1. Em mensagem do dia 27 de Julho de 2012, o nosso camarada António José Pereira da Costa (Coronel de Art.ª Reformado, ex-Alferes de Art.ª na CART 1692/BART 1914, Cacine, 1968/69 e ex-Capitão de Art.ª e CMDT da CART 3494/BART 3873, Xime e Mansambo, 1972/74), enviou-nos esta história, no mínimo hilariante, para a sua série "A Minha Guerra a Petróleo":
A Minha Guerra a Petróleo (7)
Um Casal Estranho
Naquele tempo, mesmo no pior dos “buracos” surgiam sempre motivos para rir. É sempre assim. Nas situações mais difíceis, basta estarem dois homens juntos a tentar atingir um mesmo fim, para que as situações de humor surjam, ainda que por momentos fugazes. E ainda mais se os homens forem jovens. A história que vou contar é insólita, pode parecer fantasia, mas é verdadeira e só falharei num ou noutro pormenor de que já não me recordo.
Entrada do Quartel do Xime.
A devida vénia a CART 3494 & Camaradas da Guiné
O Xime era um quartel com fracas instalações que tinha, “acoplada” a nascente, uma pequena tabanca muito pobre, onde a população vivia nem eu sei bem de quê. Para lá dos espaldões dos três obuses 10,5 cm, dispostos em linha e apontados a Sul, e do último abrigo, surgia a terra-de-ninguém, atravessada longitudinalmente pelo que restava da estrada para a Ponta Varela e Ponta do Inglês.
Uma manhã, o furriel P., comandante de uma das secções de artilharia, procurou-me com ar muito grave, dizendo que
“peguecisava falague-me”. Era um rapazito do Porto, educado, provavelmente de boas famílias e que falava acentuando os
“egues”. Quando lhe perguntei ao que vinha respondeu-me que pretendia
“mandague vigue a minha esposa”. Perguntei-lhe para onde é que quereria trazê-la e, como me respondesse que era para o próprio Xime, fiquei sem ar. Tentei recordar-lhe que ali não tínhamos qualquer espécie de comodidade para lhe proporcionar. Não podendo habitar no aquartelamento, até por falta de espaço e de todas as outras comodidades mínimas, só restava a tabanca. Aí, não sei como seria. Não havendo casas ou partes de casa para alugar, só lhe restava construir uma morança igual às que já existiam, mas não creio que esta fosse uma saída possível.
O rapaz estava mesmo numa situação difícil com a
“esposa a fazegue peguessão pâga vigue” e sem ter local para a instalar. Não se vislumbrava uma solução. Poderia vir e ficar em Bafatá e aí eu não tinha nada contra, considerando que na cidade havia três pensões, com a qualidade mínima para a receber. Porém, a distância entre o Xime e Bafatá atingia as dezenas de quilómetros, o que o impossibilitava de manter um contacto frequente com a “esposa”. Expliquei-lhe também que, em caso de ataque ou flagelação do IN, ambos ficariam em sobressalto até cada um confirmar que o outro estava bem.
Fiz-lhe um apelo à condição masculina para que lhe explicasse que as senhoras não podem
“fazegue peguessão pâga” e nós cedermos, tanto mais que não se tratava de satisfazer um capricho, mas de uma situação concrecta que poderia tornar-se muito delicada. Terminámos a conversa, ficando o furriel P. de resolver a situação através de uma carta explicativa.
Eu suspeitava de que o furriel tinha feito como um outro camarada meu fizera, em 1968. Embora estivéssemos no último quartel do Sul da Guiné, o João descrevia à sua Cármen tudo como se nada tivéssemos para fazer. Além disso, o local era agradável – e era-o, de facto – e a unidade de milícia “é que desempenhava toda a actividade operacional” sob controlo do João. Este era o único ponto verdadeiro da descrição. Enfim, vivíamos no melhor dos mundos, comíamos ostras (muitas e boas), bebíamos sumo de laranja natural, os mangos e cajus eram de excelente qualidade e, às vezes, tínhamos boas refeições caça. Também conseguíamos peixe, através do pescador senegalês – o Turé, que falava francês e até comia pelicano assado – que abastecia Cacine, a meias com um português. O peixe podia ser
“poisson de segunda”, se fosse tainha, ou
“poisson de primeira”, se fosse qualquer outro peixe. Tudo isto era verdade, mas não era suficiente para que o quadro fosse bucólico e de tranquilo tinha pouco. E a Cármen acreditou, como eu vi, alguns anos depois, quando o João ma apresentou.
