARES DA CCAÇ 5, CANJADUDE


Há de facto memórias que povoam o nosso consciente adormecido, que ao serem estimuladas, desencadeiam nas nossas lembranças, processos de regressão às nossas vivências na Guiné, e nos trazem à mente acontecimentos que recordamos carinhosamente com saudade, (sentimentos de afectividade) ainda que com dubiedade… pois no mesmo local também foram vividos momentos angustiantes e com legítima revolta.

Quando cheguei à CCAÇ 5, Canjadude, (rendição individual, Companhia de Nativos) o dia 13 de Junho de 1969, ganhei logo a estima, (quase que poderei dizer que houve empatia mutua), de um militar nativo, que sem me conhecer, se dirige a mim respeitosamente, mas com galhofice, mais ou menos nos seguintes termos:

- Bu tchiga na és Canjadude cá eh periquito bu sibi dirito salta nha mi ombro (acabas de chegar a Canjadude, ainda és periquito, salta no meu ombro).

Foi mais ou menos isto que disse, mas ao confrontar-se com a minha expressão facial a denotar ignorância, perante tal monólogo e estranhar a minha reacção de acanhamento e silêncio, rematou logo de seguida:

- Nosso Cabo, apresenta-se o teu “Alferum Tripa” um soldado às tuas ordens!

Entabulámos diálogo e constato, logo ali, que o “Tripa”, como ele dizia ser o seu nome, falava razoavelmente bem português e gostava de cerveja e particularmente de vinho. Sabia o seu nome verdadeiro, que já não me lembro, pois todos o chamávamos por “Alferum Tripa”e em idade devia estar próximo dos 27, 28 anos.

FOTO 1 > Corceiro e o “Tripa”. Quando cheguei a Canjadude, na parada, são visíveis atrás de nós duas “Tabancas”, sendo uma armazém de material e a outra o posto clínico, posteriormente desapareceram.

O “Tripa”, era único, distinto de todos os militares Nativos da CCAÇ 5, com o seu comportamento e características, “sui generis”. Tinha uma postura singular perante as adversidades da vida, que não é muito comum no ser humano, assim como era ímpar a conduta de comunhão social, que ele cultivava com todos os militares, quer com os Nativos, quer com os Metropolitanos, com os quais ele preferia relacionar-se e no seio dos quais era estimado. Muitas vezes ficava-me a dúvida, se alguns militares Nativos o ignoravam e marginalizavam, afastando-o da sua convivência, ou se era ele que voluntariamente se excluía desses relacionamentos. Era um homem que aparentemente não manifestava conflitos nem distúrbios psíquicos (parecia não haver exigências internas contrárias) e as desavenças interpessoais que surgiam do relacionamento com os elementos do meio circundante, sabia contorná-las com dose bem aferida de humor e, às vezes até com diplomacia.

O ”Tripa”, aparentava ter o dom e a bem-fadada sina, de estar sempre em paz com a vida que vivia, despreocupado, sem exigências, sempre alegre e a rir, ar brincalhão, disponível para socorrer o seu próximo, sempre interesseiro quando a migalha fosse alguma sorvedura de bebida alcoólica. Tinha sempre na ponta da língua, reposta enquadrada com humor, hilaridade e correcção, para dar troco às questões de controvérsia com as quais era confrontado, no dia-a-dia, sem nunca distinguir cor de pele, divisa ou galão, a todos respondia com descontracção, a mesma espontaneidade e contenção, sendo parcimonioso quando o momento o aconselhava. Era de etnia Papel, vivia sem família nenhuma em Canjadude, embora dissesse que tinha mulheres e filhos.

Conforme a circunstância, por vezes arranchava-se no Aquartelamento, outras vezes não, agia segundo as conveniências do momento e, qualquer toca ou terreiro eram para ele um palácio.

FOTO 2 > Fui dar com o “Tripa” a cozinhar em Nova Lamego, à sombra do”Poidão”. Um “Chalé” de cinco estrelas, visto ser um lugar sagrado dos Nativos.

Não tinha a mínima réstia de complexo devido à cor da sua pele, mais lhe servindo a mesma, para fazer humor e chacota. Segundo dizia, trabalhou desde criança até ingressar no Exército, como estivador no Porto de Bissau onde se instruiu e tirou o curso da escola da vida, a carregar e descarregar barcos. Não sabia ler, e tinha uma imaginação fértil.