Agora não era assim e, uns dias mais tarde, o Furriel P. procurou-me para me dizer que a sua esposa continuava a pressioná-lo para que a deixasse vir para a Guiné. Que sim, que já lhe escrevera a tal carta, mas ela até ameaçava que um dia aparecia-lhe no quartel, sem avisar. Esforcei-me por dissuadi-lo de colaborar em semelhante loucura, mas não contei com uma intervenção do Alferes Gomes, meu ex-colega de liceu, embora mais novo, e agora sempre decido a resolver tudo bem e depressa. Tendo presenciado a nossa conversa, gritou-lhe:
- Olha, pá! Se ela aqui aparecer, sem avisar, tu enfias-lhe um murro na tromba que ela fica enterrada no tarrafo até aos ovários. E agora, vai lá escrever a carta e conta-lhe a verdade, para ela ficar a saber porque é que não pode vir para aqui.
A resposta do furriel foi espantosamente inverosímil:
- Só se o meu
“alfegues esqueguevegue”…
Achei que a conversa estava a passar das marcas e despedi o furriel. Afinal, estávamos na hora de almoço e as batatas cozidas que acompanhavam o atum de lata estavam a esfriar.
Alguns dias depois fui, mais uma vez, contactado pelo furriel P.. A “esposa” estava para chegar e ele pretendia trazê-la para uma das pensões de Bafatá. Combinei com o comandante do pelotão de Artilharia uma ida a Bissau
“para tratar de assuntos do pelotão” e ele seguiu, com a indicação de que, na segunda-feira seguinte, deveria estar no Xime. Ia haver mais um passeio à Ponta Varela e imediações e eu queria ter a artilharia bem guarnecida e pronta para colaborar nas festividades, se necessário.
Porém, no domingo, o furriel P. não apareceu. Lá fomos ao passeio e, dessa vez, as festividades ficaram-se por mais uma estafa, algumas horas de sede e muito tempo de atenção difusa.
À chegada, o furriel esperava-me com uma carta do capitão comandante do E.Rec de Bafatá em que este assumia a responsabilidade da falta, por o ter aconselhado a ficar mais um dia e assim poder aproveitar um reconhecimento que o esquadrão ia fazer para os meus lados para se apresentar. Portanto, desculpei e tudo ficou bem por ter acabado bem.
A partir daqui, tudo se passou num galope de acontecimentos. Dois dias depois conheci a esposa do furriel. Foi transportada ao Xime por um comerciante e madeireiro, estabelecido em Bafatá, que vinha ao cais despachar algumas toneladas de madeira, conduzindo o seu Mini 1275 GT. Além dela, trazia mais duas senhoras mais velhas: a sua própria esposa e uma amiga desta.
Xime > Messe de Oficiais
Recebi-os naquilo a que se tinha convencionado chamar Messe de Oficiais, conversámos um pouco e eu admirei-me da coragem da jovem Celeste, que atravessava o quartel com uma mini-saia bastante diminuta. Feito o embarque, o “bólide” regressou, velocíssimo, a Bafatá com os seus ocupantes.
E chegámos ao domingo decisivo. Nos dois domingos anteriores eu tinha sido acordado por helicópteros que demandavam o Xime. No primeiro, os fuzileiros tinham desencadeado uma acção na Ponta Varela, sem colaboração das forças terrestres e queriam apoio de héli, negligenciando o de artilharia. No segundo domingo – o imediatamente anterior – o brigadeiro adjunto-operacional tinha vindo entregar-me um alferes que me faltava no efectivo da companhia. O helicóptero não solicitado ou previsto era habitualmente uma visita do General, com a correspondente inspecção e perguntas “de algibeira”. Eu tinha, portanto, sofrido dois falsos alarmes. Por isso, naquele domingo, revoltei-me e resolvi dar-me uma meia-manhã de descanso. Subitamente, batem-me à janela da rulote. Era o Dias do bar desorientadíssimo a gritar:
- Meu capitão! O gajo deu um tiro! O gajo deu um tiro!
Xime > Messe de Oficiais > Em primeiro plano o Cap Art.ª Pereira da Costa. À sua direita o Alf Mil Pereira
Imaginei o pior. Um suicídio, um acidente de tiro ou um ataque de loucura. Pensei que iria encontrar alguém gravemente ferido, agonizante, talvez morto. Visualizei, em poucos minutos, algumas situações aflitivas, mas, ao sair da “messe”, dei de caras com a “esposa” e, um pouco mais à frente, duas Chaimites estacionadas com as tripulações, descansando calmamente à sombra dos mangueiros. Tudo tinha sucedido no abrigo da artilharia. Ao entrar, vi o furriel P. de pé, arfando, mas não parecia ferido. O Mendes Pinto – furriel mecânico – sentado numa mala procurava acalmar o “artilheiro”. Quando procurei saber o que sucedera este respondeu:
- Capitão fui
cobáguede!
Vi então o que sucedera. Com uma G3, tinha procurado dar um tiro em si próprio, mas, por falta de jeito ou de convicção, acabara dando um tiro para o ar. Nessa altura, uma voz feminina atrás de mim indagou:
- Morreu?
Era demais. Saí, dirigi-me ao alferes que comandava a coluna do E.Rec e disse-lhe secamente, mas em voz baixa:
- Desaparece e leva isto daqui para fora!
Isto, como se calcula, era a inquiridora acerca do estado de morte do furriel P.. Enquanto as Chaimites arrancavam, regressei à messe. Aquilo, de comédia tinha pouco, mas poderia ter resultado numa tragédia e, se assim tivesse sido, nada haveria que a revertesse. Alguém, que não tinha que fazer, vinha perturbar o meu pouco sossego conseguido a custo, depois de ter sido aconselhada a deixar-se ficar na
“Ímbiqueta” quieta e calada, fazendo a vida que mais lhe aprouvesse. Graças a Deus, o promitente suicida tivera falta de coragem. Senão…
Que fazer agora? Tínhamos marcado para esse dia uma “Ranchada”, em Bafatá e eu resolvi que não seria este incidente que nos iria tirar a possibilidade de melhorar a nossa alimentação. Creio que o restaurante era a “A Transmontana” e, pela sua situação privilegiada, podíamos deixar as armas em cima das viaturas, enquanto comíamos. Organizei um patrulhamento auto, e seguimos até Bafatá. Quando íamos a sair, o furriel P. quis falar comigo.
“Queguia igue também a Bafatá pâga tegatágue da sua vida”.
A contragosto deixei-o ir. À chegada, separou-se de nós e só mais tarde eu soube para onde foi. Almoçámos com calma, tomámos o digestivo, descansámos e, na hora de regressar, comecei a constituir a coluna. Nessa altura, o P. surgiu e disse, mais uma vez, que
“peguecisava falague-me”. Como é de calcular, eu não estava com disposição para grandes conversas com ele e respondi:
- O que é que foi agora?
- Tenho
pegublema. A minha esposa não tem onde
duguemigue.
Não entendi logo o que se passava. Lembrei-lhe o que tínhamos combinado e que ele seguia connosco e ela ficaria na pensão onde estava hospedada.
- O
pegublema é que a minha esposa teve um
fegaquesa!
Imaginei um problema súbito de saúde. Uma quebra de tensão ou algo similar e indiquei-lhe o caminho para o comando do batalhão onde, provavelmente, o médico poderia ver o que passava. Mas não fora nada disso. Tinha tido uma fraqueza, sim, mas com um alferes da Cavalaria. Ao saber da desgraça, o marido manifestou a sua ira. Tinham discutido e ele até lhe tinha dado “dois tabefes”. Claro que, em face deste panorama de traição e violência doméstica, o dono da pensão tinha entendido que o melhor era pagarem a conta e, por consequência…
Lembrei-me, então, do dono do 1275 GT que também tinha uma pensão e a uma escola de condução, onde a malta da companhia obtinha as suas cartas com alguma facilidade, e fui-lhe pedir que recebesse a “jovem saneada”, ao menos por alguns dias. Parecia-me que a situação estava insustentável e que a retirada para a Metrópole era dado adquirido. A resposta foi esclarecedora:
- Depois duma “barraca" destas, se eu fizesse isso, a “Patroa” matava-me…
O tempo impunha que regressássemos ao Xime e não valeria a pena consultar a terceira pensão, considerando as proporções do escândalo. Como dizia o meu professor de História da AM
“o que preciso é dar um tiro para qualquer lado, só assim teremos algo para corrigir”. Resolvi “dar o tiro” e sentei a senhora no lugar do chefe de viatura dum Unimog 404. Rumámos ao Xime, sem passarmos por Bambadinca, não fosse o comandante do batalhão ser “informado” de que algo de estranho se passava…
No Xime havia festa. Tinha nascido a filhota de um dos furriéis e estava a organizar-se a correspondente refeição oferecida pelo feliz progenitor, seguida de fados e outras cantorias que a inspiração ditasse. A minha dúvida era agora saber onde o jovem casal desavindo iria pernoitar. Por prudência, resolvi afastá-lo da celebração que se desenhava. Não podia correr o risco de que algum conviva mais animado tecesse algum comentário despropositado ou criasse qualquer outra situação desagradável. Por isso cedi-lhes o terreiro central da nossa messe. Era uma área rectangular, cimentada, em cujos cantos haviam sido colocadas quatro rulotes, os nossos quartos. No centro, um alto tronco de palmeira cravado a pino, suportava o telhado de capim. Entre duas rulotes “funcionava” um bar. No