FOTO 3 > O Costa, Operador Cripto, que ao terminar a comissão ficou a viver em Nova Lamego, a escrever uma carta do “Tripa”.

Logo nos meus primeiros dias de estadia em Canjadude, o “Tripa”, muito convicto, com um ar de ingenuidade, mas apresentando-se seguro que está a convencer o mundo inteiro, diz-me:

- Nosso cabo, (era assim que ele me tratava) quando eu nasci a minha pele era completamente branca, só ficou preta já eu tinha 18 anos. Eu tive um acidente de trabalho quando estava a ser construída a auto-estrada entre Lisboa e Vila Franca de Xira, eu era o responsável pelo aquecimento dos bidões de alcatrão, e num descuido meu, caí para dentro dum bidão cheio, ficando unicamente por cobrir de alcatrão, as plantas dos meus pés, essa a razão porque ainda hoje são brancas. Foi após este acaso na minha vida e, para melhor ambientar o meu corpo, que ficou com a pele que o cobre toda negra, que resolvi imigrar para a Guiné, onde me tenho dado muito bem.

Noutra altura, digo eu para o “Tripa”:

- Tu tens as mulheres em Bissau, não seria mais prático que elas estivessem aqui a viver contigo na Tabanca?

Resposta imediata dele, como se estivesse à espera da minha observação:

- Isso é que nunca, eu assim vou-me servindo com as mulheres de todos e ninguém vê, nem mesmo Alá, porque eu fico de costas. Quando o nosso cabo quiser bajuda, é só dizer…

Eu ainda o tentei convencer que ele estava vulnerável e exposto à mesma fragilidade, por não estar a dar assistência e companheirismo às esposas, como devia, mas ele argumentou que a água lavava tudo, só não limpava o alcatrão da pele dele, porque se tinha demorado a banhar-se após ter caído para o bidão.

FOTO 4 > Foto que tirei ao “Tripa” numa operação no mato.

Muitas vezes, em saídas para o mato, em que eu ia e por coincidência também saia o Grupo de Combate em que o “Tripa” estava integrado, ele disponibilizava-se para me levar algum material, para me aliviar o peso e, algumas vezes oferecia-se para me transportar no pescoço dele, para passar ribeiros duma margem para a outra, (na época das chuvas) pois ele tinha de altura mais de 1,80m, e era uma maneira de eu passar sem molhar os pés. O interesse dele por estes préstimos, era a esperança que eu lhe pagasse uma cerveja ou lhe desse o copo de vinho das refeições, que ele adorava e eu raramente bebia, porque o “vinho” eram mais poses do que água e, sempre que eu não trocava o vinho pela fruta a outro camarada (porque não havia fruta) ele lá estava às horas das refeições, para poder apanhar alguma gota de vinho, o que lá ia acontecendo, ou de um, ou de outro militar.

Há uma ocasião em que o “Tripa”, se prontificou a lançar-se numa aventura irreflectida e perigosa, só para beneficiar de mais uns copitos de vinho. A culpa para esta atitude irresponsável, não foi tanto só do “Tripa”, ele acima de tudo quis ser prestável. Após a chegada de uma operação do mato, ao conferir-se o material de Transmissões, verificou-se que faltava um emissor/receptor - AVP1 (Banana). O nosso amigo Nora, de Transmissões, que tinha saído na operação, quando chegou ao aquartelamento e se contabilizou o material que se usou, verificou-se que faltava um AVP1. Entretanto, o Nora, lembrou-se onde tinha deixado, por esquecimento o aparelho, a cerca de sete ou oito quilómetros de distância de Canjadude, para os lados do Cheche. Não se deu conhecimento do facto, a não ser a uns quatro ou cinco elementos da nossa Secção. Posto isto, alguém sugeriu que a solução do problema podia estar nas mãos do “Tripa”, visto que ele estava no momento e no local onde se deixou por esquecimento o aparelho.

Ao tentar um esclarecimento junto do “Tripa”, este disponibilizou-se de imediato para recuperar o aparelho e, insensatamente a sugestão dele foi aceite. Vai daí, o nosso amigo, camuflado de caçador incógnito, lançou-se, quase ao anoitecer, à aventura da reconquista do AVP1. A missão foi cumprida com alto grau de eficiência e, pouco mais passaram de três horas, após o início da aventura, já o “Tripa” dava sinais de satisfação, com o seu troféu de caça embandeirado e a reclamar o prémio da merecida recompensa.