open-space (como hoje diríamos) assim constituído, tínhamos o nosso
living-room e a área de refeição. No
living, umas cadeiras de palha e uma baixa mesa de madeira. Uma outra mesa, cujo tampo nunca vi, pois tinha uma grande toalha de plástico permanentemente colocada, e umas cadeiras era onde tomávamos as nossas refeições. Do tecto pendia um candelabro, suspenso por uma corrente de ferro, com três garrafas de brandy, sem fundo, disfarçadas de
abat-jours. Além disso tínhamos um tabuleiro de xadrez/damas apoiado em quatro pés, a utilizar nas correspondentes práticas desportivas. Foi justamente sobre esta infraestrutura desportiva que mandei pôr a mesa onde o casal iria jantar em
tête-à-tête. Mas o pior seria arranjar um sítio onde pudessem dormir. Estava, obviamente, fora de questão que ficassem no abrigo da artilharia, onde o furriel dormia. O Mendes Pinto poderia ser a solução. Tive de usar toda a minha habilidade para o convencer a ceder o seu pequeno quarto no meio dos bidons, restos de viaturas e produtos indênticos. Era exíguo, mas garantia uma certa privacidade.
E foi assim que o casal teve um jantar a dois e uma noite de descanso. Julgo eu…
No dia seguinte, havia mais um passeio à Ponta Varela, o que invalidava a possibilidade de se fazer outra coluna a Bafatá para colocar a Celeste num avião a caminho de Bissau. No regresso do passeio eu tinha a solução. Era necessário tirar a jovem do Xime. A sua presença poderia dar aso a comentários, piropos ou algo pior do que isso tudo. Por isso, chamei o P. e intimei-o a tirá-la dali. Para tal, iria de novo a Bissau, agora por sua conta e risco, fazendo a viagem de avião, a expensas suas e devidamente acompanhado. Depois, a jovem seguiria para Lisboa, nem que fosse a nado, e ele regressaria às suas funções habituais. Tudo teria de ser resolvido num curtíssimo intervalo de tempo. Essa era a minha imposição.
Em dois dias o casal partiu para Bissau e eu fiquei com o coração nas mãos acerca do que o furriel faria em Bissau, numa situação de total ilegalidade. Os dois ficaríamos mal se se descobrisse que andava por ali um jovem casal, cujo marido deveria estar no interior a cumprir as suas tarefas operacionais.
Enfim, ao fim de uma semana, tive o grato prazer de ter o efectivo da artilharia completo. Procurei esquecer o sucedido e rezei para que o assunto não fosse muito divulgado.
Alguns dias depois, fui abordado pelo alferes Viegas da artilharia, queixando-se de que o P. não queria lavar o obus. Quando me preparava para o mandar dar uma volta ao pelotão, em bicicleta, surge o cabo enfermeiro a gritar:
- O gajo matou-se! O gajo matou-se!
Não vi logo quem era o gajo, mas a pior das hipóteses confirmou-se.
O furriel P. apanhara um frasco de Valium 10, embalagem hospitalar, e tomara “n” comprimidos. O cabo enfermeiro esclareceu-me de que o frasco tinha cem comprimidos, dos quais ele já tinha dispensado talvez uns vinte. No fundo do frasco rolavam pouco mais de vinte comprimidos. Conclusão: cerca de sessenta comprimidos iam começar a circular no sistema nervoso do furriel.
Colocámo-lo numa maca e num Unimog que eu próprio conduzi, levei-o a Bambadinca. Dois maqueiros amparavam a maca e eu dei a velocidade de que o carro era capaz. Em Bambadinca, o médico, já avisado da nossa chegada perguntou qual era o problema. Quando lhe descrevi a situação, ele colocou o sinistrado numa posição cientificamente adequada e, metendo-lhe dois dedos na boca, provocou o vómito. Um
jackpot de líquido e comprimidos azulados saiu a rolar da boca.
O médico ficou fiel depositário do sinistrado e eu regressei ao Xime. Tive informação de que dormiu praticamente durante três dias. Depois, entrou num período de recuperação e acabou por regressar à sua secção de 10,5 cm.
Entretanto, fui chamado ao meu comandante de batalhão que queria saber o que se passara. Contei muito resumidamente e confirmei que a Sr.ª D. Celeste P. já estava fora do “TO daquela PU”. Tranquilizado o meu superior hierárquico, tudo poderia ter voltado à normalidade se a respectiva esposa não se tivesse lembrado de intervir no desenrolar da acção. Era uma senhora muito participativa, que assumia o seu papel de “comandanta”, procurando influenciar os acontecimentos, exibindo, de quando em vez, os resultados positivos da comissão que ambos tinham feito em Angola. Não me lembro de ter existido um batalhão comandado “a duo” pelo comandante e esposa, mas eu também nunca estive em Angola… Alguns dias depois, encontrando em Bambadinca dois alferes do E.Rec., a boa senhora resolveu fazer uso de toda a sua persuasão, perguntando-lhes frontalmente qual dos dois dormira com a “mulher do furriel”. Colheu como resposta uma boa dose de silêncio e um sorriso amarelo.
O meu alferes Correia, que viera no mesmo helicóptero que brigadeiro adjunto-operacional, era ex-aluno do Colégio Militar, tal como um dos alferes do E.Rec.. Ao abrigo de uma camaradagem colegial e de um código de deontológico que não conheço, resolveu ir “pregar uma rabecada” no atrevido que dera uma tão larga colaboração para a “fraqueza” que vitimara a Celeste. A resposta foi desconcertante. Tudo tinha começado logo após a partida do furriel P. para o Xime. Ao jantar, na pensão, os dois alferes da cavalaria estavam presentes por terem também um quarto alugado. Era realmente uma situação insólita, mas tinha explicação. Ao que parece, a messe do esquadrão era pequena e o capitão estava também empenhado em tarefas bélico-sexuais. Para ter uma certa liberdade de acção “convidara” os dois alferes a passar um fim-de-semana fora.
Ao vê-los, a Celeste deu-se à conversa e, em breve, um bom contacto estava estabelecido. A conversa progrediu, aumentando de interesse por ter resvalado para terrenos movediços. A disponibilidade da jovem atingiu níveis inauditos, quando informou que estava grávida e, por isso “não haveria problema”. O Correia ia-se inteirando dos pormenores, mas apesar de tudo, continuou a censurar os alferes por se terem aproveitado da mulher de um camarada que estava longe e, mais ainda, num ambiente tão restrito e onde se incluíam tantos militares.
Mas, o pior (ou o melhor) estava para vir, quando a Celeste optou ou correspondeu ao assédio de apenas um dos alferes. Nessa conformidade, o outro teve de ir ver Bafatá
by night, enquanto o casal que acabava de se constituir “se recolhia”. Cerca da meia-noite e cansado do intenso movimento da
Night de Bafatá, dirigiu-se ao quarto que também era seu, já que o alugara a meias com beneficiado. Bateu à porta e foi recebido por este que o mandou entrar. De fonte segura, sabe-se que o quarto tinha duas camas. Só as paredes terão presenciado e poderiam descrever o que sucedeu, mas as paredes não falam. Por consequência, mais do que isso, o Correia não soube. Verdadeiramente abismado com estas revelações, não se sentiu à vontade para continuar a censurar os “prevaricadores”. No fundo, tudo se tinha passado como a natureza manda e o calor local propicia.
Imediatamente após aquela noite, foi organizada a coluna ao Xime que permitiu que o P. ouvisse a confissão terrível, que deu lugar ao tiro para o ar e ao susto que eu apanhei.
A cena do Valium 10 não teve, a curto prazo, mais consequências para além de uma certa letargia que determinou o comportamento do furriel P. durante uns dias. Julgo que se ofereceu para um Pel. Art. que iria para o Cantanhez, cuja ofensiva estava a decorrer, mas segundo me disseram, o oferecimento não foi aceite.
Nunca mais tive notícias do casal desavindo, devido à acção da Natureza e à “força do calor”. O alferes Correia saiu, pouco tempo depois, para uma Africana (companhia de caçadores africanos), como se dizia então, e eu perdi-lhe o rasto. O E.Rec. nunca mais patrulhou o itinerário até ao Xime, talvez porque o In tivesse deixado de andar por ali…
Esta foi uma aventura que, por variadas causas, poderia ter terminado muito mal. Como assim não foi, alimentou as nossas conversas durante algum tempo, entre censuras à Sr.ª D. Celeste P. e a hilaridade inerente à revisão da sequência de todas aquelas situações dignas de uma ópera-bufa.
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Nota de CV:
Vd. poste anterior da série de 5 de Julho de 2011 >
Guiné 63/74 - P8507: A minha guerra a petróleo (ex-Cap Art Pereira da Costa) (6): Ai que me doi tanto!... ou o drama dos especialistas de minas e armadilhas - II Parte