Seja-me permitido que inclua neste artigo, com a devida vénia, uma passagem do “Poste 5987”, cujo artigo foi enviado pelo nosso amigo José Martins, em que o Sr. Coronel, Pacífico dos Reis, a determinada altura diz o seguinte:

“ Certa vez, [Em Canjadude] quando fazia a minha ronda nocturna senti um ruído, como que um gorgolejar, atrás de uma porta. Afastei-a e encontrei sentado no chão um militar africano bebericando uma cerveja. Não resisti e perguntei-lhe porque estava a beber sendo ele islamizado. Depois de se pôr em sentido, dum salto, a resposta veio célere: - “Meu capitão, Alá não me vê atrás da porta”.”

A personagem deste episódio foi o “Tripa”, que estava a beber uma cerveja no Refeitório das Praças e apercebeu-se, pelos orifícios da parede (esteira de bambu) que o Sr. Capitão se estava a dirigir para aquele local. O “Tripa” aproveitando a porta de ligação que existia entre o Refeitório e a Caserna, refugiou-se nesta, onde o Sr. Capitão o encontrou e questionou. Eu estava em Canjadude, na época do acontecimento.

FOTO 5 > O “Tripa” no refeitório, durante a noite, à espera da hora para o render das sentinelas. Vê-se atrás, a porta da caserna onde se refugiou e, o Sr. Capitão, Pacífico dos Reis, o apanhou a beber a cerveja.

O dia 27 de Outubro de 1969, houve coluna de reabastecimento a Nova Lamego, foi muito azarada, pois no regresso tiveram nove furos nos pneus das viaturas. O “Tripa”, que também ia na coluna, caiu duma viatura em andamento. Ficou muito mal tratado, pois fracturou três ou quatro costelas, sofreu escoriações por todo o corpo, contusões e edemas nos membros, e um ou outro ferimento mais profundo. Mesmo no estado lastimável em que se encontrava, todo empanado, não perdia a oportunidade e boa disposição e dizia, que se tinha acidentado, num momento menos feliz da sua vida, porque Alá fechou os olhos e ia adormecendo, de forma que não pôde ampará-lo e protegê-lo, na queda.

O “Tripa”, é um dos muitos militares Nativos que me despertam saudades, estou a enveredar esforços no sentido de o poder descobrir, caso ainda seja vivo, pois já localizei dois Gatos Pretos em Bissau e já tenho algumas fotos recentes de Canjadude.

Para todos um abraço
José Corceiro

Foto 6 > Dia 3 de Março de 1970, houve uma grande operação no mato, ficando pouco pessoal no Aquartelamento. Tive que fazer serviço durante a noite, para acompanhar a distribuição dos homens de sentinela, (homens das fotos) pelos postos de vigia. Da direita para a esquerda: Jorge, Saldanha, “Tripa”, Romano e (?).

Foto 7 > Da direita para a esquerda: “Tripa”, Saldanha, Romano e (?).
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 5 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6320: José Corceiro na CCAÇ 5 (10): Dia de Fanado em Canjadude

Guiné 63/74 - P6411: Em busca de... (131): Fui à Festa da Flor em demanda do camarada Rui Alberto (António Tavares Oliveira)

1. Mensagem do nosso novo camarada António Manuel Tavares Oliveira, ex-Fur Mil da 3.ª CCAÇ/BCAÇ 4615/73, Bassarel, 1973/74, com data de 11 de Maio de 2010:

Há passos que vale a pena dar.
Mais tarde ou mais cedo colhemos os frutos.


Fui à Madeira, à Festa da Flor, mais para aproveitar encontrar um camarada que esteve comigo na 3.ª CCAÇ/BCaç 4615, sediado em Bassarel, Teixeira Pinto.

Através do Núcleo do Funchal da Liga dos Combatentes e graças à simpatia, disponibilidade e entrega de ajuda do Tenente-Coronel Laureano, a quem estou muito grato, conseguimos descobrir o contacto do Rui Alberto Pereira Francisco. Mas todo o esforço depois efectuado em entrar à fala com ele, foi em vão. Não consegui que ele me abrisse a porta.

Está um pouco mal, vim saber.

No entanto, deixei um amigo a tentar obter dados e o obter informações. Tivemos aí sim sucesso. Conseguiu encontrá-lo e colocou-o a falar comigo, através de telemóvel.

Verificamos realmente que ele não está muito bem, mas mesmo assim esse amigo, conseguiu sacar-lhe o contacto doutro camarada de armas, o Barrigana, Carlos Gonçalves de seu nome, madeirense, com quem tenho mantido contactos.

Carlos Vinhal, peço que coloques esta descoberta na tua página e passes a palavra a toda a gente de Teixeira Pinto.

Anexo uma foto



Cumprimentos
António Tavares
Ex-Fur Mil Oliveira
antavol@hotmail.com
__________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 21 de Novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5311: Tabanca Grande (189): António Manuel Tavares Oliveira, ex-Fur Mil da 3.ª CCAÇ/BCAÇ 4615/73 (Os Pifas), Bassarel, 1973/74

Vd. último poste da série de 8 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6345: Em busca de ... (130): Três militares, três velhos amigos do meu tempo de infância, em Bissau: os gémeos Mário e Chico e o futebolista Lino (Nelson Herbert, filho de Armando Duarte Lopes, atleta da UDIB)

Guiné 63/74 - P6410: Ao correr da bolha (Torcato Mendonça) (10): O saco do Zé Paz D'Almas

1. Mensagem de Torcato Mendonça, ex-Alf Mil AT Art da CART 2339, Mansambo, 1968/69, com data de 10 de Maio de 2010:

Caro Carlos Vinhal
Obrigado pela info do comentário da 2404.
Como é o teu tempo? Dilata?

Posso estar equivocado. Posso mesmo estar a ler mal. Posso o que quiseres... certo é que resolvi enviar um escrito diferente. Depois de guerras, depois de controversias (não da Série do Blogue), depois disto e daquilo, lembrei-me de algumas "coisas" que dizem.

Desopila, alivia o enjoo, pode ser mezinha e vai em anexo.
Tenho outro anexo. Não vai agora. Um dia segue como Estória de Mansambo que é. Facto a marcar-me para sempre e que escritos de Bolha ou mezinhas do Zé Paz d' Alma, coisa séria e acredita quem quer, não podem aliviar. Quanto mais curar.

Um abraço amigo do
Torcato


AO CORRER DA BOLHA - X

O SACO do ZÉ PAZ d’ALMAS


O Paulinho… Paulito… ou Paulocas. Não era este seu nome. Lá por casa e por alguns amigos, era assim chamado.

O padrinho, homem de posses e mau génio, tinha-o baptizado por Paulino. Nem mais, Paulino como o avô do padrinho. Homem velho, bigodes retorcidos, corrente de oiro na jaqueta, olhar a bater fundo e, ainda a custo, montador de alguma das incautas donzelas que, de quando em vez, para a família Paulino iam trabalhar nas artes domésticas.

Por mor disso acontecia, raramente agora, a interrupção do ciclo de alguma. Raios e coriscos se levantavam pela Maria, a olheira de tudo, velha que já fora donzela e tudo topava. A governanta-mor Maria, antes de o inchaço aparecer, falava de pronto com o avô do padrinho do Paulinho, Paulito ou Paulocas que, como o afilhado, se chamava Paulino.

- Patrão Paulino aquela moça coitada, a filha da Alzira lavadeira, parece que devia consultar o Dr. Leónidas.

- Trata disso e eu logo falo com ele. Respondia, enrolando as pontas da farta e já alva bigodaça, o velho.

Foi crescendo o Paulinho, Paulito ou Paulocas e era tratado como se fosse filho do padrinho, solteirão empedernido, com mulher de casa posta na vila, mais amante, contudo, das cartas e de festanças do que de donzelas.

Cresceu rápido o afilhado Paulino e nos estudos nada deu. Nada.

Um dia foi às sortes e passado um ano, nem tanto, abalou para um quartel.

Por lá andou aos saltos, cambalhotas e “desenfianços”. Só que quartel militar é diferente e foi apanhando “porradas” como diziam, em violação às regras ditas e impostas por oficiais e sargentos, mais estes que aqueles, com caras escanhoadas e marmóreas, modos bruscos e que berram de pronto. Até pareciam terem olhares na nuca.

Não estava, a isso, habituado o Paulino afilhado. Tanta levou que um dia se viu despachado para uma colónia, não penal mas de lugar, de lugar ou província que diziam ser o ultramar. Como era franzino ou fraco de aspecto, ficou logo na que mais perto se encontrava: - Guiné.

Tenta o padrinho a cunha, o pedido, a troca mesmo em paga a outro e nada. Nada livra o afilhado da ida até terras distantes.

Abalou num barco, o Paulino e uns centos de mancebos Tejo abaixo, com muitos lenços, deles e de quem em terra ficava, a abanarem despedidas e a lançarem desejos de regressos rápidos.

Lá se foi o Paulinho, Paulito ou Paulocas como a velha Maria ainda o tratava.

O avô do padrinho, para mais um desgosto deste, finou-se pouco depois. Não de desgosto. Não. Finou-se de esforço de “caça”, num final de quente tarde, a meio do Verão em pleno Agosto.

Por lá, pela Guiné, andava o Paulino, o soldado Paulino, esperto e desenfiado, mesada certa ida da Metrópole. Talvez isso tenha contribuído para mais uma ou duas “porradas” a cortarem vinda de férias. Fartou-se, definitivamente, daquela gente da tropa, daquele calor e mosqitagem de ferroada fácil.

Fartou-se daquilo tudo e tudo fazia para esquecer.

Um dia voltou. Finalmente.

Voltou diferente o Paulino. Mais magro, macilento, olhar afundado e ausente, sorriso apagado.

O velho Dr. Leónidas tentou tratá-lo mas desistiu.

- O tempo cura isto, sentenciou.

Não curou nada. Certas noites, levantava-se em sobressaltos e em muitos dias com toda a gente praguejava.

O padrinho aguentou, aguentou e um dia despachou-o para clínica recomendada. Passam uns tempos e as notícias eram ou pareciam ser boas. Diziam os clínicos: - O Paulino recupera bem. Estas eram as noticias que acompanhavam a conta mensal.

O padrinho e a Maria, já a andar de tripé e bengala, acreditavam.

A Antónia, já entrada na idade e substituta de Maria governanta-mor, não acreditava. Tanto assim que foi falar, em segredo claro, com o Zé Paz d’Almas. Agradeceu a visita e confiança nele depositada, benzeu, lançou água benta, fez rezas, mezinhas e disse:

- Aquilo acontece Tóina. Acontece. Tenho visto casos assim. Passa. Passa de certeza e eu vou tratar dele. Se não passar há a corda e o saco.

- A corda e o saco? Diz aflita, benzendo-se a Antónia.

- Sim mulher.

Se ele voltar a ter aflições, falar sozinho, pesadelos no sono, tens que o convencer a usar o saco.

A Antónia olha desconfiada, ouve com atenção o Zé Paz d’Almas e, antes de sair deixa-lhe um cesto com uns mimos.

Passa o tempo e volta a Antónia.

Conversa com Zé Paz d’Almas. Retorna a casa com o cesto, a corda, o saco benzido e todas as recomendações de convencimento do curandeiro.

Anos depois, não muitos, o Paulino, o Senhor Paulino, quando sente qualquer aflição, tormento ou contrariedade a virem, desce à cave, abre a porta, ao lado da porta da adega e agarra o saco.

Calmamente abre um pouco a boca do dito e mete lá a sua. Fala então, desabafa os tormentos e, diz a Antónia, por vezes até urra.

Rapidamente ata-o com a corda e volta a pendurá-lo.

Sai aliviado, sorridente mesmo.

Zé Paz d’Almas morreu recentemente e a Antónia está velha demais. Dizem.

Também parece haver muitos sacos e substitutos. Dizem.

Zés Paz d´Almas parece que não. Dizem.

Dizem cada uma… mas dizem.


NOTA: qualquer comparação, de alguém com o Paulino é pura maldade. Não sei dele. Não deve ter telemóvel e não sei onde vive.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 16 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6404: Ao correr da bolha (Torcato Mendonça) (9): Páscoa de 1968

Guiné 63/74 - P6409: Notas de leitura (106): Bissau Em Chamas, de Alexandre Reis Rodrigues e Américo Silva Santos (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso Camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil At Inf, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 28 de Abril de 2010:

Queridos amigos,
No estrito cumprimento do dever, li “Bissau em Chamas” num recanto de Maiorca, à espera de sol que chegou prazenteiro a anunciar o Verão.
Peço licença para voltar a importunar os tertulianos, preciso da ajuda de todos aqueles que têm bibliotecas onde constem autores que escreveram sobre a Guiné nos anos 80 e 90. Será que me podem dar notícias desses autores e desses títulos? A todos ficarei reconhecido, é público e notório que só pretendo proceder ao inventário que facilite a vida aos estudiosos de amanhã.

Um abraço do
Mário


Nota introdutória:

“Bissau em chamas”
tem a ver com uma dolorosa guerra civil que devastou a Guiné-Bissau, cindiu a sua classe política, deixou a população moralmente desfeita. O blogue não fica indiferente a todos os seus amigos guineenses, vivem na Guiné-Bissau tertulianos e muitíssimos leitores.

Trata-se de um relato da participação portuguesa nos acontecimentos, enumera as diligências diplomáticas e o auxílio prestado a todos os refugiados. O ex-presidente da República, Jorge Sampaio, enaltece o comportamento das forças militares e civis intervenientes e a capacidade da CPLP – Comunidade dos Países de Língua Portuguesa prestarem solidariedade nas horas sombrias da vida de um dos seus irmãos.


Bissau em chamas:
O golpe de Estado e a guerra civil na Guiné-Bissau em 1998


por Beja Santos

Em Junho de 1998, Portugal vivia momentos de grande euforia, sobretudo a Expo 98 provocara uma onda de entusiasmo e autoconfiança com a nossa capacidade de organizar um grande empreendimento. Logo a seguir às comemorações do 10 de Junho, alguns dos navios incluídos na parada em frente à Expo partiram para um pequena grande aventura: seguiram para a Guiné para resgatar todos os portugueses que viviam angustiados o tumulto de uma sanguinolenta guerra civil, desencadeada no dia 7 de Junho. Em complemento desta operação de resgate, nos canais diplomáticos, procurou-se promover a reconciliação das partes envolvidas em conflito. A história desta crise política, e a resposta portuguesa, política e militar, na sequência do golpe promovido por uma Junta Militar chefiada pelo brigadeiro Ansumane Mané é a razão de ser do livro “Bissau em Chamas”, por Alexandre Reis Rodrigues e Américo Silva Santos (Casa das Letras, 2007).

“Bissau em Chamas” relata a acção das Forças Armadas e da diplomacia portuguesa a várias vozes. É uma narrativa centrada na acção empreendida por Portugal, de colaboração com outros países que procuraram mediar o conflito. Tudo começou a 7 de Junho de 1998 e durou até 7 de Maio de 1999, dia em que Nino Vieira se recolheu à Embaixada de Portugal em Bissau e daqui seguiu para o exílio em Portugal.

O pretexto para o levantamento de Ansumane Mané foi a acusação pelo presidente Nino Vieira de incúria no controlo dos paióis de material de guerra do Exército guineense, o que teria permitido o desvio de material para o movimento independentista de Casamansa. Mas o pano de fundo desse pretexto passava por um descontentamento estrutural: agravamento das condições de vida, profunda crise económica, tensões internas nas Forças Armadas, atraso na organização das eleições legislativas, entre outras dificuldades. O PAIGC dava sinais de grandes divisões que se foram transferindo para o campo militar. Quando eclode o golpe de Estado, em escassas semanas, demarcaram-se os apoios aos partidários de Nino e aos da Junta Militar. Nino pediu ajuda internacional ao Senegal e à Guiné Conacri. Em Bissau, irão combater ao lado de Nino tropas senegalesas e conacri-guineenses e ao lado de Ansumane Mané Bissau-guineenses sublevados, as populações puseram-se em fuga, ninguém ignorava que o conflito estava para durar.

O embaixador português, Henriques da Silva, foi confrontado com o problema imediato com a protecção dos portugueses residentes na Guiné-Bissau. A partir da manhã do dia 7, a embaixada portuguesa foi se enchendo de refugiados. A obtenção de informações era vital para a protecção de todos que se refugiavam na embaixada, havia que retransmitir tais informações às autoridades portuguesas ao mais alto nível. Por último, havia que tentar negociar com as partes beligerantes a segurança das pessoas, incluindo os estrangeiros e procurar abrir canais para negociações entre as partes em conflito.

Felizmente, e relacionado com as comemorações do 10 de Junho, que a embaixada tinha encomendado mantimentos em quantidade apreciável. Como mais tarde escreveu Henriques da Silva, quem se refugiou na embaixada passou a comer “arroz com 10 de Junho” ou “massa com 10 de Junho”, tudo servido em pratos de cartão com dois croquetes, pastéis de bacalhau ou rissóis de camarão. O cargueiro “Ponta de Sagres” chegou no dia 11 de Junho e trouxe um alívio momentâneo a estes problemas, mesmo com o porto de Bissau bombardeado com mísseis katyushas e morteiros pesados. Ao longo de dois meses de conflito, com o contributo de navios nacionais e navios franceses, foram evacuadas 2450 pessoas.

O governo português accionou os mecanismos de solidariedade e consulta com a CPLP, em 27 de Junho iniciaram-se as tentativas de mediação, muitíssimo muito mal aceites pelo governo de Nino. De Julho para Agosto, o processo evoluiu, se bem que precariamente, e só com a Paz de Abuja, em 1 de Novembro de 1998 é que a Junta Militar obteve reconhecimento internacional. Nessa altura, Nino estava reduzido ao Bissauzinho e algumas ilhas dos Bijagós. O resto é bem conhecido: a Junta Militar venceu de armas na mão; as tropas da Guiné-Conacri e do Senegal tiveram um comportamento de inépcia e derrotismo inesperados; depois os dirigentes da Junta (Ansumane Mané, Veríssimo Seabra e Lamine Sanhá) foram assassinados; Kumba Ialá ascendeu ao poder e depois foi deposto, seguindo o retorno triunfal de Nino que viria a ser chacinado depois de abandonado pelo seu círculo de sicofantas e até pela sua guarda pessoal.

“Bissau em Chamas” relata as operações de resgate, colhe os depoimentos dos cooperantes que andaram transviados, o general Espírito Santo descreve a Operação Falcão no âmbito do Plano Crocodilo, múltiplos comportamentos briosos e anónimos são passados em revista, bem como a cobertura noticiosa através do olhar de alguns jornalistas. Igualmente a mediação diplomática é descrita ao pormenor até ao momento dos acordos que eram considerados indispensáveis para a reconciliação nacional. O prefácio é da responsabilidade de Jorge Sampaio.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 10 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6361: Notas de leitura (105): Guiné, Sempre!, de Piçarra Mourão (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P6408: (Ex)citações (72): A dolce vita de Bambadinca: Os lagostins do Zé Maria, pescados pelo barqueiro do Enxalé em "zona vermelha"... (Luís Graça)


Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > 1969 > Na tasca do Zé Maria, comendo lagostins do Rio Geba e bebendo umas bazucas... A dolce vita dos nharros de 1ª classe da CCAÇ 12 (ou tugas de 2ª classe, como a gente depreciativamente se classificava a nós próprios): na ocasião, o Alf Mil Cav Rodrigues (já falecido, há uns anos) e os furriéis milicianos Tony Levezinho e Humberto Reis, meus queridos amigos e membros desta Tabanca Grande. A chapa foi batida - salvo erro - por mim, membro assíduo desta tertúlia gastronómica.

O barqueiro do Enxalé, celebrizado por Spínola,  apanhava estes magníficos lagostins de rio, que depois o Zé Maria comprava e que a gente pagava a peso de ouro (50 pesos o quilo!)... O preço era justificado pelo risco...  (50 pesos era o equivalente a dois dias de alimentação de um militar na Guiné, ou uma noite no Pilão ou a uma garrafa de uísque novo...).

Lembras-te, Humberto Reis ? Lembras-te, Tony Levezinho ? Ao Alferes Rodrigues já não posso perguntar, por que já não está entre nós (Paz à sua alma!, fizemos operações conjuntas, foi também vítima - tal como eu e o Marques - da mina A/C em Nhabijões, em 13 de Janeiro de 1971).

E a propósito, o que será feito do tuga Zé Maria, que tinha fama (e se calhar proveito) de rezar a Deus (as NT) e ao Diabo (o PAIGC) ? Ainda estará vivo ?  Sei que era amigo do nosso alfero... que parava lá,  para o  último copo, antes de atacar a bolanha de Finete a caminho de Missirá (a partir de 19 de Outubro de 1970, trocara Fá Mandinga por Missirá...) (*).

O pobre do Zé Maria, que era tuga, tinha fama de ser turra... e fazia-nos pagar caro os lagostins, "pescados em zona de grande risco" (sic) ... entre o Enxalé e o Mato Cão, muito possivelmente pelo barqueiro do Enxalé que o Spínola, em visita ao Destacamento, em 19 de Dezembro de 1970, achava que "pescava em zona vermelha" , e que com isso o tornara famoso... (**).

Foto: © Humberto Reis (2006)

1. "Mas ainda melhor que as mulheres, é o vinho que faz esquecer as mulheres" (Luís Pacheco) ... E da água de Lisboa, camaradas ? Que me dizeis ? Muitos hectolitros de cerveja (bazuca), vinho verde (!), vinho a martelo, água do Poço do Bispo, surrapa, uísque escocês, uísque de Sacavém , cuba livre, água suja do imperialismo (coca-cola), a gente bebeu, do Cacheu ao Rio Grande Buba, passando pelo Geba e o Corubal !!!

 Parafraseando esse poeta maldito, Luís Pacheco (que nos deixou há uns tempos),  bem podíamos dizer que melhor que as bajudas, era a água de Lisboa que nos fazia esquecer as bajudas, todas as bajudas do mundo, as de Lisboa e as de Bafatá, Bolama, Barro, Bambadinca, Guileje, Bigene, Binta, Guidage, Xitole, Mansambo (não havia!!!), Candamã, Afiá, Satecuta, Xime, Fá, Missirá, Sare Gana, Geba, Banjara, Cantacunda, Contuboel, Olossato, Empada, Buba, Mampatá, Quebo, Cansissé, Canjadude, Cheche, Madina do Boé, e por aí fora...

Eu costumo lembrar aos filhos e aos meus amigos mais íntimos que fui para a Guiné com uma mala cheia de livros (à espera de umas férias tropicais!) e ao fim de seis meses havia dias que era capaz de beber uma garrafa de uísque por dia... com água de Perrier.  (Bom, agora que já me confessei, espero que o meu fígado me perdõe)...

Na Guiné, em Mansambo ou em Madina, o que fazia mal ao fígado fazia bem à alma... Não sei o que teria sido a guerra sem a nosso uisquinho com duas pedras de gelo e um bocado de Perrier... O nosso bendito Scotch... "For the Portugese Armed Forces from Scotland with love"... 

Ainda diziam que não tínhamos amigos e aliados! Todos nos ajudavam. Até o Zé Maria1 Até o barqueiro do Enxalé! Até os camaradas do PAIGC que deixavam o barqueiro apanhar lagostins  no Geba Estreito, antes da Foz do Corubal... e, claro, ao Zé Maria comprá-los ao barqueiro, cozê-los e servi-los, esplêndidos, vermelhos, bem temperados com um toque de jindungo q.b., na esplanada do seu bar com vista para o Rio...  Ah!, a dolce vita de Bambadinca!...   
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Notas de L.G.:

(*) Sobre o Zé Maria, há uma deliciosa estória cabraliana, que é obrigatório ler ou reler:

18 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1534: Estórias cabralianas (19): O Zé Maria, o Filho, Madina/Belel e um tal Alferes Fanfarrão (Jorge Cabral)

(...) Bambadinca era então para o Alferes, feito nharro de Tabanca, a Cidade. Para lá ir, fazia a barba, aprumava o seu único camuflado apresentável, munia-se de alguns pesos e, acima de tudo, preparava o relim verbal sobre ficcionadas aventuras operacionais, que iriam impressionar o Comandante.

Antes de entrar no Quartel, habituara-se a abancar no Gambrinus local, o tasco do Zé Maria, bebendo, petiscando e conversando. Um dia encontrou o Senhor Zé Maria, muito preocupado. O filho adolescente que estudava em Lisboa, ia chumbar.

Claro, logo o Alferes, prometeu interceder.
- Como se chama o rapaz? Que colégio? E o nome dos Professores?

Apontadas as respostas, descansou-o. 
– Amanhã mesmo já escrevo para Lisboa. (...)


(**) Vd. poste de 15 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6396: O Spínola que eu conheci (21): Fiquei com óptima impressão do subalterno Comandante do Destacamento do Enxalé (Benjamim Durães / Jorge Cabral / Luís Graça)